09/set/2014
Autor:
A Multa do Art. 461 do CPC: Limitação e Cabimento no Mandado de Segurança
07/09/2014.
Autor:
ARAÚJO, José Henrique Mouta
RESUMO: Este ensaio pretende analisar dois aspectos extremamente importantes relacionados à prática forense voltados ao cumprimento das ordens judiciais de fazer, não fazer e entrega de coisa: a quantificação da multa e seu cabimento no mandado de segurança. As questões a serem enfrentadas dizem respeito à possibilidade de diminuição do valor, ao respeito às ordens judiciais e ao direcionamento da multa no âmbito do mandado de segurança.
PALAVRAS-CHAVE: Ordem Judicial. Multa. Limite. Coisa Julgada. Cumprimento de Sentença. Valor. Astreinte. Mandado de Segurança. Autoridade Coatora. Pessoa Jurídica de Direito Público. Réu. Respeito à Ordem Judicial.
I - Introdução
Um dos assuntos mais interessantes e discutidos nos últimos tempos refere-se ao poder do juiz e as medidas de apoio visando o cumprimento das condutas por ele determinadas.
As tutelas específicas (fazer, não fazer, entrega de coisa - arts. 285-A, 461 e 461-A do CPC) vêm sendo estimuladas com as medidas de apoio previstas no próprio Código de Processo Civil, especialmente com a multa cominatória.
Essas medidas funcionam, na prática, como técnica de cooperação e instrumento pedagógico para a melhor tutela do direito material. Sem elas, as decisões judiciais envolvendo prestações a serem cumpridas tendem a não merecer o tratamento adequado por parte daquele a quem são dirigidas.
Ademais, as questões envolvendo a multa recebem uma especial atenção quando se está diante do mandado de segurança, tendo em vista uma indagação central: a quem ela é dirigida (à autoridade coatora, à pessoa jurídica de direito público ou ao advogado público)?
Visando delimitar o móvel deste trabalho, serão estes alguns itens a serem discutidos: a) a multa e a coisa julgada; b) os critérios para sua fixação; c) a (im)possibilidade de alteração do quantum na fase executiva; e d) o cabimento no âmbito do mandado de segurança e a quem ela é dirigida.
II - A Multa por Desobediência de Ordem Judicial e sua Limitação
Como já mencionado, a multa funciona como medida de apoio e como estímulo ao cumprimento da ordem judicial. Neste momento, cumpre analisar se há ou não limite para sua fixação.
A rigor, a multa prevista no art. 461, § 4º, do CPC não fica vinculada ao valor da prestação (1). O binômio compatibilidade e suficiência, previsto no § 4º, serve para atribuir poder ao magistrado de aplicá-la de forma situacional e concreta, sem necessariamente as amarras relativas ao valor da prestação (2)-(3).
Não se está, com isso, afirmando que há discricionariedade absoluta na fixação do valor e da periodicidade da multa. A fundamentação judicial levará em conta, necessariamente, o caráter pedagógico e estimulador do cumprimento da obrigação, considerando, também, o potencial econômico do demandado (4), sem a vinculação obrigatória relativa ao valor da prestação (5).
Outrossim, é mister aduzir que a multa não é atingida pelos efeitos da coisa julgada, podendo sofrer alteração na fase de cumprimento de sentença. A imutabilidade atingirá os limites do pedido (da prestação - da tutela específica), não se estendendo à medida de apoio. No momento do cumprimento da sentença, portanto, poderá ser analisado o caso concreto, inclusive aumentando ou diminuindo o quantum da multa fixada anteriormente, inobstante a ocorrência da coisa julgada em relação à prestação específica.
Contudo, há indagação a ser feita: poderá o magistrado alterar a multa já fixada e exaurida no tempo ou apenas aquela relativa à prestação futura? Vamos a um exemplo: uma ação judicial fundada nos arts. 282 e 461 do CPC, há determinação judicial para a retirada do nome do autor do cadastro de inadimplentes, em decorrência de uma suposta obrigação de R$ 20.000,00. In casu, o magistrado fixou a multa pelo descumprimento em R$ 2.000,00 por dia. A conduta apenas foi praticada pelo demandado depois de 60 dias, o que provoca duas outras perguntas: a) poderá a multa somar R$ 120.000,00, sendo que o valor da obrigação é um sexto dessa quantia?; e b) é possível sua diminuição na fase de cumprimento de sentença (art. 475-I e seguintes do CPC), acolhendo os argumentos ligados à desproporcionalidade, locupletamento ilícito do autor e violação ao art. 412 do Código Civil?
Essas perguntas merecem detida reflexão e conduzem ao enfrentamento de algumas variáveis. Se, de um lado, a multa não é atingida pela coisa julgada, de outro, ela funciona como medida de apoio ao cumprimento de decisões voltadas às tutelas específicas e deve ser fixada de acordo com o binômio já citado neste ensaio.
