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quarta-feira, 31 de julho de 2013

Os intelectuais e a esfera pública (Emir Sader)

26/07/2013

Os intelectuais e a esfera pública



O governo Lula surpreendeu aos intelectuais, que ficaram desarmados sobre como reagir. Estavam despreparados para encarar um governo que se propunha a enfrentar a herança neoliberal nas condições realmente existentes.

A primeira atitude foi a mais tradicional nos intelectuais de esquerda: a deníncia de “traição” do Lula, que haveria herdado e mantido o governo neoliberal de FHC e seu programa. A nomeação da equipe econômica seria a prova irrefutável do crime.

Essa concepção foi adotada desde um primeiro momento pelos intelectuais da ultra esquerda, com seus esquemas pré-fabricados de que todo partido “social democrata”, quando chega ao governo, “trai” a classe trabalhadora e se assume como governo “burguês”, de direita, que apenas administra a crise capitalista, enganando a classe trabalhadora. Só viram no governo Lula a “confirmação” do que sempre – eles e seus antepassados políticos – previam.

A eles se juntaram os que acompanhavam, com bastante desconfiança, a vitória do PT e, diante da primeira circunstância, se distanciaram, com denúncias similares às mencionadas acima, sem nenhuma criatividade. O PT teria se aburguesado, se distanciado de suas bases tradicionais, se adequado à herança recebida e fazia um governo de continuidade com o governo de FHC. Houve até mesmo economistas que tentaram provar que não teria existido sequer “herança maldita” que demandasse políticas específicas para herdá-las, que tudo eram mentiras do governo Lula para justificar medidas econômicas conservadoras.

Na crise de 2005, intelectuais da extrema esquerda aderiram ao coro de denúncias da direita contra o governo Lula. Abandonaram qualquer crítica à política econômica e se centraram em que a “traição” teria ganhado contornos morais, com a corrupção grassando em todo o governo Lula.

Perderam o norte do mundo contemporâneo, em que o capitalismo assumiu o modelo neoliberal, que busca a mercantilização de tudo. Se somaram ao liberalismo, na sua crítica ao Estado, de que as denúncias de corrupção são um capítulo.

Terminaram fazendo da crítica ao governo Lula e ao PT seu objetivo fundamental, aliados à direita – em particular a seus espaços midiáticos – e terminando grotescamente, assim, sua trajetória intelectual.

Seguem nesse lugar, sem revelar nenhuma capacidade de análise e compreensão do Brasil e da América Latina contemporâneas, com o que não captam a natureza e o estado atual da luta pela superação do modelo neoliberal.

Os intelectuais de direita, que se haviam reanimado com os governos Collor, Itamar e FHC, revigorados pelo fim da URSS e, com ela, o fracasso do Estado, se mobilizaram no apoio às versões brasileiras do projeto neoliberal, de forma eufórica. Conseguiam retomar a ofensiva diante da esquerda, com um projeto que se pretendia “modernizador” e desqualificava a esquerda como pré-histórica.

Uniram-se intelectuais tradicionais da direita – vários deles que haviam estado com a ditadura –, mais intelectuais tucanos e economistas acadêmicos, em torno da liderança de FHC. Tiveram o gosto de derrotar o Lula e o PT duas vezes, pretendiam ter chegado ao poder por 20 anos e ter derrotado de vez a esquerda.

Naufragaram com o fracasso do governo FHC. Nem foram capazes de fazer um balanço da experiência desse governo e diagnosticar a derrota do candidato de continuísmo – que, na própria distância em relação ao governo de FHC, confessava sua derrota.

A intelectualidade de esquerda que não se rendeu à fácil versão da “traição” do governo Lula manteve seu apoio ao governo e ao PT, mas em geral sem teorizar as razões desse apoio. Haviam ficado na defensiva diante dos caminhos inesperados adotados pelo governo Lula e as acusações de corrupção levantadas contra ele. Se passava a uma situação claramente de defensiva diante da ofensiva da direita e da ultra esquerda.

Foi o enfrentamento dessa crise pelo governo Lula e a vitória eleitoral de 2006 – que revelava as novas bases populares que as políticas sociais tinham conquistado para o governo e para a esquerda – que projetaram uma nova imagem do governo. A ideia de que, pela primeira vez, mesmo se por caminhos inesperados e até mesmo reprovados pela esquerda – como os elementos conservadores da política econômica –, a fisionomia social do país tinha mudado, de forma significativa, e pela primeira vez a esquerda tinha uma base realmente popular, voltou a sensibilizar a setores da intelectualidade da esquerda. 

O apoio ao governo veio, sobretudo, das conquistas sociais dos setores populares e, em menor medida, da política externa soberana do governo. A confiança na figura do Lula comandou essa retomada de apoio dos intelectuais de esquerda ao governo.

Mas sem ainda teorizar as razões do sucesso do governo. É esse processo que precisa ser dinamizado, para retomar uma interação entre o pensamento crítico e os governos do PT, que tinha sido deixada de lado. O pensamento social necessita rearticular-se com os processos políticos contemporâneos – o brasileiro e o latino-americano – e os governos e os partidos de esquerda precisam da oxigenação do pensamento crítico.

Essa retomada deve se centrar no balanço da luta pela superação do modelo neoliberal e nos traços fundamentais de uma sociedade fundada na esfera pública, na universalização dos direitos, na democratização radical da economia, da política e da vida cultural.


Postado por Emir Sader às 08:25

(http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=1290). 

Danos morais. R$ 20mil. Mulher indenizará ex-marido por omitir que caçula é filho de outro homem (TJMG)...

