Postagem no AberturaMundoJuridico 08/mar/2017...
O nada e o ódio
As mortes de Maria e de Marisa expõem a tragédia de ontem e a de hoje
Eliane Brum

Acaba de completar um mês da morte de Marisa Letícia Lula da Silva. E na sexta-feira, 3 de março, sua memória era objeto de disputa: o juiz Sérgio Moro arquivou as acusações contra ela na ação penal da Lava Jato que envolve o triplex de Guarujá,
como determina a lei em caso de falecimento, mas decretou apenas “a
extinção de punibilidade”. A defesa afirmou que vai questionar a decisão
porque o juiz deveria ter decretado também a “absolvição sumária”. A
disputa não é apenas semântica ou jurídica, mas política. A morte de
Marisa, esta que se tornou exposta, revela muito do que se tornou o
Brasil. Tanto quanto, mais de 40 anos atrás, a morte de Maria de
Lourdes, a primeira mulher do ex-presidente, revelava pelo avesso o que
éramos e ainda somos. Há algo que une essas duas mortes para além de Lula. Algo que fala de corpos objetificados e de invisibilidades.
A morte de Maria de Lourdes Ribeiro da Silva só ganhou existência
fora das estatísticas como citação na biografia do marido depois que ele
ficou famoso. Ela morreu 15 minutos depois de o bebê de sete meses ser
arrancado a fórceps do seu corpo. No atestado de óbito constava “coma
hepático, provável hepatite”. No do menino, “morte intrauterina”. Maria
de Lourdes morreu só, no Hospital Modelo, em São Paulo.
“Estou morrendo. Eles vão me deixar morrer. Não me deixa sozinha”, ela
disse à Soledade, sua cunhada, a última pessoa da família a vê-la com
vida. Mas os médicos não permitiram que nenhum familiar permanecesse com
ela. Maria, a irmã mais velha de Lula, foi quem a vestiu para o
velório. Encontrou-a “ensanguentada e cortada”, ao lado do bebê morto.
Quando Lula chegou, com a mala de roupinhas da criança, foi informado:
“Sua mulher está morta. Seu filho também”.
Em 2003, procurei os médicos que a atenderam para uma reportagem. Um
deles, Sérgio Belmiro Acquesta, gerente do departamento médico da
Villares, metalúrgica onde Lula trabalhava, já tinha morrido. Ele também
era legista do Instituto Médico Legal de São Paulo e chegou a ser
acusado de assinar dois laudos falsos para a ditadura.
O outro médico da Villares, que fez o pré-natal de Maria de Lourdes e
cuidou de sua internação, disse não se lembrar dela: “Eu atendia 30
mulheres todo dia no ambulatório, mais outro tanto no hospital. Tudo
isso em quatro horas”. O médico do bairro também afirmou não recordar de
nada: “Atendo 30 pessoas por dia e só guardo as fichas por cinco anos”.
A chefe do berçário do hospital naquele período afirmou só lembrar “de
um feto morto e de uma mulher com infecção de qualquer coisa”. E
explicou o porquê: “Todas elas gritam na maternidade, isso não chamava
atenção. Lula não era famoso, a gente lembra do pessoal mais
classificado. Pobre, sabe como é, a gente trata bem mas não tem aquela
recomendação exagerada”.
Nas semanas antes de morrer, Maria de Lourdes procurou os médicos da
Villares e do bairro várias vezes, queixando-se que tinha “uma fogueira
no estômago”. Vomitava tudo o que comia. Ouvia deles que gravidez
era assim, “dava enjoo”. Sua mãe contou que mandavam que ela caminhasse
e comesse gelatina. Quando finalmente foi internada, a mãe pediu ajuda a
um dos médicos, porque Maria de Lourdes estava desesperada de dor. Ele
respondeu: “A senhora nunca teve um filho? Ela está com dor de parto, é
normal. Está no isolamento por causa da hepatite, mas a dor é normal”.
Em entrevista para a biografia Lula, o filho do Brasil, escrita
por Denise Paraná, Lula disse: “Ninguém me tira da cabeça que ela
morreu por negligência. Como ela morrem milhões sem atendimento neste
país”.
