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terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Eleitoral. Ex-marido da presidenta Dilma mantém a paixão pela política e diz que Dilma hoje não tem adversários (Carlos Araújo. Entrevista a Flávio Ilha)...

Leia... Interessante matéria introdutória e entrevista realizada e publicada no dia 28/dez/2013...

‘A crítica de que o PT perdeu conteúdo ideológico é  correta’

  • Carlos Franklin Paixão Araújo, ex-marido da presidente Dilma, mantém a paixão pela política, e diz que o governo hoje não tem adversários


FLÁVIO ILHA (EMAIL)
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Araújo diz que parte das elites apoia o PT. Ele ataca a imprensa, ao dizer que suas críticas não afetam a popularidade do governo
Foto: Nabor Goulart



Araújo diz que parte das elites apoia o PT. Ele ataca a imprensa, ao dizer que suas críticas não afetam a popularidade do governo Nabor Goulart
Ex-preso político, o advogado Carlos Franklin Paixão Araújo, de 76 anos, foi casado por mais de 20 com a presidente Dilma, de quem ainda é próximo. De saúde frágil e com um enfisema pulmonar inoperável, mantém a paixão pela política. E, apesar da visão crítica sobre o PT, ele diz que o governo hoje não tem adversários.
O senhor acredita que mensalão pode atrapalhar a reeleição da presidente?
Acho que não. A crítica que se faz ao PT, de que o partido perdeu seu conteúdo ideológico, é absolutamente correta. Mas, mesmo que o tenha perdido, é um partido que sempre cresce politicamente. Essa é uma contradição interessante da política brasileira: a cada eleição, apesar de tudo, o PT faz mais e mais votos.
Por quê?
Porque o PT, de uma forma ou de outra, corresponde às aspirações das camadas brasileiras mais necessitadas. É simples assim. E também tem uma política que consegue agregar setores de várias classes sociais, desde a classe média até as elites. Parte das elites apoia o PT, compreende a sua política.
Isso é mérito de quem?
Da intuição e, principalmente, do aprendizado do Lula. Quando ele fez a “Carta aos Brasileiros”, em 2002, precisou ver como é que faria tudo aquilo que estava escrito e prometido. Então eu acho que, nesse sentido, o PT fez as alianças corretas. É impossível desenvolver o capitalismo brasileiro sem alianças com setores capitalistas, como temos. As tormentas que ocorreram, o PT soube assimilá-las perfeitamente. Veio a tormenta do mensalão, e o Lula foi reeleito. Veio a outra onda do mensalão agora, com as prisões, e a Dilma está crescendo. Como explicar isso? A mídia colabora muito com o PT.
O PT discorda.
Mas está sendo infantil ao dizer isso. Porque é a mídia que elege o PT, ao ser tão radical e sectária como tem sido. A mídia fala durante seis meses que o Brasil irá à falência. Não foi. Depois o Brasil não exporta mais nada e tal. Ou então esgotou o mercado interno. Não acontece nada. Agora é inflação. De novo não acontece nada. A mídia esgota todos os temas e não acontece nada. O povo brasileiro, com sua sabedoria e sua esperteza, aproveita o futebol e as novelas que passam de graça na TV, mas para o resto não dá bola.
O senhor acredita que a presidente Dilma tem adversário?
Por enquanto, não. Claro, daqui a pouco acontece um acidente de percurso e tudo muda. Mas dadas as condições atuais, não tem adversário. O Eduardo Campos, a meu ver, cometeu um erro tremendo, se antecipou ao debate. O Lula tem essa visão de que o PT precisará passar o poder para alguém, desde que seja do mesmo viés ideológico. Deveria ser o Campos, naturalmente, mas ele precipitou as coisas. Não tem como se recuperar. O Aécio Neves simplesmente não existe.
E Marina Silva?
Ao não ter validado seu partido para concorrer, é natural que ela tenha que apoiar alguém. Mas trata-se de uma contradição ambulante: ela tem um partido do qual é presidente, enquanto a secretária-geral é a dona do Itaú (Neca Setúbal) e o vice-presidente é dono da Natura (Guilherme Leal). Mas que partido é esse? E assim mesmo ela é anticapitalista e evangélica, uma coisa gozadíssima.
A oposição não tem propostas?
O problema da oposição é que eles brigam demais entre si, nunca criam uma aliança sólida. Se houvesse essa aliança, poderia ser uma força expressiva. Mas eles não conseguem porque, na minha opinião, o PT teve a sabedoria de pegar parte das elites para ficar com ele. Vários partidos, mesmo pequenos, representam essa parcela que apoia o PT. São frações das elites? São. São frações do capital? São. Mas são frações significativas.
O senhor conversa sobre essas questões com a presidente?
Não, não interfiro em nada. Tento só não atrapalhar.
Mas nem como conversa descompromissada?
Minha relação com a Dilma é estritamente pessoal e familiar. Não falamos de política porque, quando ela vem aqui (para Porto Alegre), vem ficar com a família em um ambiente mais descontraído. E nem poderia ser diferente porque, quando vem, é para descansar. Não é nada fácil ser presidente, em qualquer país do mundo. É um rolo em cima do outro. Uma confusão em cima de outra. A pessoa fica exaurida. Pega a cara do Lula quando entrou no poder e quando saiu. Pega uma foto do Obama cinco anos atrás e você vai dizer “mas o que é isso, o homem tá com a cabeça branca!”. É porque é assim. Presidente é presidente 24 horas por dia, não tem sossego.
Ela então não lhe consulta sobre determinadas questões?
Não vamos falar disso. Sou um torcedor do governo Dilma e do governo Lula, nada além disso.















































































































