Postagem no AberturaMundoJuridico em 11/mar/2017...
O Xadrez dos economistas que inventaram a recessão
Qua, 08/03/2017 - 20:52
Atualizado em 10/03/2017 - 17:06
3,6% de queda do PIB em 2016 não é culpa de Dilma Rousseff.
Arriscaria a dizer que nem é culpa de Michel Temer. Quem levou o país à
maior recessão desde 1930 é uma subciência econômica, uma submissão
atrasada a um pensamento econômico equivocado, raso, que transformou o
conhecimento científico em matéria de fé, abolindo princípios básicos de
uma economia de mercado.
A culpa de Dilma e Temer foi a da semi-ignorância de uma, da
ignorância ampla de outro, deixando a condução do país nas mãos de
técnicos e Ministros de pequena estatura, escasso conhecimento geral.
A tragédia brasileira pós-redemocratização é fruto direto da ação
deletéria dos economistas brasileiros, alguns com interesses financeiros
explícitos – como a geração do Plano Real -, outros com a ignorância
fatal dos falsos especialistas, os que confiam cegamente em respostas de
manuais, com total incapacidade de enxergar o todo.
A economia sempre foi uma ciência auxiliar das políticas públicas,
assim como o financeiro é auxiliar dos projetos de uma empresa. Cabe ao
financeiro avaliar os custos, as formas de financiamento, apontar os
limites, mas sempre se subordinando à estratégia definida pelo Board da
companhia.
Os erros de Dilma em 2014 foram fruto da sua cabeça. Os desastres de
2015 se deveram à pressão suicida do mercado/mídia e a erros trágicos de
diagnóstico de Joaquim Levy, que persistiram na gestão Henrique
Meirelles.
1o Passo – a crise fiscal
A crise fiscal do governo Dilma Rousseff foi fruto direto de um erro de diagnóstico dos economistas.
Basearam-se em estudos dos anos 90 – que haviam sido revisados pelo
FMI em 2012 – segundo os quais subsídios fiscais tinham Impacto positivo
no PIB. A enxurrada de subsídios se somou à compressão das tarifas de
energia, visando conter a inflação. Havia um quadro externo de queda nos
preços internacionais de commodities, prenunciando reflexos negativos
sobre o país. E a Lava Jato cumprindo sua missão de destruir a economia
brasileira.
A pobreza institucional e política do país permitiu que toda a
estratégia fosse comandada de forma autocrática por Dilma e Guido
Mantega, abrindo mão de qualquer consulta a outras cabeças.
2o Passo – o ajuste fiscal radical
Joaquim Levy encontrou pela frente o seguinte quadro:
1. Crise fiscal, decorrente da queda da atividade econômica e do exagero dos subsídios concedidos na gestão Mantega.
2. Problemas no front externo com a compressão do câmbio.
3. Aceleração da Selic impactando profundamente a dívida pública.
4. Desmonte da cadeia do petróleo e gás pela compressão das tarifas e pelo missão internacional da Lava Jato.
A estratégia desenhada por Levy/mercado consistia em um choque
tarifário gigantesco, um profundo arrocho fiscal e uma desvalorização
cambial.
A tática consistia em equilibrar rapidamente as contas públicas,
através dessa dupla investida, equilibrar a relação dívida/PIB
(principal indicador de solidez fiscal). E, com isso, despertar a fé dos
empresários na solidez fiscal. Bastaria para trazer de volta os
investimentos em um prazo exíguo. Com os investimentos de volta, haveria
a volta do crescimento e, consequentemente, da arrecadação fiscal.
3o Passo - A volta da inflação
Não há economia que resista a um choque simultâneo de tarifas e de
câmbio. A consequência lógica foi uma explosão da inflação. O desafio do
governo consistiria em impedir os efeitos secundários do duplo choque
de preços por alguns meses. Depois, em curto prazo, os investidores
voltariam a acreditar no país, retomando os investimentos e trazendo de
volta o crescimento.
Na prática, o que ocorreu:
.
1. Mega-reajustes de tarifas e desvalorização cambial produziram uma aceleração da inflação.
2. Para conter a inflação, o governo aumentou o aperto fiscal.
3. Simultaneamente, subiu a Selic e promover uma política de
crédito extremamente restritiva, promovendo o chamado
efeito-engavetamento: empresas que tinham crescido mais no período de
bonança não tiveram tempo de voltar ao patamar anterior, espremida pelas
restrições de crédito e juros altos.
4o Passo – o efeito engavetamento
As empresas que mais cresceram no período anterior foram as primeiras
a bater no muro da inadimplência: atrás delas, vieram as empresas da
cadeia produtiva promovendo um amplo engavetamento, que resultou no
aprofundamento inédito da recessão.
O resultado foi trágico. Ajuste fiscal, mais elevação dos juros, mais
restrição do crédito resultaram um corte radical na economia. A crise
das empresas aumentou o desemprego e afetou a parte fiscal de duas
maneiras: na ponta da receita, derrubando a arrecadação devido à crise;
na ponta da dívida pública, crescimento devido ao aumento da Selic.
Queda do numerador (receita), aumento no denominado (dívida), promoveu
um aumento maior da relação dívida/PIB.
No final de 2015, Levy saiu e o novo Ministro da Fazenda Nelson
Barbosa ensaiou uma mudança de estratégia: acenaria com o ajuste fiscal
no longo prazo em troca de mais fôlego para aumentar os gastos públicos
no curto prazo.
O boicote de Eduardo Cunha, mais a ação política combinada com a Lava
Jato, impediram qualquer mudança. E a única saída fiscal – a volta da
CPMF – foi soterrada pela campanha feita pelo golpe.
Michel Temer assumiu dobrando a aposta no pacote desastroso de
Joaquim Levy. O resultado foi o esperado: 3,6% de queda do PIB em cima
de uma queda de 4% em 2015. E nenhuma perspectiva de recuperação
vigorosa da economia este ano.
5o Passo – o mantra das expectativas
O jogo, de agora em diante, é tão óbvio que chega a ser cansativo.
Nas próximas semanas, economistas de mercado e editorias de economia
sairão buzinando que os 3,6% foram um sacrifício necessário. Se afrouxar
agora, jogará todo o sacrifício no lixo.
Em 1994 escrevi que a maior praga brasileira foi a mística dos
pacotes econômicos. Ali, morria a geração dos economistas que sabia
pensar o país de forma sistêmica.
Original disponível em: (http://jornalggn.com.br/noticia/o-xadrez-dos-economistas-que-inventaram-a-recessao). Acesso em 11/mar/2017.
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