A dor de Maria era invisível, sua voz era inaudível, e ela morreu como objeto
Maria de Lourdes era então só mais uma Maria. Que, como tantas
Marias, gritava de dor. E não pertencia ao “pessoal mais classificado”. O
que os relatos contam é que sua dor não seria dela, mas das mulheres,
estas que têm por característica sofrer na gravidez e no parto. Uma dor
tão naturalizada que a doença que a levou ao coma hepático sequer foi
investigada. A ideia de que todo sofrimento é natural apagou a
singularidade da sua dor e liberou os médicos de escutá-la. “Todas elas
gritam” é uma frase profunda, que conta de uma história de opressão. No
Ocidente, atravessada pela moral cristã que coloca na mulher o pecado
original e a dor do parto como uma de suas punições, do mesmo modo que
idealiza a maternidade
como a vocação maior de uma mulher e a sua realização máxima. A dor de
Maria de Lourdes era invisível, sua voz era inaudível. E assim ela
morreu aos 22 anos. E morreu como objeto.
E Marisa, esta que morreu um mês atrás na arena pública? À primeira
vista, pode-se pensar que ela foi visível. E visível até demais. Mas o
excesso de exposição pode ser uma forma mais sofisticada de
invisibilidade. Ao contrário de Maria de Lourdes, Marisa foi tratada num
dos melhores hospitais privados do Brasil, o Sírio-Libanês, em São
Paulo. E chegou até lá com esse título bastante controverso, de
“ex-primeira-dama”. Primeira dama do presidente mais popular da história
recente do Brasil, hoje réu da Lava Jato e alvo de ódio de uma parcela
da população. Nesta condição, Marisa, que aos 66 anos sofreu um AVC e
recebeu o melhor tratamento disponível, do ponto de vista técnico,
também foi reduzida a objeto.
É importante lembrar. Uma médica do hospital, que depois seria
demitida, vazou dados do prontuário de Marisa num grupo de médicos no WhatsApp.
Ao comentar que ela ainda não tinha sido levada para a UTI, um
residente em urologia de outro hospital comentou: “Ainda bem!”. E a
médica respondeu com risadas. Outro médico, este neurocirurgião,
escreveu: “Esses fdp vão embolizar ainda por cima”. Ele referia-se ao
procedimento de provocar o fechamento de um vaso sanguíneo para diminuir
o fluxo de sangue num local determinado. O médico então completou: “Tem
que romper no procedimento. Daí já abre pupila. E o capeta abraça ela”.
Marisa não foi tratada como pessoa, mas como coisa, um objeto de transferência do ódio a Lula
Marisa ali não era uma pessoa em processo de morte. Mas um objeto de
transferência, um repositório do ódio a Lula. E seguiria sendo mesmo
após a sua morte. Os falsários de notícias disseminaram pela internet a
“denúncia” de que ela não havia morrido, mas sim fugido para o exterior
para não responder às acusações da Lava Jato. A morte, segundo uma das
mentiras circulantes, seria uma encenação para que ela pudesse ficar
impune. Apesar de toda visibilidade que o velório teve na mídia, sites
de notícias falsas sustentaram que o caixão estava lacrado e chegaram a
publicar uma foto de Marisa na Itália,
feita em 2005, como se ela tivesse sido flagrada naquele momento. Outra
variante eram as mensagens nas redes sociais que pediam a intervenção
das Forças Armadas para fazer um exame de DNA no corpo. Tratava-se ali
de interditar a possibilidade de identificação com Lula num momento de
dor. Marisa era coisa. E, como coisa, não tinha vida nem morte. Podia
ser colocada onde fosse mais conveniente. Animada artificialmente.
É preciso lembrar destas duas mulheres porque a melhor maneira de
arrancar pessoas do lugar de objeto é lhes devolvendo a história. Se
elas ganharam uma dimensão pública por conta da excepcionalidade do
homem com quem se casaram, elas nasceram e viveram e criaram uma vida
bem antes de conhecê-lo. E a complexidade do que foram impactou o homem
público que Lula se tornou para muito além do que é dito e reconhecido.
E, no caso de Marisa, impactou capítulos recentes da vida do Brasil, na
qual ela possivelmente foi bem mais do que uma personagem secundária.
Mas, quando essa narrativa está num disputa tão feroz como a de agora,
com simplificações de parte a parte na qual se busca o que melhor sirva a
um propósito, a complexidade se perde. E assim perdemos todos.
Há algo de trágico na morte de Maria e de Marisa, mas esta tragédia
diz respeito menos a elas e mais ao que somos e ao que nos tornamos como
sociedade. É preciso lembrar antes que nossa vida de espasmo em espasmo
apague a extrema gravidade do que foi exposto. E do que segue em vigor.