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Ainda cabem embargos infringentes no Supremo (Rodrigo Lago)


Por Rodrigo Lago
10.09.13


Ainda cabem embargos infringentes no Supremo



1.Introdução
Em outros artigos que escrevi tratando de questões acerca da Ação Penal nº 470, afirmei ter sido o maior julgamento já realizado na história do Supremo Tribunal Federal. Um julgamento com essas proporções acaba servido para consolidar, alterar ou orientar a jurisprudência do Supremo para novos casos que a Corte venha a enfrentar. Somente a partir da Emenda Constitucional nº 35/2001, que alterou o art. 55, §1º , da Constituição, para dispensar a necessidade de prévia licença para processar congressistas, o STF passou a se debruçar verdadeiramente nas ações penais originárias. E com tantos réus, e diferentes conjecturas, é natural que o processo represente marcos interpretativos sobre variados temas novos.
Um dos temas ainda pendentes de análise na Ação Penal nº 470 diz respeito à admissibilidade dos embargos infringentes, que no âmbito das ações penais originárias do STF é um recurso que só pode ser interposto contra decisões condenatórias majoritárias. Convém destacar que o recurso, considerada a sua hipótese restrita de cabimento, só foi interposto por onze dos réus, mas ganhou contornos imprevisíveis, devido às aposentadorias dos ministros Ayres Britto e Cezar Peluso, que participaram do julgamento originário, e que se aposentaram, entrando em seus lugares dois novos ministros, Teori Zavaski e Luís roberto Barroso, que poderão mudar o destino desses réus.
O ministro Joaquim Barbosa, relator e presidente do STF, já manifestou seu voto contra a admissibilidade. O ministro Celso de Mello, ainda no julgamento originário, afirmou cabíveis os embargos. Mas não se pretende neste breve artigo aprofundar a análise da questão, com ampla incursão doutrinária e jurisprudencial, ou buscando citações laterais dos ministros em outras oportunidades para embasar a posição que ora se apontará.
Ressalte-se, ainda antes de adentrar no tema, que é preciso separar, de logo, a vontade política da interpretação jurídica. Ou seja, não se pode discutir o cabimento do recurso de olho na capa dos autos, no nome dos réus e na expectativa criada em torno da execução das penas.
2. A natureza jurídica do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal
O ponto de partida para a análise do recurso de embargos infringentes é saber qual a norma que fundamentaria o seu cabimento e a sua natureza jurídica. E eles estão previstos no art. 333, I e parágrafo único do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal:
Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal
Art. 333. Cabem embargos infringentes à decisão não unânime do Plenário ou da Turma:
I – que julgar procedente a ação penal;
Parágrafo único. O cabimento dos embargos, em decisão do Plenário, depende da existência, no mínimo, de quatro votos divergentes, salvo nos casos de julgamento criminal em sessão secreta.
O Regimento Interno do STF foi publicado em 27 de outubro de 1980, sob a vigência da Constituição de 1969, como se a Emenda Constitucional nº 01/1969 ao texto da Constituição de 1967. E de acordo com o art. 120, parágrafo único, “c”, da Constituição de 1969, competia ao Supremo Tribunal Federal, por seu regimento interno, dispor sobre normas processuais dos feitos de sua competência originária ou recursal:
Constituição de 1967
Art. 120. O Supremo Tribunal Federal funcionará em plenário ou dividido em turmas.
Parágrafo único. O regimento interno estabelecerá:
c) o processo e o julgamento dos feitos de sua competência originária ou de recurso.
Com isso, não há dúvidas de que a redação originária do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal buscava pressuposto de validade diretamente no art. 120, parágrafo único, “c”, da Constituição de 1969, e poderia dispor de normas processuais. Aliás, ao Supremo Tribunal Federal não eram aplicáveis, senão subsidiariamente, as regras do Código de Processo Penal. Igual natureza jurídica teve a Emenda Regimental STF nº 02/1985, aprovada e publicada a nova norma ainda sob a égide da Constituição de 1969, e que tornou mais rigoroso o cabimento do recurso. Portanto, a disposição prevista no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal era, ao tempo do início de sua vigência, formalmente constitucional.
A Constituição vigente, promulgada em 03 de outubro de 1988, não trouxe mais em seu corpo a regra acerca da competência para dispor sobre normas dos processos de competência do Supremo Tribunal Federal. Assim, a competência passou a ser a geral, prevista no art. 22, I, da Constituição de 1988, para quem “Compete privativamente à União legislar sobre: direito (…) processual (…)”.
Nessa medida, o conjunto de normas do Regimento Interno que dispunham sobre direito processual nos feitos de competência do Supremo Tribunal Federal foi recepcionado pela Constituição de 1988 como se lei federal ordinária fosse. Já as demais disposições do Regimento Interno, que diziam respeito sobre questões eminentemente regimentais, foram recepcionadas como normas de regimento interno, tal como previsto no art. 96, I, “a”, da Constituição de 1988.
3. O advento da Lei nº 8.038/90 e a derrogação de dispositivos do Regimento Interno do STF
Em 1990, foi sancionada a Lei nº 8.038/90, instituindo “normas procedimentais para os processos que específica, perante o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal”. Eis o nó górdio da controvérsia que precisa ser desatado. Estariam derrogadas todas as disposições contidas no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal que diziam respeito às normas processuais dos feitos de sua competência?
O texto legal não facilitou a análise, pois não houve derrogação expressa das disposições do Regimento Interno. Assim, restaria a dúvida se todas as disposições sobre normas processuais contidas no Regimento Interno estariam derrogadas, ou apenas aquelas que conflitassem com a nova lei.
E a dúvida surge porque é regra que “A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior”, segundo dispõe o art. 2º do Decreto-Lei nº 4.657/42, então denominada de Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, e que passou a ser denominada de Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro a partir da Lei nº 12.376/10.
Para aqueles que defendem a tese da derrogação de todas as disposições do Regimento Interno, a Lei nº 8.038/90 passou a dispor integralmente das normas processuais para os feitos de competência do Supremo Tribunal Federal. Assim, embora não tenha derrogado expressamente o art. 333 do Regimento Interno do STF, que prevê o cabimento dos embargos infringentes, houve uma derrogação tácita.