Ora, seria muito cômodo, estratégico e interessante àquele que descumpriu a obrigação determinada judicialmente argumentar a desproporcionalidade e o locupletamento ilícito do autor para requerer a diminuição do valor durante a execução da multa. Portanto, é interessante enfrentar quais os critérios para fixação e alteração do valor da multa.
Nesse contexto, duas situações devem ser analisadas: em relação às parcelas vincendas e ao período anterior já delimitado no tempo por força do descumprimento continuado da prestação. Em relação ao período futuro, parece que não há dúvida: a multa tem caráter provisório e mutável, podendo ser alterada dependendo da realidade concreta. Logo, poderia o magistrado aumentar ou diminuir, inclusive de ofício, dependendo da realidade do caso concreto e da potencialidade de estimular o efetivo cumprimento da prestação (6).
Já em relação ao período pretérito, como deve ser solucionada a questão? Interessante lembrar o exemplo anterior, no qual a obrigação era de R$ 20.000,00 e o valor da multa pelos 60 dias de descumprimento alcançou a soma de R$ 120.000,00. Será que na execução definitiva da multa será possível a diminuição de seu valor, como prevê o art. 645, parágrafo único, do CPC (7)?
Deve o intérprete observar quem foi o causador da multiplicação do valor da multa. Se a responsabilidade foi do juiz ou mesmo do autor, é razoável admitir a sua diminuição (8). Contudo, se a culpa pelo descumprimento sucessivo da ordem judicial foi do demandado, a diminuição poderá significar verdadeiro descrédito/desprestígio/desrespeito à determinação oriunda do Poder Judiciário.
No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, o assunto não é novo e vem provocando variadas interpretações. No AgRg no AI 1.121.760-MG (Rel. Vasco Della Giustina, Des. Conv. do TJRS, j. 19.10.2010, DJU 26.10.2010), entendeu o Tribunal que:
"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. ASTREINTES. REDUÇÃO. POSSIBILIDADE. FUNDAMENTOS INSUFICIENTES PARA REFORMAR A DECISÃO AGRAVADA. 1. A agravante não trouxe argumentos novos capazes de infirmar os fundamentos que alicerçaram a decisão agravada, razão que enseja a negativa de provimento ao agravo regimental. 2. 'Esta Corte Superior já firmou entendimento quanto à possibilidade de ser reduzido o valor de multa diária em razão de descumprimento de decisão judicial quando aquela se mostrar exorbitante' (AgRg no Ag 1.075.142/RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., j. 04.06.09, DJe 22.06.09). 3. Agravo regimental a que se nega provimento."
Em verdade, existem vários precedentes no STJ favoráveis à redução do valor da multa quando fixada em quantia desproporcional ao valor da obrigação (9). Contudo, ao contrário desses julgados, é dever afirmar que a diminuição da multa apenas levando em conta o valor da prestação pode significar estímulo ao descumprimento da obrigação e beneficiará o próprio infrator.
Destarte, já ficou claro que o objetivo da medida coercitiva é funcionar como medida de apoio e não tem caráter indenizatório. Portanto, a solução do problema passa pela verificação sobre de quem é a responsabilidade pela multiplicação do valor da multa. Como já dito, se a responsabilidade é do magistrado (p. ex., houve equívoco no momento da fixação) ou mesmo do autor, não resta dúvida que há o dever de diminuí-la, mas, se o responsável for o réu ou aquele que deveria cumprir a obrigação, o simples raciocínio de que o valor é desproporcional poderá significar o esvaziamento da técnica processual prevista no art. 461 do CPC e uma premiação ao infrator que descumpriu a ordem judicial (10).
A modificação (alteração ou diminuição) permitida durante a execução da multa, portanto, diz respeito apenas às parcelas futuras, com efeitos ex nunc. Em relação aos valores pretéritos já fixados, a interpretação deve ser situacional: se a quantia elevada adveio de recalcitrância daquele que deveria cumprir a obrigação, a multa não deve ser alterada, mesmo se ultrapassar o valor da obrigação, sob pena de se colocar em risco o próprio sistema de cumprimento das decisões judiciais envolvendo as tutelas específicas.
Não se pode simplesmente admitir que argumentos ligados ao valor da multa e ao eventual locupletamento do autor possam, sem qualquer ponderação, permitir a sua alteração, sob pena de se colocar em risco a efetividade da tutela jurisdicional e o próprio acesso à justiça. A análise a ser feita deve levar em conta as variáveis ligadas à responsabilidade pelo cumprimento das decisões judiciais.
III - A Pena Pecuniária por Descumprimento de Ordem Judicial no Mandado de Segurança: a quem Deve Ser Dirigida?
Outro assunto a ser analisado neste texto diz respeito ao cabimento da multa do art. 461 do CPC e a quem ela deve ser dirigida em caso de desobediência de ordem judicial no mandado de segurança.
É fato que, no mandamus, poderá ocorrer uma ordem judicial por meio de medida liminar, ou mesmo na sentença, determinando conduta a ser praticada pela autoridade coatora. Essa ordem, contendo um fazer ou não fazer (p. ex., nomeação ou reintegração de servidor público, anulação ou suspensão de uma licitação, fornecimento de produto ou a não realização de ato administrativo), deve ser determinada com as imputações contidas no art. 461 do CPC, além da possibilidade de aplicação da pena de prisão por desobediência de ordem judicial.