É preciso fazer memória para resistir ao apagamento. E resistir à
normalização do ódio.
Maria de Lourdes pertencia ao vasto grupo dos morríveis – e dos
matáveis. Seu sofrimento não produzia escuta, sua morte era um nada.
Para além da dor daqueles que a amavam, uma mulher de 22 anos morrer por
“provável hepatite” quando estava grávida não produzia espanto, só
indiferença. Sua morte não produziu nem mesmo uma marca na memória dos
que dela deveriam ter cuidado.
Enquanto a morte de Maria nada moveu, porque ela morreu “no seu lugar”, a de Marisa gerou ódio porque ela ousou mudar de lugar
Já Marisa, com a ascensão política de Lula,
deixou o grupo dos que podem morrer sem causar alarde, mas as mensagens
nas redes sociais mostram que para muitos ela não deveria estar no
Sírio-Libanês. O hospital dos mais ricos não era o lugar dela. Enquanto a
morte de Maria nada move, porque ela morreu “no seu lugar”, o
tratamento de ponta dispensado à Marisa gera ódio, porque ela ousou
mudar de lugar. Colocou-se no lugar do “pessoal mais classificado”,
lembrando as palavras que a enfermeira usou para explicar por que as
mulheres pobres não recebiam uma “recomendação exagerada”. Ao fazê-lo,
quebrou a hierarquia de classes. E foi vítima de ódio.
Mas até mesmo no ódio Marisa é objetificada. Porque o ódio é para
ele, e não para ela. Seu corpo que morre é apenas o objeto
transferencial do ódio destinado ao seu marido. O que médicos fizeram no
WhatsApp e o que os falsários de notícias fizeram na internet são uma
demonstração de que todos os limites foram rompidos. Se resta algo do
que se pode chamar, na falta de palavra melhor, de pacto civilizatório, é
talvez uma última trama bem esgarçada. Somos uma sociedade de
linchadores, movida pela vontade de destruição do outro. Não há mais espaço para adversários, só existem inimigos.
Aqueles que gozam com a desumanização do outro, não entenderam que na barbárie não se salva ninguém
Aqueles que gozam com a desumanização do outro – distorcem, mentem,
manipulam – talvez não tenham entendido que na barbárie não se salva
ninguém. Acreditam estar apenas jogando seus jogos pueris, exibindo-se
para a turma, como os médicos no WhatsApp, mas não compreenderam que o
fio sobre o qual se equilibram se desfaz. Quando se presta atenção ao
discurso dessas mensagens, neste e em outros casos, percebe-se que
contêm uma crueldade, sim, mas infantilizada. São adultos
infantilizados. E isso também é bastante perigoso, porque neste lugar
não há responsabilização.
Maria e Marisa viveram existências duras, vidas de mulheres pobres.
Maria de Lourdes migrou de Minas Gerais com a família. O pai era um
agricultor doente dos pulmões. Seu primeiro sapato foi comprado pouco
antes de pegarem o trem para São Paulo. Na primeira noite na cidade, ela
teve febre. A família conta que o pai colocou os filhos nas filas que
encontrou na Estação da Luz, pensando que era comida. Mas era vacina, e o
braço da pequena Maria, com três anos, inchou.
Anos depois, as famílias dela e de Lula seriam vizinhas, e ela dizia
ter pena “do moço que tinha perdido um dedo”. Desde os 16 anos, Maria de
Lourdes trabalhava como operária numa tecelagem. Levou uma semana para
aceitar o pedido de namoro feito num bailinho. Quando pouco antes de se
casarem Lula anunciou que pensava em participar da chapa do sindicato,
ela foi se aconselhar com os patrões. Ouviu deles que era perigoso,
“encrenca certa com a polícia”. Lula discordou.
A melhor maneira de arrancar pessoas do lugar de objeto é devolvendo-lhes a história
Filha de um agricultor e de uma benzedeira, Marisa começou a trabalhar aos 9 anos como babá.