A tese, embora tentadora, não se confirma. A Lei nº 8.038/90 não tratou inteiramente das normas processuais sobre os feitos de competência do Supremo Tribunal Federal. E essa constatação é facilmente alcançada pelo exame do inteiro teor do texto legal.
Na parte que toca às ações penais originárias, disciplinada em seu no Capítulo I, nos artigos 1º a 12, a Lei nº 8.038/90 não previu o cabimento de recurso  contra nenhuma das decisões tomadas durante todo processo penal. Ou seja, caso estivessem derrogadas as disposições contidas no Regimento Interno do STF, todas as decisões tomadas no âmbito de ações penais seriam irrecorríveis, e não caberiam sequer os embargos de declaração. Haveria de se pressupor o Supremo Tribunal Federal como um tribunal infalível, não se sujeitando as suas decisões sequer ao vício da incompletude ou da contradição.
Portanto, se a Lei nº 8.038/90 não derrogou expressamente os embargos de declaração, e este recurso integrativo ainda é cabível, o mesmo se pode afirmar quanto aos embargos infringentes. Não houve derrogação expressa desse dispositivo do Regimento Interno.
Assim, as normas processuais previstas no Regimento Interno que não foram expressamente derrogadas seguem em vigor. E tanto o é, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica quanto ao cabimento de embargos de declaração das suas decisões, inclusive em matéria criminal. E resolvendo controvérsia acerca do prazo recursal, o Supremo afirmou ser de cinco dias, e não de dois dias, como é previsto no art.619 do Código de Processo Penal:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PROCESSUAL PENAL. INTEMPESTIVIDADE. EMBARGOS NÃO CONHECIDOS. 1. O prazo para a interposição de embargos declaratórios contra as decisões do Supremo Tribunal Federal, ainda que em matéria criminal, é de cinco dias, e não de dois dias (CPP, art. 619). 2. Embargos extemporâneos. 3. Embargos de declaração não conhecidos (votação unânime). (STF – AI 430317 AgR-ED, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, Primeira Turma, julgado em 29/06/2004, DJ 27-08-2004 PP-00070)
Nota-se bem que o precedente acima citado, de relatoria do ministro Joaquim Barbosa, afirma expressamente que o prazo para oposição de embargos de declaração é de cinco dias, não se aplicando as regras do Código de Processo Penal. Essa análise se mostrou necessária porque haveria um suposto conflito entre o que dispõe o art.337, §1º, do Regimento Interno, que prevê cinco dias de prazo, e o que consta do art. 619 do Código de Processo Penal, ao prever apenas dois dias de prazo para embargos de declaração em matéria penal.
Ainda mais esclarecedor é outro precedente da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre o assunto:
RECURSO – EMBARGOS DECLARATÓRIOS – PRAZO – AÇÃO PENAL DA COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. A oportunidade dos embargos declaratórias voltados à integração de decisão do Supremo Tribunal Federal, prolatada em processo revelador de ação penal da respectiva competência originária, é de cinco dias, resolvendo-se o conflito de normas no espaço pelo critério da especialidade, sendo aplicável o artigo 337, § 1º, do Regimento Interno, e não o artigo 619 do Código de Processo Penal. (STF – AP 361 ED, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 03/03/2005, DJ 06-05-2005 PP-00007)
A ementa do precedente acima é didática e inequívoca ao explicitar que permanecem em plena vigência as disposições contidas no Regimento Interno acerca das normas processuais dos feitos da competência do Supremo Tribunal Federal, mesmo após a vigência da Lei nº 8.038/90. E no caso paradigma, do precedente mencionado, tratava-se exatamente de uma ação penal originária. Dessa forma, é incorreta a afirmação de que todas as normas processuais do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal foram derrogadas a partir do momento que a Lei nº 8.038/90 teria tratado por inteiro da matéria.
Ainda a reforçar a conclusão de que permanecem vigentes as normas processuais previstas no Regimento Interno do STF, tem-se que o próprio Supremo Tribunal Federal vem admitindo, sem qualquer questionamento, o cabimento de recursos de agravo regimental contra as decisões tomadas pelos relatores no curso das ações penais originárias.
Vale observar que o agravo regimental nasceu para permitir uma alternativa de análise monocrática para casos em que se exigiria a tomada de decisão pelo colegiado. Ou seja, em determinadas hipóteses, embora a matéria possa ser de competência do Plenário, o relator poderá decidir monocraticamente o pedido. E somente em caso de inconformismo, o processo é submetido ao exame do corpo colegiado, neste caso através do agravo regimental.
Porém, no caso das ações penais originárias, o art. 2º da Lei nº 8.038/90 designou como o juiz da instrução o relator, e não o colegiado: “O relator, escolhido na forma regimental, será o juiz da instrução”. Assim, em tese, não caberia agravo regimental contra decisões dos relatores nas ações penais originárias que dispusessem sobre provas. Mas novamente a lei não previu a irrecorribilidade da decisão, sendo cabível, portanto, o recurso regimental, funcionando o Plenário como instância revisora da decisão do relator.
Ainda no caso do agravo regimental é interessante mencionar que a própria lei o afirmou cabível em uma hipótese, que seria no caso de arquivamento liminar de pedido de intervenção federal, previsto no art.20, II, da Lei nº 8.038/90[1]. Veja-se que o caso é distinto das questões atinentes à instrução processual nas ações penais originárias, quando o relator foi designado como o juiz da instrução, enquanto na intervenção federal o presidente poderá substituir-se ao Plenário arquivando pedido manifestamente infundado. Ainda assim, o Supremo Tribunal Federal tem aceito, sem qualquer resistência, divergência ou discussão, a recorribilidade, através de agravo regimental, das decisões tomadas na instrução processual de ações penais originárias. Aliás, foram inúmeros os agravos regimentais interpostos, conhecidos e julgados durante todo o processamento da Ação Penal nº 470.
Antes que o intérprete apressado afirme a previsão na lei do agravo interno, tratado no artigo 39 da Lei nº 8.038/90, convém afirmar que o mencionado preceito está ligado ao artigo anterior, do mesmo capítulo da lei, que permite o agravo regimental das decisões terminativas dos relatores que negarem seguimento aos pedidos manifestamente descabidos em outros feitos de competência originária ou recursal do Supremo Tribunal Federal. O agravo de que trata o artigo 39 da Lei nº 8.038/90 não seria aplicável, assim, para as decisões interlocutórias nas ações penais originárias.
