O presente artigo abordará a
discussão quanto ao dever das escolas em garantir o pleno acesso e
disponibilizar amplos dados aos genitores das crianças independentemente
deste manterem ou não o vínculo da conjugalidade.
Tal temática se torna ainda mais
pertinente quando corriqueiramente os escritórios de advocacia que atuam
na área familista se deparam com repetidos casos em que as instituições
de ensino insistem em praticar condutas contrárias a esta ordem. Assim,
é salutar que sejam postos alguns esclarecimentos a fim de
desmistificar conceitos culturalmente enraizados e apresentar as
legislações pertinentes.
Desta forma, sem a pretensão de
esgotar o tema, mas no intuito de ampliar a discussão, de forma clara e
acessível, se tratará do amplo dever de informação das escolas para com
os pais, passando pela análise legislativa que ampara este dever e os
princípios constitucionais que permeiam a matéria, agrupados no
Princípio do Melhor Interesse.
Neste sentido, o artigo irá
desenvolver de forma preliminar a distinção existente entre guarda e o
poder familiar, dois institutos muitos vezes confundidos entre a
sociedade em geral. Seguindo, se fará necessário elucidar os princípios
constitucionais que estão relacionados e, consequentemente, as
legislações ordinárias e especiais que deliberam sobre este assunto.
Por fim, se buscará conglomerar as ideias expostas no intuito de sinalizar para uma conclusão.
2. O poder parental
A tradicional expressão "Pátrio
Poder" foi cedendo lugar as novas formas de denominação, como: poder
parental e poder de proteção.
Eduardo de Oliveira Leite considera
Hoje é unânime o entendimento de que
o pátrio poder é muito mais pátrio dever, mas não só 'pátrio', na ótica
do constituinte de 1988, mas sim 'parental', isto é, dos pais, do
marido e da mulher, igualados em direitos e deveres, pelo art. 226, par.
5º, da nova Constituição. [1]
Mas este poder deve ser exercido,
única e exclusivamente, no superior interesse do menor e, por isso,
deixa de ser um poder para se tornar um dever, uma responsabilidade.
Assim, o poder familiar, ou poder
parental, é um conjunto incindível de poderes-deveres, que deve ser
altruisticamente exercido à vista do integral desenvolvimento dos
filhos, até que esses se bastem em si mesmos. Importando primordialmente
a proteção do incapaz, seu benefício essencial.
Vale dizer que pai e mãe são,
conjunta, igualitária e simultaneamente, os sujeitos ativos do exercício
do poder parental, como efeito da paternidade e da maternidade e não do
matrimônio ou da união estável. Assim, ambos os pais devem permanecer
exercendo, igualitariamente, os direitos e deveres inerentes ao poder
familiar, assegurando a continuidade do benefício ao menor, mesmo depois
de desconstituída a sociedade conjugal.
A partir da Convenção Internacional
sobre os Direitos da Criança (1989), a questão do interesse da criança
em conservar relações pessoais com ambos os pais passa a ser reconhecida
como um direito, conforme disposto no artigo 9º. Torna-se importante
manter a continuidade da função exercida pelos pais, garantindo-se o
vínculo da criança com as linhagens paterna e materna. Como define a
Convenção, cabe ao Estado a garantia de manutenção da co-parentalidade,
independente da preservação ou não do vínculo conjugal.
Todavia, não foi dessa forma que o
assunto foi tratado durante tantos anos. Somente vislumbrou-se alteração
com a inovação que a nova lei civil trouxe, no sentido de atribuir, de
forma clara, ao pai e à mãe o exercício conjunto do poder familiar, em
seus artigos 1.631 e 1.634, que antes só se encontrava um respaldo no
Estatuto da Criança e do Adolescente, assegurando aos pais, na separação
judicial, no divórcio e na dissolução da união estável, terem seus
filhos em sua companhia.
Assim, o entendimento é de que a
obrigação de educação e cuidado com os filhos é decorrente do vínculo de
filiação e não do casamento. Fazendo-se necessário a distinção entre
conjugalidade e parentalidade, observando que a separação ocorre entre
marido e mulher, e não entre pais e filhos.
