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quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Ação de restituição por enriquecimento sem causa. Caráter subsidiário. Incabível. Existência de meio próprio para defesa. STJ.

Postagem 31/ago/2016...

Ementa: 

RECURSO  ESPECIAL.  CIVIL  E  PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO ART. 535 DO CPC.  APELAÇÃO  CÍVEL.  AÇÃO  DE  RESTITUIÇÃO POR ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. CARÁTER SUBSIDIÁRIO. EXISTÊNCIA DE MEIO PRÓPRIO PARA DEFENDER O DIREITO.
1.  Não  há  violação  ao  artigo  535,  II,  do  CPC, quando embora rejeitados  os  embargos  de  declaração,  a  matéria  em  exame foi devidamente   enfrentada   pelo   Tribunal  de  origem,  que  emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da recorrente.
2. A configuração do enriquecimento sem causa requer a conjugação de quatro  elementos:  a)  o  enriquecimento  em sentido estrito de uma parte;  b) o empobrecimento da outra parte; c) o nexo de causalidade entre um e outro; d) a ausência de justa causa.
3.  Quanto  à ação in re verso, o art. 886 do Código Civil preceitua não  ser  cabível  nos  casos  em que existir na lei outros meios de pleitear a recomposição do patrimônio desfalcado.
4.  É  função  da  subsidiariedade,  prevista  na  lei a proteção do sistema jurídico, para que, mediante a ação de enriquecimento, a lei não  seja  contornada  ou fraudada, evitando-se que o autor consiga, por  meio  da  ação  de  enriquecimento,  o  que  lhe  é vedado pelo ordenamento.
5.  Nos  casos  em que ocorrida a prescrição de ação específica, não pode  o  prejudicado valer-se da ação de enriquecimento, sob pena de violação da finalidade da lei.
6. Recurso especial não provido.
(REsp 1497769/RN, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 05/05/2016, DJe 07/06/2016).



Acórdão integral:


Golpe no Brasil. Simulação de impeachment. Dilma sai da presidência muito maior do que entrou (Paulo Nogueira)

Postagem 31/ago/2016...

Dilma sai da presidência muito maior do que entrou. 

Postado em 31 Aug 2016
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Dilma se agigantou no impeachment
Parecia que a melhor hora de Dilma tinha sido seu discurso na véspera do julgamento final do Senado.
Mas não.
Em clareza, grandeza, Dilma se superou na entrevista que concedeu pouco depois de definido o golpe.
Ela declarou guerra ao golpe.
Não guerra no sentido militar convencional. Ninguém está falando de pegar em armas ou coisa do gênero.
Trata-se de guerra política.
O primeiro e essencial passo é dar às coisas o nome que elas têm, sem lantejoulas e sem metáforas.
Uma amostra do que Dilma disse com a contundência indispensável:
1) É golpe. É golpe parlamentar, mas é golpe. Com exclamação.
2) Por trás do golpe estão as velhas forças conservadoras de sempre, os reacionários que conspiraram contra Getúlio, JK, Jango, Lula e, finalmente, a própria Dilma.
3) Os golpistas tiveram uma contribuição milionária da “imprensa facciosa”. De novo, é uma repetição de golpes anteriores, em que a mídia foi invariavelmente protagonista na destruição da democracia.
4) Temer é um usurpador que levou ao núcleo do poder o que existe de mais corrupto e atrasado na política brasileira.
Ficou claro que, daqui por diante, as forças progressistas mostrarão o mar de lama da plutocracia nacional.
Isto tem o poder de mudar a história. A narrativa golpista, de GV a Dilma, sempre se alicerçou no combate — farisaico, cínico, mentiroso — à corrupção.
As delações comprovaram que os principais tagarelas anticorrupção são exatamente os homens mais corruptos da vida pública nacional.
O caso mais simbólico é o de Aécio: jamais ele terá condições de falar em corrupção, como fez a carreira toda, sem provocar gargalhadas ao redor.
Aécio se tornou um ícone da corrupção plutocrata das mesmas dimensões de Eduardo Cunha.
Ele roubava, só que ninguém noticiava na mídia plutocrata.
Aécio parece ainda viver numa realidade paralela. Numa entrevista nesta quarta aos amigos da Globonews, citou o eminente senador Cássio Cunha Lima como um expoente do universo político brasileiro.
Ora, ora, ora.
Cunha Lima é um corrupto notório. Foi cassado como governador da Paraíba e só conseguiu concorrer a senador porque a lei da Ficha Limpa só passou a valer depois da eleição. Não bastasse isso, um homem de sua equipe teve que jogar dinheiro do alto de um prédio para evitar um flagrante de compra de votos. Pobres paraibanos ganhavam dinheiro de Cunha Lima para votarem nele. O episódio passou à história como o caso do Dinheiro Voador.
Esta é a probidão dos plutocratas.
Sabe-se agora quem são os reais corruptos, os parasitas que tomam dinheiro público para montar patrimônios bilionários e deixar o Brasil eternamente na condição de um inferno da desigualdade.
Dilma jogou luzes onde sempre houve sombras. Os ladrões são aqueles que todos nós conhecemos, e que se fazem de paladinos da moral para enganar a sociedade e assim poder roubar cada vez mais.
Para a democracia brasileira, a fala de Dilma como ex-presidente é algo que traz esperanças em doses colossais para que deixemos um dia de ser a republiqueta das bananas a que os plutocratas querem nos sujeitar pela eternidade.
Paulo Nogueira
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

Golpe no Brasil. Simulação de impeachment. Vice procuradora da República declara que Temer é acusado em delação e renuncia (Cf. Forum)

Postagem 31/ago/2016...