Seguindo o debate sobre o tema, poder-se-ia argumentar que o Supremo já assentou que os embargos infringentes não são mais cabíveis, como o fez quanto às ações diretas de constitucionalidade, cujo recurso era previsto no mesmo artigo 333 do Regimento Interno, em seu inciso IV[2]. Porém, a situação das ações diretas de inconstitucionalidade é completamente diversa das ações penais originárias, sendo inclusive regulamentadas por leis diferentes.
Isso porque a Lei das ADI´s, que passou a regular o processo de controle de constitucionalidade, prevê expressamente que a “decisão que declara a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo em ação direta ou em ação declaratória é irrecorrível” (art. 26 da Lei nº 9.868/98). E dessa forma, passando a lei a dispor expressamente que são irrecorríveis as decisões proferidas em sede do controle concentrado de constitucionalidade, obviamente que deixou de ser cabível o recurso de embargos infringentes. Houve, aí sim, derrogação tácita do citado art.333, IV, do Regimento Interno do STF.
Mas, diversamente da Lei nº 9.868/98, a Lei nº 8.038/90 não trouxe previsão nesse sentido, quanto à irrecorribilidade das decisões de mérito nas ações penais. Dessa forma, diferente do processo das ADI´s, não houve derrogação tácita do art.333, I, do Regimento Interno do STF, que prevê cabimento do recurso de embargos infringentes em matéria penal.
Sendo assim, outra conclusão não se chega senão que permanece em vigor o art. 333, I, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, sendo cabíveis os embargos infringentes contra as decisões majoritárias do Supremo Tribunal Federal, desde que haja ao menos “quatro votos divergentes” da procedência da ação penal, como previsto no parágrafo único do citado artigo.
4. Recurso cabível, ainda que inoportuno
São fortes os argumentos acerca da inconveniência do recurso de embargos infringentes no modelo previsto no art. 333, I, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
O primeiro ponto que se coloca é que o mencionado recurso acaba servindo como mero pedido de reconsideração do julgamento, posto que, para o seu provimento, em geral, seria necessária a alteração de voto de alguns dos ministros que tenham votado pela condenação. Mas poderia ocorrer a rara hipótese em que a votação originária, exatamente a que se pretende ver alcançada pelos efeitos infringentes, não tenha ocorrido com quórum completo, tendo a ação sido decidida por um escore de cinco votos pela condenação e quatro pela absolvição, com dois ministros ausentes. Neste caso, o recurso de embargos infringentes permitiria que os dois ministros faltantes se somassem à corrente absolutória.
Mas somente esse ponto não faria do recurso de embargos infringentes um recurso necessário, porque outra alternativa mais racional poderia ser construída para solucionar o problema. Bastaria criar regra semelhante à da ação direta de inconstitucionalidade, cujo resultado só é proclamado quando uma das teses alcança maioria absoluta. Ou seja, em lugar do cabimento de embargos infringentes, melhor seria que houvesse regra, mesmo regimental, que autorizasse a suspensão do julgamento quando, ausentes ministros, se pudesse alcançar resultado diverso com os seus votos.
O mais sedutor dos argumentos em defesa da manutenção do recurso de embargos infringentes, especialmente quanto às ações penais originárias do Supremo Tribunal Federal, é que, para todas as ações penais, sejam as originárias dos tribunais, sejam as do processo penal comum, de rito ordinário, haverá sempre outras instâncias recursais a possibilitar a correção de eventuais erros de julgamento. E mesmo nos casos das ações penais originárias de outros tribunais, em que a jurisprudência não admite o cabimento de recurso ordinário, há a possibilidade de recursos, ainda que de cognoscibilidade reduzida, como o recurso especial e o recurso extraordinário, ou mesmo a via autônoma de impugnação do habeas corpus. E no caso de decisões definitivas do Plenário do Supremo Tribunal Federal não há instância recursal alguma, nem mesmo se admite a impetração de habeas corpus.
Em que pese tais argumentos, porque se trata de recurso dirigido ao próprio órgão originário, mostra-se remota a chance de reversão do julgamento. É que os ministros já manifestaram a sua posição jurídica e também sobre as provas colhidas no processo, de forma que dificilmente alcançarão conclusão diversa da que alcançaram no primeiro julgamento.
Por fim, a alteração da composição do Tribunal entre o julgamento originário e o julgamento do recurso de embargos infringentes é outro fator que não pode ser considerado, pois se trata de evento incerto e circunstancial.
Desse modo, conclui-se que o recurso de embargos infringentes é inoportuno, merecendo ser revisto o seu cabimento. Mas, enquanto o dispositivo do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal não venha a ser derrogado, o recurso permanece admissível.
5. Conclusão
Ainda são cabíveis os embargos infringentes em ações penais originárias do STF, estando em plena vigência o art. 333, I, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, norma que nasceu constitucional, tendo como pressuposto de validade o art. 120 da Constituição de 1969, e que foi recepcionado pelo art. 22, I, da Constituição de 1988 como lei ordinária.
Considerando-se o recurso inoportuno, é possível e razoável derrogar o art. 333, I, do Regimento Interno do STF, e de resto as demais hipóteses de cabimento desse recurso que ainda estão em vigor. Mas se exige para tanto a edição de lei ordinária revogadora, pois a matéria agora é reservada à competência legislativa da União, e não mais privativamente ao Supremo Tribunal Federal.
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RODRIGO LAGO é advogado, conselheiro federal suplente da OAB, membro consultor da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da OAB, diretor-geral da Escola Superior de Advocacia do Maranhão – ESA-OAB/MA, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) e fundador e articulista do Os Constitucionalistas. Siga o autor no Twitter e no Facebook.
Foto: Fellipe Sampaio/SCO/STF
[1] Lei nº 8.038/90 – Art. 20. O Presidente, ao receber o pedido: II – mandará arquivá-lo, se for manifestamente infundado, cabendo do seu despacho agravo regimental.
[2] Regimento Interno do STF – Art. 333. Cabem embargos infringentes à decisão não unânime do Plenário ou da Turma: IV – que julgar a representação de inconstitucionalidade;

