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sábado, 30 de março de 2013

Monogamia desejo e famílias paralelas (Rodrigo da Cunha Pereira)


Monogamia, desejo e famílias paralelas

27/03/2013
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM

A monogamia é um princípio básico e organizador das relações da família conjugal no Ocidente. A matéria é de fundamental importância quando se discute, por exemplo, uniões estáveis paralelas ao casamento. Nesta entrevista, Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do IBDFAM, fala sobre o sistema monogâmico, o desejo, famílias paralelas e o fim do amor entre casais.

O QUE CARACTERIZA O ROMPIMENTO DO PRINCÍPIO DA MONOGAMIA?

Além de princípio jurídico, a monogamia é uma questão filosófica séria, pois a ele estão vinculados muitos outros valores, tais como afeto, escolha, desejo, lealdade, mentira, risco, emoção, promessa, castigo, dinheiro, confiança e tantos outros. Romper o princípio da monogamia significa estabelecer outro código moral em relação ao parceiro ou parceira.

POR VEZES, CONFUNDIMOS MONOGAMIA COM FIDELIDADE. O QUE DIFERENCIA ESSES DOIS PRINCÍPIOS CULTURAIS E JURÍDICOS E COMO SE RELACIONAM?

Fidelidade ou infidelidade pode ser um código moral e particular de cada casal. Fidelidade pode ser o mesmo que lealdade, ou não. A quebra da monogamia vincula-se mais ao estabelecimento de famílias paralelas ou simultâneas ao casamento/união estável. A infidelidade não necessariamente constitui quebra de monogamia. Às vezes, estabeleceu-se uma relação paralela sem que haja ali uma outra família. Pode ser apenas uma relação extraconjugal, sem necessariamente estabelecer outra família. Amantes, no sentido tradicional da palavra, sempre existiram, e continuarão existindo, enquanto houver desejo sobre a face da terra. 

A MONOGAMIA CONSTITUI UM INTERDITO QUE VIABILIZA A ORGANIZAÇÃO DA FAMÍLIA CONJUGAL.  SE NÃO HOUVESSE TAL PROIBIÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO, A SOCIEDADE CONSEGUIRIA ESTRUTURAR AS FAMÍLIAS DE OUTRA FORMA OU A TENDÊNCIA SERIA A PROMISCUIDADE?

Assim como acontece com a proibição do incesto, a monogamia e a poligamia, em alguns países, são interditos viabilizadores das relações e organizações sociais. Não há cultura, socialização e sociabilidade sem que haja proibições e interdições ao desejo. Se se quebrar a monogamia, estabelecer-se-á outro código de conduta. Mas jamais será a promiscuidade, como às vezes se passa. O necessário para que exista cultura, civilização e, consequentemente, ordenamento jurídico, é que haja um não necessário ao desejo.

PARTINDO DO PRESSUPOSTO DE QUE A INFIDELIDADE É FRUTO DO DESEJO E DE QUE A FIDELIDADE TORNOU-SE LEI, É POSSÍVEL REGULAR O DESEJO? NESSE SENTIDO, ATÉ QUE PONTO O ESTADO PODE INTERVIR NESTAS QUESTÕES?

O Direito só existe porque existe o torto, ou seja, toda Lei pressupõe um desejo que se lhe contrapõe. Não roubar, não matar, não cobiçar a mulher do próximo, só tiveram que ser escritos porque há um desejo contraposto a eles. A fidelidade ou infidelidade conjugal deve funcionar como um código moral particular de cada casal. O Estado tem se afastado cada vez mais destas questões, como por exemplo, quando em março de 2005 (Lei 11.106/05) retirou-se do Código Penal o adultério como crime.

COM A SUPRESSÃO DA CULPA PELO FIM DA DISSOLUÇÃO CONJUGAL (EC 66/2010 - DIVÓRCIO DIRETO) O DEVER DA FIDELIDADE PERDEU SUA FORÇA COMO REGRA JURÍDICA PARA ALEGAÇÃO DE DIVÓRCIO. NESTE SENTIDO, QUAL SERIA A SANÇÃO APLICÁVEL À QUEBRA DESTE DISPOSITIVO? 

A EC66/10, que simplificou o sistema de divórcio no Brasil, em nada interfere neste aspecto. Ela significa apenas um afastamento maior do Estado nas questões de foro mais íntimo das pessoas e atribui a elas mais responsabilidades pelas ilusões e desilusões amorosas, na medida em que não mais se discute quem é o culpado pelo fim do casamento. Finalmente, entendeu-se que não há culpados ou inocentes, não há vilões. Ambos são responsáveis pelo fim do amor.

EM SUA OPINIÃO, O PRINCÍPIO JURÍDICO DA MONOGAMIA DEVE SER SUPERADO OU PRESERVADO?

A monogamia funciona como um ponto chave das conexões morais de determinada sociedade. Mas não pode ser uma regra ou princípio moralista, a ponto de inviabilizar direitos. Por exemplo, se se constitui uma família paralelamente à outra, não se pode negar que aquela existiu. Condená-la à invisibilidade é deixá-la à margem de direitos decorrentes das relações familiares. O princípio da monogamia deve ser conjugado e ponderado com outros valores e princípios, especialmente o da dignidade da pessoa humana. Qualquer ordenamento jurídico que negar direitos às relações familiares existentes estaria invertendo a relação sujeito e objeto, isto é, destituindo o sujeito de sua dignidade e colocando a lei como um fetiche.

(http://www.ibdfam.org.br/novosite/imprensa/noticias-do-ibdfam/detalhe/4989). 

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