Entrevista
“Dizem que a Europa está mal, mas o euro continua forte”
Louis Bazire, que preside a Câmara de Comércio França-Brasil em São Paulo, acredita que o temor sobre a Europa é exacerbado e que os bancos europeus não quebrarão caso haja um calote grego
Ana Clara Costa

Bazire, presidente da Câmara de Comércio Brasil-França, em São Paulo: bancos europeus estão sólidos (Mastrangelo Reino/Folhapress)
As desconfianças sobre a economia europeia ganharam corpo nos últimos dias após novas incertezas envolvendo a Grécia. Uma vez mais, o mundo teme que o país não consiga honrar seus compromissos de dívida. Na berlinda, as ações de bancos europeus, sobretudo franceses, foram penalizadas nas bolsas de valores, uma vez que boa parte destas instituições possui elevada exposição a títulos gregos. Se antes a turbulência no continente era vista somente como uma crise das dívidas soberanas, os mais pessimistas já acreditam se tratar de um movimento que poderá se espalhar pelo setor bancário. Há, no entanto, os que apostam que, mesmo se a Grécia der calote, os bancos europeus não irão sucumbir. Para Louis Bazire, presidente da Câmara de Comércio França-Brasil, as instituições financeiras europeias têm fundamentos sólidos. Além disso, o euro tem se mostrado “duro na queda”, diz o empresário. No último mês, a cotação da moeda única tem se apreciado e já se aproxima de 2,40 real, valor semelhante ao de um ano atrás. “O dólar se desvalorizou ante muitas moedas, já o euro ficou estável e até se valorizou, apesar do que dizem sobre a economia europeia”, afirmou em entrevista ao site de VEJA. O empresário, que participa ativamente dos intercâmbios de negócios entre Brasil e França, também preside o banco francês BNP Paribas no país.
A conjuntura europeia hoje está muito pior do que estava quando houve o novo plano de resgate da Grécia, em junho deste ano? A situação ainda está complicada para a Europa, apesar de países como Irlanda, Portugal e Espanha estarem elaborando seus planos de equilíbrio fiscal. O que ocorre é que, com os cortes fiscais que serão aplicados, a economia europeia vai se resfriar. Se há corte fiscal, há mais impostos e menos consumo. Então, fica difícil prever qualquer tipo de retomada ou melhora em um futuro próximo. No caso da Grécia, as coisas continuam em um patamar tão complexo quanto antes, pois eles continuam com dificuldade para cumprir o plano de austeridade. Então ela continua sendo o ponto frágil do euro. A boa coisa que é os governantes, sobretudo o (Nicolas) Sarkozy e a (Angela) Merkel, estão tentando resolver a questão grega dentro da zona do euro e estão se esforçando muito para isso.
As ações dos bancos franceses têm sido bastante penalizadas na bolsa. O que está em jogo ainda é a exposição desses bancos aos títulos gregos? Os bancos vieram a público nos últimos dias prestar esclarecimentos e as ações voltaram a subir. Claramente essa queda é atribuída a posições especulativas que foram desfeitas ao longo dos dias. Só isso explica o alto volume de ações de bancos franceses que foi negociado nesse período. Uma ação não pode cair 20% em um dia e subir 20% no dia seguinte sem que não haja especulação por trás disso. Além disso, também pode ser que essas oscilações sejam resultado de operações antigas de venda a descoberto. Como essa prática foi proibida em muitos mercados, é possível que algumas posições antigas tenham sido desfeitas. Os fundamentos da indústria financeira estão sólidos.
É possível que essa crise de dívidas soberanas se torne uma crise bancária? Não. Se houver algum tipo de renegociação de dívida europeia, será a da Grécia. No entanto, os governantes estão fazendo de tudo para resolver isso dentro da zona do euro, para que o plano de austeridade grego seja seguido. Mas, mesmo se houver qualquer tipo de renegociação nesse país, nenhum banco europeu irá à falência.
E uma crise de liquidez? Também não acredito. O que está acontecendo é que a liquidez bancária em dólar está cada vez mais nos Estados Unidos e a liquidez em euro está na Europa. Tanto que os bancos centrais recentemente se alinharam para estabelecer uma linha obrigatória de liquidez em dólar. Não é possível haver uma crise de liquidez na Europa se o euro continua se valorizando. Dizem que a Europa toda está mal, mas, mesmo com todos os problemas que estão acontecendo, o euro continua forte.
A saída da Grécia da zona do euro aliviaria de maneira significativa as pressões sobre o bloco? A Grécia representa de 3% a 4% do Produto Interno Bruto (PIB) da zona do euro. O plano que está sendo discutido atualmente prevê um controle muito mais rigoroso do cumprimento das regras de austeridade fiscal. Se o imponderável vier a acontecer e as coisas não derem certo, a saída da Grécia seria muito mais nociva para os próprios gregos do que para os demais europeus. Para os outros países, não mudaria muita coisa.
Não mudaria nem para o euro? De forma alguma. É importante lembrar que esses rumores de que a Europa está mal e o euro está mal são coisas contestáveis. Tanto a Europa quanto os Estados Unidos estão tendo de se submeter a inúmeros ajustes fiscais. O dólar se desvalorizou muito frente a muitas moedas, já o euro permaneceu estável e até se valorizou. No próprio Brasil, quando algo vai mal, a moeda é a primeira a sofrer. E o euro continua muito bem cotado, o que mostra confiança.
