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sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Ditadura militar. Julgamentos secretos. OAB e MPF pedem abertura dos arquivos do Tribunal Militar. STF.

28/fev/2014...


OAB e MPF querem abertura dos arquivos do Tribunal Militar

Brasília – O Conselho Federal da OAB protocolou, nesta quinta-feira (27), pedido de ingresso na Reclamação (RCL) nº 11.949, que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o indeferimento do acesso a gravações de sessões secretas realizadas no Superior Tribunal Militar (STM) na década de 1970.
RCL 11.949 foi ajuizada contra ato proferido pelo STM, que segundo a relatora ministra Carmen Lúcia, “teria desrespeitado a decisão proferida no Recurso em Mandado de Segurança (RMS) n. 23.036/RJ”. No referido RMS restou assegurado o direito líquido e certo do reclamante de acessar as gravações de julgamentos de presos políticos tramitadas no STM na década de 70.
O autor da ação é o advogado Fernando Augusto Henriques Fernandes, que vê como muito importante o ingresso da OAB na ação para que sejam reveladas as gravações em áudio das audiências de julgamento dos presos políticos entre 1975 até 1979.
Para o presidente do Conselho Federal da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, "é essencial que o Estado assegure o direito do povo brasileiro de conhecer sua própria história".
Resgate da história
A OAB também figura como arguente da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 153, que questiona a constitucionalidade da Lei de Anistia (Lei Federal nº 6.683/1979) para crimes cometidos no período da ditadura militar.
A Ordem é autora, ainda, da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 3987, que impugna artigos da Lei Federal nº 8.159/1991 e a íntegra da Lei Federal nº 11.111/2005, as quais dispõem sobre a política nacional de arquivos públicos e privados e disciplinam o acesso aos documentos públicos.

Disponível em: (http://www.oab.org.br/noticia/26740/oab-e-mpf-querem-abertura-dos-arquivos-do-tribunal-militar?utm_source=2881&utm_medium=email&utm_campaign=OAB_Informa). Acesso em: 28/fev/2014.


quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Barbosa, a marionete do golpe, morreu pela boca (Miguel do Rosário)

27/fev/2014...

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014 
Joaquim Barbosa morreu pela boca 

Por Miguel do Rosário, no blog O Cafezinho:

O escritor argentino Ricardo Piglia, num de seus ensaios, propõe uma tese segundo a qual um conto oferece sempre duas histórias. Uma delas acontece num descampado aberto, à vista do leitor, e o talento do artista consiste em esconder a segunda história nos interstícios da primeira.

Agora sabemos que não são apenas escritores que sabem ocultar uma história secreta nas entrelinhas de uma narrativa clássica. O ministro Luís Roberto Barroso nos mostrou que um jurista astuto (no bom sentido) também possui esse dom.

Esta é a razão do ridículo destempero de Joaquim Barbosa. Esta é a razão pela qual Barbosa interrompeu o voto do colega várias vezes e fez questão de, ao final deste, vociferar um discurso raivoso e mal educado.

Barbosa sentiu o golpe.

Houve um momento em que Barbosa praticamente se auto-acusou: “o que fizemos não é arbitrariedade”. Ora, o termo não fora usado por Barroso. Barbosa, portanto, não berrava apenas contra seu colega. Havia um oponente imaginário assombrando Barbosa, que não se encontrava em plenário, mas ele sentiu sua presença enquanto ouvia Barroso ler, tranquilamente, seu voto.

O oponente imaginário são os milhares de brasileiros que vem se aprofundando cada vez mais nos autos da Ação Penal 470, acompanhando os debates do Supremo Tribunal Federal, ajudando alguns réus a pagar suas multas, dando entrevistas bem duras em que denunciam os erros do julgamento, e constatando, perplexos, que houve, sim, uma série de erros processuais e arbitrariedades.

Barroso contou duas histórias. Uma delas, no primeiro plano, era seu voto. Um voto tranquilo e técnico. Só que nada na Ação Penal 470 foi tranquilo e técnico, e aí entra a história subterrânea, por trás do cavalheirismo modesto de Barroso.

E aí se explica a fúria de Barbosa.

A história secreta contada por Barroso, com uma sutileza digna de um escritor de suspense, de um Edgar Allan Poe, com uma ironia só encontrada nos romances de Faulkner ou Guimarães Rosa, é a denúncia da farsa.

Aos poucos, essa história subterrânea virá à tona. Alguns observadores mais atentos já a pressentiram há tempos.

O novo ministro, antes mesmo de ingressar no STF, entendeu que há um muro de ódio e violência à sua frente, construído ao longo de oito anos, cujos tijolos foram cimentados com preconceito político, chantagens, vaidade e uma truculência midiática que só encontra paralelo nas grandes crises dos anos 50 e 60, que culminaram com o golpe de Estado.

Sabe o ministro que não é ele, sozinho, que poderá desconstruir esse muro. Em entrevista a um jornal, o próprio admitiu que estava assustado com a violência da qual já estava sendo vítima: o médico de sua mulher, sem ser perguntado, disse a ela que não tinha gostado do voto de seu marido, e suas filhas vinham sendo questionadas na escola por colegas e professores.

O Brasil vive um tipo de fascismo midiático cuja maior vítima (e algoz) é a classe média e os estamentos profissionais que ela ocupa.

É a ditadura dos saguões dos aeroportos, das salas de espera em consultórios médicos, dos shows da Marisa Monte.

Nos últimos meses, eu tenho feito alguns novos amigos, que tem me dado um testemunho parecido. Todos reclamam da solidão. A mãe rodeada de filhos “coxinhas”. O pai que é assediado, às vezes quase agredido, pelas filhas reacionárias. A executiva na empresa pública isolada entre tucanos raivosos. Alguns, mais velhos, encaram a situação com bom humor. Outros, mais jovens, vivem atordoados com as pancadas diárias que levam de seus próximos.

No entanto, o PT é o partido preferido dos brasileiros, ganha eleições presidenciais, aumenta presença no congresso e pode ganhar novamente a presidência este ano, até mesmo no primeiro turno.

Por que esta solidão se tanta gente vota no partido?

Claro que voltamos à questão da mídia, que influencia particularmente as camadas médias da sociedade, à esquerda e à direita. A maioria da classe média tradicional, hoje, independente da ideologia que professa, odeia o PT, idolatra Joaquim Barbosa, e lê os livros sugeridos nos cadernos de cultura tradicionais.

Eu conheço um bocado de artistas. Hoje são quase todos de direita, embora a maior parte se considere de esquerda. Todos odeiam Dirceu, sem nem saber porque. E me olham com profunda perplexidade quando eu tento argumentar. Como assim, parecem me perguntar, com olhos onde vemos rapidamente nascer um ódio atávico, irracional, como assim você não odeia Dirceu?

Eu tento conversar, com a mesma calma de Barroso, mas não adianta muito. Eles reagem com agressividade e intolerância.

Pessoas em geral pacatas se transformam em figuras raivosas e vingativas. O humanismo, que tanto fingem apreciar nos europeus, mandam às favas ao desejar que os réus petistas apodreçam no pior presídio do Brasil.

Eu mesmo costumo usar os mesmos termos de Barroso. “Respeito sua opinião”, eu digo. Às vezes até procuro elogiar o interlocutor, numa tentativa ingênua e canhestra de quebrar a casca de ódio que impede qualquer diálogo. Não adianta. Qual um bando de Barbosas, eles respondem, quase sempre, com grosserias e sarcasmos.

Quantas vezes não vivi a mesma situação de Barroso? Às vezes, inclusive, aceitei teses que não acreditava, violentei-me, num esforço desesperado para transmitir uma pequena divergência, uma singela ideia que foge ao script da mentalidade de um interlocutor cheio de certezas.

Entretanto, a serenidade estóica e elegante de Barroso significou uma grande vitória para nós, os solitários, os que arrostamos as truculências diárias da mídia e de seu imenso, quase infinito, exército de zumbis.

Porque encontramos um igual.

Encontramos alguém que sofre, que tenta expor uma ideia diferente, e recebe de volta uma saraivada de golpes de quem não aceita ser contestado.

Não confundamos, contudo, elegância com covardia. Não se pode exigir a um homem que derrube sozinho uma muralha desse calibre. Esse trabalho não é de Barroso. Será um esforço coletivo, que já estamos empreendedo. Barroso encontrará forças em nossas ideias.

