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SARTORI E A RETOMADA DO RECEITUÁRIO NEOLIBERAL NO RIO
GRANDE DO SUL
Publicado em 2 de janeiro de 2015

Autor: Sandro Ari Andrade de Miranda,
advogado, mestre em ciências sociais.
Durante todo o processo eleitoral, em 2014, o candidato
Sartori (PMDB), agora empossado Governador do Estado, não apresentou as suas
propostas de Governo. Utilizou a imagem aparente de homem do povo para conduzir
uma estratégia de campanha que trilhou entre o niilismo pleno e a demagogia, o
que acabou sendo favorecido pela tradição eleitoral local de alternar Governos,
e por certa dificuldade da gestão de Tarso Genro (PT) para comunicar as
realizações de uma administração que, de fato, apresentou elevado grau de
eficiência.
Passado os fogos de 2015, e assumindo o comando do Piratini,
o novo Governo dá o tom do que pretende fazer: “arrastar o Estado por 04
anos de receituário neoliberal, com a restrição de investimentos e o corte das
despesas correntes”. Receita antiga, velha, surrada e, principalmente,
fracassada. Tanto Britto, quanto Yeda aplicaram as mesmas medidas e tiveram
governos trágicos. Fernando Henrique levou o país quase à bancarrota.
Portanto, não devemos esperar nada de construtivo no
discurso de austeridade do novo Governador Gaúcho. Aliás, austeridade de
fachada, pois antes mesmo da sua posse o novo comandante do Piratini deu pleno
apoio à elevação dos salários dos dirigentes do Estado, e à criação de “aposentadoria
especial” para Deputados Estaduais.
Mais do que isto, austeridade com cheiro de
irresponsabilidade, pois foi o anunciado “calote de 6 meses no pagamento de
contratos por meio de Decreto” e isto é, sim, uma imensa irresponsabilidade
administrativa. Sartori cria uma falsa expectativa de auditoria nos contratos
administrativos para cortar despesas correntes, o que pode conduzir a prestação
de serviços públicos essenciais, como saúde, educação e segurança pública, a
uma situação de calamidade.
Nada impede o novo Governo de auditar contratos. Aliás, se o
interesse fosse realmente ético, já poderia ter solicitado a medida ao Tribunal
de Contas do Estado e à Controladoria Geral do Estado – a CAGE ainda durante a
transição. Mas não, Sartori preferiu utilizar um discurso vazio e populista,
causando pânico da economia regional, para operar uma ação que trilha a lógica
do abuso de poder. Também poderia, perfeitamente, auditar contratos sem
suspender pagamentos, sem colocar empregos em risco, e sem ameaçar a
continuidade de serviços públicos. Mas nenhuma destas medidas teria o mesmo
impacto na mídia.
Ocorre que não avisaram Sartori que ele assumiu um Governo
limitado pela Lei e pela Constituição, e que não pode sair por aí atirando
contra o funcionamento do Estado sob o risco conduzi-lo a uma crise financeira
sem precedentes.
Aqui um importante esclarecimento, Sartori “não está
suspendendo contratos do Governo anterior”, como afirmam os seus amigos de
mídia, mas “suspendendo o pagamento de serviços continuados, regidos pela
Lei 8.666/1993, e essenciais ao bom funcionamento da máquina pública”.
Isso quer dizer que podemos ter a suspensão do pagamento de
serviço de limpeza, tecnologia da informação, abastecimento, segurança
patrimonial, assessoramento administrativo, dentre outros. Sem nenhum elemento
de motivação racional, sem nenhuma base jurídica sólida, apenas um discurso
para a torcida de austeridade. Leia-se: esta torcida contém apenas meia
dúzia de teóricos do apocalipse conservador, e membros da mídia monopolista.
É evidente que o Estado pode suspender pagamentos, só que de
forma concreta e motivada. Por exemplo: se a empresa não realizou a totalidade
dos serviços, ou se há indícios de superfaturamento numa obra, a administração
pode, sim, suspender o pagamento dos contratos. Mas não pode fazê-lo de forma
genérica, muito menos sem enumeração e identificação dos elementos que
motivaram a suspensão. A motivação é a base de todos os atos administração.
Aliás, não pode ser adotada qualquer motivação, esta deve
seguir a lógica do razoável, e mostrar congruência com os princípios do direito
administrativo. Além disso, a medida deve ser proporcional à ação. Assim, não
podem ser suspensos os pagamentos se não existirem claros indícios de
irregularidades ou, ainda, inexecução comprovada do objeto. Logo, a suspensão
dos pagamentos por mero discurso, sem motivação razoável, é um típico ato de
abuso de poder. Portanto, uma ilegalidade.
Sartori poderia ainda diminuir o quantitativo dos objetos,
ou suspender alguns contratos de natureza não essencial. Jamais suspender os
pagamentos, ainda mais por tempo tão elevado.
O que a medida do novo governo pode resultar é numa oneração desnecessária e ilegal da despesa pública, através do pagamento de juros de mora e de atualização monetária. Ou seja, ao contrário de reduzir a despesa, o Decreto de Giovani Feltes vai aumentar a dívida pública. Mais do que isto, após 90 dias de atraso nos pagamentos as empresas poderão pedir a rescisão dos contratos, sem contar a indenização pelos danos causados à sua imagem e ao seu patrimônio.
O que a medida do novo governo pode resultar é numa oneração desnecessária e ilegal da despesa pública, através do pagamento de juros de mora e de atualização monetária. Ou seja, ao contrário de reduzir a despesa, o Decreto de Giovani Feltes vai aumentar a dívida pública. Mais do que isto, após 90 dias de atraso nos pagamentos as empresas poderão pedir a rescisão dos contratos, sem contar a indenização pelos danos causados à sua imagem e ao seu patrimônio.
Assim, as primeiras consequências do corte nas despesas
públicas será a descontinuidade dos serviços e, novamente, como aconteceu nos
desgovernos de Britto e de Yeda, quem pagará o custo desta conduta será a
população e o erário.
No rastilho de pólvora riscado pelo novo Secretário Estadual
da Fazenda temos o corte do pagamento de diárias de viagem para fora o Estado,
nada mais do que simples fumaça, talvez para esconder o custo da elevação em
mais de 70% dos salários dos Secretários Estaduais, e de 40% do Governador do
Estado.
Mas a coisa tende a ser mais grave, com a suspensão de
concursos e da contratação de novos servidores. Trata-se de um retrocesso
frente à política de valorização do quadro de servidores e do serviço público,
instituída por Tarso Genro.
Se os sinais iniciais do Governo Estadual tiverem sequência,
preparem-se, de nada adiantou a renegociação da dívida realizada nos últimos
meses de Governo do PT. O Rio Grande do Sul terá quadro anos em crise
administrativa, e com o sério risco de caminhar, novamente, para trás. Não vai
demorar muito para começar o discurso de privatizações e, como esperado, a
colocação da CORSAN e do Banrisul na agenda de entrega.
Disponível em: (http://sustentabilidadeedemocracia.wordpress.com/2015/01/02/sartori-e-a-retomada-do-receituario-neoliberal-no-rio-grande-do-sul/). Acesso em: 03/jan/2015.
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