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segunda-feira, 8 de junho de 2015

O Princípio da Razoabilidade no Direito Administrativo (Lucas Leonardo Souza Santos)

Postagem 08/jun/2015...


O Princípio da Razoabilidade no Direito Administrativo

Lucas Leonardo Souza Santos

Resumo: O presente texto visa analisar os atos da administração pública frente ao princípio da razoabilidade, tendo em vista a crescente utilização de normas abertas, fazendo com que o agente use da discricionariedade para enquadrá-las ao caso concreto, sob justificativa de melhor atender as conveniências da administração e as necessidades coletivas. Mais adiante, destaca-se o caráter sancionador do direito administrativo, pois se trata do setor que mais acarreta prejuízos aos administrados, haja vista as diversas decisões desconexas, incongruentes e desprovidas de fundamentação. Após citar alguns julgados, conclui-se destacando a importância do respeito ao principio da razoabilidade, que somando ao princípio da legalidade e razoabilidade, poderá chegar efetivamente à finalidade da lei. Este artigo foi orientado pelo Professor Dr. Daniel Ferreira.

Dentre as diversas facetas do Estado, merece especial destaque a função administrava que este exerce frente ao próprio governo e a sociedade. Para Celso Antonio Bandeira de Mello, esta é a função que se “exerce na intimidade de uma estrutura e regime hierárquicos e que no sistema constitucional brasileiro se caracteriza pelo fato de ser desempenhada mediante comportamentos infralegais ou, excepcionalmente, infraconstitucionais, submissos todos a controle de legalidade pelo Poder Judiciário[1]”.

Neste viés, conforme bem explicitou o autor, todas as normas regulamentadas pelo Direito Administrativo passarão pelo crivo do Judiciário, e, conseqüentemente, devem sujeitar-se à observância de determinados princípios expressos ou implícitos no ordenamento constitucional, em especial quando o Estado age por meio de seus órgãos e agentes públicos, seja editando comandos genéricos e abstratos, seja prestando serviços públicos ou resolvendo conflitos de interesse.

Ao analisar os diversos princípios vitais para a garantia da ordem pública, depara-se com o princípio da razoabilidade, o qual é definido por Antonio José Calhau de Resende da seguinte forma:

“A razoabilidade é um conceito jurídico indeterminado, elástico e variável no tempo e no espaço. Consiste em agir com bom senso, prudência, moderação, tomar atitudes adequadas e coerentes, levando-se em conta a relação de proporcionalidade entre os meios empregados e a finalidade a ser alcançada, bem como as circunstâncias que envolvem a pratica do ato”.[2]

Neste prisma, constata-se que a administração pública, ao exercer suas funções, deve primar pela razoabilidade de seus atos a fim de legitimar as suas condutas, fazendo com que o princípio seja utilizado como vetor para justificar a emanação e o grau de intervenção administrativa imposto pela esfera administrativa ao destinatário, como bem assevera José Roberto Oliveira Pimenta.[3]

A importância do princípio da razoabilidade no direito administrativo mostra-se ainda mais evidente quando se põe em pauta a face sancionadora que este exerce frente aos administrados, em que diversas vezes ocorre por meio de dispositivos abertos e abstratos, utilizando da discricionariedade para tanto.

Desta forma, esta competência discricionária vem sendo utilizada, no desempenho da função pública, como forma de melhor atender as conveniências da administração e as necessidades coletivas. Serve como um poder instrumental, o qual consiste na liberdade de ação dentro de critérios estabelecidos pelo legislador.

Assim, se remanescer na norma certa margem de opção para o agente efetivar a vontade abstrata da lei, a autoridade deverá adotar a melhor medida para o atendimento da finalidade pública.[4]

Contudo, esta discricionariedade por parte do agente não pode resultar em atitudes incoerentes, desconexas e desprovidas de fundamentação. Deve, portanto, haver adequação ou proporcionalidade entre o motivo e a finalidade, sob pena do ato administrativo ser objeto de invalidação pela própria administração ou pelo Judiciário, na hipótese de provocação do interessado.[5]

Nesta linha, o princípio da razoabilidade visa limitar esta discricionariedade na atuação da administração pública. Porém, cabe atentar que este não o único principio utilizado para tal função.

Em matéria de sanção tributária no âmbito administrativo, por exemplo, oportuno por em pauta também os princípios da legalidade e proporcionalidade. Esta, como uma das facetas da razoabilidade, revela que nem todos os meios justificam os fins. Logo, os meios conducentes à consecução das finalidades, quando exorbitantes, superam a proporcionalidade, porquanto medidas imoderadas em confronto com o resultado almejado.[6]

Quanto ao princípio da legalidade, por sua vez, surge como conquista do Estado de Direito, afim de que os cidadãos não sejam obrigados a se submeter a arbitrariedades. É o que dispõe o artigo 5°, Inciso II, que dispõe “que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.”

