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sábado, 30 de janeiro de 2016

Habeas Corpus. Juízo de Infância. Cabe contra decisão de internação de Criança. Concederam a ordem. TJMG.

Postagem 30/jan/2016...

Ementa:

FAMÍLIA. MANUTENÇÃO DE GUARDA DE MENOR. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO A ABRIGO. SUSPEITA DE BURLA AO CADASTRO NACIONAL DE ADOÇÃO. CONVÍVIO COM A FAMÍLIA SUBSTITUTA. PREVALÊNCIA DO INTERESSE DO MENOR. 
- É possível a utilização excepcional da via do Habeas Corpus para se decidir questões referentes ao interesse de menor, quando diante de suspeita de burla ao Cadastro Nacional de Adoção, com a ocorrência de "adoção a brasileira", seja determinado o recolhimento da criança a abrigo institucional. 
- Não havendo indícios de que a criança esteja exposta a risco a sua integridade física ou psíquica no lar do pai registral, necessário se faz conceder a ordem para manter a guarda com a família substituta até o julgamento final da lide principal, por não atender ao melhor interesse do menor seu acolhimento institucional em abrigo. 

(TJMG - HC 10000140252503000 MG, Relator Duarte de Paula, 4ª Câmara Cível, J. 26/06/2014). 


Acórdão integral:


EMENTA: FAMÍLIA. MANUTENÇÃO DE GUARDA DE MENOR. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO A ABRIGO. SUSPEITA DE BURLA AO CADASTRO NACIONAL DE ADOÇÃO. CONVÍVIO COM A FAMÍLIA SUBSTITUTA. PREVALÊNCIA DO INTERESSE DO MENOR 
- É possível a utilização excepcional da via do Habeas Corpus para se decidir questões referentes ao interesse de menor, quando diante de suspeita de burla ao Cadastro Nacional de Adoção, com a ocorrência de "adoção a brasileira", seja determinado o recolhimento da criança a abrigo institucional. 
- Não havendo indícios de que a criança esteja exposta a risco a sua integridade física ou psíquica no lar do pai registral, necessário se faz conceder a ordem para manter a guarda com a família substituta até o julgamento final da lide principal, por não atender ao melhor interesse do menor seu acolhimento institucional em abrigo. 
HABEAS CORPUS CÍVEL Nº 1.0000.14.025250-3/000 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - PACIENTE (S): G. L. M. - AUTORI. COATORA: J. D. V. C. I. J. C. B. H. - INTERESSADO: J. O. M., N. N. C., P. R. M., V. N. M. 
A C Ó R D Ã O 
(SEGREDO DE JUSTIÇA) 

Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em CONCEDER A ORDEM. 
DES. DUARTE DE PAULA 
RELATOR. 
DES. DUARTE DE PAULA V O T O 
Trata-se de Habeas Corpus impetrado pelo Dr. EDIMAR NASCIMENTO TRINDADE, RODRIGO ARAÚJO TRINDADE e JULIANA ARAÚJO TRINDADE, advogados inscritos na OAB/MG sob os respectivos números 48.058, 117.093 e 99.014, em favor de G. L. M., em que se alega constrangimento ilegal, em virtude da decisão judicial proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara Cível da Infância e Juventude da Comarca de Belo Horizonte, aqui apontado como autoridade coatora. 
Afirmam os impetrantes que o julgador de origem determinou o acolhimento institucional da menor paciente em abrigo institucional, fato que ensejaria violação à liberdade de ir e vir da menor e a colocaria em risco desnecessário de trauma psicológico, visto que se encontra acolhida em ambienta amoroso, inexistindo indício de que esteja correndo riscos físicos ou psíquicos que autorizem a medida decretada. 
Sustentam que a menor se encontra sob a guarda do pai registral P. R. M. e de sua companheira J. L. O. C., sendo fruto de um relacionamento extraconjugal do genitor, que foi reconhecido pela própria genitora como pai da menor, fato que o levou a registrar de boa-fé a criança e assumir sua criação, já que a genitora é dependente de drogas, afirmando que mesmo em caso de suspeita de burla ao cadastro nacional de adoção seria temerário retirar um bebê de oito meses do lar do pai registral e transferi-lo para um local de acolhimento institucional, quando não há indícios de que sofra maus tratos, buscando, assim, a concessão da ordem para manter a paciente sob a guarda de P. R. M. e J. L. O. C. 
Liminar deferida às f. 49/52. 
Informações do Juízo às f. 66/68, com documentos juntados às f. 69/88-verso. 
Instada a se manifestar a Procuradoria-Geral de Justiça, às f.90/92, opina em preliminar pelo não conhecimento da ordem, por inadequação da via eleita, e no mérito pela denegação da ordem. 
É o relatório. 
Passo a decidir. 
Como se sabe, habeas corpus é ação constitucional de natureza penal destinada especificamente à proteção da liberdade de locomoção, quando ameaçada ou violada por ilegalidade ou abuso de poder. 
Na hipótese em análise, a suposta ofensa ao direito de ir e vir da menor paciente consistiria no alegado constrangimento ilegal ocasionado pelo decreto judicial de seu acolhimento institucional em abrigo, que acarretaria violação à liberdade de ir e vir da criança e ainda a exporia a risco desnecessário de trauma psicológico, visto que se encontra acolhida no lar parental, onde não é exposta a perigo e sem qualquer risco de maus tratos. 
Em que pese a princípio a via eleita não se apresente como via adequada para análise de questões afetas ao juízo de família, cumpre ressaltar que o entendimento do colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA é de se considerar adequado o procedimento do habeas corpus em situações semelhantes à presente, em que se está diante de determinação de busca e apreensão de menor e de seu acolhimento institucional em abrigo, retirando o infante da convivência da família na qual se encontra inserida. 
É que neste caso deve se ter em conta a prevalência do interesse do menor, mesmo diante da suspeita de irregularidade na paternidade registral declarada espontaneamente em situação que gerou estranheza, levando a se desconfiar de uma "adoção a brasileira" para burlar a fila do Cadastro Nacional de Adoção. 
Ressalto que não se mostra, no caso, possível de ser examinado na via estreita do remédio heróico do habeas corpus a regularidade do reconhecimento da paternidade feita espontaneamente pelo suposto pai, mas se deve apenas limitar a análise regularidade da decisão que determinou o acolhimento em abrigo da criança, quando não se está diante de nenhuma das hipóteses do artigo 98 do ECA que justifiquem a determinação de medida de proteção à criança. 
Neste caso, os documentos juntados aos autos revelam que a menor não se encontra no lar do pai registral exposta a nenhuma situação de risco a sua integridade física ou psíquica, estando, conforme demonstram documentos, ao contrário, bem adaptada e bem cuidada. 
Não haveria, assim, melhor interesse em determinar o acolhimento institucional da menor, ainda mais quando a guarda desta inicialmente esteve com a avó materna que manifestou interesse de que a criança permaneça com o casal, visto que já cria duas crianças filhas da genitora da paciente e não teria condições de educar mais uma. 
Não se justifica, assim, a determinação de recolhimento da menor em abrigo institucional, quando não se vislumbra qualquer perigo na sua permanência com a família em que se encontra, apesar da aparência da chamada "adoção à brasileira", ao menos até o julgamento final da lide em que é discutida a irregularidade do registro ou até mesmo da questionada paternidade. 
Ressalto que acerca da questão já teve oportunidade de decidir o colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: 
"HABEAS CORPUS. BUSCA E APREENSÃO DE MENOR. DESTITUIÇÃO LIMINAR DE GUARDA. DETERMINAÇÃO DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL. POSSÍVEL PRÁTICA DE ADOÇÃO" À BRASILEIRA ". CONVÍVIO COM A FAMÍLIA SOCIOAFETIVA. Ausência de indícios de maus tratos, negligência ou abuso. melhor interesse do infante. Ordem concedida." (HC 265.771/SC, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/02/2014, DJe 10/03/2014). 
"DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. RELAÇÃO DE PARENTESCO. ADOÇÃO. BUSCA E APREENSÃO DE MENOR. SUSPEITA DE SIMULAÇÃO. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. 1. OEstatuto da Criança e do Adolescente-ECA, ao preconizar a doutrina da proteção integral (artigo 1º da Lei n. 8.069/1990), torna imperativa a observância do melhor interesse da criança. As medidas de proteção, tais como o acolhimento institucional, são adotadas quando verificada quaisquer das hipóteses do art. 98 do ECA. 2. No caso em exame, a avaliação realizada pelo serviço social judiciário constatou que a criança E K está recebendo os cuidados e atenção adequados às suas necessidades básicas e afetivas na residência do impetrante. Não há, assim, em princípio, qualquer perigo em sua permanência com o pai registral, a despeito da alegação do Ministério Público de que houve adoção 'intuitu personae', a chamada"adoção à brasileira", ao menos até o julgamento final da lide principal. 3. A hipótese dos autos, excepcionalíssima, justifica a concessão da ordem, porquanto parece inválida a determinação de acolhimento de abrigamento da criança, vez que não se subsume a nenhuma das hipóteses do art. 98 do ECA. 4. Esta Corte tem entendimento firmado no sentido de que, salvo evidente risco à integridade física ou psíquica do infante, não é de seu melhor interesse o acolhimento institucional ou o acolhimento familiar temporário. 5. É verdade que o art. 50 do ECA preconiza a manutenção, em comarca ou foro regional, de um registro de pessoas interessadas na adoção. Porém, a observância da preferência das pessoas cronologicamente cadastradas para adotar criança não é absoluta, pois há de prevalecer o princípio do melhor interesse do menor, norteador do sistema protecionista da criança. 6. As questões suscitadas nesta Corte na presente via não infirmam a necessidade de efetiva instauração do processo de adoção, que não pode ser descartado pelas partes. Na ocasião, será imperiosa a realização de estudo social e aferição das condições morais e materiais para a adoção da menor. Entretanto, não vislumbro razoabilidade na transferência da guarda da criança - primeiro a um abrigo e depois a outro casal cadastrado na lista geral -, sem que se desatenda ou ignore o real interesse da menor e com risco de danos irreparáveis à formação de sua personalidade na fase mais vulnerável do ser humano. 7. Ordem concedida." (HC 279.059/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 10/12/2013, DJe 28/02/2014). 
"HABEAS CORPUS. BUSCA E APREENSÃO DE MENOR. DETERMINAÇÃO DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL. ADOÇÃO. - Salvo no caso de evidente risco físico ou psíquico ao menor, não se pode conceber que o acolhimento institucional ou acolhimento familiar temporário, em detrimento da manutenção da criança no lar que tem como seu, traduza-se como o melhor interesse do infante. - Ordem concedida." (HC 221.594/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/03/2012, DJe 21/03/2012). 
Nesse esteio, concedo a ordem pleiteada, confirmando a liminar concedida, para que se mantenha a menor G. L. M. no lar dos guardiões de fato, P. R. M. (pai registral) e J. L. O. C. até decisão final a ser proferida no pedido de providência ajuizado pelo Ministério Público. 
Sem custas. 