Desta sorte, o poder familiar que é
um dever/direito não se confunde com a guarda e tão pouco é afetado pela
separação, divórcio ou dissolução da convivência dos pais. Este
instituto tem sua origem na razão natural dos filhos necessitarem de
cuidado, com a absoluta dependência desde seu nascimento e reduzindo
esta na medida de seu crescimento, desligando-se os filhos da potestade
dos pais quando atingem a capacidade cronológica com a maioridade civil,
ou através da sua emancipação.
O artigo, 229 da Constituição
Federal, mostra o conteúdo do poder familiar, ao prescrever como deveres
inerentes aos pais os de assistir, criar e educar os filhos menores,
sendo secundado pelo artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente,
quando estabelece ser incumbência dos pais o dever de sustento, guarda e
educação dos filhos menores.
O pai ou a mãe somente perderão o
direito ao exercício do poder familiar nas seguintes formas: 1. Através
da extinção que ocorre quando da morte dos pais ou dos filhos; pela
emancipação, nos termos do artigo 5, parágrafo único, do Código Civil, a
ser realizada por instrumento público pelos pais, ou pelo tutor,
mediante requerimento e homologação judicial [2]; pela maioridade, isto é
quando o filho atingir 18 anos; pela adoção, ou seja, os pais
biológicos perdem o poder familiar e este é assumido pelos pais
adotantes. Também terá extinto o poder familiar por ato judicial o pai
ou a mãe que castigar imoderadamente o filho, deixar o filho em
abandono, praticar atos contrários à moral e aos bons costumes, incidir,
reiteradamente no abuso de autoridade, faltar nos deveres inerentes à
sua função social ou quando arruínam os bens dos filhos. 2. Através da
suspensão, ou seja, a suspensão do poder familiar pode privar total ou
parcialmente o pai ou a mãe dos direitos nele inseridos, assim como pode
ser restrita a determinado filho, e não a todos os rebentos do conjunto
familiar. Como suspensão do poder familiar, além do rol elencado no
artigo 1.637 e parágrafo, do Código Civil, há decorrente do inciso VII,
do artigo 6 da Lei 12.318/2010, caracterizados como atos típicos de
alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de
criança ou adolescente com genitor, podendo o juiz decretar a suspensão
do poder familiar, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente
responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos
processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade
do caso. Uma vez cessada a causa, retoma ao genitor o poder familiar,
necessitando se submeter a uma avaliação psiquiátrica a bem da higidez
psíquica e do futuro da criança ou do adolescente.
3. A guarda material e a guarda jurídica: suas distinções
Por certo, a separação dissolve a
sociedade conjugal, porém não a parental entre pais e filhos, cujos
laços de afeto, direitos e deveres recíprocos subsistem, apenas
modificados quando necessário para atender-se à separação dos cônjuges.
Embora não afetando os direitos e
deveres recíprocos, há um desdobramento da guarda. Tal desdobramento
enfraquece de certa forma o poder familiar do genitor não-guardião - uma
vez estabelecida a igualdade conjugal (artigos 226, § 5º e 227, § 6º,
da CF) [3] - que fica impedido do amplo exercício do seu direito, com a
mesma intensidade e na mesma medida que o outro, o guardador.
Aquele dos genitores a quem é
atribuída a guarda, como observa Orlando Gomes tem-na não apenas a
material, mas também a jurídica. A primeira consiste em ter o filho em
companhia, vivendo com ele sob o mesmo teto, em exercício de posse e
vigilância. A segunda implica o direito de reger a pessoa dos filhos,
dirigindo-lhe a educação e decidindo todas as questões do interesse
superior dele, cabendo ao outro o direito e dever de fiscalizar as
deliberações tomadas pelo genitor a quem a guarda foi atribuída. [4]
Assim, a guarda jurídica é exercida a
distância pelo genitor não-guardião. A guarda material, ou física,
prevista no artigo 33, § 1º, do ECA realiza-se pela proximidade diária
do genitor que conviva com o filho, monoparentalmente, encerrando a
ideia de posse ou cargo. Em verdade, o que obtenha a guarda material
exercerá o poder familiar em toda a sua extensão.