Mesmo que ele tenha de fazer algum recuo estratégico, como aliás já fez, ao condenar Genoíno, será para avançar em seguida.

Mas a função de um juiz do STF não é defender uma classe. Não é defender a rapaziada que frequenta o show da Marisa Monte e lê os editoriais de Merval Pereira. Não é se tornar celebridade ou “justiceiro”. A função de um juiz é ser justo e defender tanto as razões do Estado acusador quanto os direitos dos réus.

Quando Getúlio deu um tiro em si mesmo, ele deixou um recado, no qual há referências algo misteriosas a “forças” que se desencadearam sobre ele.

Como que antevendo o que continuaríamos a enfrentar, durante muito tempo, o velhinho ainda tentou, em sua dolorosa despedida, nos consolar:

“Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado.”

E cá estamos, Getúlio, diante das mesmas forças obscuras. Diante da mesma truculência, das mesmas arbitrariedades, que dessa vez encontraram voz na figura, trágica ironia, de um negro. Do primeiro negro que nós, o povo, nomeamos para o STF, mas que preferiu se unir aos poderosos de sempre, aos donos do dinheiro, aos barões da mídia, à turma do saguão do aeroporto…

É positivamente curioso como os ministros da mídia demonstram auto-confiança, arrogância, desenvoltura. Gilmar Mendes, Barbosa, Marco Aurélio Mello, dão entrevistas como se fizessem parte de uma raça superior. São campeões de um STF triunfante, que prendeu os “mensaleiros”.

Enquanto isso, os outros ministros agem com humildade, discrição, prudência. Barroso lê seu voto com voz quase trêmula, e pede reiteradas desculpas por cada mínima divergência. Nunca se ouviu um ministro pedir tantas vênias como Barroso. Nunca se viu um juiz fazer tantos elogios àquele mesmo que o destrata sem nenhuma preocupação quanto à etiqueta de um tribunal.

Mas o que Barroso pode fazer? Não faríamos o mesmo? A situação de Barroso é quase a de um sertanejo humilde, argumentando em voz baixa diante de seu patrão.

Sintomático que Luiz Fux, que aderiu também à Casa Grande, tenha citado Lampião para designar a “quadrilha dos mensaleiros”. O mundo dá tantas voltas, e retorna ao mesmo lugar. Virgulino Ferreira da Silva, o terror do Nordeste, o maior dos facínoras, quem diria, seria comparado a José Dirceu! É o tipo de comparação que não dá para ouvir sem darmos um sorriso triste e malicioso.

Não foi Virgulino igualmente o maior herói do sertão? Não foi ele o maior símbolo das injustiças e arbitrariedades que se abatiam, dia e noite, sobre um povo sofrido e miserável?

Evidentemente, não existe comparação mais idiota. Dirceu é um homem de paz, que acreditou na democracia e na política. Lampião foi um bandido que desistiu de qualquer solução política ou pacífica para seus problemas.

Mas também Fux, sem disso ter consciência, trouxe à baila uma história subterrânea, soterrada sob sua postura covarde de um juiz submetido aos barões de sempre: Lampião provou ao Brasil que não existe opressão sem resistência, mesmo que na forma de banditismo. Esta é a lei mais antiga da humanidade. A resistência e o heroísmo nascem da opressão e da arbitrariedade, como um filho nasce da mãe e do pai.

A campanha de solidariedade aos réus petistas foi a prova disso. Mas não vai parar aí. Ao chancelar uma farsa odiosa, arbitrária, truculenta e, sobretudo, mentirosa, o STF produziu milhares de Virgulinos. Só que não são Virgulinos por serem bandidos ou violentos. São Virgulinos exatamente pela razão oposta: a coragem de lutar de maneira pacífica e democrática.

É a coragem, sempre, a grande lição que o mais humilde dos cidadãos dá aos poderosos. É a coragem que faz alguém se insurgir contra a opinião do ambiente de trabalho, da família, do condomínio, dos saguões dos aeroportos, e assumir uma posição política independente, inspirada unicamente em sua consciência.

É a coragem, enfim, que faz os olhos de Barroso irradiarem um brilho de confiante serenidade. Sua voz pode tremer, mas não por medo. Treme antes pelo receio de escorregar um milímetro no fio da navalha por onde caminha, entre o desejo de falar duras verdades a um tratante e a determinação de manter uma elegância absoluta.

Barroso sequer consegue usar o pronome “seu” ao se referir a Barbosa, com medo de cometer um deslize verbal. Se Barbosa fosse uma figura serena, amiga, Barroso não teria esse escrúpulo. Tratando-se de um oponente sem caráter, sem moderação, e ao mesmo tempo tão incensado e blindado pela mídia, Barroso tem de tomar um cuidado máximo. Tem de tratá-lo com respeito até mesmo exagerado. Barroso sabe que Barbosa é vítima de megalomania e arrogância messiânica, que sofre de uma espécie de loucura, uma loucura perigosíssima, porque protegida pelos canhões da imprensa corporativa.

Ao contestar tão ofensivamente o teor do voto de Barroso, ao acusá-lo, de maneira tão vil, Barbosa disparou um tiro no próprio pé. Ganhará, ainda, um bocado de palmas dos saguões aeroportuários, mas haverá mais gente erguendo a sombrancelha, desconfiada de tanta fanfarronice e falta de modos.

Barroso deixou que Barbosa morresse como um peixe, pela boca.

Foi a vitória da serenidade sobre o destempero, da delicadeza sobre chauvinismo, do respeito à divergência sobre a intolerância.
Disponível em: Altamiro Borges: Joaquim Barbosa morreu pela boca

Ação Penal 470: uma exceção para a história (Wanderley Guilherme dos Santos)

27/fev/2014...


