Postagem no AberturaMundoJuridico em 25/abr/2017...
PT: entre a defesa do legado e a revisitação dos erros
Se Lula vai ser candidato, nem ele
sabe, mas o PT começa a recobrar sua personalidade política que a
passagem pelo poder esmaeceu, preparando-se para disputar o retorno à
Presidência em 2018 ou mesmo para uma temporada maior na oposição,
acumulando forças como fez nos 20 anos que antecederam a primeira
eleição de Lula, em 2002. Isso começa, também, pela oxigenação
intelectual do partido que, no poder, negligenciou o debate e a
formulação. Com este objetivo as bancadas da Câmara e do Senado e
Fundação Perseu Abramo realizaram ontem o seminário “Estratégias para a
economia brasileira – Desenvolvimento, Soberania e inclusão”, encerrado
por Lula com um discurso de candidato, e pautado por discussões técnicas
que deixaram claro o duplo desafio do partido: resgatar o legado de
seus governos, que vai se perdendo na bruma criada pela crise e a
recessão, agravadas pelo governo Temer mas debitadas ao PT; e ao mesmo
tempo, revisitar os erros cometidos, inclusive de política econômica,
para que não sejam repetidos num eventual novo governo.
Ao longo do dia, cerca de 500
participantes participaram do seminário, entre parlamentares, assessores
e militantes. O velho PT estava ali, nas camisetas, na participação
militante, nas bancas vendendo estrelinhas e bandeiras. A imprensa só
cobriu o encerramento do encontro, no final do dia, por conta da
presença de Lula. E de seu discurso, destacou apenas o que se relaciona
com a Lava Jato: A declaração de que estará em Curitiba no dia em que o
juiz Moro determinar, para ter a primeira oportunidade de se “defender
de viva voz”; o repto para que mostrem as provas de que tenha recebido
um só real oriundo de corrupção; e as referências ao delator Léo
Pinheiro: “sob tortura psicológica ele entregaria até a mãe”. Mas foi um
discurso de candidato, em que ele até avançou o sinal, na avaliação de
alguns, indicando medidas que tomaria: restaurar o papel do BNDES e dos
bancos públicos, restabelecer uma política externa voltada para a
América Latina e a África, fortalecer a previdência com o crescimento
do emprego ao invés de tirar direitos e, até mesmo, regular os meios de
comunicação. Para quem pensa em voltar a governar, não poderia faltar
uma advertência: de nada adiantará vencer a eleição presidencial se,
novamente, não houver maioria para governar. “Precisamos mostrar isso ao
povo, mostrar que é importante melhorar a qualidade do Congresso.
Talvez haja algo errado em nossa mensagem. Não sei a resposta mas estou
apontando o problema”.
O encerramento foi a hora política,
em que falou Lula, precedido dos líderes Gleisi Hoffmanm (Senado),
Ricardo Zaratini (Câmara), dos governadores Tião Viana (AC) e Wellington
Dias (PI) e do presidente do partido, Rui Falcão. Ao longo dia, o
seminário foi essencialmente técnico, e nele transpareceu o desafio de
quem foi governo, está reaprendendo a ser oposição e busca reencontrar o
caminho para a vitória. A defesa do legado foi contundente mas muitos
erros (técnicos) foram admitidos, em diferentes áreas.
Na primeira mesa, que teve como tema
“Instrumentos para o desenvolvimento da indústria brasileira”, a
professora Vanessa Petrelli, da Universidade Federal de Uberlândia,
abordou aspectos macroeconômicos do governo Lula, destacando os altos
índices de crescimento alcançados graças ao cenário internacional, ao
investimento público, ao papel do Estado, e às políticas sociais,
especialmente o crescimento do salário-mínimo. Foi uma defesa
contundente do acerto econômico dos anos Lula mas ela evitou cometar as
inflexões da era Dilma. Insistiu, apoiada em gráficos, que sob Lula
houve um crescimento calcado no investimento, e não no consumo, como
dizem os críticos. Entretanto, admitiu que os governos petistas deixaram
de enfrentar questões importantes, como o uso das reservas cambiais
para investimentos estratégicos, a questão dos juros e a rediscussão do
receituário do tripé metas de inflação, câmbio livre e superávit
primário.
Carlos Sarti, professor da UFRJ,
falou sobre a grave desaceleração da indústria brasileira a partir de
2011, depois de um período exuberante no governo Lula. Entre outras
causas, apontou a liberalidade dos governos petistas com as importações
de manufaturados, o que contribuiu para a debilitação da indústria
nacional que, agora, além da “chinalização”, corre o risco de perder o
bonde das inovações radicais que estão acontecendo no mundo. Voltando ao
governo, disse ele, um erro que o PT não poderá repetir será em
relação às importações e ao papel estratégico da indústria nacional.
José Sergio Gabrielli, ex-presidente
da Petrobrás, denunciou com veemência todo o desmanche que o governo
Temer vem promovendo no perfil anterior da empresa, com a venda de
ativos para servir a uma visão financeira de curto prazo (a feira de
Pedro Parente, que vende gasodutos, sondas e poços para levantar
dinheiro), a desnacionalização (com entrega destes ativos ao capital
estrangeiro) e o quase fim da política de conteúdo nacional (obrigação
de compra de uma lista de itens da indústria brasileira).
Está claro que pretendem acelerar
os leilões do pré-sal e, como não há no horizonte previsão de expansão
da capacidade refino para os próximos cinco anos, vamos exportar óleo
cru.
Na gestão anterior, os leilões
teriam que acompanhar a capacidade de refino. Não havendo, as reservas
ficariam guardadas no fundo do mar, até momento oportuno ou de
necessidade. Exportar petróleo bruto é algo que os Estados Unidos, por
exemplo, proíbem. É atraso, não agrega valor à matéria-prima, ainda mais
numa conjuntura em que não há problema de oferta de petróleo no mundo.
Gabrielli admitiu, porém, que a
política de preços da Petrobrás nos últimos três anos dos governos
petistas foi errada. A Petrobrás conteve os preços numa fase em que
havia demanda. E com isso teve que importar combustíveis a preços mais
elevados, gerando perdas para a empresa. Admitiu que o atual governo faz
uma politica de preços mais acertada, de variação segundo a cotação
internacional.
Para um partido que há muito tempo
não faz outra coisa senão lamber feridas e lavar roupa suja, reunir-se
para discutir os problemas do país e a formulação de políticas
alternativas foi um exercício energizante. A conjuntura continua
adversa, a situação de Lula é incerta, o futuro eleitoral é uma
incógnita mas pensar e debater fez bem, diziam os petistas no final do
encontro. Até porque, como lhes disse Lula, se ele voltar é para fazer
um governo melhor, e não mais do mesmo.
Original disponível em: (http://www.brasil247.com/pt/blog/terezacruvinel/292009/PT-entre-a-defesa-do-legado-e-a-revisita%C3%A7%C3%A3o-dos-erros.htm). Acesso em 25/abr/2017.
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