31/Jul/2013
Mulher é condenada a indenizar ex-marido por revelar que caçula é filho de outro homem
Casal manteve união por 20 anos e teve três filhos. O mais novo, no entanto, foi concebido em relação extra-conjugal e o marido só soube que não era pai biológico do menino quando ele já tinha 5 anos

Publicação: 31/07/2013 19:27 Atualização:

A Justiça condenou uma mulher a indenizar o ex-marido em R$ 20 mil por danos morais. O motivo é a revelação, feita por meio de uma carta, de que o caçula dos três filhos do casal era, na verdade, filho de outro homem, concebido em relação extraconjugal. A condenação ocorreu em primeira instância, mas a mulher recorreu. Porém, o recurso foi negado e a sentença mantida.

De acordo com o Tribunal de Justiça, o homem ajuizou ação contra a ex-mulher alegando ter sofrido profundo abalo psicológico, o que o obrigou a ter despesas com tratamento psiquiátrico, após saber que o menino que criou por cinco anos não era seu filho biológico. Ele e a mulher se separaram depois de 20 anos de casamento. Em outubro de 2004, a separação judicial foi convertida em divórcio e, em dezembro do mesmo ano, a mulher casou-se com outro homem.

Seis meses depois, o homem recebeu uma carta da ex-mulher, na qual ela relatava ter confirmado, por meio de exame de DNA, que o caçula era filho do atual marido e que ele exigia reconhecer a paternidade do menino. No processo, segundo o TJ, a mulher argumentou que quando engravidou do terceiro filho já não mantinha compromisso matrimonial com o marido, mas viviam sob o mesmo teto por acordo mútuo para criarem juntos os dois filhos. Assim, ela buscou afirmar que não cometeu adultério.

O juiz Paulo Rogério de Souza Abrantes, da Comarca de Belo Horizonte, entendeu que houve dano moral e condenou a mulher a indenizar o ex-marido em R$20 mil, além de pagar mais R$ 267,83 pelos gastos que o homem teve com medicamentos. Ela recorreu da decisão, mas não obteve êxito. A sentença foi mantida pela 16ª Câmara Cível do TJMG. 

Segundo o TJ, o desembargador relator do recurso, Francisco Batista de Abreu, entendeu que o homem foi ferido em sua honra. “Além do desgosto de perder a paternidade do filho que sempre criou como sendo seu, foi ele exposto a humilhações e vexames perante seus familiares e demais pessoas da sua convivência, porque vítima de traição conjugal”, argumentou o magistrado. Os desembargadores Sebastião Pereira de Souza e Otávio de Abreu Portes acompanharam o voto do relator.

Disponível em: Mulher é condenada a indenizar ex-marido por revelar que caçula é filho de outro homem

Danos morais. R$ 8 mil. Inquilina surpreendida nua será indenizada pelo proprietário que invadiu apartamento. TJMG.

31/Jul/2013... Atualização 19/nov/2014...



Inquilina é indenizada por invasão de seu domícílio

Publicado por Tribunal de Justiça de Minas Gerais (extraído pelo JusBrasil) e mais 3 usuários 2 dias atrás
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A 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve a decisão do juiz Richardson Xavier Brant da comarca de Montes Claros, que condenou A.B.F a pagar indenização por danos morais, no valor de R$ 8 mil, a N.S.A.P, que teve seu domicílio invadido.
N.S.A.P entrou com ação de indenização por danos morais contra A.B.F em decorrência da invasão do seu domicílio, um apartamento que ela locou do réu. A autora conta que, no momento em que sua residência foi invadida, ela passou por grande constrangimento, uma vez que se encontrava completamente despida. Ela solicitou que o invasor se retirasse e, diante da negativa, chamou a polícia, que lavraou um Boletim de Ocorrência.
Citado, o réu apresentou contestação e alegou que a entrada no imóvel foi ocasionada para reparar defeito na instalação hidráulica e que, após chamar várias vezes a requerente, julgou que ela não estava em casa, procedendo à entrada no imóvel com o auxílio de um chaveiro. Após o julgamento em 2ª Instância, A.B.F recorreu, no sentido de se reformar a sentença, sob a alegação de que não houve dano moral.
O relator do processo, desembargador Rogério Medeiros, manteve a decisão do juiz de 1º Grau e, em seu voto, concluiu que não resta dúvida de que houve a invasão de domicílio, o que por si só caracteriza situação que gera dano moral indenizável. O desembargador acatou os valores fixados na sentença e determinou que a correção monetária deverá incidir pelos índices da Corregedoria-Geral de Justiça (CGJ) a partir da publicação da sentença.
Os desembargadores Estevãso Lucchesi e Valdez Leite Machado, respectivamente, revisor e vogal, votaram de acordo com o relator.
Processo: 1-0433.09.272087-2/002

Concursos Públicos e a Emenda 45 (Roberto Victor Pereira Ribeiro)

