Postagem 03/nov/2015...
Decisão monocrática:
Decisão monocrática:
EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 1.466.647 - RS (2014/0168242-5)
RELATOR : MINISTRO MARCO BUZZI
EMBARGANTE : ROBERTO NUNES DA SILVA
ADVOGADOS : ADYR NEY
GENEROSI FILHO E OUTRO(S)
CÉSAR AUGUSTO BOEIRA DA SILVA
FLOR EDISON DA SILVA FILHO E OUTRO(S)
EMBARGADO : VERA SALDANHA DA CUNHA
ADVOGADOS : AIRTON
CESAR FAVARIM E OUTRO(S)
JULIANA IBARRA
LIA PALAZZO RODRIGUES
MATHIAS SUERTEGARAY NORONHA
VERA LUISA FRANZEN E SOUZA
INTERES. : SHIRLEY SALDANHA - SUCESSÃO
INTERES. : ARISTIDES CASTRO SALDANHA - SUCESSÃO
INTERES. : ARMINDA BERNARDINA SALDANHA - SUCESSÃO
INTERES. : ELISABETE SALDANHA - SUCESSÃO
DECISÃO
Cuida-se de embargos de declaração opostos por ROBERTO NUNES
DA SILVA, em face de decisão monocrática de lavra deste signatário
(fls. 329-332, e-STJ), que deu provimento ao recurso
especial para reconhecer o direito sucessório da recorrente e determinar o prosseguimento
da ação de petição de herança ajuizada pela ora embargada.
Nas razões dos aclaratórios, o embargante alega, em síntese,
a existência de omissão e contradição na decisão singular, ao considerar que o
cônjuge sobrevivente não é herdeiro necessário, sendo a recorrente a única
herdeira legítima da falecida, mesmo reconhecendo inexistirem ascendentes ou
descendentes vivos.
Aduz, outrossim, que o acórdão de segundo grau não
considerou o embargante sucessor universal da falecida em razão da condição de herdeiro
necessário, mas sim porque na ordem de vocação hereditária prevista no artigo
1.829, incisos III e IV, e nas disposições dos artigos 1.838 e 1.839, todos do
Código Civil, o cônjuge sobrevivente, independentemente do regime de bens, é
herdeiro universal quando inexistem descendentes ou ascendentes, precedendo aos
colaterais.
Impugnação às fls. 355-363, e-STJ.
Manifestação do embargante às fls. 367-369, e-STJ.
Agravo regimental interposto pelo Ministério Público Federal
(fls. 373-375, e-STJ), manifestação da recorrente às fls. 379-383, e-STJ e do
embargante às fls. 384-388, e-STJ.
É o relatório.
Decido.
Os aclaratórios merecem acolhimento.
1. Insurge-se o embargante contra a decisão singular de
lavra deste signatário, que o excluiu não só da condição de herdeiro
necessário, mas da própria condição de herdeiro que antecede o colateral, consoante
lhe é assegurado pelo artigo 1.829, inciso III, do Código Civil, ao argumento
de que fora invertida a ordem de vocação hereditária, o que demonstra
verdadeira contradição (fl. 346, e-STJ).
Por oportuno, transcreve-se trecho da decisão embargada:
Assim, considerando que (i) o cônjuge sobrevivente, no caso
em questão, não pode ser considerado herdeiro necessário e que (ii) a falecida
não deixou descendentes nem possuía ascendentes vivos na data do seu óbito, é
inegável que a única herdeira legítima é a recorrente, nos termos do art.
1.829, inciso IV, do CC. (fl. 332, e-STJ).
Com efeito, depreende-se do julgado de fls. 329-332, e-STJ,
a existência de omissão quanto ao disposto no artigo 1.829, inciso III, do
Código Civil, pois se limitou a constatar que o cônjuge sobrevivente, no caso
em questão, não poderia ser considerado herdeiro necessário e, em razão disso,
reconheceu o direito sucessório da irmã da falecida (parente colateral).
Olvidou-se, portanto, dos demais incisos do artigo 1.829 do
Código Civil, os quais, ao disciplinarem a ordem de vocação hereditária, elegem
a pessoa do cônjuge sobrevivente (CC, art. 1.829, III) em posição anterior aos
colaterais (CC, art. 1.829, IV) para o recebimento de direitos sucessórios.
