LEI DOS MEIOS
Norma
contra oligopólios é defesa da sociedade
Artigo
publicado origialmente no jornal Folha de S.Paulo de 1º de janeiro de 2013.
Nas
últimas semanas, a Argentina voltou ao noticiário brasileiro devido aos
imbróglios relativos à aplicação da chamada "Lei dos meios",
responsável pela nova regulamentação dos serviços de comunicação. Alguns viram,
no caráter antimonopolista da Lei, a expressão de uma sanha estatal visando
limitar a liberdade de expressão, principalmente devido à arquirrivalidade
entre o governo Kirchner e o maior grupo de mídia do pais: o grupo Clarín.
No
entanto, há um debate importante que deve ser feito de maneira desapaixonada.
Ele passa pela resposta à pergunta: "Precisamos ou não de leis que
restrinjam a concentração da propriedade de canais de comunicação?". Ou
seja, podemos afirmar que a concentração da mídia não afeta necessariamente o
funcionamento da democracia?
Neste
sentido, vale a pena lembrar que o mercado de mídia é, atualmente, um dos mais
oligopolizados do mundo. Como vimos através do recente caso de Rupert Murdoch,
isto não é sem consequências para nossa vida política.
Murdoch
detinha um império mundial de TVs, jornais, editoras, revistas, rádios,
estúdios de cinema, portais de internet que lhe dava uma capacidade de moldar o
debate, pressionar governos e de intervir na política a ponto de prometer a um
general norte-americano (David Petraeus) apoio irrestrito de seu império caso
ele aceitasse concorrer à Presidência norte-americana.
Situações
como esta não são exclusivas do mundo anglo-saxão. As últimas décadas
conheceram uma tendência brutal à concentração de mídia que interfere, de
maneira nociva, não apenas na política, mas também na cultura. Um grupo como
Time Warner, por exemplo, controla, ao mesmo tempo, a produção, a difusão e o
desenvolvimento das técnicas de reprodução. Por isto, podemos dizer que leis
que impeçam a formação de oligopólios são uma forma da sociedade defender-se da
uniformização forçada de opiniões e do silenciamento de perspectivas.
Pode-se
contra-argumentar dizendo que a pulverização das mídias as deixa mais
vulneráveis às pressões dos governos. Este é um argumento relevante. No
entanto, a solução para esse problema não está na perpetuação de outro
problema. Há de se pensar ações que impeçam os governos de moldarem as
informações a partir de seus interesses.
No
caso brasileiro, isso pede a limitação da capacidade de influência dos governos
através da drástica limitação da publicidade governamental (reduzida apenas a
campanhas de utilidade pública), do respeito à proibição de políticos e seus
grupos operarem concessões de mídia, assim como de critérios absolutamente
isonômicos de usos de verbas publicitárias de empresas estatais.
Vladimir Safatle é
professor livre docente do departamento de filosofia da Universidade de São
Paulo e escreve às terças-feiras na Folha de S.Paulo.
Revista Consultor Jurídico, 1º de janeiro de 2013.
(http://www.conjur.com.br/2013-jan-01/vladmir-safatle-norma-oligopolios-defesa-sociedade?utm_source=twitterfeed&utm_medium=twitter).
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