31/Jul/2013
Concursos Públicos e a Emenda 45
O mister das profissões jurídicas tem um hiato que se constitui no período antes da Emenda 45 e depois da Emenda 45.
Hodiernamente, para ocupar cargos públicos, o candidato tem que observar os ditames propostos pelo ordenamento jurídico e pelo edital do concurso a que irá se submeter. Até aqui está claro.
Com o advento da Emenda 45 de 2004, criou-se um novo requisito sine qua non para o preenchimento dos cargos pleiteados. Estou falando da famigerada "atividade jurídica". As carreiras da Magistratura judiciária e do Ministério Público, além de cargos como Defensor Público ou Procurador do Estado, exigem a comprovação do exercício efetivo de três anos de atividade jurídica.
Neste ínterim, surge um questionamento plausível: o que é atividade jurídica? Como perfazer os três anos de atividade jurídica?
Buscando doar uma clareza solar ao imbróglio, o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público editaram resoluções esclarecendo o tema.
Para as duas instituições, considera-se atividade jurídica, dentre outras demonstradas nas Resoluções, o efetivo exercício da advocacia, mediante a participação mínima em cinco atos privativos de advogado durante o percurso de um ano.
Ainda assim, surgem várias dúvidas comprometedoras. Devemos contar o tempo a partir de quando? Durante o ano é preciso ter cinco atos privativos de advogado, mas tem que ser durante os doze meses? Quando preciso comprovar que efetivamente tenho os três anos de atividade jurídica?
O Supremo Tribunal Federal através da ADIN 3460/DF com voto do eminente Ministro Carlos Ayres Brito, definiu que o marco inicial para a contagem de tempo será a data de conclusão do curso, e não a da colação de grau. Digamos que um quintanista de Direito se submeta à prova da Ordem dos Advogados do Brasil, logre aprovação, no momento em que concluir o curso, este estará automaticamente apto a exercer a atividade jurídica de advogado. Mesmo que sua colação ocorra 1 ou 2 meses depois.
Outro entendimento pacificado é o de que se o aluno conclui o curso em novembro e obtém a aprovação na OAB, este poderá durante o mês de novembro e dezembro preencher os cinco atos privativos de advogado e o ano será contado em cheio, como se tivesse sido laborado em doze meses. Logo ele já tem um ano na contagem. O momento de apresentação dos três anos de atividade jurídica ainda é algo tênue em nossos tribunais superiores, entretanto, devemos nos ater com maior perlustração na doutrina e entender a seguinte fórmula: a Emenda diz que a prova deve ser no momento do "ingresso na carreira" e, administrativamente falando, este ingresso só ocorre na posse e não nas inscrições definitivas como querem alguns juristas, inclusive Ministros do STF. É uma questão de ciência jurídica. Só se ocupa um cargo após a posse, logo só precisa haver o preenchimento dos requisitos no momento em que houver "ingresso na carreira", isto é, no momento da posse.
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(*) O autor é membro do Conselho Editorial da Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal.
(http://www.editoramagister.com/doutrina_24665648_CONCURSOS_PUBLICOS_E_A_EMENDA_45.aspx). 

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Novo CPC deve mudar cultura de litigância excessiva (Alexandre Freire e Outros)

29/jul/2013... Atualização 06/dez/2014...