Cinge-se a controvérsia, então, em aferir se o artigo 1.829,
inciso III, do Código Civil confere ao cônjuge sobrevivente, casado sob a égide
do regime de separação convencional, a condição de herdeiro legítimo, que
precede os colaterais.
No particular, razão assiste ao embargante.
Ressalta-se, inicialmente, que, no caso dos autos, não há descendentes
ou ascendentes vivos, conforme consignado na decisão de segundo grau (fl. 122,
e-STJ), impondo-se a aplicação da norma inserta no inciso III, a qual
preceitua:
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge
sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão
universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único);
ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado
bens particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
IV - aos colaterais.
Ademais, o legislador não afasta a condição de herdeiro do
cônjuge sobrevivente casado pelo regime da separação convencional (artigo 1.845:
São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge),
portanto não cabe ao intérprete da lei fazê-lo. Até porque, se a intenção do
legislador fosse diferenciar a ordem de sucessão hereditária em razão do regime
de bens, teria o feito expressamente, porém não o fez.
A respeito do assunto, esclarece Flávio Tartuce:
Faltando descendentes e ascendentes, será deferida a
sucessão por inteiro e isoladamente ao cônjuge sobrevivente, que está na
terceira classe de herdeiros (arts. 1.829, III, e 1.838 do CC). Como se pode notar,
tal direito é reconhecido ao cônjuge independentemente do regime de bens
adotado no casamento com o falecido. (TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil.
5. ed. rev, atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015. p.
1393) [grifou-se]
Na ausência de descendentes e ascendentes, como é o caso dos
autos, o direito sucessório é do cônjuge sobrevivente, que antecede os colaterais,
independentemente do regime de bens adotado no casamento.
Note-se, por oportuno, que a tese relacionada à condição de
herdeiro do cônjuge sobrevivente e que este precede aos colaterais na ordem da
sucessão legítima, resta amparada não apenas na letra da lei e na doutrina, mas
também pela jurisprudência desta Corte.
A título ilustrativo, citam-se os seguintes precedentes:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL E
PROCESSUAL CIVIL. INVENTÁRIO JUDICIAL REQUERIDO POR QUEM NÃO É HERDEIRO PRETENDENDO
A PARTILHA DE BENS ENTRE O CÔNJUGE VIRAGO SOBREVIVENTE E PARENTES COLATERAIS.
PRETENSÃO QUESTIONADA PELA PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO. INVENTARIANTE
DESTITUÍDO. HOMOLOGAÇÃO TORNADA SEM EFEITO. PRECLUSÃO. INEXISTÊNCIA. PRETENSÃO
CONTRA LEGEM. RECURSO IMPROVIDO.
1. Na hipótese, o inventário judicial foi requerido por um
dos sobrinhos do falecido, nomeado inventariante, requerendo a partilha dos
bens entre a viúva e os colaterais. Homologado o plano de partilha, foi
requerida a retificação das últimas declarações, tendo o juiz tornado sem
efeito a sentença anterior e proferido uma nova, condicionada à concordância da
Procuradoria-Geral do Estado, que questionou a inclusão dos colaterais havendo
viúva-meeira (CC/2002, art. 1.829, I e II). Reconhecida a irregularidade das declarações
prestadas, o Juízo do inventário revogou as decisões anteriores e destituiu o
inventariante, determinando o prosseguimento do feito.
2. As circunstâncias da causa demonstram a inexistência de
preclusão na espécie. O próprio inventariante, ao retificar as últimas declarações,
deu causa à nova sentença de homologação, a qual foi dada em caráter
condicional, cuja condição não se efetivou.
3. Tratando-se de herdeira única, não se revela útil a
providência recursal requerida pelos agravantes - que não são herdeiros -, e que,
ao final, objetiva o atendimento de pretensão formulada contra legem. A
realização de partilha pressupõe a existência de coerdeiros ou de sucessores
diversos com capacidade para suceder; os colaterais não concorrem com o cônjuge
sobrevivente e não consta dos autos que sejam sucessores do de cujus por
qualquer título.
