08/11/2012 | Copyleft 


Obama convenceu EUA de que Romney era candidato dos ricos
Para o analista político estadunidense Mark Weisbrot, do Centro para Investigação Econômica e Política, aa nova composição demográfica dos Estados Unidos foi importante para a vitória do atual presidente, mas não o fator decisivo por si só: “Obama ganhou porque fez um apelo econômico populista para os eleitores da classe trabalhadora de todos os grupos raciais e étnicos, algo sem precedentes em mais de 50 anos de eleições presidenciais estadunidenses”, diz Weisbrot, em entrevista à Carta Maior.
Igor Ojeda
O presidente reeleito dos Estados Unidos Barack Obama deu um banho no republicano Mitt Romney se considerado apenas o voto “étnico”. Entre os latinos, por exemplo, obteve mais de dois terços de apoio. Entre os afroestadunidenses, recebeu a adesão de nove em cada dez eleitores. Tais dados demonstram que a “America” tradicional tão ao gosto dos Wasp(Brancos, Anglo-Saxões e Protestantes) está desaparecendo.
No entanto, para o economista estadunidense Mark Weisbrot, codiretor do Centro para Investigação Econômica e Política (CEPR, na sigla em inglês), as análises sobre a influência da nova composição demográfica dos Estados Unidos nas eleições, por si só, escondem um dado ainda mais importante: “Obama ganhou porque fez um apelo econômico populista para os eleitores da classe trabalhadora de todos os grupos raciais e étnicos, algo sem precedentes em mais de 50 anos de eleições presidenciais estadunidenses”, analisa, em entrevista à Carta Maior por correio eletrônico. Segundo ele, a campanha democrata à presidência foi vitoriosa porque conseguiu convencer a maioria dos eleitores estadunidenses de que Romney e os republicanos se importam apenas com os ricos.
Isso, porém, deve trazer poucos frutos no que diz respeito a mudanças radicais. Weisbrot acredita que o novo mandato de Obama possa avançar em alguns pontos, como a aprovação de uma reforma imigratória e a concretização do novo sistema de saúde, mas teme que ele barganhe cortes de gastos sociais. Confira a seguir a entrevista.
Carta Maior - Quais são suas primeiras avaliações sobre a vitória de Barack Obama?
Mark Weisbrot - Esse resultado estava previsto pelas pesquisas eleitorais do Princeton Electin Consortium e do Fivethirtyeight.com. Portanto, não foi uma surpresa, a não ser para a maioria dos meios de comunicação e especialistas que fingiam que havia uma disputa acirrada.
CM - Por que Obama venceu?
MW - Como muitos já mencionaram, a demografia dos Estados Unidos mudou, e Romney perdeu feio entre os latinos – entre 70 a 75% votaram em Obama – e afroestadunidenses, que deram 93% dos votos ao presidente. Romney teve grande maioria entre os eleitores brancos, mas não o suficiente para ganhar, especialmente nos estados em disputa.
Mas a análise demográfica deixa escapar algo talvez mais importante: Obama ganhou porque fez um apelo econômico populista para os eleitores da classe trabalhadora de todos os grupos raciais e étnicos, algo sem precedentes em mais de 50 anos de eleições presidenciais estadunidenses. Sua campanha convenceu a maioria dos eleitores de que Romney e seu partido se importavam bem mais com os ricos do que com o restante da população.
CM - O que a reeleição de Obama pode significar em termos de política interna?
MW - Dado o impasse no Congresso, com uma maioria republicana na Câmara dos Representantes, e a falta de liderança de Obama, as diferenças não serão enormes. Há talvez melhores chances de haver uma reforma imigratória do que se Romney tivesse vencido. Provavelmente o plano de seguro de saúde do Obama será concretizado, o que proporcionará seguro de saúde para mais de 30 milhões de estadunidenses e custos mais baixos para outros milhões. E talvez um pouquinho mais de regulação financeira.
CM - Quais serão as próximas batalhas entre o presidente reeleito e o Congresso, uma vez que a atual composição se manteve semelhante à anterior, com controle republicano sobre a Câmara dos Representantes e controle democrata sobre o Senado?
MW - Haverá batalhas sobre orçamento, impostos, questões ambientais. Um dos piores resultados possíveis é que Obama apoie cortes na Seguridade Social e/ou no Medicare em uma “grande barganha” com os republicanos na discussão sobre o orçamento, assim como outros cortes em gastos sociais. É preciso uma grande pressão popular para impedir que Obama aceite tais mudanças.
CM - Em relação à política externa, alguma coisa vai mudar? Como Obama se comportará, por exemplo, em relação a Israel, Irã e Síria?
MW - A política externa do primeiro mandato de Obama foi muito semelhante à do segundo mandato de George W. Bush. Eu não esperaria muitas mudanças. Obama optou desde o começo por se concentrar na política interna e não gastar ou arriscar capital político na política externa. Isso significa muito poucas mudanças. Uma guerra contra o Irã é ainda muito possível por causa da hostilidade estadunidense e o crescimento das tensões, embora eu acredite que seja menos provável do que se Romney tivesse se elegido.
CM - E em relação à América Latina e o Brasil?
MW - Obama quase não deu atenção à América Latina, incluindo o Brasil. Estaria tudo bem se isso não quisesse dizer que a política está determinada pelo Departamento de Estado e influenciada pelos direitistas no Congresso. Portanto, tem sido basicamente a mesma política que a de Bush. Provavelmente isso continuará por outros quatro anos.
CM - Dois terços dos eleitores hispânicos votaram em Obama. Ele retribuirá esse apoio com uma política imigratória mais flexível?
MW - Sim, mas terá dificuldades em conseguir aprovar uma reforma imigratória plena no Congresso.
CM - Estas foram as primeiras eleições presidenciais após a decisão da Suprema Corte que possibilitou a criação dos Super Pacs (comitês eleitorais sem limites de arrecadação de doações). Qual foi a influência destes sobre a campanha e os resultados das eleições?
MW - Acredito que tenham ajudado os republicanos, principalmente nas eleições para a Câmara dos Representantes. Mas a campanha de Obama teve tanta publicidade quanto a dos republicanos, cujos candidatos ao Senado não gastaram tanto mais assim. Obama e os democratas se saíram muito mais bem na campanha nas ruas, de acordo com muitos relatos. Portanto, o grande capital de direita não foi decisivo nestas eleições.
Claro que o dinheiro ainda corrompe os políticos estadunidenses em longo prazo – por exemplo, o povo votou em Obama pela mudança, mas não ganhou muito em troca. Nesse sentido, nossos políticos são mais corruptos que os de muitos países da América do Sul, onde – apesar de outras formas de corrupção piores que aqui – a população tem conseguido votar por mudanças progressistas nos últimos anos e recebê-las.
Talvez mais importante que uma reforma no sistema de financiamento de campanhas nos Estados Unidos seja uma reforma no sistema de votação. Mais de 40% dos estadunidenses não votaram nestas eleições, e os republicanos como os conhecemos hoje mal existiriam como um partido se tivéssemos leis e procedimentos de votação menos restritivos.
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