Artigos
16julho2013

Novo CPC deve mudar cultura de litigância excessiva


Tramita atualmente na Câmara dos Deputados o Projeto do Novo Código de Processo, o qual está em fase final de discussão.
Para além de uma discussão marcada pelo jargão jurídico tradicional, este texto pretende analisar como o novo CPC pode facilitar o fluxo de trocas comerciais e melhorar a vida das pessoas.
Isso tudo colocado, podemos iniciar essa discussão focando-nos na principal matriz que norteou a elaboração da nova legislação: a valorização dos precedentes judiciais.
Embora essa discussão não seja nova, e tenha sido aperfeiçoada pela chamada de “técnica de julgamento por amostragem” do artigo 543-C do CPC atual (onde, numa casca de noz, o Superior Tribunal de Justiça decide um caso concreto numa demanda repetitiva ficando um entendimento a ser adotado nos casos análogos), parece-nos que ela ficou incompleta. Afinal de contas, no Brasil continuamos a litigar excessivamente e a nossa formação jurídica, voltada para uma cultura da litigância, parece ainda ignorar que, com pequenas mudanças institucionais, podemos trazer melhorias sociais significativas.
Com efeito, o Poder Judiciário brasileiro continua assoberbado de processos dos quais não consegue dar conta. Além disso, diante do cenário de baixo crescimento econômico que vem sendo realizado nos últimos anos, aliado à perspectiva de crescimento igualmente baixo para os próximos, isso certamente refletirá na arrecadação tributária do Estado, por conseguinte, na quantidade de repasses orçamentários para os diversos tribunais do país.
Assim, a não ser por inovações técnicas que aumentem a eficiência da prestação jurisdicional sem implicar aumento de despesa (como ocorre no processo eletrônico, que certamente poupará espaço físico dos fóruns, diminuindo a quantidade de despesas correntes com o acervo imobiliário do Judiciário) ou por diminuição da “demanda indesejada de litigância”, dificilmente conseguiremos manter um Poder Judiciário confiável no sentido de conferir ao país a segurança jurídica necessária para que volte a ser um local atrativo para investimentos consistentes. Isto é, ou melhoremos a qualidade da oferta de decisões judiciais ou diminuamos a quantidade demandada. Para termos uma ideia da dimensão do problema, no ano de 2011, cada ministro do STJ recebeu, em média, um processo a cada dez minutos, enquanto julgou um a cada dezessete (nisto compreendido o tempo necessário para a análise, para a compreensão de controvérsias e de pretensões das partes, para a redação de decisão/voto e, eventualmente, para a submissão do caso aos órgãos colegiados, e isto sem falar em eventuais recursos — agravos regimentais, embargos de declaração e de divergência eventualmente manejados pelas partes no âmbito interna corporis da própria Corte Superior). Fica bem claro que, no atual arcabouço institucional, a oferta do serviço jurisdicional não consegue atender a contento a sua demanda.
Diante desse panorama, é imperioso que o Poder Judiciário não só consiga nortear as decisões dos juízes inferiores e a vida social, mas também, que recupere o seu crédito perante a sociedade como um todo otimizando o seu desempenho. Todavia, não podemos esquecer que a melhoria do desempenho do Poder Judiciário não é a salvação da lavoura, mas sim, uma das várias reformas institucionais necessárias no Brasil para melhorias marginais no ambiente de mercado.
Pois bem, a valorização dos precedentes constitui-se em síntese, num forma de pensamento que procure justamente evitar que o Poder Judiciário seja atravancado por uma série de demandas inúteis, como ocorre atualmente no cotidiano processual.
Mas, aqui, precisamos esclarecer o que se entende pela utilidade do precedente.
Um precedente é necessário quanto estamos diante de um ambiente de incerteza jurídica sobre qual deve ser a regra aplicável para uma situação de fato e as pessoas não conseguem se entender, seja porque temos mais de uma norma jurídica que possa ser aplicável (ao que se denomina de antinomia jurídica), seja porque temos uma omissão sobre o caso em questão (ao denominamos de lacuna).
Além disso, essas decisões não podem levar muito tempo para serem proferidas. É muito comum atualmente que vários processos que discutam a mesma questão jurídica de fundo levem aproximadamente uma década (ou mais que isso) para que o Poder Judiciário adote uma posição a respeito. Essa demora, na prática, inviabiliza a própria compreensão de que um precedente deve ser, assim como as leis formais, algo a ser incorporado no cotidiano da vida das pessoas. Afinal de contas, você, tendo que cuidar de sua vida e de seus afazeres, esperaria dez anos para saber que decisão tomar num ambiente de incerteza jurídica?
E, nesse cenário, o projeto do CPC inova bastante ao instituir o chamado incidente de resolução de demandas repetitivas, onde um tribunal, tão logo seja verificada a presença de uma “litigância em massa” para uma determinada questão jurídica, pode desde logo (e sem que haja decisão prévia em primeira instância) estabelecer o entendimento aplicável ao caso, vinculando os demais juízes das instâncias inferiores para os casos futuros. Essa possibilidade de o tribunal “chamar para si” esse julgamento — seja diretamente, seja por provação de alguma parte, do Ministério Público etc., — certamente reduzirá bastante o tempo mediante o qual serão estabelecidos os precedentes. E isso não está no CPC atual.
Assim, os precedentes judiciais devem ser estáveis e devem ser emitidos sem demora para que possam ser compreendidos de maneira clara e precisa dentre os vários atores sociais. Isso, por sua vez, permite uma maior eliminação das dúvidas sobre quem deve ser o titular de um direito numa situação de conflito tende a diminuir o problema de subinvestimento, pois as pessoas poderão trabalhar com uma maior margem de segurança no seu processo de tomada de decisões, uma vez que já saberão como os juízes decidirão sobre um dado ponto. Isso é, uma alocação mais clara de direitos por meio precedentes é algo socialmente mais eficiente que o cenário de indefinição jurisprudencial (seja pela ausência de precedentes, seja pela presença de precedentes antinômicos), pois cria um ambiente mais propício para trocas e para uma cultura de mercado, que historicamente (e apesar de todas as suas falhas) revelou-se como o arranjo mais notável de desenvolvimento do bem-estar humano e da qualidade de vida das pessoas.
Enfim, o ordenamento jurídico, para que possa servir como instrumento de desenvolvimento e para a melhoria das pessoas, deve assegurar que o cidadão comum não tenha sua liberdade e seus bens confiscados arbitrariamente. Isso é condição essencial de existência de qualquer sociedade que pretenda se inserir num círculo virtuoso de desenvolvimento. E isso não é assegurado apenas pela lei em sentido formal, mas também pelos precedentes judiciais que eliminam dúvidas que possam ocorrer sobre a aplicação das próprias leis e proteger o cidadão contra investidas oportunistas de grupos extratores de renda. É a segurança ofertada pelas instituições e a confiança por elas inspirada que, ao fim a ao cabo, criam um ambiente mais favorável para a efetivação de contratos e proteção de direitos de propriedade e são o fator determinante para se entender a discrepância entre os níveis de desenvolvimento da África subsaariana e os países do Atlântico Norte.
Para se ter uma ideia do risco que a indefinição pode acarretar, vejamos a seguinte situação: um determinado produtor de soja vendeu, em 2003, a sua produção para a safra de 2004 a um determinado intermediário, fixando o preço para o mercado futuro no valor de US$ 100 a saca. Em 2004, percebeu-se que, na bolsa de Chicago, onde tal commodity é negociada, o seu valor chegou a US$ 120,00 a saca. O produtor agora requer judicialmente o desfazimento do negócio sob o fundamento de que essa valorização seria algo “extraordinária” e “imprevisível”. Enfrentando a questão, alguns tribunais brasileiros entenderam para procedência dos pedidos de resolução contratual. Como consequência de tais precedentes, o mercado de compra antecipada de soja ficou comprometido durante algum tempo, pois vários dos potenciais adquirentes ficaram hesitantes em realizar tais pactos em virtude do risco adicional criado pelo cenário de insegurança jurídica de tais precedentes. Felizmente, o STJ, após alguns precedentes em sentido contrário, entendeu que a variação do preço da saca da soja ocorrida posteriormente à celebração do contrato não se consubstancia acontecimento extraordinário e imprevisível, inapto, portanto, à revisão da obrigação com fundamento em alteração das bases contratuais.
Assim, um processo judicial será útil quando servir para contribuir para a formação de um precedente judicial que elimine (ou pelo menos, diminua) o ambiente de incerteza normativa acima descrito. Por outro lado, ele será socialmente inútil quando não servir para a formação de um precedente, uma vez que, nesse caso, consistirá apenas num custo perdido para a sociedade sem qualquer contrapartida, especialmente tendo em vista que, nesse último caso, as partes certamente tinham informações simétricas em relação ao padrão de decisão do Poder Judiciário e poderiam, assim, celebrar um acordo para prevenção de litígios.
E é justamente dentro desse contexto que esperamos que o novo CPC traga as suas inovações socialmente mais benéficas e que o Brasil, com o tempo, mude a sua matriz cultural de uma litigância excessiva para um padrão de litigância mais “selecionada”, onde a formação do operador se volte muito mais para identificação de possibilidades de composição do que para a apresentação de uma petição perante o Poder Judiciário como solução prioritária para uma situação de conflito.