A questão central é a seguinte: a quem deve ser dirigida a multa em caso de descumprimento da ordem judicial (autoridade, advogado público ou ente público)? Visando encontrar a melhor resposta, é dever enfrentar quem é o réu e o terceiro interveniente no writ of mandamus.
A rigor há atuação, durante o seu procedimento, pessoalmente da autoridade coatora (que inclusive assina as informações e poderá apresentar recurso contra a decisão que resolver o mandado de segurança) e da pessoa jurídica a qual ela está vinculada, devidamente representada pelo seu procurador judicial.
Aliás, pela nova Lei do Mandado de Segurança, a participação do representante judicial da pessoa jurídica foi ampliada, eis que: a) recebe cópia da petição inicial (art. 6º) e b) toma ciência do despacho da inicial (art. 7º, II) e da própria decisão que conceder o mandado (art. 13). O art. 14, § 2º, estende à autoridade coatora o direito de recorrer.
Interessante é a análise da situação jurídica da autoridade e da pessoa jurídica, no sentido de enfrentar quem é o réu domandamus. Existem, no mínimo, três posicionamentos: a) a autoridade coatora é ré; b) há formação de litisconsórcio passivo necessário; e c) a pessoa jurídica é a ré, tendo em vista que assume as consequências da decisão judicial.
É mister registrar a existência de críticas quanto ao posicionamento de que ocorre formação de litisconsórcio ou mesmo de assistência entre a autoridade coatora e a pessoa jurídica de direito público, bem como ao que entende ser a própria autoridade coatora ré no mandamus (11).
Com efeito, deve-se partir do raciocínio de que a consequência decorrente da decisão que concede a segurança não é suportada pela pessoa física da autoridade que àquela altura praticou o ato impugnado, mas sim pela pessoa jurídica de direito público (12)-(13).
Portanto, em que pese à existência de manifestações em sentido contrário, é razoável defender que a autoridade coatora não é ré no procedimento do mandado de segurança, mas mera informante (14).
Por outro lado, não se deve esquecer que a legitimidade recursal é da pessoa jurídica de direito público e da própria autoridade, mas na qualidade de terceiro interessado (art. 14, § 2º, da Lei nº 12.016/09), evitando, quem sabe, eventual demanda regressiva a ser proposta pelo Poder Público.
Após a identificação de quem é o réu no mandamus, resta enfrentar quem deverá suportar a penalidade (multa e eventual prisão) decorrente do descumprimento da ordem judicial. Mais uma vez é dever partir de uma premissa: o terceiro pode ser responsável por cumprimento de ordem judicial (art. 14 do CPC), e não apenas a parte.
Em relação à pena de prisão, vale transcrever a ementa de habeas corpus apreciado pelo STJ em que se discutiu a responsabilidade de engenheiro responsável pela obra e que era contratado por um Município:
"CRIMINAL. DESOBEDIÊNCIA. ORDEM JUDICIAL. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO PACIENTE. ENGENHEIRO QUE CUMPRIA ORDENS DA MUNICIPALIDADE. PENA DE MULTA PREVISTA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Não se configura o crime de desobediência se o paciente não foi pessoalmente intimado da decisão que revogou uma liminar, não agindo com dolo no seu descumprimento, mormente por se tratar de engenheiro trabalhando para a municipalidade a qual foi dirigida a intimação e a quem está subordinado. 2. Para a configuração do delito de desobediência, não basta apenas o não cumprimento de uma ordem judicial, sendo indispensável que inexista a previsão de sanção específica em caso de seu descumprimento. Precedentes. 3. Ordem concedida para trancar o procedimento instaurado contra o paciente." (HC 115.504/SP, Relª Minª Jane Silva - Desª Conv. do TJMG -, 6ª T., j. 20.11.08, DJe 09.02.09)
Nada impede, a meu ver, que seja aplicada a pena de prisão por desobediência a um terceiro no processo - sujeito de direito diretamente responsável pelo cumprimento da ordem judicial. Uma coisa é ser parte; outra é ser o responsável pela prática da determinação contida na decisão judicial.