Vice-procuradora da República 

diz que Temer foi delatado, 

critica o golpe e pede demissão

Em entrevista à Veja, Ela Wiecko afirmou que Temer foi delatado à Procuradoria Geral da República e que não vê com bons olhos a posse do peemedebista como presidente efetivo
Por Redação
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Ela Wiecko, agora ex-vice-procuradora da República, contou à revista Veja que não vê a posse de Michel Temer como presidente efetivo com bons olhos, uma vez que a Procuradoria Geral da República recebeu delação contra ele.
Para Wiecko, o processo orquestrado contra a presidenta eleita Dilma Rousseff é um golpe. “Um golpe benfeito. Dentro daquelas regras. Isso a gente vê todo dia, é parte da política”, explicou. Segundo a jurista, dentro do Ministério Público Federal existem outras figuras que, como ela, veem com desconfiança e receio um eventual governo Temer até as próximas eleições.
“Tem muita gente que pensa como eu dentro da instituição. Eu estou incomodada com essas coisas que estão acontecendo no Brasil. Acho que não foi da melhor forma possível. E pelas coisas que a gente sabe do Temer, não me agrada ter o Temer como presidente. Não me agrada mesmo. Ele não está sendo delatado? Eu sei que está. Eu não sei todas as coisas a respeito das delações, mas eu sei que tem delação contra ele. Então, não quero. Mas as coisas estão indo”, afirmou.
Na noite desta terça-feira (30), após a entrevista à Veja, Wiecki renunciou ao cargo de vice-procuradora da República. Padre João, deputado e presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, emitiu nota sobre a saída dela. Confira na íntegra.
Colaboradora de anos e anos desta Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, Ela Wiecko é uma referência em lutas essenciais à nossa democracia: contra o trabalho escravo, pelos direitos dos povos indígenas e quilombolas, pela igualdade racial e de gêneros, pela ética na política. Uma pessoa cuja sensibilidade social e compromisso com a Justiça são indissociáveis de sua atividade profissional e posicionamento cidadão.
Respeitamos sua decisão de renunciar ao cargo de Vice-Procuradora Geral da República, registrando no entanto a lacuna que se abre na instituição neste momento delicado da vida nacional, com tantos riscos à democracia e aos direitos humanos. Sabemos que poderemos continuar contando, como sempre contamos, com sua atuação funcional destemida e consequente na defesa dos direitos fundamentais do povo brasileiro.

Foto: Reprodução/Jornal GGN.

Carta aberta de Letícia Sabatella para Presidente Dilma (leia)

Postagem 31/ago/2016...

Letícia Sabatella escreve 

carta para Dilma; 

leia na íntegra


“Sua coragem e firmeza no dia de ontem teve força para revelar a verdade sobre este crime político e os impactos negativos que já estão sendo perpetrados por forças corruptas, demagogas, hipócritas e oportunistas”, escreveu a atriz em texto destinado à presidenta
Por Redação
alt6 São Paulo 06/02/12 - VARIEDADES - LETICIA SABATELA - Entrevista com a atriz Leticia Sabatela. FOTO ANDRE LESSA/AE.
Querida Presidenta,
Soa bom chamar assim à governança do nosso país.
Que venham muitas presidentas!
Exercendo dignamente o cargo mais importante do Brasil, você terá aberto as portas para que as belas saiam cada vez mais do recato do seu lar, ocupando a vida pública, política e acreditando que o poder também pode lhes caber, utilizando­-o com integridade, honestidade e ética. Que não precisa e não deve ser entregue somente às mãos de um único gênero ou de um grupo de famílias, de uma classe, mas que o povo pode e deve assumir a cidadania e a política por responsabilidade própria.
Sua coragem e firmeza no dia de ontem teve força para revelar a verdade sobre este crime político e os impactos negativos que já estão sendo perpetrados por forças corruptas, demagogas, hipócritas e oportunistas que desejam implementar no Brasil um programa de governo reacionário, antiecológico e extremamente injusto com a classe trabalhadora.
Venho me manifestar por nossa democracia, que ainda é muito jovem, imatura, neocoronelista e ainda sofre com um modelo de desenvolvimento bastante predatório. E nos deve muito em justiça social, às pessoas pobres, negras, aos pequenos agricultores, aos indígenas, à justiça socioambiental e à igualdade.
Tenho sido franca ativista pelos Direitos Humanos antes e durante o seu mandato.
Enquanto era a Primavera de uma abertura de olhar às questões sociais, fundamos o movimento Humanos Direitos e participamos de grandes conquistas deste governo no combate ao trabalho escravo. Muito se fez para combater a miséria e isso espantou o mundo. Nossa Cultura Popular teve espaços mais amplos para sua expressão e pudemos ver rostos de meninos do morro, das periferias, colorindo telas de cinema, levando nossa

identidade para além­mar, fortalecendo a autoestima do povo brasileiro.

Já tive a oportunidade, presidenta, de olhar em seus olhos e, na sua presença, lhe dizer que faço uma oposição de esquerda ao seu governo e de expressar naquele momento o meu contentamento de poder dizer que ainda vivo em um Estado que se pretende ­ de forma utópica, em realidade e em exercício ­ ser democrático e que procura preservar as liberdades e o inconsciente coletivo saudável da nossa população.
Embora o seu governo tenha cometido erros, especialmente no que diz respeito ao meio ambiente, é inegável que combateu a desigualdade social, trouxe dignidade a milhões de brasileiros e brasileiras e promoveu a ascensão social de uma grande parcela da população. Ao longo desses últimos anos, aprendemos que com vontade política quase tudo é possível.
Contudo, hoje nos cobre uma sombra que assola os corações de irmãos, de irmãs, de pessoas que não mais se reconhecem e vivem em um ambiente de ódio fomentado por um plano maquiavélico de tomada de poder por grupos econômicos que não aceitaram que um mínimo de direitos seja repartido com os mais vulneráveis e desprivilegiados socialmente.
Não respeitar a decisão das urnas e apoiar esse assalto aos 54 milhões de votos que garantiram seu mandato conquistado em eleições limpas ­ é desconhecer o sentido de democracia e abrir o precedente para que o jovem sistema político brasileiro não se recupere tão cedo.
É muito assustador saber que o motivo que usam para tirá­-la do poder não está baseado em seus erros, mas em seus acertos. Como cidadã, carrego as decepções de quem esperava o empoderamento da agricultura familiar e a libertação do coronelismo. Mas acompanhando de perto todo esse processo, entendo a sua dificuldade política ao perceber como é composto o nosso Congresso Nacional e o quanto há de boicote, por parte da maioria dos nossos parlamentares, a uma verdadeira transformação social.
Uma vez conquistados os direitos sociais e culturais do nosso povo ­ com muita luta e garra temos que dar um passo adiante e não para trás. Por isso estou ao seu lado em defesa da democracia e contra esse retrocesso, que deve ser chamado exatamente pelo o que ele é, e sem temor: um golpe parlamentar!
Um abraço

Letícia Sabatella

Golpe no Brasil. Simulação de Impeachment. Cumprimento de ritos não legitima impeachment: "É golpe!" (Prof. Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira).

Postagem 31/ago/2016...