Alexandre Freire é doutorando em Direito Processual Civil pela PUC-SP, mestre em Direito Constitucional pela UFPR, pesquisador do Núcleo de Processo Civil da PUC-SP, professor da pós-graduação em Direito Processual Civil da PUC-RJ, professor da Pós-graduação em Direito Processual Civil da USP (FDRP), professor da Escola Paulista de Direito-EPD, professor convidado da Associação dos Advogados do Estado de São Paulo-AASP, professor da Escola Superior de Advocacia da OAB-SP, membro do IBDP.
Bruno Dantas é conselheiro e presidente da Comissão Permanente de Articulação Federativa e Parlamentar do Conselho Nacional de Justiça. Consultor do Senado Federal, doutorando em Direito Processual pela PUC-SP, mestre em Direito Processual Civil pela PUC-SP, professor do IDP-DF e membro das comissões de juristas encarregadas de elaborar o anteprojeto do Código de Direito Processual Civil e do Código de Direito Empresarial. Secretário-geral e fundador da Academia Brasileira de Direito Processual Constitucional.
Leonardo Albuquerque Marques é advogado da União, mestre em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) – 2010; doutorando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; membro associado da Associação Brasileira de Direito e Economia; e Diretor de Comunicação da Associação Nacional dos Advogados da União.
Revista Consultor Jurídico, 16 de julho de 2013

sábado, 27 de julho de 2013

A privatização do parlamento brasileiro (Cristóvão Feil)



 29/08/2005
POLÍTICA & SOCIEDADE

A privatização do parlamento brasileiro

A crise que vivemos hoje no Brasil aponta para a necessidade de uma reforma político-eleitoral urgente. O modelo atual, privativo das classes proprietárias e a serviço de um mosaico de interesses econômicos, está falido e só produz aberrações e deformidades.



O parlamento brasileiro não é republicano. Para ser republicano deveria deixar de ser privativo das classes proprietárias. O meio milhar de parlamentares de Brasília estão a serviço de um mosaico de interesses econômicos. Apenas menos de cem tem alguma preocupação com o chamado interesse público, fundado em matriz republicana. Esse dado indesmentível é a usina dos sucessivos escândalos que abalam o País. Acrescido do fato de o Poder Executivo ser refém desses interesses particularistas. Na raiz disso está um formulismo eleitoral que desmembra a maioria conquistada na votação majoritária daquela votação pulverizada obtida na escolha proporcional de deputados. A chamada governabilidade é fruto bichado que resulta do aliciamento de votos junto aos deputados mais sensíveis à força das prebendas e dos mimos. Tudo fica rebaixado ao nível das sarjetas. A República é apenas um nome, o que conta é a veniaga.

A agudização da crise política, para além da tarefa de separar o justo do meliante, deve apontar as saídas que superem esse quadro histórico de conseqüências degradantes.

Mais que o petismo, o lulismo, que empalmou nominalmente o poder em 2003, paga o preço por ter seguido os passos malditos da tradição brasileira. Não quis ousar fazer a reforma político-eleitoral por comodismo ou por conveniência de alguns quadros e dirigentes (e intelectuais orgânicos dessa condução deletéria) que já eram estranhos às bandeiras do partido. Preferiram a adesão incondicional ao sistema-pântano. Darwin ensinou que as espécies sempre procuram buscar o seu habitat de origem; podem até migrar, mas um dia voltam para casa. O modelo de alianças adotado para garantir a “governabilidade” reforça a tese de que ninguém contraria a sua natureza, a sua pulsão vital. Não há força racionalista que seja capaz de impedir o impulso primitivo de certos indivíduos.

Thomas Hobbes, no século 17, entendeu que o Estado seria essa força de coerção do “estado de natureza” de indivíduos e grupos. Mas, e quando o Estado está anômico, desprovido de instrumentos e regramentos que coibam a ação continuada dos malfeitores sociais? Ora, há que dotá-lo desses aparatos, sob pena de graves responsabilidades históricas recairem sobre os condutores do Estado, marcando-os com as tintas do esquecimento e do desprezo popular. 

A reforma política

A conjuntura crítica que vivemos hoje no Brasil aponta a necessidade de uma reforma político-eleitoral urgente. O modelo político-eleitoral-partidário brasileiro está esgotado, incapacitado para dar frutos sãos, só aberrações e deformidades. A forte influência do poder econômico corrompe as regras do jogo, onde a democracia formal transfigurada é uma caricatura de si própria. A representação pública deixa de ser popular e pública para ser a representação de setores e lobbies de interesses econômico-financeiros, num processo de crescente privatização de blocos inteiros do parlamento brasileiro.