A teoria do caos falhou (Chico Vigilante) | Folha Diferenciada


A teoria do caos falhou


CHICO VIGILANTE
Apesar de todo o lobby para provar que a economia brasileira se dirigia ao precipício em 2013, os fatos apontaram o contrário


O fim do ano se aproxima e com ele uma conclusão: a grande imprensa de oposição aos governos petistas deve ter passado um mau Natal e espero que tenham indigestão no Ano Novo: vão engolir em seco o mico que representou suas previsões agourentas para 2013 porque erraram feio na maioria delas.


Todas as teses de terrorismo econômico da direita travestida de jornalistas cairam por terra. Ao contrário da mídia estrangeira- que depois de pedir a cabeça do ministro Mantega, voltou atrás recentemente dizendo que a conjuntura no país está mudando – a mídia brasileira não fez até agora uma autocrítica de suas análises fatalistas sobre os destinos do país.



Na última sexta, 27, o The Wall Street Journal afirmou que Dilma “está em alta”, depois de mais um leilão bem sucedido para a exploração de uma rodovia federal. Mas convenhamos, se os analistas da imprensa nacional forem tentar se desculpar pelas previsões equivocadas levariam dias fazendo isso.



O que todos podemos ver é que o ano se encerra calmamente, com o comércio vendendo no Natal mais do que os inimigos do Brasil torciam para não acontecer. As vendas do comércio no período cresceram pelo 11º ano consecutivo.



Para a tristeza deles, nenhum apagão ocorreu em datas mais ou menos importantes, apesar das garantias de conhecidos colunistas de que o Brasil estava prestes a sofrer um apagão de energia.