Jurista diz que cumprir ritos não legitima impeachment: “É golpe”

O jurista e professor de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira, afirmou que a sessão do processo de impeachment, desta segunda-feira (29), com a presença da presidenta eleita Dilma Rousseff, demonstrou que “esse julgamento tem muito pouco de jurídico” e que o fato dela comparecer não legitima o processo.
Por Dayane Santos
Reprodução
 
“Esse processo é uma tentativa de usar a Constituição contra a própria Constituição sob o argumento de impeachment, mas na verdade é um golpe de Estado parlamentar que afasta uma presidente da República eleita por mais de 54 milhões de votos em razão de interesse políticos”, disse o jurista.
“Apelar para o suposto cumprimento de rito, não condiz com a verdade porque até do ponto de vista processual é possível criticar. E, além disso, as acusações apontadas contra Dilma não são crime. E se for impedida será por força políticas que não querem que ela continue exercendo o seu mandato”, enfatizou o jurista, que é um dos autores do livro O Impeachment e o Supremo Tribunal Federal, juntamente com Alexandre Gustavo Melo Franco Bahia e Diogo Bacha e Silva.
O comentário do professor refere-se às perguntas e discursos feitos por senadores que apoiam o impeachment durante a sessão desta segunda. Como as provas do processo não sustentam a tese de crime de responsabilidade, os golpistas utilizaram o tempo que tinham para fazer indagações de que a presença da presidenta eleita na sessão legitimava o processo e, portanto, não era golpe.
De acordo com o professor, há uma tentativa de legitimação do processo com o apelo a um suposto cumprimento dos ritos processuais, mas que, no fundo, servem de pano de fundo para esconder a falta de provas, pois “não há caracterização, nem em tese, de crime de responsabilidade” e, portanto, “o processo inteiro é nulo”.
“Não é verdade que o rito processual está sendo devidamente cumprido, pois falta uma condição indispensável para a instauração do próprio processo: o crime. Acusam a presidente de uma conduta que, por hipótese seria crime, mas se falta isso o processo também está maculado. Trata-se de uma violação básica do direito”, explica.
“Dilma esteve no julgamento para dizer exatamente isso: não há crime de responsabilidade. Ela não estava legitimando nada. Estava na verdade apelando aos senadores para reconhecerem que aquele processo era um erro”, disse.
Para Cattoni, a ida de presidenta eleita ao Senado também cumpriu um papel histórico para o Brasil. “No mínimo é necessário o registro para a história. Isso é fundamental porque nós vamos ter que prestar contas às gerações futuras de tudo que foi feito no Brasil.”
STF
O professor da UFMG publicou recentemente um artigo em que afirma que o Supremo Tribunal Federal deveria anular o processo de impeachment, pois não há crime de responsabilidade que possa fundamentar o afastamento de uma presidenta legitimamente eleita.
“Primeiro, não se pode impedir um presidente pelo ‘conjunto da obra’. Isso é um absurdo! Não existe. Segundo, as acusações de crime de responsabilidade nas chamadas ‘pedaladas fiscais’ e dos decretos não se configuram. Dizer que os decretos teriam violado a Lei Orçamentária é outro absurdo, pois só tem como saber que houve violação no final do exercício financeiro. E se o próprio Congresso revê as metas e convalida os atos, não faz sentindo dizer que ali poderia ter havido uma violação”, pontuou.
Cattoni apontou outra violação grosseira do relatório do senador tucano Antonio Anastasia (PSDB-MG). Segundo ele, diferentemente do que o senador Anastasia pensa, “o exercício financeiro não é trimestral, é anual”, portanto, não se pode analisar as contas como ele fez para justificar o pedido de impeachment.
Sobre a questão do Plano Safra, o jurista classifica como “absurda” a tentativa de responsabilizar a presidenta Dilma pela gestão. “A gestão do banco não é feita diretamente pela presidente da República. Então como podem atribuir responsabilidade à presidente por um crime que ela não cometeu? E ainda que tivesse cometido tal medida não configura operação de crédito, até porque operação de crédito envolve transferência de propriedade. Das duas uma: ou as acusações não são crimes ou elas não restam suficientemente comprovadas”, enfatiza.
E acrescenta: “Isso demonstra que se Dilma for impedida será mais por uma reação política à linha de governo que ela promoveu e a sua atuação do que com base em argumentos jurídicos. Os argumentos são muito frágeis”, disse.
Questionado sobre a aplicação da teoria do domínio do fato que os golpistas usam para fraudar o impeachment, o jurista afirma que o ordenamento jurídico brasileiro não dá condições para a aplicação de tal fundamento.
Ele explica: “Essa tese do domínio do fato foi construída num outro contexto histórico para resolver o processo de responsabilização de autoridades alemãs no período posterior à Segunda Guerra Mundial. A tese se baseia na ideia de que o soldado que atirou não é responsável pelo tiro que deu porque estava cumprindo ordens”.
Segundo ele, aplicar essa teoria para justificar o impeachment “é absurdo”, porque a própria Constituição brasileira diferencia a forma de julgamento das contas do presidente da República, das contas da administração direta ou indireta.
“Basta lembrar que o Tribunal de Contas emite um parecer técnico, mas quem julga é o Congresso no caso das contas do presidente. E incrivelmente não há nenhuma conta da presidente Dilma reprovada pelo Congresso em 2015. Nem sequer foram analisadas”, lembrou.
“De acordo com a Constituição, o Congresso deve julgar por uma sessão conjunta entre Câmara e Senado. Quem julga as contas da administração direta ou indireta é o tribunal de contas. Existe uma diferença de competência quanto ao julgamento de contas da administração pública, portanto, não se pode falar em tese de domínio do fato. A presidente da República não pode ser responsável por descumprimento de um ente da administração indireta ou direta”, frisou.

Contranarrativa midiática

O jurista fez questão de salientar o papel da mídia alternativa na denúncia do golpe. “Vejo um papel importante da imprensa, sobretudo da imprensa alternativa, já que os grandes meios de comunicação têm procurado legitimar o que tem acontecido. É necessário construir a contranarrativa, mostrando exatamente que o que tem ocorrido é uma fraude à Constituição.”
Do Portal Vermelho

terça-feira, 30 de agosto de 2016

José Eduardo Cardozo chora ao comentar a menção dos netos de Dilma Rousseff na fala da acusação

Postagem 30/ago/2016...

José Eduardo Cardozo chora ao comentar a menção dos netos de Dilma Rousseff na fala da acusação

Após o discurso em que defendeu a improcedência do impeachment, o advogado de defesa da presidenta eleita Dilma Rousseff, concedeu uma breve entrevista coletiva.
Visivelmente emocionado, José Eduardo Cardozo afirmou que a maneira como a acusação agiu na tribuna do Senado Federal, hoje (30), que sugeriu que Dilma fosse condenada para proteger seus netos, o deixou profundamente indignado.

“Eu nunca deixei de me emocionar diante da injustiça. Aquele que perde a emoção diante da injustiça é alguém que se desumanizou”, disse aos prantos.

De fato, Janaína Paschoal e Miguel Reale Jr. agiram como verdadeiros tiranos durante a exposição da acusação na tribuna. O que despertou um profundo sentimento de decepção ao advogado de defesa.
“Eu acho que do ponto de vista humano, há que se indignar diante da injustiça. Perdeu-se a humanidade. Eu achei profundamente injusta a menção aos netos”, lamentou.
Como afirmou o professor Afranio Silva Jardim, a fala de Janaína Paschoal provoca a nulidade total do processo de impeachment

Dilma: “Hoje só temo a morte da democracia, pela qual lutamos” (Renato Rabelo)

Postagem 30/ago/2016...