A ruptura conjugal cria a família
monoparental e a autoridade parental, até então exercida pelo pai e pela
mãe, acompanha a crise e se concentra em um só dos genitores, ficando o
outro muitas vezes reduzido a um papel verdadeiramente secundário
(visita, alimentos, fiscalização). Quer isso dizer que um dos genitores
exerce a guarda no âmbito da atuação prática, no cuidado diário e outro
conserva as faculdades potenciais de atuação.
Assim, com o crescente número de
rupturas surgem, também, os conflitos em relação à guarda de filhos de
pais que não mais convivem, fossem casados ou não. Cumpre ao legislador e
ao judiciário o dever de estabelecer as soluções que privilegiem a
manutenção dos laços que vinculam os pais a seus filhos, eliminando a
dissimetria dos papéis parentais que o texto constitucional
definitivamente expurgou, como se vê pelo artigo 226, §5º.
A ruptura afeta diretamente a vida
dos menores, porque modifica a estrutura da família e atinge a
organização de um de seus subsistemas, o parental. Diante de tal
situação, aparece a necessidade de se manter todos os personagens da
família envolvidos, mesmo após a ruptura da vida em comum, tentando,
assim, atenuar as consequências injustas que essa ruptura provoca.
Portanto, resta esclarecido, que o
fato do genitor não possuir a guarda do filho, não resta prejudicado
para exercer o poder familiar que, inclusive, deixando de fazer estará
praticando crime tipificado no Código Penal, como: abandono material,
artigo 244; abandono intelectual artigo 245; abandono moral artigo 247;
abandono de incapaz artigo. 133; abandono de recém nascido artigo. 134.
Enfatiza-se, através da fala de Paulo Lobo que
A convivência dos pais, entre si,
não é requisito para a titularidade do poder familiar, que apenas se
suspende ou se perde, por decisão judicial, nos casos previstos em lei.
Do mesmo modo, a convivência dos pais com os filhos pode ocorrer
variação de grau do poder familiar, máxime quanto ao que cumpre o dever
de guarda, mas isso diz respeito apenas ao seu exercício e não à
titularidade.
O novo Código estabelece que havendo
separação judicial, divórcio ou dissolução da união estável, o poder
familiar permanece íntegro, exceto quanto ao direito de terem os filhos
em sua companhia (art. 1.631). No art. 1.589, quando tratou da
dissolução da sociedade conjugal, estabelece que o pai ou a mãe que não
for guardião poderá não apenas visitar os filhos, mas os ter em suas
companhias, bem como fiscalizar sua manutenção e educação, que são
características do poder familiar. Do mesmo modo, o art. 1.579 prescreve
que o divórcio não modifica os direitos e deveres dos pais em relação
aos filhos.
Mais do que a guarda, concebida
tradicionalmente como direito preferencial de um pai contra o outro, a
proteção dos filhos constitui direito primordial destes e direito/dever
de cada um dos pais. Invertendo-se os pólos dos interesses protegidos, o
direito à guarda converteu-se no direito à continuidade da convivência
ou no direito ao contato. Os pais preservam os respectivos poderes
familiares em relação aos filhos com a separação, e os filhos preservam o
direito de acesso a eles e ao compartilhamento recíproco de sua
formação. [5]
Neste contexto de ideias, debruça-se
o olhar sobre os princípios constitucionais esculpidos em prol das
crianças e adolescentes, que se prefere aqui denominar, aos filhos, que
se passará explorar.
4. Do melhor interesse
O Princípio do melhor interesse da
criança, que leva em conta primordialmente a condição especial de serem
pessoas em via de desenvolvimento e que em todos os atos relacionados
com a criança deve ser considerado o seu melhor interesse acaba por
abarcar demais princípios constitucionais voltados para os filhos, como:
o princípio da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável.
A partir da Constituição da
República Federativa do Brasil, promulgada no ano de 1988, o Brasil
passa a ser signatário da Doutrina da Proteção Integral. A criança,
antes sujeito de necessidades, adquire a condição de sujeito de
direitos. Assim, referida norma legal incumbiu uma maior ênfase no que
concerne à proteção e garantias à criança e ao adolescente. Ampliando
essa responsabilidade à família, à sociedade e ao Estado, declarando a
proteção integral a toda a população infantojuvenil, conforme se
encontra preconizado no caput do art. 227.