Acho que chegou a hora destes senhores mudarem suas fontes de informação ou a pauta das reuniões onde buscam qual será a catástofre mais provável de acontecer, para que insulflem os ânimos a respeito, de outros veículos e da própria sociedade.



O grande cavalo de batalha dos colunistas econômicos - a inflação fora do controle – também não se concretizou: a inflação deve fechar em 6% em 2013, ou seja, dentro da meta estabelecida pelo Banco Central de até 6,5%.



A ordem reinante na imprensa comercial era pregar que essa meta seria estourada logo no início do segundo semestre e para convencer o público levavam para a telinha os “maiores especialistas“, engravatados de universidades e instituições financeiras.



As capas de Veja e Época e o colar de tomates usado por Ana Maria Braga em seu programa, para aterrorizar as donas de casa de todo o país com a fantasma da volta da inflação, entram agora para a história como algumas das mais rídiculas tentativas de generalizar um problema simplesmente sazonal.



O economista-chefe e sócio do Banco Itaú Unibanco, Ilan Goldfajn, afirmou em palestras que a capacidade do Brasil crescer não ultrapassa os 4% e em artigos publicados no jornal O Estado de S. Paulo, pregou o “esfriamento” da economia, deixando claro acreditar que somente o desemprego frearia a demanda e impediria a inflação. Infelizmente ele não está sozinho, outros figurões da economia defendem também a tese do desemprego como política anti-inflacionária.



O governo, no entanto, está vacinado contra os lobbys do gênero. Quando olhamos para trás o que enxergamos ao final de 2013 é um recorde histórico na geração de empregos, a maior do país desde 2002, com um aumento de massa salarial.



Quase todas as categorias tiveram reajustes acima da inflação com um ganho real em seus vencimentos. Isso sem falar da política governamental de recuperação do salário mínimo dos últimos anos.



Apesar da revista Veja, entre outro veículos, ter dado espaço a empresários que queriam denegrir a imagem do Brasil junto a investidores internacionais, criticando a montagem dos leilões de concessão de infraestrutura, o resultado foi o melhor possível.



O saldo do leilão do campo de Libra, do pré-sal, em outubro, resultou em bônus de R$ 15 bilhões para o caixa do governo, e a seguir a administração federal leiloou aeroportos e estradas com altos pagamentos pela exploração dos equipamentos e expressivo rebaixamento de pedágios. 



As apostas pessimistas em relação as contas públicas também não aconteceram e elas não mergulharam, em 2013, num rombo profundo, como diziam os comentaristas econômicos lobistas de plantão.



Os números oficiais do ministério da Fazenda, divulgados na sexta-feira, 27 mostram que o superávit primário (receitas menos despesas) alcançou R$ 28,8 bilhões em novembro, chegando a um saldo acumulado no ano de R$ 62,4 bilhões. Com as projeções para dezembro, as contas públicas fecharão no azul acima da meta de R$ 73 bilhões, estabelecida pelo governo.



Para o desespero da direita, apesar de todo o seu esforço em deturpar , a presidenta Dilma Rousseff fecha o ano com a popularidade de seu governo e de si própria em alta.



A mídia comercial brasileira deveria fazer como nos EUA optar claramente pela defesa de um ou outro candidado e não ficar defendendo interesses inconfessos, pregando teses impatrióticas.



Nestes momentos temos que tirar o chapeu para Delfim Netto, economista que vê os fatos com uma lupa histórica sem histerismos à direita ou à esquerda. Ele afirmou em artigo no jornal Valor Econômico, que o governo continua tendo todas as condições para conduzir sem sobressaltos a economia brasileira no próximo ano, por meio de ações que parecem seguras aos investidores e à sociedade brasileira.



O que me anima é que cada vez mais a grande imprensa deixa de ser hegemônica, diante da proliferação das mídias independentes na internet, onde cada vez mais se discute a realidade e os fatos de interesse da sociedade e não situações criadas pelo interesse de grupos econômicos.

Disponível em: A teoria do caos falhou | Folha Diferenciada

Sistema prisional. 'A decisão de Barbosa de não transferir Genoíno para SP é ilegal, arbitrária e desumana; e contraria o próprio STF' (Conceição Lemes)


“A decisão de Barbosa de não transferir Genoino para SP é ilegal, arbitrária e desumana; contraria o próprio STF”

publicado em 30 de dezembro de 2013 às 21:30

Genoino passa Natal e Ano Novo preso; Jefferson ainda não teve a prisão decretada pelo presidente do STF

por Conceição Lemes

Em novembro, logo após a “espetacularização midiática” da prisão dos réus da Ação Penal 470, o chamado mensalão, advogados, juristas, partidos e entidades lançaram manifesto de repúdio às medidas adotadas pelo ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF):

A decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal de mandar prender no dia da proclamação da República expõe claro açodamento e ilegalidade.
Sem qualquer razão meramente defensável, organizou-se um desfile aéreo, custeado com dinheiro público e com forte apelo midiático, para levar todos os réus a Brasília. Não faz sentido transferir para o regime fechado, no presídio da Papuda, réus que deveriam iniciar o cumprimento das penas já no semiaberto em seus estados de origem. Só o desejo pelo espetáculo justifica.
Tal medida, tomada monocraticamente pelo ministro relator Joaquim Barbosa, nos causa profunda preocupação e constitui mais um lamentável capítulo de exceção em um julgamento marcado por sérias violações de garantias constitucionais.
Não escrevemos em nome dos réus, mas de uma significativa parcela da sociedade que está perplexa com a exploração midiática das prisões e teme não só pelo destino dos réus, mas também pelo futuro do Estado Democrático de Direito no Brasil.

