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segunda-feira, 6 de julho de 2015

Divórcio. Regime de separação obrigatória de bens. São partilhaveis os bens adquiridos onerosamente na constância do casamento. Presunção de esforço comum. TJSP.

Postagem 06/jul/2015...

Ementa:

Divórcio - Casamento celebrado sob o regime da separação obrigatória de bens - Incidência da Súmula 377 do C. Superior Tribunal Federal - Comunicação dos bens adquiridos onerosamente na constância do matrimônio - Presunção de esforço comum - Vedação ao enriquecimento ilícito de um dos consortes em detrimento do outro - Sentença reformada - Sucumbência recíproca.
Recurso provido. 
(TJSP – AC nº 0022324-14.2010.8.26.0008, Relator Elcio Trujillo, 10ª Câmara de Direito Privado, J.18/11/2014).


Acórdão integral:

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2014.0000746906

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0022324-14.2010.8.26.0008, da Comarca de São Paulo, em que é apelante CARLOS SIMÕES RODRIGUES (JUSTIÇA GRATUITA), é apelada FERNANDA APARECIDA SIMON.
ACORDAM, em 10ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores JOÃO CARLOS SALETTI (Presidente sem voto), CESAR CIAMPOLINI E CARLOS ALBERTO GARBI.
São Paulo, 18 de novembro de 2014.
Elcio Trujillo
RELATOR
Assinatura Eletrônica
10ª Câmara Seção de Direito Privado
Apelação com Revisão nº 0022324-14.2010.8.26.0008
Comarca: São Paulo Foro Regional de Tatuapé
Ação: Divórcio
Apelante: C.S.R.
Apelado: F.A.S.R.