Dilma: “Hoje só temo a morte da democracia, pela qual lutamos”


A presidenta eleita Dilma Rousseff fala neste momento fazendo sua defesa no julgamento final no processo de impeachment, nesta segunda-feira (29). A presidenta afirmou que o seu mandato é marcado pela defesa da Constituição. “Sempre acreditei na democracia e no Estado de Direito. Jamais atentarei contra o que acredito ou praticaria atos contra os interesses daqueles que me elegeram”, afirmou a presidenta afastada na parte inicial de sua fala.
Reprodução
 
“Não luto pelo meu mandato por vaidade ou apelo ao poder como é próprio dos que não têm caráter. Luto pelo povo do meu país, pelo seu bem-estar”, declarou.
Dilma reafirmou que não cometeu nenhum dos crimes de responsabilidade pelos quais é acusada. Citando as manobras políticas da elite conservadora contra os ex-presidentes Getúlio Vargas e João Goulart, disse que a “ruptura democrática” se dá agora sob pretextos constitucionais “embasados por uma frágil retórica jurídica”.
“Diante das acusações que contra mim são dirigidas, não posso deixar de sentir novamente o gosto amargo da injustiça e do arbítrio. Mas como no passado, resisto. Não esperem de mim o obsequioso silêncio dos covardes”, salientou.
Com a voz embargada pela emoção, Dilma afirmou que “por duas vezes vi de perto a face da morte: quando fui torturada por dias seguidos, submetida a sevícias que nos fazem duvidar da humanidade e do próprio sentido da vida; e quando uma doença grave e extremamente dolorosa poderia ter abreviado minha existência”.
“Hoje eu só temo a morte da democracia, pela qual muitos de nós, aqui neste plenário, lutamos com o melhor dos nossos esforços. Reitero: respeito os meus julgadores. Não nutro rancor por aqueles que votarão pela minha destituição. Respeito e tenho especial apreço por aqueles que têm lutado bravamente pela minha absolvição, aos quais serei eternamente grata”, completou.
Ela afirmou que “o que está em jogo no processo de impeachment não é o meu mandato”, mas “as conquistas dos últimos 13 anos”, e listou iniciativas do governo dela, como valorização do salário mínimo, programas Mais Médicos, Minha Casa Minha Vida e a inserção de jovens nas universidades.
“Um golpe que, se consumado, resultará na eleição de um governo indireto e usurpador. A eleição indireta de um governo que na sua interinidade não tem mulheres nos ministérios quando o povo nas urnas escolheu uma mulher para comandar o país. Um governo que dispensa negros na sua composição ministerial e revelou profundo desprezo pelo programa escolhido e aprovado pelo povo em 2014”, disse.
“No presidencialismo previsto na Constituição, não basta a eventual perda de maioria parlamentar para afastar o presidente. Há que se configurar crime de responsabilidade e está claro que não houve tal crime”, frisou a presidenta.
E completa: “Não é legítimo, como querem meus acusadores, afastar o chefe de Estado e governo por não concordarem com o conjunto da obra. Quem afasta o presidente por conjunto da obra é o povo, só nas eleições”.
Dilma fez questão de fazer referência ao papel das mulheres na luta pela democracia diante das ameaças que enfrenta. “As mulheres brasileiras têm sido, neste período, um esteio fundamental para minha resistência. Me cobriram de flores e me protegeram com sua solidariedade. Parceiras incansáveis de uma batalha em que a misoginia e o preconceito mostraram suas garras, as brasileiras expressaram, neste combate pela democracia e pelos direitos, sua força e resiliência. Bravas mulheres brasileiras, que tenho a honra e o dever de representar como primeira mulher Presidenta do Brasil”, disse.
Ao encerrar o discurso, Dilma se dirigiu aos senadores e senadoras. “Faço um apelo final a todos os senadores: não aceitem um golpe que, em vez de solucionar, agravará a crise brasileira. Peço que façam justiça a uma presidenta honesta, que jamais cometeu qualquer ato ilegal, na vida pessoal ou nas funções públicas que exerceu. Votem sem ressentimento. O que cada senador sente por mim e o que nós sentimos uns pelos outros importa menos, neste momento, do que aquilo que todos sentimos pelo país e pelo povo brasileiro. Peço: votem contra o impeachment. Votem pela democracia”, concluiu.
Confira a Integra do discurso:

Excelentíssimo Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski
Excelentíssimo Senhor Presidente do Senado Federal Renan Calheiros,
Excelentíssimas Senhoras Senadoras e Excelentíssimos Senhores Senadores,
Cidadãs e Cidadãos de meu amado Brasil,

