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domingo, 29 de março de 2015

Boulos, PSOL e petistas defendem Frente Popular para barrar avanço conservador (Rodrigo Vianna)


Boulos, PSOL e petistas defendem Frente Popular para barrar avanço conservador

Guilherme Boulos defendeu que 'ou o governo reverte o modelo, baseado no ajuste liberal, ou em breve o golpismo terá base popular nas ruas.'


Rodrigo Vianna - Escrevinhador
24/03/2015 - Copyleft
Mídia Ninja
O debate ocorrido neste fim-de-semana em São Paulo, numa quadra da CUT, foi simbólico por muitos motivos.
 
Primeiro, mostrou o grau de esgotamento do PT, como força renovadora de esquerda. Sob impacto do avanço da direita no Brasil, militantes de esquerda se reuniram atraídos pelo tema: “Direitos Sociais e Ameaça conservadora”.
 
Mas não foi um debate organizado pelo Partido dos Trabalhadores – principal alvo da fúria direitista do dia 15. O PT segue acuado, quase mudo. Havia na plateia do debate muitos petistas, mas sem camisas nem símbolos petistas. Isso tudo num evento organizado pelo PSOL
 
Mais que isso: na mesa, estavam dois ex-auxiliares de Lula – Frei Beto e André Singer (hoje, professor da USP, e que segue filiado ao PT). O debate, realizado na “Quadra dos Bancários” (histórico ponto de encontro dos militantes da CUT e do PT), reuniu quase mil pessoas no sábado à tarde.
 
Foi o deputado federal Ivan Valente (do PSOL) quem cumpriu o papel de criar aquele espaço de reflexão, abrindo o microfone também para Guilherme Boulos (MTST – Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e Berna Menezes (sindicalista ligada ao PSOL).
 
As críticas ao governo Dilma foram duras. E generalizadas. Boulos disse que “o governo é indefensável”, e foi mais longe: “ou o governo reverte o modelo, baseado no ajuste liberal, ou em breve o golpismo terá base popular nas ruas”.
 
Ele reconheceu os avanços sociais da era Lula, mas reafirmou a posição do MTST de que o modelo de conciliação do lulismo se esgotou. “2013 foi um aviso, mas parece que o PT não entendeu”. A avaliação do líder do MTST é de que, apesar da queda de popularidade de Dilma, quem está na rua por enquanto protestando contra o PT é um setor mais radicalizado de direita e comandado pela classe média. Boulos, no entanto, diz que um ponto deveria preocupar os petistas: “a massa trabalhadora, que votava no PT até hoje, ficou em casa dia 15, mas aplaudiu os protestos porque não aguenta mais”.
 
Boulos se mostrou preocupado com o “desfilar de preconceito e ideias fascistas” ocorrido no dia 15. E mostrou clareza de que não se trata de um ataque ao PT, apenas: “o petismo deixou de ser de esquerda, mas o antipetismo é um movimento contra toda a esquerda, é anti-movimentos sociais, anti-esquerda, anti-vermelho.  Temos uma direita venezuelana, e um governo covarde. Mas vamos enfrentar essa turminha que destila ódio. Com fascismo, não se conversa; fascismo, se enfrenta.”
 
Andre Singer concordou com a avaliação de que o início do governo Dilma é desastroso para a esquerda. Até porque o ajuste de Levy deve provocar desemprego, enfraquecendo os trabalhadores – que são a base social da esquerda.
 
O professor da USP, porém, discordou de Boulos na avaliação do dia 15. “Considero que a manifestação foi majoritariamente de centro. Havia, sim, setores de extrema-direita, golpistas. E havia ainda uma direita radicalizada a favor do impeachment, mas as pesquisas mostram que a maioria estava ali para rechaçar a corrupção”.
 
Singer acha que é possível “dialogar” com esses setores de centro. Mas foi contestado no debate por gente da plateia. O dia 15, disse o professor Gilberto Maringoni (PSOL) foi, sim, “tendencialmente” em favor da extrema-direita, abrindo espaço para ex-torturadores e golpistas na Paulista. O dia 15, lembraram outros, significou a proibição para que qualquer cidadão vestisse vermelho num amplo raio em torno da Paulista. Essa não é atitude de “centro”, disse um militante anônimo.
 