Em relação ao cabimento de multa pelo descumprimento, também é fácil encontrar precedentes favoráveis à sua aplicação ao terceiro que atua indiretamente na demanda judicial, senão vejamos:
"PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS ESPECIAIS. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. ATO ATENTATÓRIO AO EXERCÍCIO DA JURISDIÇÃO. MULTA DO ART. 14 DO CPC. APLICABILIDADE ÀS PARTES E A TODOS AQUELES QUE, DE ALGUMA FORMA, PARTICIPAM DO PROCESSO. 1. Hipótese de mandado de segurança impetrado pelo Município de Curitiba/PR com a finalidade de impedir que as autoridades impetradas promovessem a realização de audiência pública convocada pelo Ministério Público do Trabalho, destinada a redefinir o valor do repasse de verbas municipais a entidades e organizações não governamentais de atendimento a crianças e adolescentes. O pedido liminar foi deferido, ocasião em que foi determinada a suspensão da audiência pública mencionada. 2. Na tentativa de conferir efetividade à ordem mandamental, e por não ter conseguido intimar as autoridades impetradas no dia anterior, o Oficial de Justiça designado compareceu ao local de realização da audiência pública, ocasião em que uma das impetradas, Procuradora do Trabalho, 'tão logo tomou ciência da notificação, de microfone em punho, diante do auditório, afirmou que realizaria o evento, pois considerava a decisão ilegal e inconstitucional, razão pela qual não iria obedecê-la'. Consta dos autos, ainda, que um Promotor de Justiça do Estado do Paraná causou 'tumultos e pressões', além de ter imposto ao Oficial de Justiça, quando do cumprimento da decisão judicial, a obrigação de falar ao microfone para todo o auditório, com mais ou menos 150 pessoas. 3. De todo o ocorrido, resultou a condenação pessoal da Procuradora do Trabalho e do Promotor de Justiça do Estado do Paraná ao pagamento de multa, no valor equivalente a vinte por cento (20%) do valor da causa atualizado, em virtude de ato atentatório ao exercício da jurisdição (art. 14, V e parágrafo único, do CPC), e a extinção do mandado de segurança, sem resolução de mérito (art. 267, VI, do CPC), por perda de objeto, já que a audiência pública, mesmo em afronta à decisão judicial, foi realizada. 4. O inciso V do art. 14 do Código de Processo Civil, incluído pela Lei nº 10.358/01, prevê como dever das partes e de todos aqueles que, de alguma forma, participam do processo, 'cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final'. 5. Não há como se admitir, no entanto, que um membro do Ministério Público, a quem incumbe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127 da CF/88), deixe de dar cumprimento à ordem judicial que suspendeu a realização do evento, sob a alegação de que não era parte na ação mandamental, máxime porque o provimento liminar era extremamente claro no tocante à extensão dos seus efeitos. 6. 'Os deveres enumerados no art. 14, pois, são deveres das partes. E por partes devem-se entender todos os sujeitos do contraditório. Em outros termos, o conceito de partes a que alude o art. 14 não se refere apenas às partes da demanda (demandante e demandado), mas a todas as partes do processo (incluindo-se aí, também, portanto, os terceiros intervenientes e o Ministério Público, que atua como custos legis). É mais amplo ainda, porém, o alcance do art. 14. Isso porque não só as partes, mas todos aqueles que de qualquer forma participam do processo têm de cumprir os preceitos estabelecidos pelo art. 14' (CÂMARA, Alexandre Freitas. Revista Dialética de Direito Processual, n. 18, p. 9-19, set. 2004). 7. Deixa-se de analisar, por fim, toda a argumentação no sentido de que 'o princípio da unidade do Ministério Público (...) não tem o condão de interligar a extremos os papéis autonomamente desempenhados pelos membros dos diversos Ministérios Públicos', pois todos os envolvidos na presente ação tiveram conhecimento da decisão judicial que impedia a realização da audiência pública e, deliberadamente, decidiram desrespeitá-la, em flagrante ato atentatório ao exercício da jurisdição. 8. Recursos especiais desprovidos." (REsp 757.895/PR, Relª Minª Denise Arruda, 1ª T., j. 02.04.09, DJe 04.05.09)
A hipótese a ser analisada, neste momento, diz respeito a quem devem ser dirigidas as sanções decorrentes de eventual descumprimento de ordem judicial contida no mandado de segurança.
Não se deve olvidar que a Lei nº 12.016/09 indica a necessidade de remessa, por ofício, da íntegra da sentença à autoridade coatora e ao representante da pessoa jurídica interessada (art. 13), bem como a notificação da inicial e da eventual liminar a ambos (art. 7º). Essa dupla comunicação dos atos praticados pelo magistrado tem objetivos distintos. À primeira, a sentença e a eventual liminar, se contiverem ordens a serem cumpridas, será com a determinação de prática do ato administrativo necessário, sob as penalidades do art. 461 do CPC c/c art. 26 da LMS (imputação do crime de desobediência), enquanto que ao segundo visa dar ciência para a prática do ato processual cabível.
A rigor, portanto, não pode ser imputada a penalidade do art. 330 do Código Penal ao representante judicial da pessoa jurídica (p. ex., advogado, procurador do Estado, do Município, etc.), tendo em vista que não tem poderes nem competência para a prática do ato determinado pelo órgão jurisdicional. O único que possui competência administrativa para o cumprimento do decisum é a própria autoridade coatora.
A multa ao advogado (público e também privado) por litigância de má-fé já foi objeto de enfrentamento pelo STJ, como se observa nestas decisões:
"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. INEXISTÊNCIA DE OBSCURIDADE E CONTRADIÇÃO. PREQUESTIONAMENTO PARA FINS DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INVIABILIDADE. Omissão quanto à condenação solidária do advogado ao pagamento de multa por litigância de má-fé. Possibilidade de atribuição de efeitos infringentes aos embargos de declaração, nas hipóteses em que a modificação do julgado for consequência direta do suprimento da omissão.