Neste sentido, os filhos vistos como
detentores de dignidade subjetiva merecem especial atenção a fim de
efetivamente receber proteção. Nas palavras do prof. Ingo Sarlet,
verifica-se a necessidade urgente de garantir respeito à integridade
deste que formarão a sociedade de amanhã.
(...) onde não houver respeito pela
vida e pela integridade física e moral do ser humano, onde as condições
mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde não houver
limitação do poder, enfim, onde a liberdade e a autonomia, a igualdade
(em direitos e dignidade) e os direitos fundamentais não forem
reconhecidos e minimamente assegurados, não haverá espaço para a
dignidade da pessoa humana e esta (a pessoa), por sua vez, poderá não
passar de mero objeto de arbítrio e injustiças. [6]
Na esteira destes direitos, em
legislação especial do ECA as crianças e os adolescentes passaram a ser
reconhecidos como "Sujeito de Direitos" de "Prioridade Absoluta". Frente
a esse Estatuto, observa-se o direito da criança e do adolescente
perante um sistema de direitos fundamentais, conforme se encontra
preconizado no art. 3º do referido documento legal. A respeito desses
direitos fundamentais, o ECA, traz consubstanciado no art. 4º, 7º e no
caput do art. 19 o direito à vida, saúde e convivência familiar e
comunitária.
E sobre o direito à liberdade, ao
respeito e à dignidade, estes estão previstos no art. 15 do ECA,
consoante de que as crianças e os adolescentes são pessoas em
desenvolvimento e sujeitos de direitos civis, humanos e sociais que são
garantidos na Constituição Federal, bem como em outras leis.
Neste sentido, por meio desse
dispositivo, o legislador buscou por a salvo os filhos perante qualquer
arbitrariedade por parte do Estado, da família ou da sociedade.
5. Do dever de informação das Instituições de Ensino
Em virtude do Direito Constitucional
esculpido no art. 229, de acompanhar o desenvolvido e as atividades de
lazer, educacionais e psicológicas dos filhos, bem como os arts. 1.589,
1.632, 1.634, inc. I do Código Civil foi promulgada a Lei 12.013/09, que
alterou o art. 12 da Lei de Diretrizes e Bases, garantindo o direito de
pais, conviventes ou não com seus filhos, receberem informações quanto a
freqüência e rendimentos dos alunos, bem como sobre a execução da
proposta pedagógica da escola [7].
Assim, assegurar ao pai não-guardião
o acesso às informações escolares do filho é, antes de tudo, um direito
da criança e do adolescente a garantir-lhe o desenvolvimento e preparo
para o exercício da cidadania (artigo 53 do Estatuto da Criança e
Adolescente).
Acredita-se que os diretores das
escolas que não compartilham e até proíbem o acesso às informações
acerca do rendimento escolar, dia e horário de reuniões, festas
comemorativas como: dia da criança, dia dos pais, páscoa, natal; senhas
de acesso a páginas eletrônicas onde constam dados do aluno, sob o
argumento de que o responsável é àquele que detém a guarda, estão
demonstrando confusão entre os institutos da guarda e poder familiar
anteriormente abordado, além do descumprimento de ordem legal.
Desta forma, pela falta de
conhecimento da legislação vigente e insensibilidade frente à realidade
social, que aponta a existência de vasto número de demandas de divórcio e
separação por casais com filhos no Brasil [8] e que estes,
naturalmente, já sofrem com os conflitos familiares aos quais são
expostos e por consequência dentre um dos prejuízos é o baixo rendimento
escolar, as escolas brasileiras seguem descumprindo com o preceito
maior de proteção e atenção às crianças e adolescentes.
A escola, ao contrário do que vem
ocorrendo, deve ser uma aliada no cumprimento do que preconiza a
Constituição Federal no que se refere ao melhor interesse da criança e
do adolescente.
Acredita-se que um dos fatores que
pode contribuir com este equivocado pensamento seja a interpretação de
que a guarda será garantida àquele que tiver melhores "condições" de
permanecer com os filhos. Isso aos olhos leigos indica erroneamente que
aquele que não tem a guarda está desqualificado.