O ministro Mantega afirmou que irá se alinhar com os outros membros dos Brics para ajudar a Europa. Isso implicaria no investimento em bônus europeus? Seria uma das formas. E isso não me surpreende. De uma certa maneira, os Brics se beneficiam se os países desenvolvidos estão bem, pois garantem mercado consumidor para suas exportações. Então seria interessante haver uma diversificação de ativos, por meio da compra de títulos europeus, e não apenas americanos. Mas é preciso ter em mente que um país não reduz seu déficit de 10% ou 100% para 0% do PIB em um dia. Os países europeus ainda estão emitindo papéis da dívida e precisam dos que estão acumulando reservas e dispostos a comprar títulos públicos.
Qual é o papel do eurobônus na busca por uma melhora econômica? É desejável que esses títulos sejam criados, mas ainda há muito caminho a percorrer. Esses bônus só poderão existir se houver um controle efetivo das finanças públicas de todos os países da zona do euro. Não se pode emitir bônus em nome da Europa sem uma supervisão extremamente rígida. Na minha visão, a Europa deu o recado: "eurobônus, por que não?” Não significa que no próximo mês esses bônus serão emitidos.
As ações dos bancos franceses têm sido bastante penalizadas na bolsa. O que está em jogo ainda é a exposição desses bancos aos títulos gregos? Os bancos vieram a público nos últimos dias prestar esclarecimentos e as ações voltaram a subir. Claramente essa queda é atribuída a posições especulativas que foram desfeitas ao longo dos dias. Só isso explica o alto volume de ações de bancos franceses que foi negociado nesse período. Uma ação não pode cair 20% em um dia e subir 20% no dia seguinte sem que não haja especulação por trás disso. Além disso, também pode ser que essas oscilações sejam resultado de operações antigas de venda a descoberto. Como essa prática foi proibida em muitos mercados, é possível que algumas posições antigas tenham sido desfeitas. Os fundamentos da indústria financeira estão sólidos.
É possível que essa crise de dívidas soberanas se torne uma crise bancária? Não. Se houver algum tipo de renegociação de dívida europeia, será a da Grécia. No entanto, os governantes estão fazendo de tudo para resolver isso dentro da zona do euro, para que o plano de austeridade grego seja seguido. Mas, mesmo se houver qualquer tipo de renegociação nesse país, nenhum banco europeu irá à falência.
E uma crise de liquidez? Também não acredito. O que está acontecendo é que a liquidez bancária em dólar está cada vez mais nos Estados Unidos e a liquidez em euro está na Europa. Tanto que os bancos centrais recentemente se alinharam para estabelecer uma linha obrigatória de liquidez em dólar. Não é possível haver uma crise de liquidez na Europa se o euro continua se valorizando. Dizem que a Europa toda está mal, mas, mesmo com todos os problemas que estão acontecendo, o euro continua forte.
A saída da Grécia da zona do euro aliviaria de maneira significativa as pressões sobre o bloco? A Grécia representa de 3% a 4% do Produto Interno Bruto (PIB) da zona do euro. O plano que está sendo discutido atualmente prevê um controle muito mais rigoroso do cumprimento das regras de austeridade fiscal. Se o imponderável vier a acontecer e as coisas não derem certo, a saída da Grécia seria muito mais nociva para os próprios gregos do que para os demais europeus. Para os outros países, não mudaria muita coisa.
Não mudaria nem para o euro? De forma alguma. É importante lembrar que esses rumores de que a Europa está mal e o euro está mal são coisas contestáveis. Tanto a Europa quanto os Estados Unidos estão tendo de se submeter a inúmeros ajustes fiscais. O dólar se desvalorizou muito frente a muitas moedas, já o euro permaneceu estável e até se valorizou. No próprio Brasil, quando algo vai mal, a moeda é a primeira a sofrer. E o euro continua muito bem cotado, o que mostra confiança.
O ministro Mantega afirmou que irá se alinhar com os outros membros dos Brics para ajudar a Europa. Isso implicaria no investimento em bônus europeus? Seria uma das formas. E isso não me surpreende. De uma certa maneira, os Brics se beneficiam se os países desenvolvidos estão bem, pois garantem mercado consumidor para suas exportações. Então seria interessante haver uma diversificação de ativos, por meio da compra de títulos europeus, e não apenas americanos. Mas é preciso ter em mente que um país não reduz seu déficit de 10% ou 100% para 0% do PIB em um dia. Os países europeus ainda estão emitindo papéis da dívida e precisam dos que estão acumulando reservas e dispostos a comprar títulos públicos.
Qual é o papel do eurobônus na busca por uma melhora econômica? É desejável que esses títulos sejam criados, mas ainda há muito caminho a percorrer. Esses bônus só poderão existir se houver um controle efetivo das finanças públicas de todos os países da zona do euro. Não se pode emitir bônus em nome da Europa sem uma supervisão extremamente rígida. Na minha visão, a Europa deu o recado: "eurobônus, por que não?” Não significa que no próximo mês esses bônus serão emitidos.
Disponível no Portal Veja: (http://veja.abril.com.br/noticia/economia/dizem-que-a-europa-esta-mal-mas-o-euro-continua-forte). Acesso em: 19/set/2011.
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