Barbosa, a marionete do golpe, morreu pela boca

Enviado por on 27/02/2014 – 4:25 am 173 comentários
O escritor argentino Ricardo Piglia, num de seus ensaios, propõe uma tese segundo a qual um conto oferece sempre duas histórias. Uma delas acontece num descampado aberto, à vista do leitor, e o talento do artista consiste em esconder a segunda história nos interstícios da primeira.
Agora sabemos que não são apenas escritores que sabem ocultar uma história secreta nas entrelinhas de uma narrativa clássica. O ministro Luís Roberto Barroso nos mostrou que um jurista astuto (no bom sentido) também possui esse dom.
Esta é a razão do ridículo destempero de Joaquim Barbosa. Esta é a razão pela qual Barbosa interrompeu o voto do colega várias vezes e fez questão de, ao final deste, vociferar um discurso raivoso e mal educado.
Barbosa sentiu o golpe.
Houve um momento em que Barbosa praticamente se auto-acusou: “o que fizemos não é arbitrariedade”. Ora, o termo não fora usado por Barroso. Barbosa, portanto, não berrava apenas contra seu colega. Havia um oponente imaginário assombrando Barbosa, que não se encontrava em plenário, mas ele sentiu sua presença enquanto ouvia Barroso ler, tranquilamente, seu voto.
O oponente imaginário são os milhares de brasileiros que vem se aprofundando cada vez mais nos autos da Ação Penal 470, acompanhando os debates do Supremo Tribunal Federal, ajudando alguns réus a pagar suas multas, dando entrevistas bem duras em que denunciam os erros do julgamento, e constatando, perplexos, que houve, sim, uma série de erros processuais e arbitrariedades.
Barroso contou duas histórias. Uma delas, no primeiro plano, era seu voto. Um voto tranquilo e técnico. Só que nada na Ação Penal 470 foi tranquilo e técnico, e aí entra a história subterrânea, por trás do cavalheirismo modesto de Barroso.
E aí se explica a fúria de Barbosa.
A história secreta contada por Barroso, com uma sutileza digna de um escritor de suspense, de um Edgar Allan Poe, com uma ironia só encontrada nos romances de Faulkner ou Guimarães Rosa, é a denúncia da farsa.
Aos poucos, essa história subterrânea virá à tôna. Alguns observadores mais atentos já a pressentiram há tempos.
O novo ministro, antes mesmo de ingressar no STF, entendeu que há um muro de ódio e violência à sua frente, construído ao longo de oito anos, cujos tijolos foram cimentados com preconceito político, chantagens, vaidade e uma truculência midiática que só encontra paralelo nas grandes crises dos anos 50 e 60, que culminaram com o golpe de Estado.
Sabe o ministro que não é ele, sozinho, que poderá desconstruir esse muro. Em entrevista a um jornal, o próprio admitiu que estava assustado com a violência da qual já estava sendo vítima: o médico de sua mulher, sem ser perguntado, disse a ela que não tinha gostado do voto de seu marido, e suas filhas vinham sendo questionadas na escola por colegas e professores.
O Brasil vive um tipo de fascismo midiático cuja maior vítima (e algoz) é a classe média e os estamentos profissionais que ela ocupa.
É a ditadura dos saguões dos aeroportos, das salas de espera em consultórios médicos, dos shows da Marisa Monte.
Nos últimos meses, eu tenho feito alguns novos amigos, que tem me dado um testemunho parecido. Todos reclamam da solidão. A mãe rodeada de filhos “coxinhas”. O pai que é assediado, às vezes quase agredido, pelas filhas reacionárias. A executiva na empresa pública isolada entre tucanos raivosos. Alguns, mais velhos, encaram a situação com bom humor. Outros, mais jovens, vivem atordoados com as pancadas diárias que levam de seus próximos.
No entanto, o PT é o partido preferido dos brasileiros, ganha eleições presidenciais, aumenta presença no congresso e pode ganhar novamente a presidência este ano, até mesmo no primeiro turno.
Por que esta solidão se tanta gente vota no partido?
Claro que voltamos à questão da mídia, que influencia particularmente as camadas médias da sociedade, à esquerda e à direita. A maioria da classe média tradicional, hoje, independente da ideologia que professa, odeia o PT, idolatra Joaquim Barbosa, e lê os livros sugeridos nos cadernos de cultura tradicionais.
Eu conheço um bocado de artistas. Hoje são quase todos de direita, embora a maior parte se considere de esquerda. Todos odeiam Dirceu, sem nem saber porque. E me olham com profunda perplexidade quando eu tento argumentar. Como assim, parecem me perguntar, com olhos onde vemos rapidamente nascer um ódio atávico, irracional, como assim você não odeia Dirceu?
Eu tento conversar, com a mesma calma de Barroso, mas não adianta muito. Eles reagem com agressividade e intolerância.
Pessoas em geral pacatas se transformam em figuras raivosas e vingativas. O humanismo, que tanto fingem apreciar nos europeus, mandam às favas ao desejar que os réus petistas apodreçam no pior presídio do Brasil.
Eu mesmo costumo usar os mesmos termos de Barroso. “Respeito sua opinião”, eu digo. Às vezes até procuro elogiar o interlocutor, numa tentativa ingênua e canhestra de quebrar a casca de ódio que impede qualquer diálogo. Não adianta. Qual um bando de Barbosas, eles respondem, quase sempre, com grosserias e sarcasmos.
Quantas vezes não vivi a mesma situação de Barroso? Às vezes, inclusive, aceitei teses que não acreditava, violentei-me, num esforço desesperado para transmitir uma pequena divergência, uma singela ideia que foge ao script da mentalidade de um interlocutor cheio de certezas.
Entretanto, a serenidade estóica e elegante de Barroso significou uma grande vitória para nós, os solitários, os que arrostamos as truculências diárias da mídia e de seu imenso, quase infinito, exército de zumbis.
Porque encontramos um igual.
Encontramos alguém que sofre, que tenta expor uma ideia diferente, e recebe de volta uma saraivada de golpes de quem não aceita ser contestado.
Não confundamos, contudo, elegância com covardia. Não se pode exigir a um homem que derrube sozinho uma muralha desse calibre. Esse trabalho não é de Barroso. Será um esforço coletivo, que já estamos empreendedo. Barroso encontrará forças em nossas ideias.
Mesmo que ele tenha de fazer algum recuo estratégico, como aliás já fez, ao condenar Genoíno, será para avançar em seguida.
Mas a função de um juiz do STF não é defender uma classe. Não é defender a rapaziada que frequenta o show da Marisa Monte e lê os editoriais de Merval Pereira. Não é se tornar celebridade ou “justiceiro”. A função de um juiz é ser justo e defender tanto as razões do Estado acusador quanto os direitos dos réus.
Quando Getúlio deu um tiro em si mesmo, ele deixou um recado, no qual há referências algo misteriosas a “forças” que se desencadearam sobre ele.
Como que antevendo o que continuaríamos a enfrentar, durante muito tempo, o velhinho ainda tentou, em sua dolorosa despedida, nos consolar:
“Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado.”
E cá estamos, Getúlio, diante das mesmas forças obscuras. Diante da mesma truculência, das mesmas arbitrariedades, que dessa vez encontraram voz na figura, trágica ironia, de um negro. Do primeiro negro que nós, o povo, nomeamos para o STF, mas que preferiu se unir aos poderosos de sempre, aos donos do dinheiro, aos barões da mídia, à turma do saguão do aeroporto…
É positivamente curioso como os ministros da mídia demonstram auto-confiança, arrogância, desenvoltura. Gilmar Mendes, Barbosa, Marco Aurélio Mello, dão entrevistas como se fizessem parte de uma raça superior. São campeões de um STF triunfante, que prendeu os “mensaleiros”.
Enquanto isso, os outros ministros agem com humildade, discrição, prudência. Barroso lê seu voto com voz quase trêmula, e pede reiteradas desculpas por cada mínima divergência. Nunca se ouviu um ministro pedir tantas vênias como Barroso. Nunca se viu um juiz fazer tantos elogios àquele mesmo que o destrata sem nenhuma preocupação quanto à etiqueta de um tribunal.
Mas o que Barroso pode fazer? Não faríamos o mesmo? A situação de Barroso é quase a de um sertanejo humilde, argumentando em voz baixa diante de seu patrão.
Sintomático que Luiz Fux, que aderiu também à Casa Grande, tenha citado Lampião para designar a “quadrilha dos mensaleiros”. O mundo dá tantas voltas, e retorna ao mesmo lugar. Virgulino Ferreira da Silva, o terror do Nordeste, o maior dos facínoras, quem diria, seria comparado a José Dirceu! É o tipo de comparação que não dá para ouvir sem darmos um sorriso triste e malicioso.
Não foi Virgulino igualmente o maior herói do sertão? Não foi ele o maior símbolo das injustiças e arbitrariedades que se abatiam, dia e noite, sobre um povo sofrido e miserável?
Evidentemente, não existe comparação mais idiota. Dirceu é um homem de paz, que acreditou na democracia e na política. Lampião foi um bandido que desistiu de qualquer solução política ou pacífica para seus problemas.
Mas também Fux, sem disso ter consciência, trouxe à baila uma história subterrânea, soterrada sob sua postura covarde de um juiz submetido aos barões de sempre: Lampião provou ao Brasil que não existe opressão sem resistência, mesmo que na forma de banditismo. Esta é a lei mais antiga da humanidade. A resistência e o heroísmo nascem da opressão e da arbitrariedade, como um filho nasce da mãe e do pai.
A campanha de solidariedade aos réus petistas foi a prova disso. Mas não vai parar aí. Ao chancelar uma farsa odiosa, arbitrária, truculenta e, sobretudo, mentirosa, o STF produziu milhares de Virgulinos. Só que não são Virgulinos por serem bandidos ou violentos. São Virgulinos exatamente pela razão oposta: a coragem de lutar de maneira pacífica e democrática.
É a coragem, sempre, a grande lição que o mais humilde dos cidadãos dá aos poderosos. É a coragem que faz alguém se insurgir contra a opinião do ambiente de trabalho, da família, do condomínio, dos saguões dos aeroportos, e assumir uma posição política independente, inspirada unicamente em sua consciência.
É a coragem, enfim, que faz os olhos de Barroso irradiarem um brilho de confiante serenidade. Sua voz pode tremer, mas não por medo. Treme antes pelo receio de escorregar um milímetro no fio da navalha por onde caminha, entre o desejo de falar duras verdades a um tratante e a determinação de manter uma elegância absoluta.
Barroso sequer consegue usar o pronome “seu” ao se referir a Barbosa, com medo de cometer um deslize verbal. Se Barbosa fosse uma figura serena, amiga, Barroso não teria esse escrúpulo. Tratando-se de um oponente sem caráter, sem moderação, e ao mesmo tempo tão incensado e blindado pela mídia, Barroso tem de tomar um cuidado máximo. Tem de tratá-lo com respeito até mesmo exagerado. Barroso sabe que Barbosa é vítima de megalomania e arrogância messiânica, que sofre de uma espécie de loucura, uma loucura perigosíssima, porque protegida pelos canhões da imprensa corporativa.
Ao contestar tão ofensivamente o teor do voto de Barroso, ao acusá-lo, de maneira tão vil, Barbosa disparou um tiro no próprio pé. Ganhará, ainda, um bocado de palmas dos saguões aeroportuários, mas haverá mais gente erguendo a sombrancelha, desconfiada de tanta fanfarronice e falta de modos.
Barroso deixou que Barbosa morresse como um peixe, pela boca.
Foi a vitória da serenidade sobre o destempero, da delicadeza sobre chauvinismo, do respeito à divergência sobre a intolerância.
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Barbosa ao lado de seu patrão, um dos Marinho (eles não tem nome próprio)
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15/11/2013 - Copyleft 
 Ação Penal 470: uma exceção para a história

Não enxergo qualquer efeito pedagógico nesse julgamento e não desejo em hipótese alguma que se repita em outros processos futuros.