No dia 1° de janeiro de 2015 assumi meu segundo mandato à Presidência da República Federativa do Brasil. Fui eleita por mais de 54 milhões de votos.
Na minha posse, assumi o compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição, bem como o de observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil.
Ao exercer a Presidência da República respeitei fielmente o compromisso que assumi perante a nação e aos que me elegeram. E me orgulho disso. Sempre acreditei na democracia e no Estado de Direito, e sempre vi na Constituição de 1988 uma das grandes conquistas do nosso povo.
Jamais atentaria contra o que acredito ou praticaria atos contrários aos interesses daqueles que me elegeram.
Nesta jornada para me defender do impeachment me aproximei mais do povo, tive oportunidade de ouvir seu reconhecimento, de receber seu carinho. Ouvi também críticas duras ao meu governo, a erros que foram cometidos e a medidas e políticas que não foram adotadas. Acolho essas críticas com humildade.
Até porque, como todos, tenho defeitos e cometo erros.
Entre os meus defeitos não está a deslealdade e a covardia. Não traio os compromissos que assumo, os princípios que defendo ou os que lutam ao meu lado. Na luta contra a ditadura, recebi no meu corpo as marcas da tortura. Amarguei por anos o sofrimento da prisão. Vi companheiros e companheiras sendo violentados, e até assassinados.
Na época, eu era muito jovem. Tinha muito a esperar da vida. Tinha medo da morte, das sequelas da tortura no meu corpo e na minha alma. Mas não cedi. Resisti. Resisti à tempestade de terror que começava a me engolir, na escuridão dos tempos amargos em que o país vivia. Não mudei de lado. Apesar de receber o peso da injustiça nos meus ombros, continuei lutando pela democracia.
Dediquei todos esses anos da minha vida à luta por uma sociedade sem ódios e intolerância. Lutei por uma sociedade livre de preconceitos e de discriminações. Lutei por uma sociedade onde não houvesse miséria ou excluídos. Lutei por um Brasil soberano, mais igual e onde houvesse justiça.
Disso tenho orgulho. Quem acredita, luta.
Aos quase setenta anos de idade, não seria agora, após ser mãe e avó, que abdicaria dos princípios que sempre me guiaram.
Exercendo a Presidência da República tenho honrado o compromisso com o meu país, com a Democracia, com o Estado de Direito. Tenho sido intransigente na defesa da honestidade na gestão da coisa pública.
Por isso, diante das acusações que contra mim são dirigidas neste processo, não posso deixar de sentir, na boca, novamente, o gosto áspero e amargo da injustiça e do arbítrio.
E por isso, como no passado, resisto.
Não esperem de mim o obsequioso silêncio dos covardes. No passado, com as armas, e hoje, com a retórica jurídica, pretendem novamente atentar contra a democracia e contra o Estado do Direito.
Se alguns rasgam o seu passado e negociam as benesses do presente, que respondam perante a sua consciência e perante a história pelos atos que praticam. A mim cabe lamentar pelo que foram e pelo que se tornaram.
E resistir. Resistir sempre. Resistir para acordar as consciências ainda adormecidas para que, juntos, finquemos o pé no terreno que está do lado certo da história, mesmo que o chão trema e ameace de novo nos engolir.
Não luto pelo meu mandato por vaidade ou por apego ao poder, como é próprio dos que não tem caráter, princípios ou utopias a conquistar. Luto pela democracia, pela verdade e pela justiça. Luto pelo povo do meu país, pelo seu bem-estar.
Muitos hoje me perguntam de onde vem a minha energia para prosseguir. Vem do que acredito. Posso olhar para trás e ver tudo o que fizemos. Olhar para a frente e ver tudo o que ainda precisamos e podemos fazer. O mais importante é que posso olhar para mim mesma e ver a face de alguém que, mesmo marcada pelo tempo, tem forças para defender suas ideias e seus direitos.
Sei que, em breve, e mais uma vez na vida, serei julgada. E é por ter a minha consciência absolutamente tranquila em relação ao que fiz, no exercício da Presidência da República que venho pessoalmente à presença dos que me julgarão. Venho para olhar diretamente nos olhos de Vossas Excelências, e dizer, com a serenidade dos que nada tem a esconder que não cometi nenhum crime de responsabilidade. Não cometi os crimes dos quais sou acusada injusta e arbitrariamente.
Hoje o Brasil, o mundo e a história nos observam e aguardam o desfecho deste processo de impeachment.
No passado da América Latina e do Brasil, sempre que interesses de setores da elite econômica e política foram feridos pelas urnas, e não existiam razões jurídicas para uma destituição legítima, conspirações eram tramadas resultando em golpes de estado.
O presidente Getúlio Vargas, que nos legou a CLT e a defesa do patrimônio nacional, sofreu uma implacável perseguição; a hedionda trama orquestrada pela chamada “República do Galeão”, que o levou ao suicídio.
O presidente Juscelino Kubitscheck, que contruiu essa cidade, foi vítima de constantes e fracassadas tentativas de golpe, como ocorreu no episódio de Aragarças.
O presidente João Goulart, defensor da democracia, dos direitos dos trabalhadores e das Reformas de Base, superou o golpe do parlamentarismo mas foi deposto e instaurou-se a ditadura militar, em 1964. Durante 20 anos, vivemos o silêncio imposto pelo arbítrio e a democracia foi varrida de nosso país. Milhões de brasileiros lutaram e reconquistaram o direito a eleições diretas.
Hoje, mais uma vez, ao serem contrariados e feridos nas urnas os interesses de setores da elite econômica e política nos vemos diante do risco de uma ruptura democrática. Os padrões políticos dominantes no mundo repelem a violência explícita. Agora, a ruptura democrática se dá por meio da violência moral e de pretextos constitucionais para que se empreste aparência de legitimidade ao governo que assume sem o amparo das urnas. Invoca-se a Constituição para que o mundo das aparências encubra hipocritamente o mundo dos fatos.
As provas produzidas deixam claro e inconteste que as acusações contra mim dirigidas são meros pretextos, embasados por uma frágil retórica jurídica.
Nos últimos dias, novos fatos evidenciaram outro aspecto da trama que caracteriza este processo de impeachment. O autor da representação junto ao Tribunal de Contas da União que motivou as acusações discutidas nesse processo, foi reconhecido como suspeito pelo presidente do Supremo Tribunal Federal. Soube-se ainda, pelo depoimento do auditor responsável pelo parecer técnico, que ele havia ajudado a elaborar a própria representação que auditou. Fica claro o vício da parcialidade, a trama, na construção das teses por eles defendidas.
São pretextos, apenas pretextos, para derrubar, por meio de um processo de impeachment sem crime de responsabilidade, um governo legítimo, escolhido em eleição direta com a participação de 110 milhões de brasileiros e brasileiras. O governo de uma mulher que ousou ganhar duas eleições presidenciais consecutivas.
São pretextos para viabilizar um golpe na Constituição. Um golpe que, se consumado, resultará na eleição indireta de um governo usurpador.
A eleição indireta de um governo que, já na sua interinidade, não tem mulheres comandando seus ministérios, quando o povo, nas urnas, escolheu uma mulher para comandar o país. Um governo que dispensa os negros na sua composição ministerial e já revelou um profundo desprezo pelo programa escolhido pelo povo em 2014.
Fui eleita presidenta por 54 milhões e meio de votos para cumprir um programa cuja síntese está gravada nas palavras “nenhum direito a menos”.
O que está em jogo no processo de impeachment não é apenas o meu mandato. O que está em jogo é o respeito às urnas, à vontade soberana do povo brasileiro e à Constituição.
O que está em jogo são as conquistas dos últimos 13 anos: os ganhos da população, das pessoas mais pobres e da classe média; a proteção às crianças; os jovens chegando às universidades e às escolas técnicas; a valorização do salário mínimo; os médicos atendendo a população; a realização do sonho da casa própria.
O que está em jogo é o investimento em obras para garantir a convivência com a seca no semiárido, é a conclusão do sonhado e esperado projeto de integração do São Francisco. O que está em jogo é, também, a grande descoberta do Brasil, o pré-sal. O que está em jogo é a inserção soberana de nosso país no cenário internacional, pautada pela ética e pela busca de interesses comuns.
O que está em jogo é a autoestima dos brasileiros e brasileiras, que resistiram aos ataques dos pessimistas de plantão à capacidade do país de realizar, com sucesso, a Copa do Mundo e as Olimpíadas e Paralimpíadas.
O que está em jogo é a conquista da estabilidade, que busca o equilíbrio fiscal mas não abre mão de programas sociais para a nossa população.
O que está em jogo é o futuro do país, a oportunidade e a esperança de avançar sempre mais.
Senhoras e senhores senadores,
No presidencialismo previsto em nossa Constituição, não basta a eventual perda de maioria parlamentar para afastar um presidente. Há que se configurar crime de responsabilidade. E está claro que não houve tal crime.
Não é legítimo, como querem os meus acusadores, afastar o chefe de Estado e de governo pelo “conjunto da obra”. Quem afasta o presidente pelo “conjunto da obra” é o povo e, só o povo, nas eleições. E nas eleições o programa de governo vencedor não foi este agora ensaiado e desenhado pelo governo interino e defendido pelos meus acusadores.
O que pretende o governo interino, se transmudado em efetivo, é um verdadeiro ataque às conquistas dos últimos anos.
Desvincular o piso das aposentadorias e pensões do salário mínimo será a destruição do maior instrumento de distribuição de renda do país, que é a Previdência Social. O resultado será mais pobreza, mais mortalidade infantil e a decadência dos pequenos municípios.
A revisão dos direitos e garantias sociais previstos na CLT e a proibição do saque do FGTS na demissão do trabalhador são ameaças que pairam sobre a população brasileira caso prospere o impeachment sem crime de responsabilidade.
Conquistas importantes para as mulheres, os negros e as populações LGBT estarão comprometidas pela submissão a princípios ultraconservadores.
O nosso patrimônio estará em questão, com os recursos do pré-sal, as riquezas naturais e minerárias sendo privatizadas.
A ameaça mais assustadora desse processo de impeachment sem crime de responsabilidade é congelar por inacreditáveis 20 anos todas as despesas com saúde, educação, saneamento, habitação. É impedir que, por 20 anos, mais crianças e jovens tenham acesso às escolas; que, por 20 anos, as pessoas possam ter melhor atendimento à saúde; que, por 20 anos, as famílias possam sonhar com casa própria.