Voto nº 23.439
DIVÓRCIO - Casamento celebrado sob o regime da separação obrigatória de bens - Incidência da Súmula 377 do C. Superior Tribunal Federal - Comunicação dos bens adquiridos onerosamente na constância do matrimônio -Presunção de esforço comum - Vedação ao enriquecimento ilícito de um dos consortes em detrimento do outro -Sentença reformada - Sucumbência recíproca - RECURSO PROVIDO.
Trata-se de recurso de apelação interposto contra a r. sentença de fls. 273/276, que julgou procedente a ação para decretar o divórcio do casal e declarou a inexistência de bens a serem partilhados.
Apela o réu pugnando pela partilha do imóvel adquirido na constância do casamento, ou, ainda, a partilha das benfeitorias realizadas no referido bem. Para tanto, sustenta que o regime da separação obrigatória de bens prescinde da realização de pacto antenupcial, nada constando, a este respeito, na certidão de casamento; que o cheque para a compra do imóvel não foi depositado e sim compensado na conta bancária da pessoa jurídica (do apelante) em favor do vendedor; que o juízo monocrático não considerou as despesas (notas fiscais e recibos) suportadas exclusivamente pelo apelante para a reforma do imóvel; e, nos termos da Súmula 377, do C. STF, o referido bem deve ser partilhado, sob pena de enriquecimento ilícito da apelada, o que é absolutamente vedado pela lei (fls. 282/287).
Recebido (fls. 288) e respondido (fls. 293/303).
É o relatório.
O recurso comporta provimento.
O matrimônio do casal foi celebrado em 16 de fevereiro de 1996, pelo regime da separação obrigatória de bens, nos termos do artigo 258, parágrafo único, inciso IV 1 , do Código Civil de 1916 (certidão de casamento às fls. 15).
O cerne da controvérsia consiste no direito de meação do apelante sobre o imóvel em que residia o casal, adquirido durante o matrimônio - em 27 de junho de 2006 (fls. 21/23) - e de titularidade exclusiva da apelada, bem como as benfeitorias realizadas no referido bem.
A apelada defende que o imóvel foi adquirido com recursos próprios, sem qualquer contribuição por parte do varão.
Informa que os litigantes eram proprietários de um apartamento e, ao alienarem tal bem, cada consorte ficou com 50% (cinquenta por cento) do valor da venda. O apelante utilizou sua cota para investir em uma loja de tecidos, enquanto ela utilizou sua parte e complementou o valor para aquisição do imóvel discutido na presente lide com recursos obtidos junto ao banco em que é correntista.
De outra parte, o apelante alega que o imóvel foi adquirido com seus recursos e que ele custeou toda a reforma do bem, apresentando os documentos de fls. 102/218 relativos às benfeitorias.
Pois bem.
No regime da separação obrigatória de bens cada cônjuge conserva para si os bens que possuía antes do casamento, sendo incomunicáveis aqueles que cada um vier a adquirir na constância do casamento, em tese.
Fixar o regime de separação obrigatória de bens, todavia, não implica na impossibilidade de meação dos bens adquiridos a título oneroso durante o matrimônio, evitando-se, assim, o enriquecimento sem causa de um consorte em detrimento do outro.
Art. 258. Não havendo convenção, ou sendo nula, vigorará, quanto aos bens,
entre os cônjuges, o regime da comunhão universal.
Parágrafo único. É, porém, obrigatório o da separação de bens no casamento:
IV. E de todos os que dependerem, para casar, de autorização judicial (arts. 183, nº XI, 384, nº III, 426, nº I, e 453).
Neste sentido, o C. Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento:
“Súmula 377: No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”.
Ou seja, no regime de separação legal os bens amealhados durante casamento comunicam-se pelo simples fato de terem sido adquiridos na constância do matrimônio, independentemente da comprovação de esforço comum, tal como ocorre na comunhão parcial de bens.
Tal conclusão é louvável, pois acompanha a ideia concernente à solidariedade, inerente à vida comum do casal, que, por si só, é fator contributivo para a aquisição dos frutos na constância de tal convivência, aliado ao repúdio do enriquecimento sem causa.
Sobre o tema, oportuna a transcrição das lições da jurista Maria Berenice Dias:
“(...) vem sendo admitida pela jurisprudência a divisão do acervo adquirido durante o casamento em nome de um dos cônjuges. A presunção de comunicabilidade instituída pela Súmula 377 do STF, quanto aos matrimônios celebrados sob o regime da separação legal, visa a evitar o enriquecimento sem causa de um do par. As mesmas razões estariam presentes no regime da separação convencional de bens, o que autoriza a divisão do patrimônio adquirido”.
“O legislador limitou-se a reproduzir dispositivo que existia no Código Civil anterior, não atentando que a justiça já o havia alterado. A restrição à autonomia da vontade, não admitindo sequer a comunhão dos bens adquiridos durante a vida em comum, levou o STF a editar a Súmula 377. Assim, encontra-se justificado seu enunciado: a interpretação exata da súmula é no sentido de que, no regime da separação legal, os aqüestos se comunicam pelo simples fato de terem sido adquiridos na constância do casamento, não importando se resultaram, ou não, do esforço comum. Portanto, a jurisprudência, considerando que a convivência leva à presunção do esforço comum na aquisição dos bens, procedeu à alteração do dispositivo legal que impunha o regime da separação obrigatória”. (grifo no original) (Manual de Direito das Famílias, 4ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 228 e 232).
No mesmo sentido, o C. Superior Tribunal de Justiça há muito se manifestou: 
“UNIÃO ESTÁVEL. DISSOLUÇÃO. PARTILHA DO PATRIMÔNIO. REGIME DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA. SÚMULA 377 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRECEDENTES DA CORTE. 
1.Não há violação do art. 535 do Código de Processo Civil quando o Tribunal local, expressamente, em duas oportunidades, no acórdão da apelação e no dos declaratórios, afirma que o autor não comprovou a existência de bens da mulher a partilhar. 2. As Turmas que compõem a Seção de Direito Privado desta Corte assentaram que para os efeitos da Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal não se exige a prova do esforço comum para partilhar o patrimônio adquirido na constância da união . Na verdade, para a evolução jurisprudencial e legal, já agora com o art. 1.725 do Código Civil de 2002, o que vale é a vida em comum, não sendo significativo avaliar a contribuição financeira, mas, sim, a participação direta e indireta representada pela solidariedade que deve unir o casal, medida pela comunhão da vida, na presença em todos os momentos da convivência, base da família, fonte do êxito pessoal e profissional de seus membros . 3. Não sendo comprovada a existência de bens em nome da mulher, examinada no acórdão, não há como deferir a partilha, coberta a matéria da prova pela Súmula 7 da Corte. 4. Recurso especial não conhecido.” (grifo nosso) (REsp 736.627/PR, Rel. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, julgado em 11/04/2006, DJ 01/08/2006, p. 436).
Confira-se, ainda, recente julgado desta E. Corte paulista: “DECLARATÓRIA - Pretensão de reconhecimento de que o bem, constante apenas em nome da esposa, foi adquirido pelo esforço do pai dos autores -Escritura realizada apenas em nome da esposa -Simulação não caracterizada.
Imóvel adquirido na constância de casamento firmado pelo regime da separação obrigatória de bens -Presunção de esforço comum - Exegese da Súmula 377 do STF - Imóvel pertencente ao casal, independentemente de constar apenas o nome da esposa como adquirente - Fato que não implica em nulidade da escritura, mas apenas no reconhecimento de que o imóvel pertence ao casal e, por consequência, que os herdeiros do “de cujus” têm direito sobre a parte pertencente ao seu pai – Recurso desprovido. (...) conquanto a questão suscite certa controvérsia, esta Câmara possui entendimento sedimentado no sentido da aplicabilidade da Súmula 377 do STF, cuja exegese é feita no sentido da presunção do esforço comum, tal como ocorre na comunhão parcial de bens, razão pela qual o imóvel de matrícula n.º 2.352 pertence a apelante e ao “de cujus” como bem assentado pela sentença...”. (Apelação Cível nº 0003086.15.2010.8.26.0297, 7ª Câmara de Direito, Rel. Des. Miguel Brandi, j. 19/05/2014).
Como visto, a súmula em questão não faz qualquer referência à comprovação do esforço comum na aquisição do bem, prevalecendo o entendimento de que todos os bens adquiridos onerosamente na constância do casamento pelo regime de separação obrigatória comunicam-se.
Desta feita, considerando que o bem foi amealhado na constância do matrimônio, cumpre a reforma da r. sentença recorrida para determinar a partilha na proporção de 50% (cinquenta por cento) para cada cônjuge do imóvel situado na Rua Água Santa, nº 85, Alto da Mooca, São Paulo/SP.
Em razão do decidido, a sucumbência é recíproca, impondo-se a compensação dos honorários advocatícios entre os litigantes, nos termos do artigo 21, caput, do Código de Processo Civil.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso.
ELCIO TRUJILLO
Relator

Assinado Digitalmente

Original disponível em: (http://ibdfam.org.br/jurisprudencia/3338/Div%C3%B3rcio.%20Regime%20de%20bens). Acesso em: 06/jul/2015.

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