No quadro atual, o presidente da República, embora tenha logrado conseguir cerca de 62% dos votos dos eleitores e, portanto, reunindo numericamente soberania e legitimidade suficiente para desenvolver e implementar seu projeto político, na prática está refém daqueles parlamentares privatizados. Como superar isso? Com uma reforma política, com as seguintes modificações:

Voto em lista pré-ordenada

Partidos ou federações de partidos apresentam uma lista de candidatos, do presidente da República a senadores e deputados. A lista mais votada elege o presidente e tantas cadeiras no parlamento quanto for o percentual alcançado nas urnas. Se esse sistema eleitoral estivesse vigorando em 2002, o candidato Lula, que então alcançou 62% das preferencias de voto, teria no Congresso 62% de deputados e senadores relativamente ao total de vagas existentes. Estaria, portanto, em tese, assegurado ao Executivo os votos necessários à aprovação democrática dos seus projetos de governo. A lista de candidatos proporcionais seria pré-ordenada, conforme disputa democrática interna nas convenções partidárias, e os critérios de preenchimento dos lugares na lista seria de livre deliberação do partido e seus militantes, ou da federação partidária do qual ele faça parte. 

Financiamento público de campanhas

Financiamento público exclusivo de campanhas eleitorais. Estima-se o valor de sete reais por eleitor o custo para o orçamento público de campanhas eleitorais, num total de 900 milhões para um pleito nacional como o do ano de 2002. A estimativa do custo total da campanha de 2002, somando os gastos de todos os partidos em todos os Estados da Federação, foi ao redor de 9 bilhões de reais. Nessas alturas astronômicos voam somente os pássaros agourentos da corrupção e da privatização de mandatos parlamentares. 

Auditoria de campanhas

Auditoria pública durante a campanha eleitoral para verificação de balanço e caixa dos partidos. As campanhas seriam auditadas pela Justiça Eleitoral (e outras instituições públicas de apoio) 90 dias antes do pleito, 60 dias antes do pleito, e 30 dias antes do dia da votação geral. As prestações de contas depois do pleito seriam feitas até o trigésimo dia do mesmo, com auditagem geral de todo o processo eleitoral e divulgação na internet dos resultados parciais e totais.

Outras medidas podem ser acrescentadas a esse alinhavo mínimo. Lula, no seu discurso de posse, em janeiro de 2003, falou sobre a necessidade de uma reforma político-eleitoral. Não moveu uma palha para fazê-la, sucumbiu aos desígnios dos acontecimentos que estão lhe abreviando a passagem pela vida pública. Com ou sem Lula, o Brasil precisa de uma República suficientemente forte para resistir aos ataques de bárbaros e malfeitores. Em Brasília, os primeiros aromas de orégano já prenunciam um grande acordo para acomodar parlamentares faltosos de todos os grandes partidos. Poucos são os apontados e muitos serão os impunes. E somente uma autêntica reforma político-eleitoral pode apontar para horizontes menos sombrios. 


é sociólogo e ensaísta

(http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=2173). 

Cardeal argentino hoje Papa Francisco era o pesadelo da alta cúpula da Igreja (Entrevista. Andreas Englisch)


22 julho 2013


Cardeal argentino, hoje Papa Francisco, era o pesadelo da alta cúpula da Igreja

"Acontece agora uma revolução latino-americana no Vaticano".

‘Bergoglio era o pesadelo da Cúria’

"Enquanto os votos da quinta rodada são apurados, a esperança dos cardeais da Cúria afunda a olhos vistos. "Bergoglio, Bergoglio, Bergoglio", ressoa novamente pela Capela Sistina. Tarcisio Bertone simplesmente não pode entender." 

Quem revela o clima da votação que elegeu Francisco é o jornalista Andreas Englisch.


Vaticanista há 25 anos, ele escreveu sobre João Paulo II, Bento XVI e, agora, traz Francisco – o papa dos humildes (ed. Universo dos Livros, R$ 39,90). Na obra, bastidores do conclave, como o desespero da Cúria com a eleição do papa argentino, e as mudanças já percebidas nos corredores do Vaticano.



Entrevista publicada em O Estado de S. Paulo, 14/07/2013



Os cardeais escolheram um "papa forte". O interesse da Cúria, liderada pelo cardeal Tarcisio Bertone, seria por outro papa apolítico, tal qual Bento XVI?
Exatamente. João Paulo II tomou o poder da Cúria. Bento XVI devolveu. Por seu perfil, Bergoglio era o pesadelo da Cúria durante a eleição. Ele é completamente anticúria.



Francisco abriu mão do palácio para viver em uma suíte da Casa Santa Marta. Mais do que evitar o luxo, o senhor diz que foi uma estratégia para saber tudo o que ocorre no Vaticano. É um sinal de que a Cúria perdeu o poder?
Sim. Tenho certeza de que nunca nenhum outro papa conseguiu reduzir o poder da Cúria tão drasticamente como Francisco. Ele quebrou a estrutura de isolamento. A Cúria sabe que pode controlar qualquer papa, desde que ele esteja isolado do restante da Igreja.



Havia uma expectativa de que Francisco mudasse de imediato a estrutura da Cúria. Ele já não deveria ter feito isso, a começar pela demissão de Bertone?
Ele precisa demitir Bertone, mas Bergoglio é muito inteligente. Sabe que ninguém espera mudanças drásticas no Vaticano. Por isso, criou uma comissão com oito cardeais. Se decide com o aval e a participação da comissão, terá respaldo para outras decisões difíceis.



Na mídia, durante o conclave, Bergoglio não aparecia na lista de favoritos. Para os cardeais sua vitória também foi surpresa?
Para entender isso, é preciso considerar que Bergoglio foi eleito porque os cardeais estavam completamente aborrecidos com o péssimo trabalho da Cúria, o que inclui o escândalo do banco do Vaticano.