Aos 13, embalava bombons numa fábrica. Seu primeiro marido dirigia um
táxi quando foi assassinado num assalto. Marisa estava grávida do
primeiro filho. Quando conheceu Lula, ela vivia um momento de extrema
dificuldade. O episódio é romantizado porque virou uma história de amor,
mas ele revela bastante sobre o machismo vigente e generalizado do
movimento sindical da época. Lula havia deixado a ordem de que, quando
aparecesse uma “viuvinha nova, bonita”, que o chamassem. Marisa
precisava “pegar o carimbo” para poder liberar a pensão do marido. Mas
como Lula queria sair com ela, fez com que voltasse ao sindicato várias
vezes alegando que a lei tinha mudado. Depois, chantageou-a para
conseguir seu telefone.
Marisa tinha personalidade forte e muita influência sobre Lula. Não
era de medir palavras. Mas na campanha de 2002 e, durante todo o seu
período como primeira-dama,
foi blindada. Dela, quase nada se sabe além do que se considerou
conveniente falar sobre sua vida. Na quarta campanha presidencial, a que
Lula finalmente venceu pela primeira vez, ela cumpria os compromissos
públicos com as mãos visivelmente trêmulas e enorme timidez. Em geral
acompanhada pelo filho Fábio Luís, o Lulinha. Tinha então uma explicação
recorrente, talvez orientada por um marqueteiro: “Não estou nervosa,
estou emocionada”.
Dela se contava uma história que ecoa a do triplex do Guarujá, esta
última ainda sem conclusão. Em 1989, quando Lula disputou sua primeira
eleição para presidente, foram plantados vários boatos de que ele tinha
uma mansão no Morumbi, então o bairro que mais representava uma
ostentação emergente. Marisa teria pegado um táxi e ouvido essa história
do motorista. Pediu então que ele a levasse até a casa chique de Lula. O
motorista recuou. Ela então teria dito: “Ah, que pena. Eu sou a mulher
do Lula e queria tomar posse do que é meu”. Quando conheceu Brasília,
em 1980, e botou os olhos nas mansões do Lago Paranoá, Marisa
vaticinou: “Esses caras não vão deixar você chegar ao poder nunca. Fazem
qualquer coisa, mas não abandonam essa vida”.
Enquanto crescia a expressão pública de Lula, Marisa foi se tornando
para o público a mulher muda. Aquela que só falava da porta da casa (ou
do Alvorada) para dentro, a que reinava no mundo doméstico, aquele que
seria invadido pela Polícia Federal um ano atrás para a “condução coercitiva” de Lula.
O momento em que o Brasil mais ouviu a sua voz foi justamente num
episódio de violação de seus direitos, quando uma conversa grampeada
pela Polícia Federal vazou. Marisa conversava com o filho Fábio Luís
sobre um panelaço contra o PT e desabafou: “Deviam enfiar essas panelas
no cu!”. A frase ganhou chamadas na imprensa, o áudio foi para o
YouTube. Seria interessante saber daqueles que se escandalizaram quantos
não disseram algo semelhante numa conversa privada. E como se sentiriam
se suas conversar privadas com familiares fossem expostas publicamente.
Quando Marisa morreu, seu obituário foi composto por fragmentos
pinçados da vida de uma mulher lançada na arena pública, mas que o
público pouco conhece de fato. “Costurou a estrela da primeira bandeira
do PT”, “primeira-dama de perfil discreto”, “foi criticada quando
plantou um canteiro de flores vermelhas em formato de estrela no jardim
do Alvorada”. Neste momento de intensa disputa, só se conhece de Marisa o
que convém de um lado e outro. E com isso se perde sua complexidade,
mas também o pedaço da história que ela testemunhou, assim como o seu
real papel nela.
Maria e Marisa tiveram despedidas muito diferentes. Maria de Lourdes
foi velada em casa. A certa altura sua mãe passou mal. O médico do
bairro foi chamado. Ela rasgou a camisa dele com as unhas em desespero.
Era uma casa pobre, precária, em reformas para abrigar o quarto do bebê
que chegaria em breve. Numa daquelas cenas em que a realidade supera a
ficção, o peso do caixão fez com que o assoalho afundasse. Parecia
realismo mágico, mas era vida.
A indiferença reservada à Maria, o nada de sua morte, segue em vigor. E o ódio reservado à Marisa mostra que pioramos
Marisa teve um caixão vistoso, reverenciado por milhares no Sindicato
dos Metalúrgicos, em São Bernardo do Campo. Na parede, uma ampliação
gigante de uma fotografia dela com Lula. Havia pessoas ilustres e
discursos inflamados. Enquanto isso, na internet, os falsários de
notícias espalhavam que ela estava na Europa. O ódio era tanto que era
preciso transformá-la numa morta viva para que pudessem continuar
destruindo-a. E assim forjou-se uma cena em que a realidade supera a
ficção, mas de uma forma perversa, já que se cria uma mentira (o que é
bem diferente da ficção) para colocar no lugar da realidade.
