21/mar/2014...
19/Feb/2014 às 18:02
Paulo Donizetti de Souza, RBA
19/Feb/2014 às 18:02
Professor dá aula de Venezuela e passa pito na Globo, em plena Globo
Uma aula de Venezuela e um pito na Globo, em plena Globo. Em debate na Globonews, Igor Fuser, professor de Relações Internacionais da UFABC, explica a crise, derruba o mito da ‘falta de liberdade’ no país vizinho e desnuda a parcialidade da imprensa

Professor Igor Fuser é doutor em Ciência Política pela USP (Reprodução)
O professor de Relações Internacionais da USP José Augusto Guillon e a
apresentadora Mônica Waldvogel, do programa Entre Aspas, da Globonews,
chegaram ao limite da gagueira, ontem (18), durante debate a respeito da
crise na Venezuela com a participação do professor e jornalista Igor
Fuser, do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do
ABC (UFABC). O debate começa dirigido, ao oferecer como gancho para a
discussão a figura de Leopoldo López, o líder oposicionista acusado de instigar a violência nos protestos das últimas semanas, e preso ontem.
Diz a narração de abertura: “Ele é acusado de assassinato, vandalismo
e de incitar a violência. Mas o verdadeiro crime de Lopez, se podemos
chamar isso de crime, foi convocar uma onda de protesto contra o governo
de Nicolás Maduro. Protestos seguidos de confrontos que deixaram quatro
mortos e dezenas de feridos”. E segue descrevendo que a violência
política decorre da imensa crise no país – inflação, falta de produtos
nas prateleiras, criminalidade em alta. Ainda no texto de abertura, na
voz de Mônica, o governo é acusado de controlar a economia e a Justiça,
pressionar a imprensa e lançar milícias chavistas contra dissidentes. E
encerra afirmando que Leopoldo Lopez, na linha de frente, reivindica
canais de expressão para os venezuelanos, e abrem-se as aspas para
Lopez: “Se os meios de expressão calam, que falem as ruas”.
Do início ao fim do debate, com serenidade e domínio sobre o assunto,
Igor Fuser leva a apresentadora e o interlocutor às cordas desde o
início. Reconhece as dificuldades políticas do presidente Nicolás Maduro
e a divisão da sociedade venezuelana. Mas corrige os críticos, ao
enfatizar que o país vive uma democracia, e opinar que a campanha
liderada por López é “golpista”, ao ter como mote a derrubada do governo
legitimamente eleito com mandato até 2019.
Fuser informa que em dezembro se cristalizou um processo de diálogo
entre governo e oposição, então liderada por Henrique Capriles,
derrotado nas duas últimas eleições presidenciais por margem muito
pequena de votos. E que a disposição ao diálogo levou a direita mais
radical a isolá-lo, permitindo a ascensão de figuras como Leopoldo
López. Indagado se não seria legítimo as manifestações da ruas pedirem a
saída do governo, como foi no Egito ou está sendo na Ucrânia, o
professor da UFABC resume que as manifestações na Ucrânia são conduzidas
por nazistas, e no Egito a multidão protestava contra uma ditadura.
Lembra que na Venezuela houve quatro eleições nos últimos 15 meses, que o
chavismo venceu todas no plano federal, mas que as oposições venceram
em cidades e estados importantes, governam normalmente e as instituições
funcionam, e que a Constituição é cumprida.
Questionado sobre a legitimidade da Constituição – que teria sido
sido aprovada apenas por maioria simples – informou que a Carta, depois
de passar pelo Parlamento, foi submetida a referendo popular e aprovada
por 80% dos venezuelanos – o que inclui, portanto, mais da metade dos
que hoje votam na oposição. E à ironia dos debatedores, de que seria
paranoia das esquerdas acusar os Estados Unidos de patrocinar uma
suposta tentativa de golpe, esclareceu: os Estados Unidos estiveram por
trás de tantos golpes da América Latina – na Guatemala nos anos 1950, no
Brasil em 1964, no Chile em 1973, na própria Venezuela em 2002 – que
não é nenhum absurdo supor que estejam por trás de mais um. E que também
não é absurdo, em nenhum país do mundo, expulsar diplomatas que se
reúnem com a oposição como se fossem dela integrantes.
O jornalista desmontou também os argumentos de que o país sofre de
ausência de liberdade de expressão. Disse que o governo dispõe, de fato,
de jornais, canais de rádio e de televisão importantes, mas que dois
terços dos veículos de imprensa da Venezuela são controlados por forças
oposicionistas. E que o que existe na Venezuela seria, portanto, a
possibilidade de contraponto. E Fuser foi ferino no exemplo dos
problemas que a ausência de diversidade nos meios de comunicações causam
à qualidade da informação: “Sou jornalista de formação e nunca vi nem
na Globo nem nos jornais brasileiros uma única notícia positiva sobre a
Venezuela. Uma única. A gente pode ter a opinião que a gente quiser
sobre a Venezuela, é um país muito complicado. Agora, será que em 15
anos de chavismo naõ aconteceu nada positivo? Eu nunca vi. Não é
possível que só mostrem o que é supostamente ruim. Cadê o outro lado?
Será que os venezuelanos que votaram no Chávez e no Maduro são tão
burros, de votar em governo que só faz coisa errada?”
E fecha aspas! Fecha aspas!
Disponível em: (http://www.pragmatismopolitico.com.br/2014/02/professor-da-aula-de-venezuela-e-passa-pito-na-globo-em-plena-globo.html). Acesso em: 21/mar/2014.