O senhor diz que Bento XVI era um admirador de Bergoglio. Será que ele imaginava que teria o argentino como sucessor?
Tenho certeza de que não. Bento XVI não sabia o quão mal avaliados estavam seu governo e sua Cúria. Ele nunca imaginou que a ira dos cardeais estivesse tão grande a ponto de escolherem pela revolução. Bergoglio era o pesadelo da Cúria. Nenhum outro cardeal foi tão maltratado como ele durante seu tempo em Buenos Aires. Uma das críticas era porque enviava os melhores padres para os pobres e não para as paróquias ricas da cidade.



Como você avalia a primeira encíclica de Francisco? Teólogos dizem que o texto foi totalmente escrito por Bento XVI.
Francisco foi instado a publicar a encíclica de Ratzinger. Não teve outra opção, senão permitir que sua primeira encíclica, a primeira declaração do que ele pensa sobre a fé, fosse escrita por Bento XVI. Ele foi gentil e a publicou com o seu nome, mas a fé não é o ponto principal para Francisco. Ele não acredita que se encontra Deus lendo livros sobre a fé. Para ele, se encontra Cristo ajudando os pobres, os doentes e as pessoas desesperadas.



Como você vê as mudanças no banco do Vaticano, como a prisão de um padre e a demissão de um diretor?
Por décadas, bispos e padres, mesmo quando culpados, eram protegidos pelo Vaticano. Exemplo: o cardeal americano Bernard Law, de Boston, ganhou um passaporte do Vaticano para escapar da Justiça dos EUA (ele é acusado de encobrir casos de pedofilia). Mas Francisco disse ao governo italiano que isso acabou. Agora, o Vaticano vai ajudar a encontrar os sacerdotes culpados.



Francisco prega uma "Igreja pobre para os pobres". O que ele já fez em direção a isso?
Fez a coisa certa: disse à Igreja que o tempo de não fazer nada, apenas de estudar e rezar, acabou. Para ele, é desnecessário dizer a alguém no que acreditar e como se comportar, se essa pessoa está desesperadamente com fome. Primeiro a ajude, depois fale sobre Deus.



A Cúria repreendeu o papa por lembrar o "suntuoso Vaticano que tudo começou com o pobre Jesus de Nazaré", como o senhor diz no livro?
A Cúria não tem qualquer influência sobre ele. Isso ficou claro quando se recusou a ir a um concerto de gala no Vaticano. Toda a Cúria foi, mas ele declarou que não gosta de compromissos da sociedade elegante. Acontece agora uma revolução latino-americana no Vaticano, em que as famílias europeias aristocráticas não são melhores do que as outras.



QUEM É



Jornalista alemão, mudou-se para Roma em 1987. É autor dos livros João Paulo II, o segredo de Karol Wojtyla (2002), Habemus papam (2005), O papa dos milagres (2011) e O homem que não queria ser papa (2013).
  
Disponível em: Antonio Lassance: Cardeal argentino, hoje Papa Francisco, era o pesa...

Danos morais. R$ 5mil. Celesc indenizará consumidor por corte indevido do fornecimento de energia...

18 abril, 2013


Justiça reconhece dano moral em corte de energia pela Celesc

     Cortar indevidamente a energia  elétrica
Roberto, cobrando danos morais da estatal
do cliente pode custar uma indenização. Isto foi o que  descobriu a Celesc com a sentença da juiza Cintia Gonçalves  Costi, do  Juizado Especial Civel, de Blumenau, em ação  impetrada pelo  advogado Roberto da Luz

Os clientes, argumentou ele,  sofreram dano moral, foram expostos ao ridículo pela ação da estatal de energia, pois as faturas pelo consumo de energia haviam sido pagas nos prazos.

      Demorou o trâmite da ação ajuizada  em maio de 2008. Foram seis anos de espera, até o inicio deste mês, quando saiu a decisão de  primeira instância. 

 O autor,  Hercílio Martins Pinto, não chegou a saber que o erro da Celesc seria, de alguma forma reparado: morreu  antes. Sua viúva receberá  os R$ 5 mil arbitrados como indenização, o que ainda pode demorar um tempo, se a estatal recorrer ao  Tribunal de Justiça.

     Roberto  da Luz comemora a vitória,  não tanto pelo valor da indenização, mas pelo judiciário ter reconhecido o erro como causa de danos morais. Há  magistrados que relutam em penalizar as estatais prestadoras de serviço, observa ele. Na mesma linha ele ajuizou outras 10 ações contra o Samae, pelos danos causados pelo desabastecimento de água.
Disponível em: É isto aí, Blumenau!: Justiça reconhece dano moral em corte de energia p...

sexta-feira, 26 de julho de 2013

A Sucessão dos Bens Particulares na Comunhão Parcial (José Carlos Teixeira Georgis)