Assim, como bem salienta Lucia Valle Figueiredo, o princípio da legalidade não deve ser visto como condicionante de qualquer ato do administrador, que deve encontrar norma expressa que se enquadre exatamente ao caso concreto. Ao contrário, é bem mais amplo que a mera sujeição do administrador à lei, pois este também deve necessariamente se submeter ao Direito, ao ordenamento jurídico, às normas e princípios constitucionais, devendo buscar como meta a igualdade na própria lei.[7]

Portanto, a atuação da administração pública deve seguir os parâmetros da razoabilidade, legalidade e da proporcionalidade, que censuram o ato administrativo que não guarde uma proporção adequada entre os meios que emprega e o fim que a lei almeja alcançar.[8]

De forma mais precisa e técnica, José Roberto Pimenta Oliveira assim conclui:

“O regime jurídico-sancionatório, por força do princípio constitucional da razoabilidade, está atrelado ao dever de ostentar, entre as infrações e sanções administrativas, como inarredável condição de validade da norma que as istatui e do ato administrativo que as aplica, o necessário coeficiente de adequação, necessidade e proporcionalidade, sindicável pelo Poder Judiciário, ao nível do controle de constitucionalidade ou legalidade de produção jurídica.”[9]

São inúmeros os precedentes que seguem esta linha, como na hipótese de erro no preenchimento de nota fiscal, que caso não implique em nenhum prejuízo ao fisco não poderá gerar nenhuma atuação administrativa[10]. Do mesmo modo quando não haja respeito entre a fundamentação exposta no processo administrativo com os princípios da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade[11].

Desta forma, conforme já exposto anteriormente, a atuação do agente público deve seguir fielmente os princípios acima referidos, em especial ao da razoabilidade, tendo em vista a sua importância para a garantia da ordem democrática, vez que ensejam a possibilidade de concretização de justiça social e dos valores a elas inerentes. Ademais, não impendem em nada a atuação estatal e nem dificulta o alcance coletivo, pois apenas servem como norte para uma atuação coesa, moderada e de bom senso por parte dos executores da vontade do Estado.

Referências bibliográficas:

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 21ª Ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2006, p. 36.

RESENDE, Antonio José Calhau. O princípio da Razoabilidade dos Atos do Poder Público. Revista do Legislativo. Abril, 2009

OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade no Direito Administrativo Brasileiro. 1ª Ed., São Paulo. Malheiros Editores, 2006, p. 473

CARDOSO, Hélio Apoliano. Os Princípios da Razoabilidade, Proporcionalidade e Legalidade na Atuação da Administração Pública. < http://www.advogado.adv.br/artigos/2007/helioapolianocardoso/principios.htm>. Acesso em: 11 setembro 2011. 

FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de Direito Administrativo. 9ª Ed., São Paulo. Malheiros Editores, 2008, p. 42.
Notas:

[1] MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 21ª Ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2006, p. 36.

[2] RESENDE, Antonio José Calhau. O princípio da Razoabilidade dos Atos do Poder Público. Revista do Legislativo. Abril, 2009.

[3] OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade no Direito Administrativo Brasileiro. 1ª Ed., São Paulo. Malheiros Editores, 2006, p. 473.

[4] RESENDE, Antonio José Calhau. Op. Cit.

[5] RESENDE, Antonio José Calhau. Op. Cit.

[6] CARDOSO, Hélio Apoliano. Os Princípios da Razoabilidade, Proporcionalidade e Legalidade na Atuação da Administração Pública. < http://www.advogado.adv.br/artigos/2007/helioapolianocardoso/principios.htm>. Acesso em: 11 setembro 2011. 

[7] FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de Direito Administrativo. 9ª Ed., São Paulo. Malheiros Editores, 2008, p. 42.

[8]  CARSOSO, Hélio Apoliano. Op. Cit.
  
[9]  OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Op. Cit. p. 473.

[10] TRIBUTÁRIO. ADUANEIRO. IMPORTAÇÃO. INDICAÇÃO INCORRETA DO PAÍS DE ORIGEM. MERA IRREGULARIDADE. BOA-FÉ. MULTA. INAPLICABILIDADE. Não incidência, no caso concreto, da multa prevista no art. 84, da Medida Provisória nº 2.158-35/2001. As penalidades previstas na legislação aduaneira destinam-se não só ao controle administrativo, como também ao controle fiscal, havendo a possibilidade de aplicação de multa quando os atos promovidos na importação ou exportação se encontrarem em desconformidade com a legislação de regência da matéria. Todavia, é necessário que os requisitos constantes na documentação de importação, cuja violação enseja a aplicação da multa aduaneira, sejam essenciais. O erro no preenchimento do campo relativo ao país de procedência consistiu em mera irregularidade, pois não teve o condão de influir na identificação da mercadoria. O simples fato de existir outra(s) DI envolvendo as mesmas partes, preenchida(s) corretamente, não elidem a presunção de boa-fé do importador. (TRF4, AC 2005.71.13.000773-2, Primeira Turma, Relatora Maria de Fátima Freitas Labarrère, D.E. 11/05/2011).

[11] ADMINISTRATIVO. CONSELHO DE CLASSE. ATO ADMINISTRATIVO DE SUSPENSÃO DE EXERCÍCIO PROFISSIONAL. 1. Em que pese a regularidade formal do procedimento administrativo disciplinar, estando a fundamentação das decisões administrativas em contradição com dispositivos legais e com o princípio da razoabilidade e proporcionalidade, ao impor ao autor obrigações desarrazoadas, deve ser decretada a nulidade das penalidades aplicadas ao autor. 2. Improvimento da apelação. (TRF4 5000553-83.2010.404.7009, D.E. 18/08/2011).
Lucas Leonardo Souza Santos é acadêmico de Direito do Centro Universitário Curitiba - UNICURITIBA.

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