4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no
AREsp 451.968/MS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 07/04/2015,
DJe 15/06/2015) [grifou-se]
CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. CÔNJUGE. HERDEIRO NECESSÁRIO.
ART. 1.845 DO CC. REGIME DE SEPARAÇÃO CONVENCIONAL DE BENS. CONCORRÊNCIA COM
DESCENDENTE. POSSIBILIDADE. ART. 1.829, I, DO CC.
1. O cônjuge, qualquer que seja o regime de bens adotado
pelo casal, é herdeiro necessário (art. 1.845 do Código Civil).
2. No regime de separação convencional de bens, o cônjuge sobrevivente
concorre com os descendentes do falecido. A lei afasta a concorrência apenas
quanto ao regime da separação legal de bens prevista no art. 1.641 do Código
Civil. Interpretação do art. 1.829, I, do Código Civil.
3. Recurso especial desprovido. (REsp 1430763/SP, Rel.
Ministra
NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE
NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/08/2014, DJe 02/12/2014) [grifou-se]
RECURSO ESPECIAL. DIREITO DAS SUCESSÕES. INVENTÁRIO E
PARTILHA. REGIME DE BENS. SEPARAÇÃO CONVENCIONAL. PACTO ANTENUPCIAL POR ESCRITURA
PÚBLICA. CÔNJUGE SOBREVIVENTE.
CONCORRÊNCIA NA SUCESSÃO HEREDITÁRIA COM DESCENDENTES. CONDIÇÃO DE
HERDEIRO. RECONHECIMENTO. EXEGESE DO ART. 1.829, I, DO CC/02. AVANÇO NO CAMPO
SUCESSÓRIO DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO SOCIAL.
1. O art. 1.829, I, do Código Civil de 2002 confere ao
cônjuge casado sob a égide do regime de separação convencional a condição de herdeiro
necessário, que concorre com os descendentes do falecido independentemente do
período de duração do casamento, com vistas a garantir-lhe o mínimo necessário
para uma sobrevivência digna. [...]
7. Aplicação da máxima de hermenêutica de que não pode o
intérprete restringir onde a lei não excepcionou, sob pena de violação do dogma
da separação dos Poderes (art. 2º da Constituição Federal de 1988).
8. O novo Código Civil, ao ampliar os direitos do cônjuge sobrevivente,
assegurou ao casado pela comunhão parcial cota na herança dos bens
particulares, ainda que os únicos deixados pelo falecido, direito que pelas
mesmas razões deve ser conferido ao casado pela separação convencional, cujo
patrimônio é, inexoravelmente, composto somente por acervo particular.
9. Recurso especial não provido. (REsp 1472945/RJ, Rel.
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe
19/11/2014) [grifou-se]
O cônjuge sobrevivente, portanto, precede a recorrente (irmã
da falecida - herdeira colateral) na ordem de vocação hereditária, razão pela
qual é o cônjuge que deve receber a totalidade da herança, sendo irrelevante o
regime de bens que regulou o casamento, tanto que os artigos 1.829, inciso III
e 1.838, do Código Civil não fazem qualquer distinção. 2. Do exposto, acolho os
embargos de declaração, com efeitos infringentes, para reconsiderar a decisão
monocrática de fls. 329-332, e-STJ e negar seguimento ao recurso especial,
mantendo-se o acórdão recorrido (fls. 122-127, e-STJ) por seus fundamentos, que
considerou o cônjuge sobrevivente como herdeiro legítimo, precedente ao
colateral na ordem de vocação hereditária, independentemente do regime de bens
que regulou o casamento.
Em consequência, revogo a liminar concedida no bojo da
Medida Cautelar n. 23.242/RS, determinando a expedição de ofício, com urgência,
ao juízo da 3ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Porto Alegre/RS,
informando o teor da presente decisão.
3. Junte-se cópia da presente deliberação nos autos da
Medida Cautelar n. 23.242/RS.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília (DF), 25 de agosto de 2015.
MINISTRO MARCO BUZZI
Relator
(Ministro MARCO BUZZI, 28/08/2015).
Original disponível em: (http://www.stj.jus.br/SCON/decisoes/toc.jsp?livre=REsp+1466647&&b=DTXT&thesaurus=JURIDICO&p=true#DOC2).
Acesso em 03/nov/2015.
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