Na mesma medida, culturalmente a
guarda restava mantida às mulheres, tendo em vista que estas eram
responsáveis pelo cuidado do lar e dos filhos, em tempos não tão
remotos. Assim, o ranço cultural da sociedade existente no século
passado persiste em determinados aspectos da nossa vivência atual. O
Professor Rolf Madaleno, seguindo nesta linha, aponta alguns fatores que
favoreceram por muito tempo a guarda maternal:
Historicamente, a guarda dos filhos
na hipótese dos pais foi considerada como custódia individual,
maciçamente outorgada à mãe, salvas raras e graves exceções capazes de
afetar os interesses do menor. A preferência em favor da mãe para
continuar com a custódia dos filhos na separação dos pais era tida como
razoável para o contexto social e familiar existentes em um período em
que a mulher não trabalhava e costumava ter tempo para poder se dedicar
inteiramente ao lar e aos filhos. [9]
O Direito sendo um instrumento
social torna-se incapaz de estar dissociado da cultura que permeia o
momento histórico o qual está inserido. Portanto, se antes por
conjunturas econômicas, sociais e culturais as mães estavam mais
disponíveis para permanecer com os cuidados dos filhos e teriam sua
preferência, hoje os pais, muitas vezes, é que estão nestes papéis.
Assim, a definição da guarda, sendo está unilateral, não se faz tão
evidente.
De outra sorte, tendo em vista o
avanço legislativo, no ano de 2008 entrou em vigor a Lei de n. 11.698,
que instituiu a Guarda Compartilhada no ordenamento jurídico brasileiro,
que busca minimizar os descompassos entre os genitores após a ruptura
da convivência marital e garantir plenas condições de exercício do poder
familiar [10].
Portanto, tendo sido deferida a
guarda a um dos genitores não há que se fazer qualquer confusão no
sentido de que o outro não seja capaz de permanecer exercendo o poder
familiar ou que seja desqualificado para tal, pois a guarda não afeta o
poder familiar dos pais em relação aos filhos, senão quanto ao direito
de os primeiros terem em sua companhia os segundos (art. 1.632 do Código
Civil).
Da mesma forma, o genitor que impede
o exercício do poder familiar por parte do genitor não guardião, também
estará cometendo crime, posto que a lei 12.318/2010 preconiza que é ato
de alienação parental ocultar informações médicas e escolares
relevantes sobre a criança. E, muita vezes, para atingir a intenção de
afastar o genitor não permitindo que este exerça o seu poder familiar se
utiliza da escola, conforme Denise Maria Peressine da Silva demonstra
Um dos incisos do artigo 2º da Lei
tipifica ato de Alienação Parental ocultar informações médicas e
escolares relevantes sobre a criança a genitor. Ora, muitos alienadores,
geralmente guardiães, matriculam seus filhos em escolas e obrigam
diretores, coordenadores pedagógicos e professores a não revelarem
informações escolares, boletins de notas, calendário, reuniões, festas,
passeios e excursões. E muitas escolas, sobretudo as particulares,
acabam cedendo às pressões, temendo que os alienadores tirem seus filhos
das escolas (o que representa prejuízo financeiro) e por
desconhecimento da Lei da Alienação Parental e da Lei 12.013, que
modifica a Lei de Diretrizes e Bases da Educação brasileira. [11]
Com a alteração trazida pela lei
12.013 de 2009, as instituições de ensino estão obrigadas a fornecer
informações escolares aos pais, conviventes ou não com seus filhos.
Neste sentir, a escola que cumpre a legislação não apenas esta cumprindo
o seu dever como também esta contribuindo para que os filhos tenham
seus genitores mais próximos, ou seja contribuindo com a política da
paternidade responsável, cumprindo com a efetivação dos direitos de
convivência familiar saudável, com o princípio do melhor interesse da
criança e do adolescente.
No momento em que age de forma
contrária está agindo contra o ordenamento jurídico e cometendo um ato
ilícito grave ao optar por uma conduta que contraria a legislação
vigente e que prejudica a criança e o genitor não guardião,
potencializando os efeitos nocivos dessa conduta no lapso temporal da
evolução escolar.