25/julho/2013

A Sucessão dos Bens Particulares na Comunhão Parcial


Autor:
GIORGIS, José Carlos Teixeira
1. O Código Civil adotou os seguintes regimes de bens para o casamento: a) comunhão universal, na qual se comunicam todos os bens havidos antes ou depois do matrimônio, salvo exceções (bens doados ou herdados com cláusula de incomunicabilidade, gravados com fideicomisso, dívidas anteriores, doações antenupciais e as demais hipóteses do art. 1.668); b) separação de bens (legal), na qual não se comunicam nem os bens anteriores, nem os posteriores ao matrimônio, pertencendo sempre ao seu titular no registro (art. 1.641); c) comunhão parcial, na qual se comunicam os aquestos, ou seja, bens havidos durante o casamento, salvo, entre outras hipóteses, os bens que lhe sobrevierem, na constância do casamento,por doação ou sucessão, e os que forem sub-rogados em seu lugar (art. 1.659, I); d) separação de bens (convencional), na qual os cônjuges estipulam por escritura o destino dos bens (pacto antenupcial); e o novel regime da participação final nos aquestos, na qual há um regime de separação durante o casamento e outro de comunhão parcial em caso de separação ou divórcio, regime complexo, pouco adotado.
2. Também estabeleceu, mas agora no livro das sucessões, uma ordem de vocação hereditária, ou seja, uma ordem para a herança (lembre-se: num espólio há de distinguir-se a meação - direito patrimonial resultante da comunhão pelo casamento - e a herança, ou seja, direito sucessório, a que têm acesso os herdeiros, na seguinte ordem: 1º, os filhos; 2º, os pais; 3º, o cônjuge sobrevivente, caso faltem algum dos dois primeiros; 4º, os colaterais - irmãos, sobrinhos, tios, etc. -, caso faltem os três primeiros; e, não havendo herdeiros, os bens tocam ao Estado ou Município, como herança jacente.
3. Todavia, ainda no direito sucessório, o Código criou uma polêmica doutrinária, por má redação, quanto ao direito hereditário do cônjuge (não se trata da meação) ao bem particular havido por doação ou sucessão.
Assim, nos regimes da comunhão universal e da separação legal, nas quais o cônjuge já tem sua meação ou bens em seu nomenão tem direito à herança, salvo se não existirem descendentes ou ascendentes, concentrando-se o direito inteiramente nele, pois é o 3º vocacionado na ordem hereditária.
Mas a questão controvertida convergiu para o regime da comunhão parcial (e também na separação convencional e participação nos aquestos), ante a afirmação da lei de que não haveria concorrência entre cônjuge e herdeiros, no regime da comunhão parcial, se o autor da herança não houvesse deixado bens particulares, art. 1.829, I.
Esclareça-se: antes do Código, quando nada sobrasse ao cônjuge (não houvesse meação), tinha direito ao chamado usufruto vidual, ou seja, gozo da quarta parte dos bens enquanto vivesse, para compensá-lo. O novo Código extinguiu o usufruto e deu ao cônjuge (disse o relator que fora para proteger a viúva) o direito de concorrênciacom os herdeiros, ou seja, receber uma parcela dos quinhões que tocariam aos mesmos solitariamente, mas apenas nos regimes da comunhão parcial, separação e convencional e participação nos aquestos, desde que existissem bens particulares (como já se disse antes: doados ou herdados).
Segundo a doutrina, podem-se arrolar quatro posições a esse respeito:
a) a concorrência apenas se dá quando houver bens particulares e o cônjuge terá direito à concorrência com o herdeiro (descendente ou ascendente) somente nos bens particulares e não nos comuns (aquestos, havidos durante a união).
Esse entendimento é sustentado pelo Enunciado nº 270 das Jornadas de Direito Civil do STJ, editados pelo Centro de Estudos Jurídicos da Justiça Federal, colegiado nacional (magistrados, juristas, professores) que expede orientação aos tribunais (espécie de súmula atípica).
Aqui no Estado encontrou ressonância na Oitava Câmara (Agravo 70038747325, Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, por maioria, em 09.12.2010).
b) a concorrência se dá na comunhão parcial, mas incide em toda a herança (bens comuns e particulares). É mais uma posição doutrinária, logo após a edição do Código, mas que não achou maior relevo na jurisprudência.
c) a concorrência se dá na comunhão parcial somente se o autor da herança não tivesse bens particulares, ou seja, não tem bens particulares, há concorrência, o que parece contradição interna.
d) a concorrência se dá na comunhão parcial quando houver bens particulares, mas a sucessão (concorrência) incide somente nos bens comuns, pois os bens particulares são partilhados apenas entre os descendentes (em sua falta, por óbvio, os ascendentes, colocados em 2º lugar na vocação hereditária).
É entendimento recente do STJ (Recurso Especial 1.117.563/SP, Relª Minª Nancy Andrighi, julgado em 17.12.09, por unanimidade, pela Terceira Turma).
Em resumo: o cônjuge, além de sua meação nos bens comuns, neles também concorre (se houver um herdeiro, quinhão igual), mas nada recebe nos bens particulares, integralmente destinados ao herdeiro.
Tem apoio da Oitava Câmara Cível do TJRS, consoante o Agravo 70035286681, Rel. Des. Claudir Fidelis Faccenda, julgado em 20.05.2010.
É a posição que modestamente adoto.
Os argumentos estão solidamente postos pela Ministra Nancy Andrighi, a que acrescentaria algo que escrevi em acórdão de 2005 (APC 70011565496).
A interpretação das regras do Código deve ser sistemática, ou seja, não pode haver contradição interna entre as diversas normas, tanto de direito de família como de direito sucessório, elas têm de harmonizar-se, ter coerência interna.
Ora, se a vontade do doador do bem, no instante da escritura, foi a de reservar o bem, tornando-o particular (livro do direito de família), tanto que ali fica excluída de qualquer comunhão (art. 1.659, I), a que se associa a autonomia do beneficiário em havê-lo com tal natureza, essa especificidade deve ter o mesmo tratamento na herança (direito sucessório), assim a natureza incomunicável deve ser mantida, para que haja simetria lógica entre as normas materiais.
Em conclusão: quando o autor da herança (falecido), além de deixar bens comuns (aquestos) possui bens particulares, os últimos apenas tocam a seu herdeiro (descendente ou ascendente), em vista da peculiar natureza de sua instituição.
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(*) O autor é membro do Conselho Editorial da Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal.
(http://www.editoramagister.com/doutrina_24644222_A_SUCESSAO_DOS_BENS_PARTICULARES_NA_COMUNHAO_PARCIAL.aspx).