Celso Antônio Bandeira de Mello, um dos mais eminentes juristas brasileiros, assinou o manifesto. Em entrevista ao IGele sentenciou: “Joaquim Barbosa é um homem mau, com pouco sentimento humano”.

Referia-se, especificamente, à forma como Joaquim Barbosa conduziu a prisão de José Genoino, 67 anos, ex-deputado federal ex-presidente nacional do PT, que tem problemas graves de saúde.
Pois, além de “homem mau, com pouco sentimento humano”, Joaquim Barbosa é cruel; aparentemente tem prazer em causar dor alheia.

Genoino, devido à fragilidade de sua saúde, pediu ao STF para cumprir em casa os 6 anos e 11 meses de prisão em regime semiaberto a que foi sentenciado.

Em 2 de dezembro, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, recomendou para Genoino a prisão domiciliar durante 90 dias e reavaliação da situação após esse prazo.

Em  parecer a Joaquim Barbosa, Janot afirma:

29. “Diante das provas contidas nos autos, conclui-se que o requerente apresenta graves problemas (delicada condição de saúde) e que corre risco se continuar a cumprir a pena no presídio, onde as condições para atendimento de problemas cardiológicos são extremamente limitadas ou até inexistentes, no caso de ocorrências em período noturno ou nos finais de semana. Sua permanência  em cárcere,  por pouco mais de  dez   dias,   caracterizou-se  por  diversos   episódios   de   pressão   alta,  alteração na coagulação e outros sintomas que demandaram  não só consultas  médicas e exames,  mas também internação hospitalar [grifo em negrito é do próprio procurador-geral da República].

O presidente do Supremo levou 25 dias para se posicionar.
Na sexta-feira passada, 27 de dezembro, ele acatou os 90 dias de prisão domiciliar sugerido por Janot.

Porém, negou o pedido de transferência de Genoino para São Paulo a fim de cumprir, provisoriamente, a pena domiciliar.  Mais. Adiantou que é “forte” a probabilidade de Genoino voltar para o Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília:

“O preso não pode escolher, ao seu livre alvedrio e conveniência, onde vai cumprir a pena que lhe foi definitivamente imposta.
Por fim, considerada a provisoriedade da prisão domiciliar na qual o condenado vem atualmente cumprindo sua pena, e a forte probabilidade do seu retorno ao regime semi-aberto ao fim do prazo solicitado pela Procuradoria-Geral da República, considero que a transferência ora requerida fere o interesse público”.

DOIS PESOS E MEDIDAS ATÉ NA DOENÇA: GENOINO ESTÁ PRESO HÁ 45 DIAS; JEFFERSON, LIVRE

Em 11 de dezembro, denunciamos:  No STF, Genoino teve os seus direitos violados como paciente, enquanto Jefferson, não.

O laudo da perícia médica em Genoino, feita por doutores da Universidade de Brasília (UnB), foi vazado para a imprensa sem que ele fosse consultado previamente se autorizava ou não a publicização. Todos os indícios apontam que vazamento ocorreu vazou no próprio STF e não antes.

Já sobre a perícia médica realizada por especialistas do Instituto Nacional do Câncer (Inca)em Roberto Jefferson, delator do “mensalão”, só foi divulgada a conclusão. Condenado a 7 anos e 14 dias de reclusão em regime semiaberto, ele também pediu ao STF para cumprir a pena em casa devido à situação da saúde.

Não é única diferença de tratamento dispensado aos réus do “mensalão”.
Genoino está preso há 45 dias. Inicialmente na Papuda, em Brasília, e desde 24 de novembro em prisão domiciliar provisória. Nessa condição, passou Natal e passará o Ano Novo.
Já Jefferson, não. Joaquim Barbosa ainda não decretou a sua prisão, apesar de ter pena maior e oprocurador-geral já ter-se pronunciado contra a sua prisão domiciliar.

Até agora, com exceção de Genoino, todos os réus do mensalão que pediram para cumprir a pena perto de suas casas, tiveram o pedido aceito por Barbosa.  Por exemplo, José Roberto Salgado e Vinicius Samarane, respectivamente  ex-vice-presidente e ex-dirigente do Banco Rural, e os ex-deputados Pedro Henry, Pedro Correa e Romeu Queiroz.

“É direito do preso cumprir a pena próximo da sua família”, afirma o advogado Patrick Mariano em entrevista ao Viomundo. “A não autorização da transferência de Genoino para São Paulo é  uma decisão ilegal, arbitrária e que não se sustenta por qualquer ângulo analisado. Fere tanto a jurisprudência do STF quanto a Lei e Constituição da República.”

Patrick Mariano é mestre em Direito, Estado e Constituição pela UnB e integrante da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares – Renap.

