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quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

Reintegração de posse. Autora herdou direito de posse do possuidor falecido pelo instituto da seisine. Direito de posse reconhecido. Procedência. TJMG. J. 06/02/2018.

Postagem no Abertura Mundo Jurídico em 21/fev/2018...


Ementa:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - IMÓVEL OBJETO DE HERANÇA - SAISINE - ART. 1.784 CC - SENTENÇA MANTIDA. 
I- Pelo instituto da "saisine" (art. 1.784 CC), são transmitidas aos sucessores do possuidor falecido não só a propriedade, mas também a posse dos bens por ele deixados. 
II- Presentes os requisitos legais, deve ser mantida a sentença primeira que deferiu o pedido de reintegração de posse ao herdeiro/possuidor do imóvel objeto da ação.  
(TJMG. AC Nº 1.0514.12.000481-7/001, Relator: João Câncio, 18ª CÂMARA CÍVEL, J. 06/02/2018). 


Acórdão integral:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - IMÓVEL OBJETO DE HERANÇA - SAISINE - ART.1.784 CC - SENTENÇA MANTIDA. I- Pelo instituto da "saisine" (art.1.784 CC), são transmitidas aos sucessores do possuidor falecido não só a propriedade, mas também a posse dos bens por ele deixados. II- Presentes os requisitos legais, deve ser mantida a sentença primeira que deferiu o pedido de reintegração de posse ao herdeiro/possuidor do imóvel objeto da ação.
 
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0514.12.000481-7/001 - COMARCA DE PITANGUI - APELANTE(S): MARIA DA CONCEIÇÃO CAMPOS - APELADO(A)(S): FLÁVIA APARECIDA PIMENTA DIAS
 
A C Ó R D Ã O
 
Vistos etc., acorda, em Turma, a 18ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO. 
 
DES. JOÃO CANCIO 
 
RELATOR.
  
DES. JOÃO CANCIO (RELATOR)
   
V O T O
 
Trata-se de apelação cível interposta por MARIA DA CONCEIÇÃO CAMPOS contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 01ª Vara Cível da Comarca de Pitangui que, nos autos da "Ação de Reintegração de Posse" ajuizada por FLÁVIA APARECIDA PIMENTA DIAS, julgou procedente o pedido inicial.
 
Em suas razões (fls.200/208), a recorrente alega que a cópia do contrato de compra e venda é documento hábil para provar a aquisição da propriedade. Afirma que a apelada não residia no imóvel ao tempo do falecimento de seu companheiro e, assim, não detinha a posse do imóvel. Diz que os cômodos construídos na laje do seu imóvel é extensão de sua residência e que não há direito algum da parte autora. Relata que restou comprovado que não foi o seu filho quem construiu o imóvel mas sim toda a sua família e, inclusive, a requerida. Assevera que a relação havida entre as partes foi de simples comodato não podendo o mesmo atingir o direito de propriedade da requerida. Diz que o fato de residirem por mais de 07 anos no imóvel não autoriza o direito de posse da extensão da construção. Argumenta que não pediu a reintegração de posse pois se tratava de moradia de seu filho, sendo o imóvel dado para moradia em ato de mera permissão. 
 
Contrarrazões às fls.218/224.
 
É o Relatório.
 
Passo a decidir.
 
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
 
Através da presente ação busca a autora a reintegração na posse do imóvel situado na rua Zico Bicalho Nº519, apto. 01, Bairro Centro, no Município de Conceição do Pará, que teria sido construído por ela e por seu finado companheiro Ademilson de Campos sobre a casa de propriedade da Sra. Maria da Conceição Campos, mãe de seu companheiro. 
 
Informou que, quando seu companheiro faleceu foi juntamente com suas filhas para a casa de sua mãe até se restabelecer da perda de seu ente querido. Contudo, 02 meses depois, quando voltou à sua casa encontrou a mesma alugada para terceiros. 
 
Afirmou que procurou a requerida que se recusou a restituir o bem.
 
O D. Sentenciante, entendendo ter a autora logrado êxito em comprovar a sua posse e o esbulho sofrido, julgou procedente o pedido inicial para reintegrar a autora na posse do imóvel, condenando a requerida nas custas e honorários advocatícios correspondentes a 10% do valor da causa. 
 