Wanderley Guilherme dos Santos
Arquivo

Ao bem afamado Péricles, o ateniense, é atribuída a opinião de que, embora sendo certo que nem todos têm sabedoria para governar, a capacidade de julgar um governo em particular é universal. A observação parece valer com razoável generalidade. Por exemplo: nem por faltar um diploma em medicina está um adoentado impedido de avaliar a competência do profissional que o assiste. Assim, ainda que não portador de títulos ou conhecimentos para ocupar assento no Supremo Tribunal Federal, tenho como direito constitucional e recomendação de um clássico grego inteira liberdade para opinar sobre a Ação Penal 470.

Posso dispensar a cautela de não me indispor com aquele colegiado, pois não tenho licença para advogar oficialmente ou não a causa de quem quer que seja. E contrariando desde logo o juízo de algumas pessoas de bem, não enxergo qualquer efeito pedagógico nesse julgamento e não desejo em hipótese alguma que se repita em outros processos. Falacioso em seu início, enredou os ministros em pencas de distingos argumentativos e notória fabricação de aleijados fundamentos jurídicos. Não menciono escandalosos equívocos de análise com que a vaidade de alguns e a impunidade de todos sacramentaram, pelo silêncio, o falso transformado em verdadeiro por conluio majoritário. Vou ao que me parece essencial.

A premissa maior da denúncia postulava a existência de um plano para a perpetuação no poder arquitetado por três ou quatro importantes personagens do Partido dos Trabalhadores. Até aí nada, pois é aspiração  absolutamente legítima de qualquer partido em uma ordem democrática. Não obstante, é também mais do que conhecido que o realismo político recomenda, antes de tudo, a busca da vitória na próxima eleição. Não existe a possibilidade logicamente legítima de extrair de uma competição singular, exceto por confissão dos envolvidos, a meta de perpetuação no poder de forma ilegal ou criminosa. Pois o procurador-geral da República pressupôs que havia um plano transcendente à próxima eleição, a ser executado mediante meios ilícitos.

A normal aspiração de continuidade foi denunciada como criminosa, denúncia a ser comprovada no decorrer do julgamento. E aí ocorreu essencial subversão na ordem das provas. Ao contrário de cada conjunto parcial de evidências apontar para a solidez da premissa era esta que atribuía a frágeis indícios e bisbilhotices levianas uma contundência e cristalinidade que não possuíam. Todos os ministros engoliram a pílula da premissa e passaram a discutir, às vezes pateticamente, a extensão de seus efeitos. Dizer que a mídia reacionária ajudou a criar a confusão, que, sim, o fez, não isenta nenhum dos ministros da facilidade com que caíram na armadilha arquitetada pelo procurador geral e pelo ministro relator Joaquim Barbosa.

Era patético, repito, o espetáculo em que cada ministro procurava nos textos legais quer a inocência, quer a culpabilidade dos acusados. Em momentos, fatos que eram apresentados por um ministro como tendo certa significação, derivada da premissa, e por isso condenava o acusado pelo crime supostamente cometido, os mesmos fatos eram apresentados como significando o oposto e, todavia, servindo de comprovação da culpabilidade do acusado. Exemplo: a ministra Carmem Lucia entendeu que o fato de a mulher de João Paulo Cunha ter ido descontar ou receber um cheque em gerência bancária no centro de Brasília comprovava a tranqüilidade com que os acusados cumpriam atos criminosos à luz do dia, desafiadoramente. Já a ministra Rosa Weber interpretou o mesmo fato como uma tentativa de esconder uma ação ilegal e, portanto, João Paulo Cunha, seu marido, era culpado. Uma ação perfeitamente legal, note-se, o desconto de um  cheque, sofreu dupla operação plástica: uma transformou-o em deboche à opinião pública, outra o encapotou como um pioneiro ato black bloc. Dessas interpretações contraditórias, seguiu-se a mesma conclusão condenatória, pela intermediação da premissa maior, segundo a qual qualquer ato dos indiciados estava associado àquele desígnio criminoso.

Estando os acusados condenados conforme tal rito subversivo, o julgamento de outras acusações (sendo o julgamento “fatiado” como bem arquitetou o relator Joaquim Barbosa, enfiando-o aos gritos pela goela de nove dos 11 ministros) se iniciava assim: tendo ficado provado que o réu cometeu tal e tal crime, lá se ia nova acusação como se se tratasse de um reincidente no mundo do crime em momentos diferentes no tempo. E mais, como se a condenação já estabelecida houvesse confirmado a veracidade da premissa maior sobre a existência de um plano político maligno. Pois assim foi até o fim: a premissa caucionando indícios frágeis – e até mesmo a total ausência de indícios como na fala da ministra Rosa Weber explicando que aceitava a culpabilidade de José Dirceu justamente pela inexistência de provas – e os indícios frágeis, convertidos em condenações, emprestando solidez a uma estapafúrdia premissa.

Foi igualmente lamentável o espetáculo da dosimetria. Como calcular penas segundo a extensão e intensidade do agravo, se a existência do agravo pendia de farrapos de indícios? E como calcular se o que sustentava os indícios era uma conjetura dialeticamente tornada plausível por esses farrapos e para a qual não há pena explícita consignada?

Todos os ilícitos comprovados, e vários o foram, se esclarecem e adquirem sentido terreno quando se aceita o crime confesso de criação e utilização de caixa dois.
Esta outra acusação foi desvirtuada pela mídia e pelos ressentidos de derrotas eleitorais, apresentando-a como tentativa de inocentar militantes políticos.

Notoriamente, buscou-se punir de qualquer modo os principais nomes do Partido dos Trabalhadores. A seguir, sucederam-se os contorcionismos para a montagem de um roteiro em que se busca provar o inexistente.

Não há nada a copiar neste julgamento de exceção – a Ação Penal 470.

Créditos da foto: Arquivo
 
Disponível em: (http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Acao-Penal-470-uma-excecao-para-a-historia/4/29546). Acesso em: 27/fev/2014.





quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

FGTS. Foram suspensas em todo o país as ações sobre aplicação da TR na correção. STJ.

26/fev/2014...


26/02/2014 - 19h26 
Suspensas em todo o país as ações sobre aplicação da TR na correção do FGTS

O ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), suspendeu nesta quarta-feira (26) o trâmite de todas as ações relativas à correção de saldos de FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) por outros índices que não a TR (taxa referencial).

A decisão alcança ações coletivas e individuais em todas as instâncias das Justiças estaduais e federal, inclusive juizados especiais e turmas recursais. A Caixa Econômica Federal (CEF), que pediu a suspensão, estima serem mais de 50 mil ações sobre o tema em trâmite no Brasil.

Dessas, quase 23 mil já tiveram sentença, sendo 22.697 favoráveis à CEF e 57 desfavoráveis. Ainda haveria em trâmite 180 ações coletivas, movidas por sindicatos, e uma ação civil pública, movida pela Defensoria Pública da União.

A suspensão vale até o julgamento, pela Primeira Seção do STJ, do Recurso Especial 1.381.683, que será apreciado como representativo de controvérsia repetitiva. Ainda não há data prevista para esse julgamento.