(...)
3. A responsabilização solidária do advogado, nas hipóteses de lide temerária, ocorrerá somente após a verificação da existência de conluio entre o cliente e seu patrono, a ser apurada em ação própria. A condenação ao pagamento da multa por litigância de má-fé deve ser limitada às partes, pois o profissional da advocacia está sujeito exclusivamente ao controle disciplinar da Ordem dos Advogados do Brasil. Precedente. 4. Embargos de declaração parcialmente acolhidos, com modificação do julgado." (EDcl no RMS 31.708/RS, Relª Minª Nancy Andrighi, 3ª T., DJe 20.08.2010)
"CIVIL E PROCESSO CIVIL. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA DO ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE.
(...)
4. Responde por litigância de má-fé (arts. 17 e 18) quem causar dano com sua conduta processual. Contudo, nos termos do art. 16, somente as partes, assim entendidas como autor, réu ou interveniente, em sentido amplo, podem praticar o ato. Com efeito, todos que de qualquer forma participam do processo têm o dever de agir com lealdade e boa-fé (art. 14 do CPC). Em caso de má-fé, somente os litigantes estarão sujeitos à multa e indenização a que se refere o art. 18 do CPC. 5. Os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser aferidos em ação própria para essa finalidade, sendo vedado ao magistrado, nos próprios autos do processo em que fora praticada a alegada conduta de má-fé ou temerária, condenar o patrono da parte nas penas a que se refere o art. 18 do Código de Processo Civil. 6. Recurso especial conhecido em parte e, nesta parte, provido." (REsp 1.173.848/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., j. 20.04.2010, DJe 10.05.2010)
Aliás, especificamente em relação ao mandado de segurança, em julgado de 2013, o STJ afastou a penalidade de multa por litigância de má-fé aplicada ao procurador do Estado. Esta é a ementa do REsp 1.370.503 (Relª Minª Eliana Calmon, 2ª T., j. 04.06.2013, DJe 11.06.2013):
"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CARACTERIZADA. CUMPRIMENTO DE ACÓRDÃO PROFERIDO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SENTENÇA MANDAMENTAL. TÍTULO EXECUTIVO APTO À REPARAÇÃO DOS DANOS PATRIMONIAIS. MULTA E INDENIZAÇÃO POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. APLICAÇÃO CONTRA O PROCURADOR DO ESTADO. IMPOSSIBILIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO PROTELATÓRIO. APLICAÇÃO DE MULTA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA Nº 105/STJ. 1. Impetração contra ato do Presidente do Tribunal de Contas do Estado da Bahia, consistente na redução de proventos da impetrante mediante desconsideração das aulas suplementares ou extraordinárias, incorporadas por força de disposição contida na Constituição Estadual. 2. Não ocorre ofensa ao art. 535 do CPC, se o Tribunal de origem decide, fundamentadamente, as questões essenciais ao julgamento da lide. 3. 'A sentença concessiva da segurança deve ser considerada título executivo apto a reparar os danos patrimoniais sofridos, mesmo que não contenha parte condenatória expressa nesse sentido' (REsp 783.286/SP, Rel. Min. Paulo Gallotti, 6ª T., j. 14.03.06, DJ 10.04.06). 4. Refeito o ato pela autoridade coatora, o pagamento das diferenças resultantes da majoração dos proventos da impetrante constitui simples consectário do novo ato de aposentadoria. 5. Má-fé processual evidenciada pelo fato de estar a impetrante, desde o ano de 2002, buscando a satisfação de um direito assegurado em sentença transitada em julgado. Impossibilidade de fixação de multa e indenização por litigância de má-fé em desfavor do Procurador do Estado. Precedentes da Corte Suprema. 6. Situação fática que demonstra resistência injustificada ao andamento do processo, caracterizando a litigância de má-fé, que justifica a manutenção da multa fixada com fundamento no art. 538, parágrafo único, do CPC. 7. Nos termos da Súmula nº 105/STJ, 'na ação de mandado de segurança não se admite condenação em honorários advocatícios', independentemente de se tratar de incidente visando ao acertamento da ordem judicial concessiva da segurança. 8. Recurso especial parcialmente provido para excluir a multa processual e a indenização fixada contra o Procurador do Estado, bem como para afastar a condenação em honorários advocatícios."
Por analogia, é razoável entender que a multa por descumprimento de ordem judicial não deve ser imputada ao causídico, especialmente levando em conta que o mesmo não tem competência para a prática de qualquer conduta administrativa.
Assim, ao ser provocado com as notificações ou intimações judiciais no âmbito do MS, aquele profissional deve adotar as condutas processuais (recursos, defesas, etc.), e não administrativas, sendo necessário, em relação a estas, observar quem é a autoridade competente devidamente responsável pela conduta determinada judicialmente.
