28/set/2014...
Comarca de Santa Maria
Vara da Direção do Foro
Rua Alameda Buenos Aires, 201
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Processo nº: 027/1.14.0013023-9 (CNJ:.0031506-63.2014.8.21.0027)
Natureza: Voluntária - Outros
Requerente:
Juiz Prolator: Juiz de Direito - Rafael Pagnon Cunha
Data: 11/09/2014
'... se, para o direito, a família é instrumento de realização da
pessoa humana por considerar que toda e qualquer pessoa necessita de
relações de cunho afetivo para se desenvolver e viver seu projeto
próprio de felicidade e, porque para outras áreas do conhecimento, a
família não se estabelece somente pelas formas convencionais de união,
parece ficar evidente a possibilidade de reconhecimento do status
jurídico e de família às demais formas de organização familiar....'
GIRARDI, Viviane. Famílias contemporâneas, filiação e afeto: a
possibilidade jurídica de adoção por homossexuais. Porto Alegre,
Livraria do Advogado, Ed. 2005, p.133.
'A vida há de nos cobrar duramente por considerarmos pecado o amor que
não se enquadra em nossa visão mesquinha; por querermos medir
comportamentos segundo nossos padrões poucos generosos; por querermos
prender, humilhar, podar todo o relacionamento que não se adapta à
medida da nossa ignorância e dos nossos farisaicos valores.
Porque o amor, do jeito que pode ser, é o caminho da liberdade e da
grandeza – é a nossa única possibilidade de salvação.' LUFT, Lya. Pensar
é transgredir. Rio de Janeiro Record, 2004, p. 55.
Vistos.
Trata-se de analisar ação de suprimento de registro civil com
multimaternidade, aviada com o intento de levar a registro anotação de
paternidade e de dupla maternidade, articulada por genitores e pela
esposa da gestante, em comum acordo. Narraram que a gestação foi
concertada pelos três, com concepção natural, intentando fazer constar
no registro civil do nascituro os nomes do pai e das duas mães, bem como
de seus ascendentes.
MP manifestou-se pela competência do Juízo de Família.
Mantido o feito junto à Direção do Foro.
Novel parecer ministerial, pela realização de estudo social e psi; alternativamente, pela procedência da pretensão.
É O RELATO.
PASSO A MOTIVAR.
Procede a pretensão.
Moderna, inovadora, mas, fundamentalmente – e o mais importante -, tapada de afeto.
Na riquíssima experiência de um lustro de Jurisdição exclusiva de
Família, pronunciava às pessoas, diária e diuturnamente, das poucas
certezas que tinha: que afeto demais não é o problema; o problema é a
falta (infinda, abissal) de afeto, de cuidado, de amor, de carinho.
O que intentam Fernanda, Mariani e Luis Guilherme, admiravelmente, é assegurar à sua filha uma rede de afetos.
E ao Judiciário, Guardador das Promessas do Constituinte de uma
sociedade fraterna, igualitária, afetiva, nada mais resta que dar
guarida à pretensão – por maior desacomodação que o novo e o diferente
despertem.
Não vislumbro necessidade de providências outras na espécie, embora louvável o cuidado do sensível Promotor de Justiça.
As Mães são casadas entre si, o que lhes suporta a pretensão de duplo registro, enquanto ao Pai igualmente assiste tal direito.
A desatualização do arcabouço legislado à velocidade da vida nunca foi
impediente ao Judiciário Gaúcho; a lei é lampião a iluminar o caminho,
não este, como já se pronunciou outrora; a principiologia constitucional
dá guarida à (re)leitura proposta pela bem posta inicial.
Muito haveria a ser escrito.
Serviria o presente case ao articular de erudita e fundamentadíssima sentença.
Não é o que esperam, entretanto, Fernanda, Mariani, Luis Guilherme e,
mui especialmente, Maria Antônia (lindo nome); aguardam, sim, célere e
humana decisão, a fim de adequar o registro civil da criança ao que a
vida lhe reservou: um ninho multicomposto, pleno de amor e afeto.
Forte, pois, na ausência de impedientes legais, bem como com suporte no
melhor interesse da criança, o acolhimento da pretensão é medida que se
impõe.
Isso, posto, julgo procedente o pedido, para o fim de determinar a
expedição de mandado ao Registro Civil, anotando-se a paternidade e a
dupla maternidade (e respectivas ascendências), nos termos do pedido.
No mandado deverá constar que os interessados fazem jus à gratuidade dos serviços extrajudiciais.
Expeça-se, de pronto, mandado, dada a urgência da situação.
Registre-se.
Intimem-se.
Santa Maria, 11 de setembro de 2014.
Rafael Pagnon Cunha
Juiz de Direito.
Disponível em: (http://ibdfam.org.br/jurisprudencia/2718/Multimaternidade.%20Registro%20civil%20de%20paternidade%20e%20dupla%20maternidade.%20Comum%20acordo). Acesso em: 28/set/2014.
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