Inflação e TR

As ações buscam, em geral, obrigar que o FGTS seja corrigido pela inflação e não pela TR. Segundo a CEF, a jurisprudência brasileira seria “remansosa” em seu favor, já que não há nenhum dispositivo legal que determine tal índice. A pretensão ainda configuraria, no entendimento da CEF, indexação da economia.

Na ação que resultou no recurso repetitivo, um sindicato argumenta que a TR é parâmetro de remuneração da poupança e não de atualização desses depósitos. Por isso, a CEF estaria equivocada ao usar essa taxa para o FGTS.

A ação destaca que a TR chegou a valer 0% em períodos como setembro a novembro de 2009 e janeiro, fevereiro e abril de 2010. Como a inflação nesses meses foi superior a 0%, teria havido efetiva perda de poder aquisitivo nos depósitos de FGTS, violando o inciso III do artigo 7º da Constituição Federal.

O sindicato aponta que a defasagem alcançaria uma diferença de 4.588% desde 1980. A pretensão foi afastada em primeira e segunda instância no caso que chegou ao STJ.

Justiça homogênea

Para o ministro Benedito Goncalves, a suspensão evita a insegurança jurídica pela dispersão jurisprudencial potencial nessas ações.

Gonçalves destacou que o rito dos recursos repetitivos serve não apenas para desobstruir os tribunais superiores, mas para garantir uma prestação jurisdicional homogênea às partes, evitando-se movimentações desnecessárias e dispendiosas do Judiciário.

O processo segue agora ao Ministério Público Federal por 15 dias, para parecer. Depois, o ministro relator elaborará seu voto e levará o caso para julgamento perante a Primeira Seção do Tribunal, que reúne os dez ministros componentes das Turmas do STJ responsáveis pelo julgamento de temas de direito público.

A notícia refere-se aos seguintes processos: REsp 1381683

Disponível em: (http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=113456). Acesso em: 26/fev/2014.

Acesso direto à Decisão:  https://ww2.stj.jus.br/websecstj/decisoesmonocraticas/frame.asp?url=/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/MON?seq=34017300&formato=PDF

AP 470: Ministro Barroso vota pela absolvição dos réus pelo crime de quadrilha. STF.

26/fev/2014...


Quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014
AP 470: Ministro Barroso vota pela absolvição dos réus pelo crime de quadrilha

Segundo a votar no julgamento dos embargos infringentes apresentados contra o acórdão na Ação Penal (AP) 470, o ministro Luís Roberto Barroso se manifestou pela inocorrência da prática do crime de quadrilha em todos os recursos sob julgamento. Para ele, os autos apontam para a hipótese de coautoria, e não formação de quadrilha. Para caracterizar esse crime, disse o ministro Barroso, é preciso estar presente o dolo, a estabilidade e a unidade de desígnios, o que, segundo ele, não estaria provado nos autos.

Prescrição

Na argumentação de seu voto, o ministro apresentou uma questão preliminar e destacou que houve uma exacerbação inconsistente das penas aplicadas pelo crime de quadrilha, com desrespeito aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Para o ministro, se as penas fossem aplicadas conforme esses princípios, em todos os casos o delito previsto no artigo 288 (em sua redação anterior) do Código Penal teria sido alcançado pela prescrição, por conta da extinção da punibilidade.

O ministro revelou que a discrepância se deu entre as condenações pelos diferentes crimes por quais cada réu foi condenado. Nesse sentido, explicou o ministro Barroso, pelo crime de corrupção ativa, Delúbio Soares teve a pena-base fixada em quatro anos, e majoração de 20% entre as penas mínima (dois anos) e máxima (doze anos). Já pelo crime de quadrilha, a pena-base foi fixada em dois anos e três meses, com majoração de 63% entre o mínimo (um ano) e máximo (três anos). Em ambos os casos foram usadas as mesmas circunstâncias judiciais desfavoráveis.

O mesmo teria ocorrido com José Genoino, que teve majoração na pena-base pelo crime de corrupção ativa na faixa de 15%, e pelo crime de quadrilha na faixa de 63%. Já José Dirceu teve discrepância maior, conforme o voto. Pelo crime de corrupção ativa, a majoração foi de 21%, e pelo crime de quadrilha, 75%. De acordo com os dados apresentados pelo ministro Barroso, a situação de desproporção se repete nos casos dos demais embargantes.

Para o ministro, não é necessário que se aplique proporções exatas em eventuais aumentos de pena-base, mas no caso da Ação Penal (AP) 470, teria ocorrido uma exacerbação. Nesse ponto, o ministro lembrou de casos julgados pelo STF. No caso Natan Donadon (AP 396), lembrou Barroso, parlamentar condenado por peculato e formação de quadrilha, os aumentos nas penas bases foram de 30% por peculato e 50% por quadrilha. No caso Asdrúbal Bentes (AP 481), condenados por três crimes, as majorações nas penas bases ficaram em patamares próximos. “Em nenhum desses casos houve discrepância tão grande como no caso da AP 470”, frisou Barroso.

Com esse argumento, o ministro disse entender que, aplicando-se majoração na pena-base pelo crime de quadrilha proporcional aos demais crimes pelos quais os embargantes foram condenados, todos os embargantes ficariam com penas inferiores a dois anos e seriam alcançados pela prescrição da pretensão punitiva.

No mérito, ele concluiu seu voto pela absolvição de todos os réus pela imputação de quadrilha, por entender que os autos apontam para a hipótese de coautoria, e não de quadrilha, no mesmo sentido dos votos divergentes na primeira fase do julgamento da AP 470. Esclareceu que acompanha os fundamentos do voto da ministra Rosa Weber na fase originária do julgamento da AP, que considerou não configurada a prática do crime de quadrilha.

Disponível em: (http://stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=261283). Acesso em: 26/fev/2014.

Quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014
STF retoma nesta quinta julgamento de recursos na AP 470

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) retoma, em sessão extraordinária marcada para esta quinta-feira (27), às 10h, o julgamento dos embargos infringentes apresentados contra o acórdão da Ação Penal (AP) 470 por 11 condenados: Delúbio Soares, José Dirceu, José Genoino, José Roberto Salgado, Kátia Rabello, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach, Marcos Valério, João Cláudio Genu, Breno Fischberg e João Paulo Cunha. Inicialmente estão sendo julgados os embargos que questionam a condenação por formação de quadrilha e, na sequência, o Plenário analisará os recursos de réus condenados por lavagem de dinheiro.

Na sessão desta quarta-feira (26), o relator dos embargos, ministro Luiz Fux, votou pelo desprovimento dos recursos e reafirmou as condenações por quadrilha impostas a Delúbio Soares, José Dirceu, José Genoino, José Roberto Salgado, Kátia Rabello, Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach.

Em seguida, o ministro Luís Roberto Barroso votou pela absolvição dos réus quanto a esse crime, por entender que os autos apontam para a hipótese de coautoria, e não de formação de quadrilha.

Antecipando voto, a ministra Cármen Lúcia e os ministros Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski reiteraram sua posição apresentada na primeira fase do julgamento da AP, no sentido de inocentar todos os réus acusados de quadrilha.
 
Disponível em: (http://stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=261286). Acesso em: 26/fev/2014.

Ação Renovatória de Locação Comercial e o prazo do novo contrato (Sergio Eduardo MARTINEZ)

26/fev/2014...