Segue a íntegra da entrevista que concedeu a esta repórter.

Viomundo — O que diz a lei brasileira sobre o local de cumprir pena?

Patrick Mariano — O artigo 1º da Lei de Execução Penal é bem claro ao anunciar a finalidade da execução da pena: proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.
Por sua vez, o artigo. 86 da mesma Lei diz: as penas privativas de liberdade aplicadas pela Justiça de uma Unidade Federativa podem ser executadas em outra unidade, em estabelecimento local ou da União.
Portanto, o cumprimento de pena deve observar o melhor para a chamada ressocialização do condenado. Isso implica, no caso concreto, não só na possibilidade legal de se cumprir a pena próximo aos seus, mas em verdadeiro comando da Lei para que isso ocorra.
As antigas penas de degredo, em que o condenado era levado para além mar, pertencem, ou deveriam pertencer, à triste lembrança de livros história. A Lei de Execuções, que é de 1984 e inspirada em recomendações e textos da ONU, deve ser a direção para toda e qualquer decisão judicial neste tema.

Viomundo – No caso de Genoino e demais apenados da AP 470, dois pesos e duas medidas dentro da mesma ação?

Patrick Mariano — Eu diria que uma decisão fora dos parâmetros legais que acabei de mencionar fere a dignidade da pessoa humana. Não é só isso. Contraria a jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal que, em julgamentos parecidos, decidiu favoravelmente aos réus. Leia-se o habeas corpus de nº 105.175, de relatoria do ministro Gilmar Mendes e o HC 71.179, relatoria do ministro Marco Aurélio. Esse último vale a pena citar um trecho:
“Tanto quanto possível, incumbe ao Estado adotar medidas preparatórias ao retorno do condenado ao convívio social. Os valores humanos fulminam os enfoques segregacionistas. A ordem jurídica em vigor consagra o direito do preso de ser transferido para local em que possua raízes, visando a indispensável assistência pelos familiares. Os óbices ao acolhimento do pleito devem ser inafastáveis e exsurgir aoprimeiro exame, consideradas as precárias condições do sistema carcerário pátrio. Eficacia do disposto nos artigos 1. e 86 da Lei de Execução Penal – Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984 – (…)”.

Viomundo – Essa decisão de Joaquim Barbosa caracterizaria o quê?

Patrick Mariano – Segundo o presidente do Supremo, a sua decisão em relação a Genoino foi baseada em dois motivos. O primeiro é o de que “o preso não pode escolher, ao seu livre alvedrio e conveniência, onde vai cumprir a pena que lhe foi imposta”. E segundo, porque a transferência pleiteada feriria o “interesse público”.

Viomundo – O senhor concorda?

Patrick Mariano  – A primeira argumentação, com o devido respeito, não se sustenta porque o preso escolheu estar perto da sua família, como preceitua a Lei de Execução do seu País. Não se trata de livre vontade ou conveniência, se trata de direito! É direito do preso cumprir a pena próximo da sua família. Como disse, pena de banimento e degredo foram utilizadas em regimes monárquicos. Não cabem na Democracia.
O segundo argumento, “interesse público”, fere o inciso IX do artigo 93 da Constituição da República de 1988. Este artigo exige fundamentação válida de todas as decisões judiciais.
Ou seja, obriga o magistrado a demonstrar, com amparo legal, a lógica da sua decisão com postulados válidos, lógicos e racionais. O uso de termos abertos, que tudo e nada dizem, acaba por servir para encobrir as reais motivações do ato decisório. São as chamadas idiossincracias do magistrado que devem ser evitadas.
Qual interesse público foi ferido? De quem? Perceba que há um vácuo que encobre as reais motivações? Seria quase o mesmo que dizer, “porque eu quis”. Raduan Nassar tem uma passagem linda que diz: “foi o senhor mesmo que disse há pouco que palavra é uma semente: traz vida, energia, pode trazer inclusive uma carga explosiva no seu bojo: corremos graves riscos quando falamos”.
Desta forma, tanto pela jurisprudência do STF, quanto pela Lei e Constituição da República, não resta dúvidas de que a decisão em relação a Genoino é decisão ilegal, arbitrária e que não se sustenta por qualquer ângulo analisado.
*****

Esses esclarecimentos do advogado Patrick Mariano tornam ainda mais difícil compreender o tratamento ostensivamente diferente dispensado pelo presidente do Supremo aos dois réus.

Por que Barbosa martiriza Genoino e alivia para Jefferson, já que ambos têm de problemas graves de saúde, que exigem cuidados especiais e deveriam ter direito à prisão domiciliar?

O aceno “forte” de Genoino de voltar para a cadeia em fevereiro seria o troco de Barbosa  por Jefferson não ter conseguido a prisão domiciliar?
Ou uma forma de pressão a favor do seu protegido?
Ou será que deixará a batata quente para ser resolvida nas suas férias pelo seu desafeto, o ministro Ricardo Lewandowski, que em 10 de janeiro, assume a presidência do STF?

Independentemente de quem seja a decisão, eu, Conceição Lemes, como já disse aqui, acho que se deveria conceder prisão albergue domiciliar permanente  tanto a José Genoino quanto a Roberto Jefferson. Questão de direito e humanidade.

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