Frei Beto definiu as manifestações do dia 15 (e também as de junho de 2013) como “manifestações de protesto, mas não de proposta.” E ressaltou que o PT colhe os frutos por ter governado 12 anos, sem ter feito – nem encaminhado - uma reforma estrutural sequer.
 
A sindicalista Berna Menezes destacou que não se pode igualar os governos FHC e Lula/Dilma, mas lembrou que o PT é responsável pelo avanço da direita, porque jamais enfrentou a mídia, nem fez uma Reforma Tributária em favor dos trabalhadores.
 
Outra avaliação comum entre os presentes: a crise será longa, pode durar 4 anos ou mais. Boulos disse que há riscos de ruptura pela direita, devido à “forte presença de setores golpistas” nas ruas. Já Singer, não vê riscos imediatos de ruptura. “A turbulência será grande, o estresse democrático é parecido com 64, mas não há mais a Guerra Fria”.
 
Não há mesmo? O que os Estados Unidos fazem no Oriente Médio e na Ucrânia é o que? Hum…
 
Os debatedores defenderam uma “Frente Social”, ou uma “Frente Popular”, para combater o avanço da direita. Uma frente que não seja dos partidos de esquerda, mas agregue amplos setores em defesa de uma pauta mínima.
 
“O meu partido, o PT, não tem mais condições para dar direção à esquerda. É preciso formar logo essa frente“, disse Singer.
 
Ele lamentou que o PSOL e o MTST não tenham ido ao ato do dia 13 na Paulista. “Com uma formação mais ampla, poderíamos ter chegado a cem mil pessoas, e não 40 mil, como tivemos”, afirmou. A lembrança de Singer indica as dificuldades que ainda impedem as forças de esquerda e os movimentos sociais de agirem juntos – num momento de forte avanço conservador.
 
O deputado Ivan Valente listou cinco pontos em torno dos quais poderia ser construída essa frente, aberta a entidades, partidos e cidadãos interessados em barrar a direita – dentro e fora do governo:
 
- Combate ao ajuste fiscal de Levy;
- Democratização dos meios de Comunicação;
- Reforma agrária e combate ao latifúndio;
- Defesa da Democracia e rechaço ao golpismo;
- Defesa dos direitos trabalhistas.
 
Formou-se, entre os debatedores, um consenso de que é possível unificar a esquerda. Não contra o governo Dilma, que em nenhum momento foi citado como inimigo principal. Mas contra o ajuste de direita – que significa o sequestro, pela direita, de um governo eleito com discurso de esquerda. E, especialmente, contra a direita que baba de ódio nas ruas e no Congresso.
 
Ivan Valente disse que é preciso levar pras ruas “os nomes de Cunha e Renan, como parte da corrupção que se precisa derrotar.” O deputado do PSOL lembrou que o discurso udenista, de falso moralismo, hoje é o mesmo de 54 e 64. Mas dessa vez, lembrou, parte importante da direita está afundada na lama da corrupção: “há 33 parlamentares indiciados, inclusive os presidentes da Câmara e do Senado – que não podem ser poupados, como a direita tentou fazer no dia 15.”
 
Foi um encontro curioso, em que a turma do PSOL usou a ”casa” da CUT e do PT. Um encontro em que o PSOL se definiu claramente contra o impeachment, e fez questão de ressaltar que PT e PSDB não são iguais. Um encontro em que petistas ou ex-petistas não tiveram dúvidas em atacar o ajuste de Levy – ainda que isso significasse atacar frontalmente o governo Dilma.
 
Havia uma presença de militantes de esquerda, para além do PSOL. E havia a certeza de que a Frente Popular vai nascer com ou sem o governo. Vai nascer nas ruas. E parte importante da base social do PT vai ajudar a compor essa frente – ainda que o partido, como lembrou Singer, tenha perdido a capacidade de liderar a esquerda.
 
Já não se trata de defender o governo ou o PT. Mas de recompor o campo da esquerda, e impedir a completa restauração conservadora no Brasil.

 
Alguns vídeos do debate (gravados por Artur Scavone):
Bernardete Menezes da Intersindical propõe uma frente de esquerda para enfrentar a crise

Guilherme Boulos do MTST destaca a importância da defesa das conquistas dos trabalhadores

André Singer enfatiza a necessidade de uma frente de esquerda

Ivan Valente diz quais suas condições para uma frente de esquerda

Créditos da foto: Mídia Ninja





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