APELAÇÃO CÍVEL. REGULAMENTAÇÃO DO DIREITO DE VISITA. PEDIDO FORMULADO PELOS AVÓS MATERNOS. POSSIBILIDADE. DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR, EX VI DO ART. 227, DA CF. PRIMAZIA DO INTERESSE DA CRIANÇA. AUSÊNCIA DE RISCOS. PROIBIÇÃO INJUSTIFICADA. RECURSO DESPROVIDO. (AC. n. 2006.021720-1, de Concórdia; Relator Des. Moacyr de Moraes Lima Filho).
1. Muito embora inexista regulamentação legal expressa, mas considerando a incidência do art. 227 da Constituição Federal de 1988, que estatui o dever da família, da sociedade e do Estado assegurar a criança, com absoluta prioridade, o direito à convivência familiar, é certo que aos avós é garantido o direito de visita.
2. O direito de visita, bem como outros institutos afetos, deve-se nortear, precipuamente, pelo atendimento ao melhor interesse da criança, não se admitindo, por um lado, que os pais o cerceiem injustificadamente, e, por outro, que a criança seja submetida a situações prejudiciais.
3. "A regulamentação de visitas deve amoldar-se às peculiaridades do caso concreto, visando, sempre, ao bem-estar da criança. Não demonstrados prejuízos ao infante, mas, ao contrário, benefícios, autorizada é a visitação por seus parentes paternos" (Des. Luiz Carlos Freyesleben).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.2006.021720-1, da comarca de Concórdia (1ª Vara Cível), em que é apelante I. G. e outro, e apelado J. B. N. e outro:
ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, negar provimento ao recurso. Custas legais.
RELATÓRIO
Cuida-se de recurso de apelação interposto por I. G. e M. C. B., em face de sentença prolatada nos autos de ação para a "regulamentação de visitas dos avós maternos" proposta por J. B. N. e C. T. B., que julgou parcialmente procedente o pedido, conferindo aos avós maternos o direito de visita às crianças M. C. B. e C. G., considerando prejudicado o pedido de visita em relação a M. C. B. e condenando os réus ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que foram fixados em R$ 300,00 (trezentos reais).
Os apelantes pugnam pela reforma da decisão recorrida para que seja julgado improcedente o pedido de regulamentação de visitas formulado pelos avós maternos das crianças M. C. B. e C. G., bem como pela concessão das benesses da assistência judiciária gratuita.
Aduzem que os apelados, avós maternos das filhas dos recorrentes, sempre despenderam um tratamento agressivo e incompatível à filha.
Alegam que a infante M. C. B., conforme teria ficado evidenciado no estudo social promovido, não deseja relacionar-se com os apelados.
Argúem, ao final, que cumpriram os requisitos necessários para a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita.
Verificando a ausência de preparo, o ilustre Sentenciante julgou deserto o recurso interposto.
No julgamento do agravo de instrumento interposto pelos apelantes, esta Primeira Câmara de Direito Civil, deu-lhe provimento para conceder o benefício e possibilitar a subida dos autos de apelação, independe do respectivo preparo (fls. 139/143).
Contra-razões às fls. 146 a 149.
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Dr. Mário Gemin, manifesta-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
Objetivam os apelantes a reforma da r. sentença de Primeiro Grau, que julgou parcialmente procedente o pedido, regulamentando o direito de visita dos avós maternos.
O art. 1.589 do Código Civil assegura ao pai ou à mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, o direito de "visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação".
Muito embora inexista regulamentação legal expressa, mas considerando a incidência do art. 227 da Constituição Federal de 1988, que estatui o dever da família, da sociedade e do Estado assegurar a criança, com absoluta prioridade, o direito à convivência familiar, é certo que aos avós é garantido o direito de visita.
Comentando a omissão legislativa, Regina Beatriz Tavares da Silva preleciona:
"Também carece o novo Código Civil de regra que assegure a visitação de outros parentes do menor, como os avós, irmãos, padastros, levando-se em onsideração especialmente os laços de afeição que os unem e o proveito que esses contatos trazem ao menor. Não são incomuns situações em que, com a separação judicial, o guardião procure afastar os filhos de parentes do outro genitor, o que traz prejuízos aos menores. A visitação de outros parentes tem reconhecimento doutrinário e jurisprudencial (v. Yussef Said Cahali, Divórcio e separação, cit., p. 951-7, e Fabio Bauab Boschi, Direito de visita, cit., p. 123 e s., que apontam vários julgados sobre o tema). Muito embora exista esse reconhecimento, embasado em direito natural dos envolvidos nessas relações, é relevante estabelecer norma legal a respeito, para sanar lacuna existente" (Novo código civil comentado. Coord. Ricardo Fiúza. São Paulo: Saraiva, 2002. p. .398/1.399).
O direito de visitação recíproco entre avós e netos decorre do natural relacionamento afetivo e jurídico existente, fundando-se na solidariedade e nodireito de ambos de gozarem amplamente da convivência familiar.
Ressalta-se, entretanto, que o direito de visitas, bem como outros institutos afetos, deve-se nortear, precipuamente, pelo atendimento ao melhor interesse da criança, não se admitindo, por um lado, que os pais o cerceiem injustificadamente, e, por outro, que a criança seja submetida a situações prejudiciais.