Ainda nesse sentido, vale transcrever duas passagens de texto escrito por Rodrigo Klippel e José Antônio Neffa Junior. Na primeira, afirmam que "o procurador, a menos que seja a autoridade coatora no mandado de segurança, não pode ser processado e apenado pelo crime de desobediência caso a decisão mandamental seja descumprida". Em seguida, concluem: "afinal de contas, quem tem competência para cumprir a decisão judicial é a autoridade coatora e, por esse motivo, é ela que deve ser apenada com as sanções do crime de desobediência caso se quede inerte e não cumpra o comando judicial" (15).
Resta analisar se a multa deve ser imputada à autoridade, à pessoa jurídica ou a ambas. Aqui também não há unanimidade interpretativa.
Há entendimentos jurisprudenciais defendendo o cabimento da astreinte diretamente para a Fazenda Pública, em que pese o ato de desobediência advir de falta de conduta de um de seus agentes. Nesse sentido, vale transcrever os seguintes:
"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. TRATAMENTO DE SAÚDE E FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS A NECESSITADO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. FAZENDA PÚBLICA. INADIMPLEMENTO. COMINAÇÃO DE MULTA DIÁRIA. ASTREINTES. INCIDÊNCIA DO MEIO DE COERÇÃO. 1. Ação ordinária c/c pedido de tutela antecipada ajuizada em face do Estado objetivando o fornecimento de medicamento de uso contínuo e urgente a paciente portadora de cirrose biliar primária. 2. A função das astreintes é vencer a obstinação do devedor ao cumprimento da obrigação e incide a partir da ciência do obrigado e da sua recalcitrância. 3. In casu, consoante se infere dos autos, trata-se obrigação de fazer, consubstanciada no fornecimento de medicamento a pessoa portadora de cirrose biliar primária, cuja imposição das astreintes objetiva assegurar o cumprimento da decisão judicial e consequentemente resguardar o direito à saúde. 4. 'Consoante entendimento consolidado neste Tribunal, em se tratando de obrigação de fazer, é permitido ao juízo da execução, de ofício ou a requerimento da parte, a imposição de multa cominatória ao devedor, mesmo que seja contra a Fazenda Pública' (AgRgREsp 189.108/SP, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 02.04.01). 5. Precedentes jurisprudenciais do STJ: REsp 490.228/RS, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ 31.05.04; AgRgREsp 440.686/RS, Felix Fischer, DJ 16.12.02; AgREsp 554.776/SP, Rel. Min. Paulo Medina, DJ 06.10.03; AgRgREsp 189.108/SP, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 02.04.01; e AgRgAg 334.301/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ 05.02.01. 6. Recurso especial provido." (REsp 715.974, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª T., DJ 28.11.05, p. 217)
"PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE FAZER. DESCUMPRIMENTO. ASTREINTES. APLICAÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. CABIMENTO. EXTENSÃO DA MULTA DIÁRIA AOS REPRESENTANTES DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme jurisprudência firmada no âmbito desta Corte, a previsão de multa cominatória ao devedor na execução imediata destina-se, de igual modo, à Fazenda Pública. Precedentes. 2. A extensão ao agente político de sanção coercitiva aplicada à Fazenda Pública, ainda que revestida do motivado escopo de dar efetivo cumprimento à ordem mandamental, está despida de juridicidade. 3. As autoridades coatoras que atuaram no mandado de segurança como substitutos processuais não são parte na execução, a qual dirige-se à pessoa jurídica de direito público interno. 4. A norma que prevê a adoção da multa como medida necessária à efetividade do título judicial restringe-se ao réu, como se observa do § 4º do art. 461 do Códex Instrumental. 5. Recurso especial provido." (REsp 747.371/DF, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 06.04.2010, DJe 26.04.2010)
Contudo, ao ser aplicada a multa diretamente à pessoa jurídica, o comando judicial será efetivamente cumprido? Visando a melhor tutela do direito e a melhoria da prestação jurisdicional, é razoável defender que a multa (e a eventual penalidade do art. 330 do CP) seja dirigida à própria autoridade coatora, e não à pessoa jurídica de direito público.
Destarte, se aquela autoridade sentir pessoalmente as consequências de sua desobediência, por certo irá pensar duas vezes antes de não atender ao mandamento judicial (16). Uma vez fixada e estabilizada, a autoridade será parte no cumprimento de sentença relativa a este capítulo, e será satisfeito nos termos dos arts. 475-J e seguintes do CPC.
Em que pese a autoridade ser, em relação ao mandado de segurança originário, mera informante e, posteriormente, terceiro com interesse recursal (art. 14, § 2º, da Lei nº 12.016/09), será parte no incidente relativo à multa e estará sujeita ao procedimento previsto no sistema processual comum, com intimação para pagamento, multa de 10%, penhora de bens, etc. (arts. 475-J e seguintes do CPC).
E não é só.