Ação Renovatória de Locação Comercial e o prazo do novo contrato

25/fev/2014
Autor:
MARTINEZ, Sergio Eduardo
Já tivemos a oportunidade de escrever em artigos anteriores sobre as locações comerciais e o direito à renovação judicial da locação e a fixação do valor do aluguel na ação renovatória. Contudo, algumas questões merecem destaque na questão da ação renovatória de locação comercial.
Uma delas, é sobre o prazo da renovação judicial estabelecida na ação renovatória até para fins de planejamento de investimentos e, sobretudo, de segurança jurídica aos contratantes.
A Lei de Locações (Lei nº 8.245/91), que deveria regular de forma clara e objetiva essa situação não é clara e refere em seu artigo 51: "Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a renovação do contrato, por igual prazo (...)".
Logo surgiram dúvidas sobre a interpretação da expressão "igual prazo", todas absolutamente justificáveis e sobre qual prazo a lei estaria se referindo, (i) ao prazo de 5 (cinco) anos exigido para que o locatário tenha direito à renovação (inciso II do art. 51 da Lei 8.245/91); ou (ii) à soma dos prazos de todos os contratos celebrados pelas partes; ou (iii) ao prazo do último contrato, que completou os cincos anos, que poderia ser de 1 (um) ano ou (dois) ou até menos.
Essas interpretações foram externadas em opiniões de respeitáveis doutrinadores e também de julgados proferidos em inúmeros tribunais, inclusive do Superior Tribunal de Justiça e que deve dar a "última palavra" sobre a interpretação da lei de locações.
Essa questão, porém, parece ter sido resolvida recentemente, quando o Superior Tribunal de Justiça, através da 3ª Turma, no julgamento do Recurso Especial nº 1.323.410/MG, relatado pela Min. Nancy Andrighi, afirmou: "Quando o art. 51, caput, da Lei 8.245 dispõe que o locatário terá direito à renovação do contrato 'por igual prazo', ele está se referido ao prazo mínimo exigido pela legislação, previsto no inciso II do art. 51, da Lei 8.245/91, para a renovação, qual seja, de 5 (cinco) anos, e não ao prazo do último contrato celebrado pelas partes".
E para justificar tal entendimento, a Min. Nancy Andrighi com muita propriedade justificou essa decisão:
"Ademais, vale consignar que a renovatória, embora vise garantir os direitos do locatário face às pretensões ilegítimas do locador de se apropriar patrimônio imaterial, que foi agregado ao seu imóvel pela atividade exercida pelo locatário, notadamente o fundo de comércio, o ponto comercial, também não pode se tornar uma forma de eternizar o contrato de locação, restringindo os direitos de propriedade do locador, e violando a própria natureza bilateral e consensual da avença locatícia.
18. Nesse contexto, 5 (cinco) anos mostra-se um prazo razoável para a renovação do contrato, a qual pode ser requerida novamente pelo locatário ao final do período, pois a lei não limita essa possibilidade. Mas permitir a renovação por prazos maiores, de 10, 15, 20 anos, poderia acabar contrariando a própria finalidade do instituto, dadas as sensíveis mudanças de conjuntura econômica, passíveis de ocorrer em tão longo período de tempo, além de outros fatores que possam ter influência na decisão das partes em renovar, ou não, o contrato."
E essa decisão conseguiu, com muita sabedoria, equilibrar o direito à renovação contratual em favor do locatário que estabelece no imóvel o ponto comercial (ou fundo de comércio) com o direito de propriedade do locatário. O prazo de cinco anos para cada contrato preserva a relação de eventual desequilíbrio causado por mudança de legislação, variações decorrentes do mercado imobiliário e, sobretudo, a referida conjuntura econômica, permitindo a intervenção judicial a cada 5 (cinco) para manter a relação contratual com os ajustes decorrentes dessas variações imprevisíveis nas locações comerciais.

Passados mais de 22 anos de vigência da Lei de Locações, a definição desse prazo tardou, mas chegou ainda em tempo de pacificar uma questão de relevantes consequências. Ao que tudo indica, a definição do novo prazo da relação contratual acarreta segurança aos contratantes desse espécie de relação locatícia, permitindo que estes saibam as vantagens e desvantagens de contratar considerando o investimento necessário por parte do locatário e o retorno do investimento na propriedade ao locador.
Disponível em: (http://www.editoramagister.com/doutrina_25318332_ACAO_RENOVATORIA_DE_LOCACAO_COMERCIAL_E_O_PRAZO_DO_NOVO_CONTRATO.aspx). Acesso em: 26/fev/2014.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

União Estável homoafetiva. Ação de reconhecimento pós morte. Competência. Foro privilegiado. Parte mais vulnerável. Lugar da residência do companheiro sobrevivo. TJMG.

20/fev/2014...


Acórdão:

Órgão 1ª Turma Cível
Processo N. Agravo de Instrumento 20130020194678AGI
Agravante(s) W. S. C. D.
Agravado(s) M. F. S. E OUTROS
Relator           Desembargador ALFEU MACHADO
Acórdão Nº    748.333
 
 
E M E N T A
 
 
PROCESSO CIVIL. CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA “POST MORTEM”. COMPETÊNCIA. ARTIGO 100, I, DO CPC. FORO PRIVILEGIADO. HOMEM. VULNERABILIDADE. CABIMENTO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA CONSTITUCIONAL. UNIÕES ESTÁVEIS HETEROAFETIVAS. ANALOGIA. REMESSA DOS AUTOS AO DOMICÍLIO DOS REQUERIDOS. IMPOSSIBILIDADE. MANIFESTO PREJUÍZO AO CONSORTE SOBREVIVO. FIXADO O FORO DA ÚLTIMA RESIDÊNCIA DO CASAL. DECISÃO REFORMADA.
 
1. O art. 226, §3º, da Constituição Federal de 1988 (CF/88), reconhece a união estável como entidade familiar, de modo que não há razão para tratamento diverso entre os cônjuges e os companheiros.
 
2. Consoante jurisprudência majoritária, impõe-se a interpretação extensiva do preceito do art. 100, I, do CPC, que estabelece a competência do foro do domicílio da mulher para a ação de separação dos cônjuges, conversão desta em divórcio e a de anulação de casamento, para que se permita também à companheira ajuizar a ação que veicula pedido de reconhecimento e dissolução de união estável no foro de seu domicílio.
 
3. A união estável entre pessoas do mesmo sexo e as questões jurídicas dela derivadas são temas ainda recentes na doutrina e na jurisprudência. No entanto, cuidando-se de união estável homoafetiva, de acordo com a ADI 4277 do e. STF, o art. 1.723 do Código Civil deve ser interpretado conforme à Constituição Federal para excluir dele qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família.
 
4. Objetivando equilibrar o poder dos litigantes nas ações que visam reconhecer o estabelecimento das uniões estáveis homoafetivas, cabe analisar o art. 100, I, do CPC conforme a Constituição Federal para que seja interpretado à luz do Princípio da Isonomia, aplicando-o também na fixação de competência das ações de reconhecimento de união estável entre pessoas do mesmo sexo.
 
5. Atualmente, tendo sido conferido às uniões homoafetivas os mesmos direitos dos relacionamentos heteroafetivos, também deve ser garantido aos envolvidos em relacionamentos familiares de pessoas do mesmo sexo, o foro privilegiado conferido à parte mais vulnerável financeira ou juridicamente nessas relações, quando, examinando cada caso concreto, de fato, verificar-se que a pretensão da parte menos favorecida ficará manifestamente prejudicada caso tenha que litigar em local diferente da sua residência.
 
6. Na hipótese, tendo em vista que o aludido consorte sobrevivente se mostrou vulnerável, financeira e juridicamente, mormente em caso de remessa dos autos à comarca do interior do país, levando-se em consideração ainda os Princípios da Celeridade e da Economia Processuais, haja vista que as provas do relacionamento, aparentemente, deverão ser colhidas no Distrito Federal, local da última residência dos supostos companheiros, “data vênia” o entendimento do eminente juiz de primeiro grau, a ação de reconhecimento de união estável homoafetiva “post mortem” deve permanecer no juízo de origem, privilegiando a regra do art. 100, I, do CPC, em ordem ao Princípio Constitucional da Isonomia, a fim de garantir o equilíbrio entre as partes.
 
7. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. DECISÃO REFORMADA.
 