Afora isto, contribui para agravar o
processo de alienação, por se tornar mais um instrumento que o
alienador utiliza para sua conveniência, objetivando afastar a criança
do convívio com o outro genitor.
Os danos morais em que a instituição
incorre são irreparáveis. Nas palavras de Denise Maria Peressine da
Silva, verifica-se esta preocupação na medida em que poderá ser imputada
prática de crime, "estará preparada para arcar com as consequências de
haver colaborado para a ocorrência de um crime (violação do art.1589 do
atual Código Civil - Lei n.º 10.406/02)?"
O referido dispositivo legal citado
pela nobre psicóloga preceitua: "O pai ou a mãe, em cuja guarda não
estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o
que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como
fiscalizar sua manutenção e educação".
Neste sentido, o termo "fiscalizar
sua (...) educação" inclui obter informações acerca do rendimento e
desempenho escolar, desenvolvimento cognitivo e social, proposta
pedagógica, atividades e eventos curriculares e extracurriculares,
conhecer os professores, participar das reuniões de pais, ser notificado
de doenças ou acidentes dentro do ambiente escolar, bem como faltas e
atrasos justificados ou não, e ainda avaliações e exames regulares e
extraordinários.
Desta forma, a escola pode ser uma
aliada ao combater a alienação parental, bem como instrumento de
efetivação de desenvolvimento sadio. Agindo nestes moldes, contribuirá
com a tarefa de conciliar, pois proporcionará um ambiente de
imparcialidade, com foco primordial na criança e adolescente, em busca
de solução que melhora atenda às necessidades dos filhos.
No mesmo sentido, oferecerá a cada
um dos pais o espaço para fazer parte da escola, compartilhar momentos
importantes e dialogar nas tomadas de decisões. Assim, tornar-se um
agente fundamental na busca pela dignidade dos filhos, muitas vezes
mitigada por comportamentos egoístas dos pais.
É dever da família, da comunidade,
da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta
prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária. [12]
De nada nos adianta mais uma lei, se ela ficar esquecida ou desviada do seu propósito.
6. Conclusão
As transformações, os
questionamentos, as direções por que passam a sociedade obrigam os
profissionais, instituições e grupos sociais a pesquisar, discutir,
orientar-se e atualizar-se quanto aos aspectos sociais, jurídicos,
psicológicos e institucionais dessas mudanças. Os ordenamentos jurídicos
devem refletir a realidade social, e com isso corresponder o melhor
possível às necessidades e demandas que essa sociedade impõe.
Tratados internacionais, legislações
ordinárias e leis especiais põe a salvo o direito dos filhos no país. O
que resta é efetivar alguns destes direitos e possibilitar o efetivo
desenvolvimento da criança e adolescente. Nesta medida, chama-se os
pais, filhos, profissionais, juristas, legisladores e principalmente as
instituições publicas e privadas de ensino a modificar a postura, a
mentalidade e as atitudes.
Da mesma forma que a sociedade
passou da arcaica estrutura familiar patriarcal a um contexto mais
participativo, igualitário e afetivo, há de se buscar o melhor interesse
da criança a fim de que novas gerações tornem-se mais saudáveis,
amadurecidas, compreensivas, tolerantes, íntegras, com vínculos afetivos
e sociais estruturados.
7. Referências
GLANZ, Semy. A família mutante - sociologia e direito comparado: inclusive o novo código civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.
GOMES, Orlando. Direito de família. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981.
LEITE, Eduardo de Oliveira. Temas de direito de família. São Paulo: RT, 1994.
________ A igualdade de direito
entre o homem e a mulher face à Nova Constituição. Ajuris, Porto Alegre,
n. 61, p. 19-36, jul. 1994.
________ Famílias monoparentais. São Paulo: RT, 1997.
LÔBO, Paulo. Guarda e Convivência
dos filhos após a Lei n. 11.698/2008, in: Revista Brasileira de Direito
das Família e Sucessões, Editora Magister, IBDFAM, n. 06 (out/Nov.
2008).
MADALENO, Rolf. Curso de direito de família. Forense, 4 ed., 2011.
