Postagem no Abertura Mundo Jurídico em 16/fev/2019...
Maioria dos juízes entende que não deve seguir jurisprudência, diz pesquisa
Os
juízes brasileiros não gostam muito de seguir jurisprudência e nem são
apegados a precedentes. De acordo com pesquisa sobre o perfil da
magistratura divulgada nesta segunda-feira (11/2) pela Associação dos
Magistrados Brasileiros (AMB), a maioria dos juízes, de primeira e de
segunda instância, acha que o sistema de precedentes prejudica sua
independência profissional.
De acordo com a pesquisa, 52% dos juízes de primeiro grau entendem
que não devem se pautar por jurisprudência. Até mesmo os ministros,
responsáveis por criar os precedentes e súmulas, são ressabiados com o
sistema: 55% dos 20 entrevistados pela pesquisa concordam que o
magistrado deveria poder decidir sem se pautar necessariamente pelo
sistema de súmulas e precedentes vinculantes.
Ao mesmo tempo, no
entanto, a maioria esmagadora dos juízes concorda que o sistema de
precedentes garante maior velocidade e segurança jurídica à atividade
jurisdicional e, portanto, maior racionalização do Judiciário. A
pesquisa “Quem somos: a magistratura que queremos” ouviu cerca de 4 mil magistrados.
É um dado alarmante, aponta o constitucionalista Lenio Streck.
O Código de Processo Civil de 2015 acabou com o que o jurista chama de
"livre convencimento". Os artigos 926 e 927 do CPC enumeram o que os
juízes e tribunais devem observar quando forem tomar decisões,
minimizando a influência de interpretações pessoais.
Para
Lenio, "a pesquisa desnuda um problema grave, que já era do conhecimento
da comunidade jurídica, isto é, não há simpatia de parcela considerável
da magistratura, nos diversos graus, por um sistema jurídico que
funcione por, e com, coerência e integridade".
"E aí reside o nó:
exatamente por isso é que o sistema é fragmentado e há tantos recursos.
Isso gera jurisprudência defensiva. É um círculo vicioso. Se as decisões
não são coerentes umas com outras e não obedecem uma integridade
vertical, parece óbvio que aumenta a insegurança jurídica", analisa o
professor.
"O que a pesquisa não perguntou é, por exemplo, as
razões pelas quais nem os próprios tribunais superiores seguem a sua
própria jurisprudência. Temos, pois, um duplo problema: os juízes de
piso e tribunais de segundo grau não obedecem - ou, como diz a pesquisa,
não concordam que devam obedecer - a jurisprudência (precedentes,
sumulas etc) que vem de cima. E os tribunais de cima não seguem a si
mesmos. Interessante é que, desde 2015, existe o novo CPC que obriga a
que todos os magistrados (incluídos Ministros) que julguem de acordo com
o artigo 926 do CPC, que diz que a jurisprudência deve ser estável,
íntegra e coerente, além do artigo 10 que diz que nenhuma decisão deve
ser feita de surpresa. Isso sem considerar o artigo 489, parágrafo 1º do
CPC."
Ativismo judicial
Os juízes responderam também perguntas sobre ativismo judicial e
fundamentação das decisões. Em relação à possibilidade do Judiciário
exercer um papel criativo na produção de normas acerca de temas
sensíveis para a sociedade sobre os quais não se constitui uma maioria
parlamentar, o posicionamento muda conforme o grau do judiciário.
Em
primeiro grau, a maioria discorda. Já em segundo grau, há uma maioria
favorável (55,8%). Nos tribunais superiores, a quantidade de ministros
que concordam com esse papel do Judiciário aumenta ainda mais (66,6%).
Já
em relação à possibilidade do Judiciário interpretar criativamente as
leis para atender a anseios da sociedade sobre temas sem definição
parlamentar, a maioria dos magistrados concorda que é possível.
90%
dos entrevistados concordaram ainda que é legítimo ao magistrado se
basear em princípios constitucionais para compelir os demais poderes a
assegurar a efetividade de direitos, em especial quanto à saúde,
educação e segurança.
Clique aqui para ler a pesquisa.
Tadeu Rover é repórter da revista Consultor Jurídico.
Original disponível em: (https://www.conjur.com.br/2019-fev-11/juizes-entendem-nao-seguir-jurisprudencia-pesquisa#author). Acesso em 16/fev/2019.
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