 
 
A C Ó R D Ã O
 
Acordam os Senhores Desembargadores da 1ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, ALFEU MACHADO - Relator, LEILA ARLANCH - Vogal, FLAVIO ROSTIROLA - Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador ALFEU MACHADO, em proferir a seguinte decisão: CONHECER E DAR PROVIMENTO, UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.
Brasília (DF), 8 de janeiro de 2014
 
Documento Assinado Digitalmente
09/01/2014 - 13:57
Desembargador ALFEU MACHADO
Relator
 
R E L A T Ó R I O
 
 
Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por W. S. C. D. contra a decisão cuja cópia está acostada às fls. 55/56, proferida pelo Juízo da Sexta Vara de Família de Brasília que, nos autos do incidente de exceção de incompetência nº 2013.01.1.072777-7, que fora proposto por M. F. S. e M. A. F., ora agravados, em desfavor do agravante, acolhendo o pleito, declinou da competência para processar e julgar a Ação de Reconhecimento de União Estável “Post Mortem” (2012.01.1.026727-2) em favor de uma das varas de família da cidade de Aracati-CE, local da residência dos réus.
Desde logo, adota-se o relatório lançado na decisão de fls. 55/56, “in verbis”:
Vistos etc,
Cuida-se de agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo, interposto por W. S. C. D. em face da decisão de fls. 17/18 que, na exceção de incompetência de Nº 2013.01.1.072777-7, movida por M. F. S. E OUTROS em desfavor do agravante, considerando que os ora agravados ajuizaram ação de reconhecimento e dissolução de união estável “post mortem” em Brasília-DF, conforme cópias às fls. 23/43, sendo que o foro competente seria o da residência dos agravados, Acarati-CE, tratando-se de reconhecimento de união estável homoafetiva entre dois homens, considerou impossível aplicar-se a regra específica do art. 100, I, do CPC, porquanto não há que se falar em existência de uma companheira, ou mesmo disparidade entre a relação das partes, aplicou a regra geral do art. 94, concluindo pela competência do foro da residência do réu, no caso, competente uma das Varas de Família de Aracati - CE, residência dos ora agravados.
Irresignado, em suas teses recursais o agravante sustenta que ingressou em juízo com ação de reconhecimento e dissolução de união estável “post mortem” em desfavor de M. F. S. e M. A. F. em razão da união estável que mantinha com S. A. F., filho desses. Pugna pela reforma da decisão que, acolhendo a exceção, declinou a competência para uma das Varas de Família de Aracati - CE, ressaltando que no relacionamento era quem precisava de apoio e auxílio, por isso, equipara-se à figura da mulher, apontando orientação do Egrégio STJ, da Relatoria da Ministra Nancy Andrighi, esclarecendo que a declinação da competência tornaria inviável a produção probatória eis que o relacionamento ocorreu em Brasília e as testemunhas que conviviam com o casal moravam nesta capital. Acrescenta que o inventário foi aberto e tramita na 2ª Vara de Órfãos e Sucessões de Brasília.
Aduzindo presentes os requisitos para antecipação da tutela recursal, requereu a concessão do efeito suspensivo à decisão impugnada até o julgamento final do mérito do agravo, o que deverá ser confirmado com o reconhecimento da competência da 6ª Vara de Família de Brasília. Juntou os documentos de fls. 11/43.
É o relatório.” [nomes dos envolvidos abreviados]
 
Acrescenta-se que o efeito suspensivo requerido em sede de liminar foi indeferido, ante a ausência dos requisitos exigidos pelo art. 558 do CPC (fls. 55/56).
Intimados, os agravados apresentaram contrarrazões (fls. 60/61), onde em resumo pugnaram pela manutenção do “decisum”. Para tanto, asseveram que o art. 100, I, do CPC, deve ser interpretado restritivamente e, portanto, tratando de reconhecimento de união estável entre dois homens, não haveria como aplicá-lo, devendo a ação ser processada no foro dos réus, nos termos do art. 94 do CPC.
Informações do juízo singular à fl. 62.
Foi concedida a gratuidade de justiça ao recorrente, o que dispensou o recolhimento do preparo.
É o relatório.
 
V O T O S
 
O Senhor Desembargador ALFEU MACHADO - Relator
 
 
CONHEÇO do recurso porquanto presentes os seus pressupostos de admissibilidade.
Consoante relatado, insurge-se o agravante contra a decisão interlocutória que acolheu a exceção de incompetência oferecida pelos agravados, declinando-se da competência para processar o feito principal em favor de um dos juízos de família da cidade de Aracati – CE, foro de domicílio dos réus, registrando-se que se aplicaria ao caso a regra geral de fixação de competência, contida no art. 94 do CPC.
Nesse passo, o prolator entendera que, por se tratar de ação de reconhecimento de união estável entre dois homens, seria impossível a aplicação do foro privilegiado previsto no art. 100, I, do mesmo diploma legal, haja vista que não haveria uma mulher a ser beneficiada nem disparidade entre a relação das partes.
Convém lembrar que o art. 226, §3º, da Constituição Federal de 1988 (CF/88), reconhece a união estável como entidade familiar, de modo que não há razão para tratamento diverso entre os cônjuges e os companheiros.
Dessa forma, consoante jurisprudência majoritária, impõe-se a interpretação extensiva do preceito do art. 100, I, do CPC, que estabelece a competência do foro do domicílio da mulher para a ação de separação dos cônjuges, conversão desta em divórcio e a de anulação de casamento, para que se permita também à companheira ajuizar a ação que veicula pedido de reconhecimento e dissolução de união estável no foro de seu domicílio. Ao propósito, confira-se:
 
PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. COMPETÊNCIA. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL PÓS-MORTE. FORO DE DOMICÍLIO DA COMPANHEIRA.
1. A pretensão inicial em ação declaratória para o reconhecimento de união estável de fato é obter uma decisão judicial sobre a existência do relacionamento afetivo mantido entre os companheiros e, a partir daí, usufruir dos direitos decorrentes dessa declaração. Eventuais reflexos indiretos da declaração não são aptos a justificar o deslocamento da competência.
2. É competente o foro da residência da companheira para dirimir questões envolvendo a união estável, pela aplicação analógica do comando inserto no art. 100, I, do CPC, porquanto, símeis as situações e ausente regulação específica quanto à companheira, em que impera a mesma razão, deve prevalecer a mesma decisão.
3. Recurso especial não provido.
(REsp 1145060/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/09/2011, DJe 26/09/2011)
 
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL POST MORTEM.
1.   'À míngua de regulação específica para o foro prevalente, quando houver discussão relativa ao reconhecimento da união estável, deve ser aplicado, de forma analógica, em consonância com o comando constitucional relativo às uniões estáveis (art. 226, §3º, da CF), o disposto no art. 100, I, do CPC, para se definir como competente o foro do domicílio da companheira.' (STJ - CC 117526/SP - Relª Min. Nancy Andrighi - Segunda Seção - Dje 05/09/2011)
2. Ajuizada a ação em foro diverso do domicílio da autora, por se tratar de incompetência relativa, não pode ser argüida de ofício, prorrogando-se a competência (art. 112 do CPC e Súmula 33 do STJ)
3. Conflito julgado procedente. Competência do Juízo Suscitado".
(Acórdão n.555609, 20110020211248CCP, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, 2ª Câmara Cível, Data de Julgamento: 12/12/2011, Publicado no DJE: 15/12/2011. Pág.: 67) [G.N.]
 
AGRAVO DE INSTRUMENTO. COMPETÊNCIA. FORO PRIVILEGIADO. MULHER. UNIÃO ESTÁVEL.
O foro privilegiado do artigo 100, inciso I, do Código de Processo Civil, instituído para atenuar eventuais desigualdades existentes entre o homem e a mulher, deve ser aplicado na hipótese de dissolução de união estável, pois a lei processual deve ser interpretada conforme a Constituição da República, a qual reconhece a união estável como entidade familiar (Artigo 226, § 3º).
(Acórdão n.420042, 20100020006832AGI, Relator: NATANAEL CAETANO, 1ª Turma Cível, Data de Julgamento: 28/04/2010, Publicado no DJE: 11/05/2010. Pág.: 77) [G.N.]
 
A união estável entre pessoas do mesmo sexo e as questões jurídicas dela derivadas são temas ainda recentes na doutrina e na jurisprudência. No entanto, cuidando-se de união estável homoafetiva, de acordo com a ADI 4277 do e. STF, o art. 1.723 do Código Civil deve ser interpretado conforme à Constituição Federal para excluir dele qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família.
A par disso, destaque-se que a questão ora analisada é excepcional, também não prevista expressamente no preceito que fixou o foro privilegiado para as mulheres nas ações de extinção do vínculo familiar, na medida em que o objeto da lide principal é o reconhecimento de uma união estável supostamente estabelecida entre dois homens, o agravante e o filho falecido dos agravados, havendo uma ressalva afirmada pelo requerente de que era a parte mais vulnerável no relacionamento.
Aliás, insta assinalar que há quem combata a constitucionalidade dessa regra de foro, com fundamento na igualdade de gêneros, prevista na Carta Magna. Contudo o excelso STF possui precedente no sentido de que a regra fora recepcionada pela CF/88:
 
DIREITO CONSTITUCIONAL. PRINCÍPIO DA ISONOMIA ENTRE HOMENS E MULHERES. AÇÃO DE SEPARAÇÃO JUDICIAL. FORO COMPETENTE. ART. 100, I DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ART. 5º, I E ART. 226, § 5º DA CF/88. RECEPÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.
O inciso I do artigo 100 do Código de Processo Civil, com redação dada pela lei 6.515/1977, foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988. O foro especial para a mulher nas ações de separação judicial e de conversão da separação judicial em divórcio não ofende o princípio da isonomia entre homens e mulheres ou da igualdade entre os cônjuges. Recurso extraordinário desprovido.
(RE 227114, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 22/11/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-034 DIVULG 15-02-2012 PUBLIC 16-02-2012 RT v. 101, n. 919, 2012, p. 694-699) [G.N.]
 