Sobre a primazia do interesse da criança, Yussef Said Cahali assevera:
"A regulamentação do direito de visitas deve atender precipuamente aos interesses do filho: 'seria desvirtuar o sentido do direito de visita a suposição de que, dado o interesse dos pais, haveria a Justiça de olhar também para o interesse do filho menor; o interesse que se há de levar em conta, porquanto é o interesse juridicamente protegido eabsolutamente determinante, será sempre o do incapaz, credor de uma prestação de companhia: a este deve ceder, por inteiro, os dos pais que, devedores dessa prestação, freqüentemente se reveste de feição apenas apetitiva: satisfazer sua própria necessidade de afeto'(2ª Câmara do TJSP, apelação 103.088-1, 29.11.1988)" (Divórcio e separação. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 930/931).
Esse é o entendimento pretoriano:
"CIVIL. REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. PEDIDO FORMULADO POR PARENTES PATERNOS. AUSÊNCIA DE RISCO À CRIANÇA. DEFERIMENTO. RECURSO DESPROVIDO.
"A regulamentação de visitas deve amoldar-se às peculiaridades do caso concreto, visando, sempre, ao bem-estar da criança. Não demonstrados prejuízos ao infante, mas, ao contrário, benefícios, autorizada é a visitação por seus parentes paternos" (AI n.2006.037384-6, de Itajaí, rel. Luiz Carlos Freyesleben, j. em 22/2/07).
"A ação de regulamentação de visitas visa estreitar os laços afetivos do menor com aquele que não detém sua guarda. Neste contexto, é imperioso que se observe, sempre, a forma que melhor assegurar o interesse da criança, atentando-se para a sua faixa etária, em função do seu desenvolvimento físico, mental, emocional e, também, social"(AI n. 2003.030311-1, da Capital, Rela. Desa. Salete Silva Sommariva, j. 11/5/04).
Destaca-se que se não restar comprovado que a convivência com o não-guardião ocasiona prejuízos à criança, constituindo, ao revés, substrato para a sua formação saudável e afetuosa, a imposição de obstáculos pelo detentor do diretode guarda transfigura-se em abuso no exercício do poder familiar, que deve serrechaçado.
Nesse sentido:
"REGULAMENTACAO DE VISITAS. PROPOSTA PELA AVÓ PATERNA. INTERESSE DE (O) MENOR. ART. 227. CONSTITUICAO FEDERAL DE 1988.
"Ação de regulamentação de visita proposta pela avó paterna. Incidência do art. 227 da Constituição Federal. O direito dos avós de visitarem os netos e de serem visitados constitui corolário natural de um relacionamento afetivo e jurídico assente em Lei. Tal direito se funda na solidariedade familiar e nas obrigações oriundas do parentesco. A visitação se compreende hoje em decorrência do direito outorgado à criança e ao adolescente de gozarem de convivência familiar. A oposição à relação de amizade e de certo intercâmbio espiritual entre avós e netos, mostra-se odiosa e injusta, constituindo-se um verdadeiro abuso de pátrio poder, principalmente, quando se recebe substancial ajuda material da mesma. Há sempre que prevalecer, em primeiro lugar, o interesse, o bem estar e a proteção da criança. Recurso conhecido e desprovido". (TJRJ, AC 2005.001.25415, rel. Des. Ferdinaldo do Nascimento, j. em 24/1/06).
Dessa forma, tem-se que o direito de visita, se comprovadamente benéfico à criança, não constitui tão-somente direito dos avós ao convívio com os netos, mas sim, a priori, direito destes à manutenção dos laços de afeto e carinhodespendidos por aqueles.
No caso dos autos, vê-se que a privação do convívio com os avós maternos não se justifica, sendo prejudicial para as crianças, que não poderão desfrutar de afeto e da ampla convivência familiar, e impingindo grande sofrimento àqueles.
O estudo social realizado e as demais provas produzidas demonstraram que o afastamento dos avós maternos decorreu de contenta entre os ascendentes; motivo alheio às crianças. Viu-se, também, que os apelados cuidavam com apreço da neta mais velha, quando possuía tenra idade.
Compulsando o processo, verifica-se que não há prova nos autos a justificar a proibição de visitas dos avós maternos, devendo ser considerada a análise das peculiariedades do caso concreto promovida pelo Juízo de Primeiro Grau, que se cercou de cuidados para salvaguardar os interesses das infantes, determinando, inclusive, o contínuo acompanhamento da família pelo Estado.
Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso, mantendo incólume o decisum vergastado.
DECISÃO
Pelo exposto, a Câmara, após debates, decidiu, à unanimidade de votos, negar provimento ao recurso.
O julgamento, realizado no dia 11 de dezembro de 2007, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Carlos Prudêncio, com voto, e dele participou a Exma. Sra. Desa. Maria do Rocio Luz Santa Ritta.
Florianópolis, 12 de dezembro de 2007.
Moacyr de Moraes Lima Filho
RELATOR
(Do Portal do TJSC: http://tjsc6.tj.sc.gov.br/cposg/pcpoResultadoConsProcesso2Grau.jsp, acesso 08.09.2008).
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