São despedidas tão diferentes, a de Maria e Marisa. Mas ambas seguem
invisíveis. A tragédia maior, a que vai muito além destas duas mulheres,
é que a indiferença reservada à Maria, o nada de sua morte, segue em
vigor. E o ódio reservado à Marisa mostra que pioramos.
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A greve internacional de mulheres reivindica a potência de criar um novo pacto

É importante perceber onde hoje existe potência. E especialmente a
potência de criar pactos que permitam recriar os laços sociais.
Prepara-se para esta quarta-feira, 8 de Março, uma greve internacional
de mulheres, organizada por ativistas de mais de 40 países. O movimento
surgiu a partir das greves feitas na Polônia e na Argentina no ano
passado (escrevo sobre elas aqui) e também a partir da marcha das mulheres contra Trump, nos Estados Unidos, assim como outras manifestações pelo mundo. Os manifestos e convocatórias
propõem um novo ciclo do feminismo, capaz de articular várias lutas.
Esta agenda expandida é a parte mais interessante: as mulheres na
produção, no trabalho remunerado, reivindicando melhores condições de
trabalho e salários equivalentes, mas as mulheres também no trabalho não
remunerado dentro de casa e no trabalho da reprodução, reivindicando
direitos reprodutivos; as mulheres contra o feminicídio, contra a
violência doméstica, contra o estupro e outras violências de gênero, mas
também um feminismo contra o racismo, a xenofobia, a homofobia e a
transfobia. É também uma posição contra “o ataque neoliberal em curso
sobre os direitos sociais e trabalhistas”, como diz o manifesto assinado por intelectuais americanas, entre elas Angela Davis.
A internacionalização da greve é geográfica, mas também simbólica: ela
supera as fronteiras ao propor um feminismo atravessado por todas as
questões cruciais deste tempo. Assim, as convocatórias estão chamando
todas as mulheres, o que significa incluir também as mulheres trans. No
Brasil, onde há articulações significativas em algumas cidades e quase
inexistentes em outras, é forte a oposição à reforma da previdência
proposta pelo governo Temer, já que ela poderá ter grande impacto sobre
todos e especialmente sobre as mulheres mais pobres, a maioria delas
negras. Mas, como qualquer movimento que pretenda ganhar as ruas, o que
de fato acontecerá neste 8 de março é uma incógnita. Ni Una Menos, o mote da greve argentina, se expandiu pelo mundo. Nem uma a menos é um pacto de vida. É também um pacto contra o ódio.
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A escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie escreveu um pequeno livro-manifesto chamado Para educar crianças feministas (Companhia das Letras).
O livro, que chega nesta terça-feira (7/3) às livrarias do Brasil e do
mundo, é escrito na forma de uma carta a uma amiga, mãe de uma menina,
mas tudo o que ela diz obviamente vale para crianças de qualquer gênero.
A escritora deixa claro o que entende por feminismo: “Ser feminista é
como estar grávida. Ou se é ou não se é. Ou você acredita na plena
igualdade entre homens e mulheres. Ou não”. Ela dá 15 sugestões para
criar uma criança feminista. E talvez a mais transgressora delas, nestes
tempos em que a ignorância se tornou popular, seja a quinta:
“Ensine-lhe o gosto pelos livros. (...) Os livros vão ajudá-la a
entender e questionar o mundo, vão ajudá-la a se expressar, vão ajudá-la
em tudo o que ela quiser ser”.
Eliane Brum é escritora, repórter e documentarista. Autora dos livros de não ficção Coluna Prestes - o Avesso da Lenda, A Vida Que Ninguém vê, O Olho da Rua, A Menina Quebrada, Meus Desacontecimentos, e do romance Uma Duas. Site: desacontecimentos.com Email: elianebrum.coluna@gmail.com Twitter: @brumelianebrum/ Facebook: @brumelianebrum
Original disponível em: (http://brasil.elpais.com/brasil/2017/03/06/opinion/1488822564_205808.html?id_externo_rsoc=Fb_BR_CM). Acesso em 08/mar/2017.
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