DES. DÁRCIO LOPARDI MENDES 
V O T O 
O em. Desembargador Relator está concedendo a ordem para que a menor, paciente, seja mantida no lar dos guardiões de fato até decisão final no pedido de providência ajuizado pelo Ministério Público. 
Após detida análise do feito ponho-me de acordo com o em. Relator, e peço vênia apenas para tecer algumas considerações. 
No caso em exame a criança está recebendo todo o apoio material e afetivo no lar em que se encontra, inexistindo qualquer das hipóteses do artigo 98 do ECA aptos a ensejar a medida extrema de enviar a menor para um abrigo. 
Dessa forma, ainda que haja indícios de que a criança está sob a guarda do seu pai registral P.R.M e sua companheira J.L.O.C. em virtude de uma "adoção a brasileira", não havendo certeza acerca do fato, entendo que manter a criança em um lar atenda melhor aos seus interesses do que em um abrigo de menores. 
De acordo com o Princípio do melhor interesse do menor, devem-se preservar ao máximo aqueles que se encontram em situação de fragilidade. A criança e o adolescente figuram nesta posição por estarem em processo de formação da personalidade. O menor tem, assim, o direito fundamental de chegar à condição adulta sob as melhores garantias morais e materiais. 
Ante o exposto, pelas razões acima expostas, também concedo a ordem. 
DESA. HELOISA COMBAT - De acordo com o Relator. 
SÚMULA: "CONCEDERAM A ORDEM" 

Original disponível em: (http://ibdfam.org.br/jurisprudencia/3804/Cadastro%20nacional%20de%20ado%C3%A7%C3%A3o.%20Conv%C3%ADvio.%20Melhor%20interesse%20do%20menor). Acesso em 30/jan/2016.

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