De fato, o que motivou o eminente Ministro Joaquim Barbosa foi a hipossuficiência da mulher em relação ao homem na entidade familiar, a qual, embora esteja mitigada atualmente, ante as conquistas femininas na sociedade, resta ainda verificada nos dias de hoje. Destaco um trecho do voto do relator do Recurso Extraordinário supra colacionado, “in verbis”:
 
“[...] Em outras palavras, entendo que o inciso I do artigo 100 do CPC não ofende o princípio da isonomia entre homens e mulheres.
Em primeiro lugar porque não se trata de um privilégio estabelecido em favor das mulheres, mas de uma norma que visa a dar um tratamento menos gravoso à parte que, em regra, se encontrava e, ainda se encontra, em situação menos favorável econômica e financeiramente.
A propositura da ação de separação judicial no foro do domicílio da mulher é medida que melhor atende ao princípio da isonomia, na famosa definição de Rui Barbosa de que este consiste em ‘tratar desigualmente os desiguais na medida em que se desigualam’.
 
[...]
 
É inegável que a regra do foro específico em debate é antiga, malgrado esteja vigente. Isso, possivelmente, ensejará a sua modificação, buscando adequá-la a essa nova realidade. É o que prevê o projeto de lei do novo código de processo civil (PL 8046/10), em trâmite na Câmara dos Deputados, o qual anota em seu art. 53, I, atualmente, a seguinte redação:
 
“Art. 53. É competente o foro:
I – do último domicílio do casal para o divórcio, a anulação de casamento, o reconhecimento ou dissolução de união estável; caso nenhuma das partes resida no antigo domicílio do casal, será competente o foro do domicílio do guardião de filho menor, ou, em último caso, o domicílio do réu;”
 
Não se pode perder de vista que a necessidade da existência de um foro privilegiado para tratar das ações familiares também tem por propósito oferecer aos jurisdicionados mais proteção aos direitos indisponíveis que envolvem este tipo de lide, até mesmo para propiciar facilidade de acesso e igualdade de condições. Nesse sentido, hora se facilita a defesa da parte mais vulnerável; hora se dá mais relevo ao contexto social em que as partes estariam inseridas; hora se resguarda o melhor interesse da criança e do adolescente; ou simplesmente prevalece a regra geral do domicílio do réu.
Não obstante, em que pese atualmente prevalecer o entendimento segundo o qual o privilégio de foro conferido às mulheres casadas deve ser estendido às companheiras, a priori, não há norma expressa a fixar uma regra específica em favor de um dos integrantes das entidades familiares homoafetivas. A esse respeito também, consultando a jurisprudência pátria, também não logrei êxito em encontrar jurisprudência específica sobre a questão.
A prevalecer a interpretação literal do dispositivo em exame, aliada a que vem sendo admitida nas hipóteses de uniões estáveis heterossexuais, encontraríamos a seguinte situação em relacionamentos semelhantes: em tese, nos estabelecidos entre duas mulheres ambas poderiam usufruir da benesse e nos referentes a dois homens, diferentemente, nenhum deles poderia vindicá-lo.
Todavia, tal como prudentemente vem sendo afirmado pela jurisprudência pátria, a regra referente ao foro privilegiado da mulher casada deve ser interpretada extensivamente para que seja assegurada também à companheira. Nesse passo, ouso ir mais adiante. Entendo que, por analogia, tratando de foro específico em favor da parte mais vulnerável do casal, ele também deve ser verificado nos casos de relacionamento familiar entre pessoas homossexuais, por se tratar de situações análogas às vivenciadas nos casos de relacionamentos entre conviventes heterossexuais.
Com efeito, objetivando equilibrar o poder dos litigantes nas ações que visam reconhecer o estabelecimento das uniões estáveis homoafetivas, cabe analisar o art. 100, I, do CPC conforme a Constituição Federal para que seja interpretado à luz do Princípio da Isonomia, aplicando-o também na fixação de competência das ações de reconhecimento de união estável entre pessoas do mesmo sexo.
Assim, atualmente, tendo sido conferido às uniões homoafetivas os mesmos direitos dos relacionamentos heteroafetivos, também deve ser garantido aos envolvidos em relacionamentos familiares de pessoas do mesmo sexo, o foro privilegiado conferido à parte mais vulnerável financeira ou juridicamente nessas relações, quando, examinando cada caso concreto, de fato, verificar-se que a pretensão da parte menos favorecida ficará manifestamente prejudicada caso tenha que litigar em local diferente da sua residência.
 
Na espécie, percebo que o agravante alega que estabeleceu união estável com o filho falecido dos agravados nesta Capital, inclusive indicando testemunhas desse fato, todas estas residentes no Distrito Federal. Ao que parece, o óbito do aludido companheiro também se dera nesta cidade. Por seu turno, os recorridos, em que pese residirem no Ceará, outorgaram procuração à filha do casal, I. A. F., que também reside no Distrito Federal e era irmã do extinto.
Destarte, a toda evidência, verifico que, mantendo-se os autos em Brasília, não haverá qualquer prejuízo significativo para ambas as partes. Primeiro porque, para configuração da união estável, deve ser atestado que o relacionamento era público, contínuo, duradouro e com intenção de constituir família. Então, certamente, as provas a ser colhidas devem estar localizadas onde os supostos conviventes residiam, ou seja, no Distrito Federal. Depois, os agravados podem ser representados, da mesma maneira que aqui se faz, pela filha, pessoa da sua confiança que deve atuar em ordem a exercer a plena defesa dos seus interesses, inclusive para solicitar que os recorridos sejam ouvidos na comarca de sua residência mediante carta precatória, se for necessário para o deslinde da controvérsia.
De outro modo, remetendo-se os autos para Aracati-CE, observo que o aludido consorte sobrevivo experimentará considerável prejuízo financeiro e processual. Ao que consta, ele terá que encontrar, numa cidade distante, um defensor apto para acompanhar sua demanda gratuitamente, já que litiga sob o pálio da justiça gratuita, situação que pode ser bastante dificultosa. Além disso, de qualquer forma, aquele juízo, possivelmente, acabaria por determinar praticamente toda a colheita de provas por este Tribunal. Assim, adiaríamos desnecessariamente por um longo período a rápida solução esperada para o litígio, em inobservância dos Princípios da Celeridade e da Economia Processuais.
Por conseguinte, na hipótese, tendo em vista que o aludido consorte sobrevivente se mostrou vulnerável, financeira e juridicamente, mormente em caso de remessa dos autos à comarca do interior do país, levando-se em consideração ainda os Princípios da Celeridade e da Economia Processuais, haja vista que as provas do relacionamento, aparentemente, deverão ser colhidas no Distrito Federal, local da última residência dos supostos companheiros, “data vênia” o entendimento do eminente juiz de primeiro grau, a ação de reconhecimento de união estável homoafetiva “post mortem” deve permanecer no juízo de origem, privilegiando a regra do art. 100, I, do CPC, em ordem ao Princípio Constitucional da Isonomia, a fim de garantir o equilíbrio entre as partes.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO para reformar a decisão resistida a fim de declarar o MM. Juízo de Direito da Sexta Vara de Família de Brasília competente para processar e julgar os autos principais (nº 2012.01.1.026727-2).
É como voto.
 
 
A Senhora Desembargadora LEILA ARLANCH - Vogal
 
Com o Relator.
 
O Senhor Desembargador FLAVIO ROSTIROLA - Vogal
 
Com o Relator.
 
 
D E C I S Ã O
 
CONHECER E DAR PROVIMENTO, UNÂNIME.

Disponível em: (http://ibdfam.org.br/jurisprudencia/2296/Uni%C3%A3o%20homoafetiva.%20Foro%20privilegiado.%20Parte%20mais%20vulner%C3%A1vel). Acesso em: 20/fev/2014.