Senhor presidente Ricardo Lewandowski, sras. e srs. senadores,
A verdade é que o resultado eleitoral de 2014 foi um rude golpe em setores da elite conservadora brasileira.
Desde a proclamação dos resultados eleitorais, os partidos que apoiavam o candidato derrotado nas eleições fizeram de tudo para impedir a minha posse e a estabilidade do meu governo. Disseram que as eleições haviam sido fraudadas, pediram auditoria nas urnas, impugnaram minhas contas eleitorais, e após a minha posse, buscaram de forma desmedida quaisquer fatos que pudessem justificar retoricamente um processo de impeachment.
Como é próprio das elites conservadoras e autoritárias, não viam na vontade do povo o elemento legitimador de um governo.
Queriam o poder a qualquer preço.
Tudo fizeram para desestabilizar a mim e ao meu governo.
Só é possível compreender a gravidade da crise que assola o Brasil desde 2015, levando-se em consideração a instabilidade política aguda que, desde a minha reeleição, tem caracterizado o ambiente em que ocorrem o investimento e a produção de bens e serviços.
Não se procurou discutir e aprovar uma melhor proposta para o país. O que se pretendeu permanentemente foi a afirmação do “quanto pior melhor”, na busca obsessiva de se desgastar o governo, pouco importando os resultados danosos desta questionável ação política para toda a população.
A possibilidade de impeachment tornou-se assunto central da pauta política e jornalística apenas dois meses após minha reeleição, apesar da evidente improcedência dos motivos para justificar esse movimento radical.
Nesse ambiente de turbulências e incertezas, o risco político permanente provocado pelo ativismo de parcela considerável da oposição acabou sendo um elemento central para a retração do investimento e para o aprofundamento da crise econômica.
Deve ser também ressaltado que a busca do reequilíbrio fiscal, desde 2015, encontrou uma forte resistência na Câmara dos Deputados, à época presidida pelo deputado Eduardo Cunha. Os projetos enviados pelo governo foram rejeitados, parcial ou integralmente. Pautas bombas foram apresentadas e algumas aprovadas.
As comissões permanentes da Câmara, em 2016, só funcionaram a partir do dia 5 de maio, ou seja, uma semana antes da aceitação do processo de impeachment pela Comissão do Senado Federal. Os srs. e as sras. senadores sabem que o funcionamento dessas Comissões era e é absolutamente indispensável para a aprovação de matérias que interferem no cenário fiscal e encaminhar a saída da crise.
Foi criado assim o desejado ambiente de instabilidade política, propício a abertura do processo de impeachment sem crime de responsabilidade.
Sem essas ações, o Brasil certamente estaria hoje em outra situação política, econômica e fiscal.
Muitos articularam e votaram contra propostas que durante toda a vida defenderam, sem pensar nas consequências que seus gestos trariam para o país e para o povo brasileiro. Queriam aproveitar a crise econômica, porque sabiam que assim que o meu governo viesse a superá-la, sua aspiração de acesso ao poder haveria de ficar sepultada por mais um longo período.
Mas, a bem da verdade, as forças oposicionistas somente conseguiram levar adiante o seu intento quando outra poderosa força política a elas se agregou: a força política dos que queriam evitar a continuidade da “sangria” de setores da classe política brasileira, motivada pelas investigações sobre a corrupção e o desvio de dinheiro público.
É notório que durante o meu governo e o do presidente Lula foram dadas todas as condições para que estas investigações fossem realizadas. Propusemos importantes leis que dotaram os órgãos competentes de condições para investigar e punir os culpados.
Assegurei a autonomia do Ministério Público, nomeando como procurador-geral da República o primeiro nome da lista indicado pelos próprios membros da instituição. Não permiti qualquer interferência política na atuação da Polícia Federal.
Contrariei, com essa minha postura, muitos interesses. Por isso, paguei e pago um elevado preço pessoal pela postura que tive.
Arquitetaram a minha destituição, independentemente da existência de quaisquer fatos que pudesse justificá-la perante a nossa Constituição.
Encontraram, na pessoa do ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, o vértice da sua aliança golpista.
Articularam e viabilizaram a perda da maioria parlamentar do governo. Situações foram criadas, com apoio escancarado de setores da mídia, para construir o clima político necessário para a desconstituição do resultado eleitoral de 2014.
Todos sabem que este processo de impeachment foi aberto por uma “chantagem explícita” do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, como chegou a reconhecer em declarações à imprensa um dos próprios denunciantes. Exigia aquele parlamentar que eu intercedesse para que deputados do meu partido não votassem pela abertura do seu processo de cassação.
Nunca aceitei na minha vida ameaças ou chantagens. Se não o fiz antes, não o faria na condição de presidenta da República. É fato, porém, que não ter me curvado a esta chantagem motivou o recebimento da denúncia por crime de responsabilidade e a abertura deste processo, sob o aplauso dos derrotados em 2014 e dos temerosos pelas investigações.
Se eu tivesse me acumpliciado com a improbidade e com o que há de pior na política brasileira, como muitos até hoje parecem não ter o menor pudor em fazê-lo, eu não correria o risco de ser condenada injustamente.
Quem se acumplicia ao imoral e ao ilícito, não tem respeitabilidade para governar o Brasil. Quem age para poupar ou adiar o julgamento de uma pessoa que é acusada de enriquecer às custas do Estado brasileiro e do povo que paga impostos, cedo ou tarde, acabará pagando perante a sociedade e a história o preço do seu descompromisso com a ética.
Todos sabem que não enriqueci no exercício de cargos públicos, que não desviei dinheiro público em meu proveito próprio, nem de meus familiares, e que não possuo contas ou imóveis no exterior. Sempre agi com absoluta probidade nos cargos públicos que ocupei ao longo da minha vida.
Curiosamente, serei julgada, por crimes que não cometi, antes do julgamento do ex-presidente da Câmara, acusado de ter praticado gravíssimos atos ilícitos e que liderou as tramas e os ardis que alavancaram as ações voltadas à minha destituição.
Ironia da história? Não, de forma nenhuma. Trata-se de uma ação deliberada que conta com o silêncio cúmplice de setores da grande mídia brasileira.
Viola-se a democracia e pune-se uma inocente. Este é o pano de fundo que marca o julgamento que será realizado pela vontade dos que lançam contra mim pretextos acusatórios infundados.
Estamos a um passo da consumação de uma grave ruptura institucional. Estamos a um passo da concretização de um verdadeiro golpe de Estado.
Senhoras e senhores senadores,
Vamos aos autos deste processo. Do que sou acusada? Quais foram os atentados à Constituição que cometi? Quais foram os crimes hediondos que pratiquei?
A primeira acusação refere-se à edição de três decretos de crédito suplementar sem autorização legislativa. Ao longo de todo o processo, mostramos que a edição desses decretos seguiu todas as regras legais. Respeitamos a previsão contida na Constituição, a meta definida na LDO e as autorizações estabelecidas no artigo 4° da Lei Orçamentária de 2015, aprovadas pelo Congresso Nacional.
Todas essas previsões legais foram respeitadas em relação aos 3 decretos. Eles apenas ofereceram alternativas para alocação dos mesmos limites, de empenho e financeiro, estabelecidos pelo decreto de contingenciamento, que não foram alterados. Por isso, não afetaram em nada a meta fiscal.
Ademais, desde 2014, por iniciativa do Executivo, o Congresso aprovou a inclusão, na LDO, da obrigatoriedade que qualquer crédito aberto deve ter sua execução subordinada ao decreto de contingenciamento, editado segundo as normas estabelecidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal. E isso foi precisamente respeitado.
Não sei se por incompreensão ou por estratégia, as acusações feitas neste processo buscam atribuir a esses decretos nossos problemas fiscais. Ignoram ou escondem que os resultados fiscais negativos são consequência da desaceleração econômica e não a sua causa.
Escondem que, em 2015, com o agravamento da crise, tivemos uma expressiva queda da receita ao longo do ano – foram R$ 180 bilhões a menos que o previsto na Lei Orçamentária.
Fazem questão de ignorar que realizamos, em 2015, o maior contingenciamento de nossa história. Cobram que, quando enviei ao Congresso Nacional, em julho de 2015, o pedido de autorização para reduzir a meta fiscal, deveria ter imediatamente realizado um novo contingenciamento. Não o fiz porque segui o procedimento que não foi questionado pelo Tribunal de Contas da União ou pelo Congresso Nacional na análise das contas de 2009.
Além disso, a responsabilidade com a população justifica também nossa decisão. Se aplicássemos, em julho, o contingenciamento proposto pelos nossos acusadores cortaríamos 96% do total de recursos disponíveis para as despesas da União. Isto representaria um corte radical em todas as dotações orçamentárias dos órgãos federais. Ministérios seriam paralisados, universidades fechariam suas portas, o Mais Médicos seria interrompido, a compra de medicamentos seria prejudicada, as agências reguladoras deixariam de funcionar. Na verdade, o ano de 2015 teria, orçamentariamente, acabado em julho.
Volto a dizer: ao editar estes decretos de crédito suplementar, agi em conformidade plena com a legislação vigente. Em nenhum desses atos, o Congresso Nacional foi desrespeitado. Aliás, este foi o comportamento que adotei em meus dois mandatos.
Somente depois que assinei estes decretos é que o Tribunal de Contas da União mudou a posição que sempre teve a respeito da matéria. É importante que a população brasileira seja esclarecida sobre este ponto: os decretos foram editados em julho e agosto de 2015 e somente em outubro de 2015 o TCU aprovou a nova interpretação.
O TCU recomendou a aprovação das contas de todos os presidentes que editaram decretos idênticos aos que editei. Nunca levantaram qualquer problema técnico ou apresentaram a interpretação que passaram a ter depois que assinei estes atos.
Querem me condenar por ter assinado decretos que atendiam a demandas de diversos órgãos, inclusive do próprio Poder Judiciário, com base no mesmo procedimento adotado desde a entrada em vigor da Lei de Responsabilidade Fiscal, em 2001?
Por ter assinado decretos que somados, não implicaram, como provado nos autos, em nenhum centavo de gastos a mais para prejudicar a meta fiscal?