Ratificando o citado anteriormente, a diminuição ou aumento da multa na fase de cumprimento de sentença deverá levar em conta as variáveis ligadas à continuidade do descumprimento, a recalcitrância da autoridade coatora e o respeito à coisa julgada, evitando-se que a diminuição indiscriminada de seu valor possa servir de estímulo ao descumprimento continuado de ordem judicial.
Por outro lado, se acaso a multa for aplicada à pessoa jurídica de direito público, qual incentivo terá a autoridade coatora para cumprir a determinação judicial? Na prática, a multa será executada pelo sistema dos arts. 730 e 731 do CPC e satisfeita por meio de precatório requisitório ou requisição de pequeno valor, sem o seu caráter educativo-sancionador; provocando, quem sabe, o manejo de posterior e demorada ação regressiva.
Como conclusão, é fácil perceber que o correto direcionamento, por parte do magistrado, da penalidade de desobediência de ordem judicial no mandado de segurança faz com que a decisão judicial tenha maior estímulo para ser cumprida.
Logo, se a multa for dirigida à autoridade, e não ao ente público (ou seu procurador), alcançará mais facilmente seu caráter educativo-sancionador, fazendo com que as ordens judiciais sejam efetivadas dentro de um limite temporal razoável e necessário à garantia do direito líquido e certo discutido no writ of mandamus.
Bibliografia
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Notas
(1)Ao contrário da cláusula penal prevista no Código Civil (arts. 408-416).
(2)Júlio Fernandes aponta que: "a multa pode ultrapassar o valor da obrigação principal, desde que seja 'suficiente' e 'compatível', visto que a multa não possui qualquer relação com o valor da obrigação inadimplida, sendo um meio coercitivo de fazer com que o devedor cumpra a prestação à qual se obrigou perante o credor" (Tutela específica das obrigações de fazer a não fazer [art. 461 do Código de Processo Civil]. Revista Brasileira de Direito Processual - RBDPro, n. 70, Belo Horizonte, Fórum, 2010, p. 151).
(3)Contudo, entendeu o STJ, no julgamento do AgRg no AI 1.257.122/SP (Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, 4ª T., j. 02.09.2010): "Processual civil. Embargos de declaração em agravo de instrumento. Decisão que obsta recurso especial. Contradição não configurada. Propósito infringente. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental. Obrigação de não fazer. Execução de multa diária. Valor excessivo. Redução e limitação do valor. Possibilidade. I - É possível a redução das astreintes, sem importar em ofensa à coisa julgada, fixadas fora dos parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade ou quando se tornar exorbitante, limitando-se o total devido a tal título, para evitar o enriquecimento ilícito. II - O objetivo das astreintes é o cumprimento do decisum, e não o enriquecimento da parte. III - Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, sendo negado provimento a este". No tema, ver também o REsp 13.416, 4ª T., Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 17.03.93, DJ 13.04.92.
(4)Nesse sentido, vale transcrever duas passagens da obra de Eduardo Talamini, especialmente quando enfrenta o valor da multa. Observa, inicialmente, que: "se o crédito decorrente da multa é algo inconfundível com as perdas e danos, careceria de sentido limitá-lo ao valor do dever violado ou dos prejuízos havidos". Em seguida, conclui: "haverá de estabelecer-se montante tal que concretamente influa no comportamento do demandado - o que, diante das circunstâncias do caso (a situação econômica do réu, sua capacidade de resistência, vantagens por ele carreadas com o descumprimento, outros valores não patrimoniais eventualmente envolvidos, etc.), pode resultar em quantum que supere aquele que se atribui ao bem jurídico visado" (Tutela relativa aos deveres de fazer e não fazer - CPC, art. 461; CDC, art. 84. São Paulo: RT, 2001. p. 243).
(5)Também Marinoni observa que: "atualmente, em face do art. 461 do CPC, não há mais qualquer dúvida acerca da possibilidade de a multa exceder ao valor da prestação. Tal norma, na verdade, estando completamente atrelada à ideia de que a tutela específica é imprescindível para a realização concreta do direito constitucional à adequada tutela jurisdicional, não faz qualquer limitação ao valor da multa" (MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória [individual e coletiva]. 2. ed. São Paulo: RT, 2000. p. 175).
(6)Luiz Guilherme Marinoni assevera que: "nota-se que a multa deve cessar quando se verifica que o seu valor não mais conduzirá ao cumprimento da ordem, seja porque o seu valor assumiu a natureza de confisco do patrimônio do demandado, seja porque a coisa que se pretendia pereceu. Se a multa continuou eficaz, mesmo depois de ter se tornado potencialmente ineficaz no plano concreto, há que considerar o espaço de tempo em que não deveria ter incidido" (Técnica processual e tutela dos direitos. São Paulo: RT, 2004. p. 520-521).
(7)Esse dispositivo, a rigor, trata de título executivo extrajudicial, tendo em vista que o cumprimento da decisão pecuniária que fixou a multa é feito nos moldes dos arts. 475-J e seguintes do CPC.