Inconformada a ré apela, nos termos já relatados.
 
Eis os limites da controvérsia.
 
Compulsando os autos, não encontro elementos suficientes a autorizar a reforma da r. sentença atacada, entendendo ter seu douto prolator conferido correto e seguro desfecho à causa. 
 
Conforme cediço, a posse repousa numa situação de fato, dispondo o artigo 1.210 do Código Civil Brasileiro que "O possuidor tem direito a ser mantido na posse, em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado". 
 
A ação de reintegração de posse tem por objetivo restituir o possuidor na posse em caso de esbulho, sendo este considerado como a injusta e total privação da posse sofrida por alguém que a vinha exercendo. Tem a finalidade de retornar a posse para aquele que já a obteve, tendo-a perdido em função de esbulho de outrem.
 
Daí decorre que, consideradas as exigências do art. 282 do CPC/73 hoje art. 319 do CPC/15, combinado com o art. 927 CPC/73 561 CPC/15, para o manejo do interdito recuperandae possessionis, devem ficar satisfatoriamente comprovados: a posse do autor da ação, sua duração e objeto; o esbulho imputado ao réu e a data em que foi praticado. 
 
No caso em comento, a prova testemunhal aliada aos documentos comprovam que a autora residiu no imóvel objeto do litígio, com seu companheiro Ademilson Campos por vários anos. 
 
Na condição de companheira do Sr. Ademilson (caso reconhecida a união estável), a Sra. Flávia Aparecida teria, em tese, o direito de real de moradia, personalíssimo e intransferível, e a posse do bem, que, com o falecimento do Sr. Ademilson, efetivo possuidor, passou a pertencer aos seus herdeiros, dentre os quais ela está inserida.
 
Isso porque, pelo instituto da "saisine" (art.1.784 CC) o de cujus transmitiu aos seus sucessores não só a propriedade, mas também a posse dos bens por ele deixados, de tal sorte que ainda que a autora e outros herdeiros não tenham exercido fisicamente a posse sobre o imóvel em questão, esta restou anteriormente caracterizada pelo exercício de seu companheiro, o Sr. Ademilson.
 
Sobre o tema lecionam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, citando Pontes de Miranda: 
  
"Consequências da saisine. Os herdeiros são investidos na posse e adquirem a propriedade pelo simples fato da morte do autor da herança. Adquirem os direitos e obrigações do morto com todas as suas qualidades e vícios (CC 1203 e 1206). A posse é por eles adquirida sem que haja necessidade de apreensão material do bem. Independentemente da abertura de inventário, podem fazer uso dos instrumentos de proteção da posse (interditos proibitórios) e propriedade (v.g., ação reivindicatória, ação de usucapião), podendo somar à sua a posse do de cujus (CC 1207), para fins de usucapião (Pontes de Miranda. Tratado, v.XI, §1194, n.3, p.132) Como a morte do de cujus faz os seus bens ingressarem no patrimônio dos herdeiros, independentemente de qualquer outra providência, a renúncia à herança pode constituir-se em fraude contra credores, pois o herdeiro já é possuidor e proprietário no momento da morte e, ao dispor desses direitos com renúncia à herança, pode praticar, em tese, ato apto a fraudar direitos dos credores." 1
  
Com efeito, os herdeiros tornaram-se também possuidores do bem, ainda que não a tenham exercido de forma direta a posse.
 
Com a morte do Sr. José Júlio, sua posse sobre o imóvel transferiu-se automaticamente para seus herdeiros, dentre eles a autora.
 
Assim, presentes os requisitos legais, deve ser mantida a sentença primeira que deferiu o pedido de reintegração de posse à autora, eis que herdeira/possuidor do imóvel objeto da presente ação.
  
CONCLUSÃO
 
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO para manter, na íntegra, a sentença primeva. 
 
Custas e honorários recursais de 05% sobre o valor da causa pela recorrente, suspensa a exigibilidade em face da gratuidade concedida.
 
É como voto.
   
DES. SÉRGIO ANDRÉ DA FONSECA XAVIER - De acordo com o(a) Relator(a).
 
DES. VASCONCELOS LINS - De acordo com o(a) Relator(a).
  
SÚMULA: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO."
 
1 Código Civil comentado. 9ªed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p.1503

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