A segunda denúncia dirigida contra mim neste processo também é injusta e frágil. Afirma-se que o alegado atraso nos pagamentos das subvenções econômicas devidas ao Banco do Brasil, no âmbito da execução do programa de crédito rural Plano Safra, equivale a uma “operação de crédito”, o que estaria vedado pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Como minha defesa e várias testemunhas já relataram, a execução do Plano Safra é regida por uma lei de 1992, que atribui ao Ministério da Fazenda a competência de sua normatização, inclusive em relação à atuação do Banco do Brasil. A presidenta da República não pratica nenhum ato em relação à execução do Plano Safra. Parece óbvio, além de juridicamente justo, que eu não seja acusada por um ato inexistente.
A controvérsia quanto a existência de operação de crédito surgiu de uma mudança de interpretação do TCU, cuja decisão definitiva foi emitida em dezembro de 2015. Novamente, há uma tentativa de dizer que cometi um crime antes da definição da tese de que haveria um crime. Uma tese que nunca havia surgido antes e que, como todas as senhoras e senhores senadores souberam em dias recentes, foi urdida especialmente para esta ocasião.
Lembro ainda a decisão recente do Ministério Público Federal, que arquivou inquérito exatamente sobre esta questão. Afirmou não caber falar em ofensa à Lei de Responsabilidade Fiscal porque eventuais atrasos de pagamento em contratos de prestação de serviços entre a União e instituições financeiras públicas não são operações de crédito.
Insisto, senhoras senadoras e senhores senadores: não sou eu nem tampouco minha defesa que fazemos estas alegações. É o Ministério Público Federal que se recusou a dar sequência ao processo, pela inexistência de crime.
Sobre a mudança de interpretação do TCU, lembro que, ainda antes da decisão final, agi de forma preventiva. Solicitei ao Congresso Nacional a autorização para pagamento dos passivos e defini em decreto prazos de pagamento para as subvenções devidas. Em dezembro de 2015, após a decisão definitiva do TCU e com a autorização do Congresso, saldamos todos os débitos existentes.
Não é possível que não se veja aqui também o arbítrio deste processo e a injustiça também desta acusação.
Este processo de impeachment não é legítimo. Eu não atentei, em nada, em absolutamente nada contra qualquer dos dispositivos da Constituição que, como presidenta da República, jurei cumprir. Não pratiquei ato ilícito. Está provado que não agi dolosamente em nada. Os atos praticados estavam inteiramente voltados aos interesses da sociedade. Nenhuma lesão trouxeram ao erário ou ao patrimônio público.
Volto a afirmar, como o fez a minha defesa durante todo o tempo, que este processo está marcado, do início ao fim, por um clamoroso desvio de poder.
É isto que explica a absoluta fragilidade das acusações que contra mim são dirigidas.
Tem-se afirmado que este processo de impeachment seria legítimo porque os ritos e prazos teriam sido respeitados. No entanto, para que seja feita justiça e a democracia se imponha, a forma só não basta. É necessário que o conteúdo de uma sentença também seja justo. E no caso, jamais haverá justiça na minha condenação.
Ouso dizer que em vários momentos este processo se desviou, clamorosamente, daquilo que a Constituição e os juristas denominam de “devido processo legal”.
Não há respeito ao devido processo legal quando a opinião condenatória de grande parte dos julgadores é divulgada e registrada pela grande imprensa, antes do exercício final do direito de defesa.
Não há respeito ao devido processo legal quando julgadores afirmam que a condenação não passa de uma questão de tempo, porque votarão contra mim de qualquer jeito.
Nesse caso, o direito de defesa será exercido apenas formalmente, mas não será apreciado substantivamente nos seus argumentos e nas suas provas. A forma existirá apenas para dar aparência de legitimidade ao que é ilegítimo na essência.
Senhoras e senhores senadores,
Nesses meses, me perguntaram inúmeras vezes porque eu não renunciava, para encurtar este capítulo tão difícil de minha vida.
Jamais o faria porque tenho compromisso inarredável com o Estado Democrático de Direito.