(8)Como aponta Luiz Guilherme Marinoni, "a diminuição do valor acumulado da multa somente é possível quando se chegou a esse valor por inércia do juiz, que, em determinado momento, deveria ter diminuído ou feito cessar a multa" (Técnica processual e tutela dos direitos. São Paulo: RT, 2004. p. 520).
(9)Dentre os quais, ver: AgRg no Ag 896.430/RS, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., j. 23.09.08, DJe 08.10.08; AgRg no AI 878.423, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª T., j. 02.09.2010, DJe 15.09.2010; AGREsp 1.145.824, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, 4ª T., j. 18.11.2010, DJe 01.12.2010; e AgRg no AI 1.311.941, Rel. Vasco Della Giustina (Des. Convocado do TJRS), 3ª T., j. 16.11.2010, DJe 24.11.2010.
(10)Gustavo de Medeiros Melo, em texto intitulado A Multa Cominatória e o Acesso à Justiça, publicado no jornal Valor Econômico de 28.12.2010 (Caderno E- Legislação e Tributos, p. 2), após comentar como está sendo interpretada a aplicação da multa cominatória, constata o seguinte paradoxo: "o tribunal que tanto penaliza o jurisdicionado pelo uso de recurso manifestamente inadmissível ou infundado é o mesmo tribunal que 'anistia' quem desobedece seus próprios acórdãos".
(11)Após citar a existência de duas correntes de opinião (a primeira de que a autoridade coatora seria a autoridade coatora e a segunda a própria PJ o sujeito passivo), entende Sidou: "parte passiva na ação de mandado de segurança é a autoridade coatora, pessoa natural, do mesmo modo como parte passiva no habeas corpus e na ação popular é o agente da coação e o autor do atentado ao patrimônio público. O mandado é concedido contra o executante do ato ilegal, para que ele próprio cumpra o objeto de segurança e o corrija desfazendo-o ou executando-o, o que reforça a convicção de que parte passiva não é o órgão da administração" (SIDOU, J. M. Othon. Habeas corpus, mandado de segurança, mandado de injunção, habeas data, ação popular: as garantias ativas dos direitos coletivos. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 161-162). Em seguida, conclui: "argumentar que o ônus do processo de mandado de segurança é suportado não pela autoridade coatora, e sim pela pessoa jurídica de direito público, não afiança, por si, que é a pessoa jurídica a parte passiva da demanda, porque, se é verdade que esta é levada a absorver as consequências da sentença, não menos verdade é que a Administração reserva-se agir regressivamente contra o seu agente, responsável pelos danos causados a terceiros, como previne o art. 37, § 6º, da Constituição" (Idem, ibidem, p, 162).
(12)O STF já decidiu: "Mandado de segurança: legitimação passiva da pessoa de direito público ou assemelhada, à qual seja imputável o ato coator, cabendo à autoridade coatora o papel de seu representante processual, posto que de identificação necessária: consequente possibilidade de sanar-se o erro do impetrante na identificação da autoridade coatora, mediante emenda da inicial, para o que se determina a intimação da parte: voto médio do Relator para o acórdão" (Rcl 367/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ o Acórdão Min. Sepúlveda Pertence, j. 04.02.93, Tribunal Pleno, DJ 06.03.98. p-00004. Ement. vol-01901-01 p-00001).
(13)Também aduzindo que é a pessoa jurídica de direito público que irá suportar os efeitos decorrentes da ação, ver obra clássica de Sérgio Ferraz: Mandado de segurança (individual e coletivo) - aspectos polêmicos. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 52.
(14)No tema, ver meu: Mandado de segurança. 3. ed. Salvador: Juspodivm, 2012.
(15)Pode o procurador que defende os interesses da pessoa jurídica de direito público no mandado de segurança ser processado pela prática de crime de desobediência, nos termos do art. 26 da Lei nº 12.016/2009? In: ALVIM, Eduardo Arruda; RAMOS, Glauco Gumerato; MELO, Gustavo de Medeiros; ARAÚJO, José Henrique Mouta (Coord.). O novo mandado de segurança: estudos sobre a Lei 12.016/2009. Belo Horizonte: Fórum, 2010. p. 542-543.
(16)Marcelo Lima Guerra ensina que: "sugere-se a aplicação da multa diária contra o próprio agente administrativo responsável pelo cumprimento da obrigação a ser satisfeita in executivis. Com efeito, a tanto se pode chegar com fundamento no próprio § 5º do art. 461 do CPC, uma vez que aí foi conferido ao juiz o poder de determinar as medidas que julgar necessárias, quer sub-rogatórias, quer coercitivas, para a prestação de uma satisfação integral e em forma específica do credor de obrigação de fazer ou não fazer" (Execução de sentença em mandado de segurança. In: BUENO, Cassio Scarpinella; ALVIM, Eduardo Arruda; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais do mandado de segurança. São Paulo: RT, 2002. p. 650).
Disponível em: (http://www.lex.com.br/doutrina_25926669_A_MULTA_DO_ART_461_DO_CPC_LIMITACAO_E_CABIMENTO_NO_MANDADO_DE_SEGURANCA.aspx). Acesso em: 09/set/2014.
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