SARLET, Ingo Wolfgang. In: SOUZA,
Ivoen Maria Candido Coelho de. Direito de Família, diversidade e
multidisciplinaridade. Porto Alegre: IBDFAM, 2007.
Notas:
[1] LEITE, Eduardo de Oliveira. Famílias monoparentais. São Paulo: RT, 1997.
[2] A emancipação é irrevogável, e
deve ser outorgada por ambos os genitores, só sendo reduzida à pessoa de
um dos genitores quando o outro já é falecido, foi destituído do poder
familiar, ou quando inexistente o registro de um dos ascendentes.
[3] Sobre a auto-aplicabilidade das
normas constitucionais a respeito, consular As garantias constitucionais
e o princípio da igualdade entre marido e mulher (LEITE, Eduardo de
Oliveira. Temas de direito de família. São Paulo: RT, 1994, p. 67-69)
Mais amplamente, do mesmo autor, A igualdade de direito entre o homem e a
mulher face à Nova Constituição. Ajuris, Porto Alegre, n. 61, p. 19-36,
jul. 1994.
[4] GOMES, Orlando. Direito de família. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p. 281.
[5] LÔBO, Paulo. Guarda e
Convivência dos filhos após a Lei n. 11.698/2008, in: Revista Brasileira
de Direito das Família e Sucessões, Editora Magister, IBDFAM, n. 06
(out/Nov. 2008), p. 24.
[6] SARLET, Ingo Wolfgang. In:
SOUZA, Ivoen Maria Candido Coelho de. Direito de Família, diversidade e
multidisciplinaridade. Porto Alegre: IBDFAM, 2007, p. 62-3.
[8] De acordo com o IBGE, a taxa de
divórcio no Brasil é de 1,8 para cada 1 mil pessoas. E a de separações é
de 0,5 para cada 1 mil. Além disso, 40,3% são de casais sem filhos e
22% só têm filhos maiores de idade. Entre 2000 e 2010 foi de 3,7 milhões
- só que a maioria (70%) é consensual. O IBGE tem pesquisas realizadas
com base em registro civis que mostra o total de casais separados
judicialmente com filhos e sem filhos, bem como o números de filhos
existentes e, dentre estes, os menores de idade. Para maiores
informações e a íntegra das tabelas consulte o site http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/registrocivil/2010/separacao.shtm
[9] MADALENO, Rolf. Curso de direito de família. Forense, 2011.ed.4.
[10] No Direito Francês, no ano de
1987 foi constituído o primeiro passo a esta evolução, com a Lei
Malhuret, permitindo aos pais naturais exercer em conjunto a autoridade
parental por simples declaração conjunta não controlável. Uma segunda
etapa veio com a Lei de 8 de janeiro de 1993, que englobou num mesmo
conjunto, ante a autoridade parental, os casais casados, os casais
separados e os casais não casados (BRUNETTI-PONS, Clotilde. "L'émergence
d'une notion de couple em droit civil, Revue trimestrielle de droit
civil, jan-março de 1999, p. 27-49. In: GLANZ, Semy. A família mutante -
sociologia e direito comparado: inclusive o novo código civil. Rio de
Janeiro: Renovar, 2005, p. 08).
[12] Trecho do art. 227 da Constituição Federal.
Autoras
Laura Affonso da Costa Levy
é Advogada; Mestranda em Aspectos Bioéticos e Jurídicos pela UMSA -
Universidad del Museo Social Argentino; Especialista em Bioética pela
PUC/RS, Especialista em Direito Civil - ênfase em Direito de Família e
Sucessões, pela Faculdade IDC. Membro da Sociedade Rio-Grandense de
Bioética SORBI. Membro do Núcleo de Estudos de Bioética da Associação
dos Juízes do Rio Grande do Sul AJURIS; Parecerista e Consultora
Jurídica. Vice-Presidente do Instituto Proteger
Melissa Telles Barufi é
Advogada familista do escritório Telles e Dala Nora advogados,
especializada em Direito de família e sucessões, palestrante convidada
da Escola Superior de Advocacia do Estado do Rio Grande do Sul.
Presidente do Instituto Proteger