Jamais o faria porque nunca renuncio à luta.
Confesso a Vossas Excelências, no entanto, que a traição, as agressões verbais e a violência do preconceito me assombraram e, em alguns momentos, até me magoaram. Mas foram sempre superados, em muito, pela solidariedade, pelo apoio e pela disposição de luta de milhões de brasileiras e brasileiros pelo país afora. Por meio de manifestações de rua, reuniões, seminários, livros, shows, mobilizações na internet, nosso povo esbanjou criatividade e disposição para a luta contra o golpe.
As mulheres brasileiras têm sido, neste período, um esteio fundamental para minha resistência. Me cobriram de flores e me protegeram com sua solidariedade. Parceiras incansáveis de uma batalha em que a misoginia e o preconceito mostraram suas garras, as brasileiras expressaram, neste combate pela democracia e pelos direitos, sua força e resiliência. Bravas mulheres brasileiras, que tenho a honra e o dever de representar como primeira mulher presidenta do Brasil.
Chego à última etapa desse processo comprometida com a realização de uma demanda da maioria dos brasileiros: convocá-los a decidir, nas urnas, sobre o futuro de nosso país. Diálogo, participação e voto direto e livre são as melhores armas que temos para a preservação da democracia.
Confio que as senhoras senadoras e os senhores senadores farão justiça. Tenho a consciência tranquila. Não pratiquei nenhum crime de responsabilidade. As acusações dirigidas contra mim são injustas e descabidas. Cassar em definitivo meu mandato é como me submeter a uma pena de morte política.
Este é o segundo julgamento a que sou submetida em que a democracia tem assento, junto comigo, no banco dos réus. Na primeira vez, fui condenada por um tribunal de exceção. Daquela época, além das marcas dolorosas da tortura, ficou o registro, em uma foto, da minha presença diante de meus algozes, num momento em que eu os olhava de cabeça erguida enquanto eles escondiam os rostos, com medo de serem reconhecidos e julgados pela história.
Hoje, quatro décadas depois, não há prisão ilegal, não há tortura, meus julgadores chegaram aqui pelo mesmo voto popular que me conduziu à Presidência. Tenho por todos o maior respeito, mas continuo de cabeça erguida, olhando nos olhos dos meus julgadores.
Apesar das diferenças, sofro de novo com o sentimento de injustiça e o receio de que, mais uma vez, a democracia seja condenada junto comigo. E não tenho dúvida que, também desta vez, todos nós seremos julgados pela história.
Por duas vezes vi de perto a face da morte: quando fui torturada por dias seguidos, submetida a sevícias que nos fazem duvidar da humanidade e do próprio sentido da vida; e quando uma doença grave e extremamente dolorosa poderia ter abreviado minha existência.
Hoje eu só temo a morte da democracia, pela qual muitos de nós, aqui neste plenário, lutamos com o melhor dos nossos esforços.
Reitero: respeito os meus julgadores.
Não nutro rancor por aqueles que votarão pela minha destituição.
Respeito e tenho especial apreço por aqueles que têm lutado bravamente pela minha absolvição, aos quais serei eternamente grata.

Neste momento, quero me dirigir aos senadores que, mesmo sendo de oposição a mim e ao meu governo, estão indecisos.
Lembrem-se que, no regime presidencialista e sob a égide da nossa Constituição, uma condenação política exige obrigatoriamente a ocorrência de um crime de responsabilidade, cometido dolosamente e comprovado de forma cabal.
Lembrem-se do terrível precedente que a decisão pode abrir para outros presidentes, governadores e prefeitos. Condenar sem provas substantivas. Condenar um inocente.
Faço um apelo final a todos os senadores: não aceitem um golpe que, em vez de solucionar, agravará a crise brasileira.
Peço que façam justiça a uma presidenta honesta, que jamais cometeu qualquer ato ilegal, na vida pessoal ou nas funções públicas que exerceu. Votem sem ressentimento. O que cada senador sente por mim e o que nós sentimos uns pelos outros importa menos, neste momento, do que aquilo que todos sentimos pelo país e pelo povo brasileiro.
Peço: votem contra o impeachment. Votem pela democracia.
Muito obrigada.
Ouça o discurso na íntegra
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